Acórdão nº 07A4069 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Dezembro de 2007
Magistrado Responsável | ALVES VELHO |
Data da Resolução | 13 de Dezembro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - AA, divorciada, intentou acção declarativa contra BB, entretanto falecido, e mulher, CC, e contra DD e mulher, EE e FF, e GG e mulher, HH, sendo ainda Interveniente a "Sociedade Familiar SJP", pedindo fosse declarado nulo e de nenhum efeito o acto constitutivo da "sociedade familiar SJP", bem como julgada derivadamente nula a aquisição pela mesma sociedade do imóvel sito na AV. ....., n.º 00 A, freguesia de S. João de Brito, em Lisboa, e ainda ser declarada a litigância de má fé no caso de os Réus contestarem a acção.
Alegou a A., em síntese, que é filha dos dois primeiros Réus e irmã e cunhada dos demais e que os seus pais, sendo donos do identificado imóvel, formaram juntamente com os irmãos da Autora uma sociedade familiar, na qual os seus pais realizaram a respectiva quota com a entrada do imóvel referido, sem o consentimento da Autora, existindo conluio entre todos os Réus com o fim de prejudicarem e enganarem a Autora, pois que a sua real vontade foi transmitir a favor dos irmãos da Autora, com exclusão desta, a propriedade do imóvel e não a constituição da sociedade, sendo certo, também, que o contrato societário visa obter um fim contratual objectivamente impossível e contrário à lei, assim como ofensivo dos bons costumes, ou seja, afastar a Autora de qualquer controle de uma potencial venda a outros descendentes hereditários legitimários dos Réus pais e esvaziar o conteúdo do seu direito potestativo de herdeira legitimaria.
Os Réus contestaram.
Alegam, em resumo, que o projecto de constituição de uma sociedade familiar só surgiu depois da Autora se ter desinteressado duma proposta apresentada por seu pai, no sentido de contribuir para as despesas de adaptação e construção de 4 espaços autónomos para habitação dos agregados familiares dos Réus e da Autora, no espaço onde existia uma vivenda dos pais da A,, tendo então deliberado criar a sociedade modo a que pudessem obter deduções à matéria colectável do rendimento fiscal de cada um, negando ter ofendido qualquer direito da Autora bem como a simulação de qualquer negócio. Concluem pela absolvição do pedido.
A acção foi julgada improcedente, decisão que a Relação confirmou.
A Autora interpôs recurso de revista, insistindo na procedência dos pedidos formulados na petição inicial, incluindo o de condenação dos Réus por litigância de má fé.
Para tanto, levou às conclusões da sua alegação: 1) - Os Recorridos pais foram proprietários de uma moradia sita na AV. ....., nº 4 a 4A, na freguesia de São João de Brito em Lisboa, 2) - Os Recorridos, sem o conhecimento da Recorrente, em 13 de Dezembro de 1991 outorgaram no 2° Cartório Notarial de Lisboa, escritura de constituição de sociedade civil, sendo que, os Recorridos pais, realizaram a sua quota na mesma, pela transferência do imóvel para a referida sociedade que tem por objecto social, "a gestão e administração de bens patrimoniais dos sócios", com um valor abaixo do real.
3) - Os Recorridos pais decidiram adaptar o referido imóvel para no seu local construírem 3 fracções autónomas, para habitação deles próprios, e dos Recorridos filhos, excluindo a Recorrente.
4) - 0 Recorrido pai requereu em 6 de Maio de 1991 na Câmara Municipal de Lisboa a aprovação do projecto de alterações, sem que a Recorrente tivesse conhecimento.
5) - Os Recorridos pais iniciaram as obras de construção de um novo imóvel em substituição do existente em 1995, concluindo-se as obras em 1996, sem qualquer conhecimento da Recorrente.
6) - A Recorrente apenas teve conhecimento desta situação em finais de 1995, início de 1996 quando se dirigiu ao local e constatou a obra em estado avançado e foi informada nesse local que toda a documentação relativa à mesma estava em nome do Recorrido pai, na qualidade de proprietário.
7) - A decisão recorrida não deu cumprimento ao disposto no artigo 659º, nº 2 do Código do Processo Civil, não interpretando e aplicando as normas jurídicas correspondentes ás conclusões de recurso, da ora recorrente, constantes nas suas conclusões de 8° a 29°, o que origina a nulidade da mesma - artigo 668°, n.º 1, b) do Código do Processo Civil.
Caso assim se não entenda, 8) - O artigo 877° do Código Civil assenta na presunção "juris et jure" de que as vendas a filhos ou netos sem o consentimento dos restantes são simuladas, sendo que, no caso concreto os Recorridos não ilidiram tal presunção.
9) - No caso concreto não se realizou uma venda, mas antes a entrada de um imóvel como forma de realização da respectiva quota, pelos Recorridos pais, sócios no capital social de uma sociedade civil, constituída por aqueles e alguns filhos.
Porém, 10) - Estão naturalmente sujeitas ao regime da compra e venda as entradas em realização de capital social que consistam na transferência de um direito real, no caso a propriedade sobre o mencionado prédio urbano, (artigo 984° do Código Civil).
11) - Esta amplitude confirma o disposto no Artigo 939° do Código Civil, dado que, a entrada para a sociedade constitui um acto oneroso pelo qual se aliena um bem e, a esse mesmo acto serem genericamente aplicáveis as regras da compra e venda.
Ora, 12) - A alienação feita directamente não a filhos, mas a uma sociedade de que os mesmos filhos são sócios, configura um negócio que é uma fraude à disposição proibitiva do Artigo 877º do Código Civil, de que a retratada no caso concreto é um exemplo perfeito, ao excluir a Recorrente, enquanto filha em beneficio dos Recorridos irmãos, tendo todo o negócio corrido debaixo de um secretismo próprio de quem estava a actuar de má fé.
Ora, 13) - A finalidade do Artigo 988º do Código Civil é evitar a ocorrência de uma simulação, sempre difícil de provar, em claro prejuízo dos legítimos descendentes que não consentiram na alienação, como foi o caso da Recorrente.
14) - E mesmo com a constituição da sociedade civil, como se verificou, em face das circunstâncias objectivas, a alienação do prédio urbano constitui um negócio cujo resultado, coincidiu com o previsto naquele artigo.
15) - Tal...
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