Acórdão nº 560/99 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Outubro de 1999

Magistrado ResponsávelCons. Luís Nunes de Almeida
Data da Resolução19 de Outubro de 1999
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 560/99

Proc. nº 299/97

  1. Secção

Relator: Cons.º Luís Nunes de Almeida

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - RELATÓRIO

1. O MINISTÉRIO PÚBLICO interpôs, no Tribunal de Círculo de Lisboa, recurso contencioso das deliberações de 18 de Janeiro de 1984, de 26 de Setembro de 1984 e de 15 de Novembro de 1989, da Câmara Municipal de Sintra, com fundamento em duplo vício de violação de lei, por preterição do disposto nos artigos 2º, nº 1 e 14º, nº 1, do Decreto-Lei nº 289/73, de 6 de Junho – in casu, por preterição do parecer homologado pela DGPU, por um lado, e por outro, devido à não precedência da indispensável autorização do Ministro da Qualidade de Vida.

Citadas para o efeito, vieram a CÂMARA MUNICIPAL DE SINTRA e J..., LDA apresentar contestações. Esta última, além do mais, defendendo-se por excepção e por impugnação, suscitou a questão de inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 2º, nº 1 e 14º, nº 1, do Decreto-Lei nº 289/73, de 6 de Junho, por violação do princípio da autonomia do poder local, consagrado nos artigos 6º, 237º e 243º da Constituição da República Portuguesa.

Nas suas alegações continuou a sustentar tal questão de inconstitucionalidade, que concluiu nos termos seguintes:

Os citados artigos 2º e 14º do DL 289/73 são inconstitucionais, pois:

- violam o art. 243º/1 da Constituição, que só permite a tutela de legalidade a posteriori exercida através de inspecções, inquéritos e sindicâncias (cfr. art. 3º da Lei nº 87/89), enquanto os citados arts. 2º e 14º do DL 289/73 consagram uma tutela integrativa de mérito através da exigência de pareceres prévios vinculativos;

- violam o princípio da autonomia das autarquias locais consagrado nos artigos 6º, 237º e segts. da CRP;

- violam no caso concreto os princípios da justiça, da proporcionalidade e da boa fé, consignados no art. 266º da Constituição, ao decretarem a nulidade do loteamento como sanção para a falta de um parecer [...].

Sustentou ainda a inconstitucionalidade orgânica e material do artigo 7º do Decreto-Lei nº 292/81, - na medida em que sujeita o pedido de loteamento a autorização ministerial prévia, considerada esta como incluída no elenco das previstas pelo artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 289/73 - por violação do disposto no artigo 167º, alíneas c) e g), da Constituição (versão originária), e por violação do artigo 62º, nº 1 da CRP, ao impor daquela forma restrições ao direito de propriedade.

Por acórdão de 30 de Dezembro de 1993, o Tribunal Administrativo de Círculo negou provimento ao recurso.

2. O Ministério Público interpôs então recurso dessa decisão para o Supremo Tribunal Administrativo.

A recorrida J... contra-alegou, mantendo, nas respectivas conclusões, as anteriormente suscitadas questões de inconstitucionalidade.

Por acórdão de 23 de Fevereiro de 1995, o Supremo Tribunal Administrativo concedeu provimento parcial ao recurso, no tocante à deliberação de 15 de Novembro de 1989, que julgou nula, com fundamento em vício de violação de lei.

No tocante às questões de inconstitucionalidade suscitadas, afirmou-se naquele aresto:

Com efeito, no artº 6º nº 1 da CRP consagra-se o princípio da autonomia das autarquias locais, as quais visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas estando apenas sujeitas a uma tutela que se limita à finalidade de "verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos (artºs 237º nº 2 e 243º nº 1 da CRP).

Porém, tal como se escreveu no Acórdão de 14/4/94, "importa não esquecer que, por um lado, a autonomia local não é um valor absoluto, devendo ser compatibilizado com os princípios da unidade e eficácia da Administração Pública e, por outro lado, as atribuições das autarquias locais estão limitadas à prossecução de interesses próprios das populações respectivas e que em diversas matérias – de que é paradigmático o caso do urbanismo e do ordenamento do território, em que estão em causa interesses que ultrapassam os limites da autarquia envolvida e da respectiva população – constata-se uma concorrência de atribuições e competências da administração central (ou regional) e da administração local. Nestas situações, a intervenção da administração central não representa qualquer tutela, pois não visa controlar a legalidade ou o mérito da actuação das autarquias locais no âmbito das suas específicas atribuições, mas antes o exercício de competências próprias visando a prossecução de interesses gerais postos a cargo dessa administração central".

Assim, a obrigatoriedade de audiência da DGPU para o licenciamento das operações de loteamento, estabelecida nos artºs 2º e 14º do Dec. Lei nº 289/73, não consagra uma tutela governamental de mérito visando antes acautelar interesses gerais a cargo do Estado. Trata-se de casos de concorrência de atribuições e competências da administração local e da administração central.

[...]

Também não ocorre a invocada violação dos princípios da justiça, da proporcionalidade e da boa fé.

Com efeito, o artº 14º nº 1 do Dec. Lei nº 289/73, ao sancionar com a nulidade os actos das câmaras municipais respeitantes a loteamento não precedidos da audiência da DGPU, não viola os referidos princípios nem o disposto no artº 266º da Constituição da República pois tais princípios reportam-se à actuação da Administração na sua actividade administrativa e, no caso concreto tal sanção resulta do próprio diploma legal. De qualquer forma, estando em causa valores de interesse nacional, ligados ao ordenamento do território e ao ambiente que cumpre ao Estado acautelar, tem de se considerar como justa, equilibrada e proporcionada a nulidade, perante a grave ilegalidade do licenciamento de uma operação de loteamento em que se impunha que fosse e não foi ouvida a DGPU.

3. É desta decisão que vem interposto o presente recurso, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, para apreciação da questão de inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 2º e 14º do Decreto-Lei nº 289/73, de 6 de Junho, por violação dos artigos 6º, nº 1, 237º, 241º, 243º e 266º da Constituição.

Já neste Tribunal, a recorrente apresentou alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

1ª Os artigos 2º e 14º./1 do D.L. nº 289/73, de 6 de Jun., enfermam de inconstitucionalidade material por violação do disposto no art. 243º/1 da CRP, já que estabelecem uma forma de tutela que transcende a mera averiguação da legalidade dos actos do município, possibilitando à Administração Central impedir a concessão de licenças de loteamento por razões de conveniência ou oportunidade.

2ª Os artigos 2º e 14º./1 do D. L. nº 289/73, de 6 de Jun., ao pressuporem o exercício de poderes de...

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