Acórdão nº 10587/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Abril de 2007
Magistrado Responsável | ROQUE NOGUEIRA |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1 - Relatório.
No Tribunal Judicial da Comarca de Cascais, Maria […] interpôs acção declarativa de condenação com processo comum ordinário contra A.[…], alegando que constituiu o Réu seu mandatário e que este só em 29/6/2000 é que propôs execução por alimentos contra o seu marido, por prestações em atraso devidas aos filhos menores de ambos, apesar de desde 1996 e 1997 o ter instado, por várias vezes, para accionar tal execução.
Mais alega que, tendo sido deduzidos embargos à execução, foram os mesmos julgados procedentes, por decisão transitada em julgado, por se ter considerado ter ocorrido a prescrição.
Alega, ainda, que o Réu não dedicou à questão o cuidado e zelo que a importância da mesma requeria, sendo tal negligência causa directa da perda do direito económico que a autora esperava obter com a referida execução.
Conclui, assim, que deve o Réu ser condenado a pagar-lhe, a título de indemnização pelos danos causados, a quantia que tinha direito a receber do executado - € 16.884,31 -, acrescida de juros moratórios, desde 1/7/2000 até 31/1/2005, no montante de € 5.635,33, e de sanção pecuniária compulsória, desde 1/7/2000, no valor de € 3.876,45, o que tudo perfaz o total de € 26.396,09.
O Réu contestou, alegando que, no seu entender, a execução especial por alimentos deu entrada em juízo tempestivamente, não tendo cometido qualquer erro de ofício merecedor de censura deontológica, pelo que, não foi a sua conduta que originou a perda reclamada pela autora.
Na contestação, deduziu o Réu o chamamento da […] Companhia de Seguros, SA, alegando ter transferido para esta a responsabilidade civil profissional de advogado, sendo a mesma responsável pelo pagamento de eventual indemnização que possa ser legalmente exigida ao Réu.
Conclui, deste modo, pela improcedência da acção, requerendo a intervenção principal provocada da referida Seguradora.
Esta contestou, concluindo que o Réu actuou de acordo com os padrões usuais de litigância que lhe são impostos pelo seu estatuto profissional, não tendo violado qualquer disposição estatutária ou geral, pelo que, a acção deve ser julgada improcedente.
Seguidamente, foi proferido despacho saneador, tendo-se seleccionado a matéria de facto relevante considerada assente e a que passou a constituir a base instrutória da causa.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, após decisão da matéria de facto, proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente e condenando o Réu e a interveniente a pagarem à Autora, respectivamente, as quantias de € 1.799,08 e de € 16.191,74, acrescidas de juros, à taxa legal de 4%, desde a data da sentença até integral pagamento.
Inconformada, a interveniente interpôs recurso de apelação daquela sentença, tendo a Autora interposto recurso subordinado.
Produzidas as alegações e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
2 - Fundamentos.
2.1. RECURSO PRINCIPAL 2.1.1. A Recorrente remata as suas alegações com as seguintes conclusões: a) Patenteiam os autos que o segurado da ora Recorrente, Dr. A.[…], patrocinou, entre outras, as acções de divórcio da ora Recorrida e do seu cônjuge C.[…] e de Regulação de Poder Paternal, as quais correram os seus trâmites […] Tribunal Judicial da Comarca de Cascais, sob o nº […] e respectivos Apensos.
b) Por douta sentença de 24 de Fevereiro de 1995, transitada em julgado em 16 de Março seguinte, foi estabelecida a regulação de poder paternal, tendo sido decidido que o Requerido entregaria à Requerente, até ao dia 5 de cada mês de calendário, através de numerário, cheque ou vale postal, uma prestação alimentar no montante de 40.000$00 (equivalente a € 199,52) relativamente a cada um dos seus filhos e no quantitativo global de 80.000$00 (equivalente a € 399,04) devida desde a propositura da acção (15 de Julho de 1993) até atingirem a maioridade (alínea C) dos Factos Assentes).
c) O ali Requerido não efectuou o pagamento das prestações fixadas (alínea D) dos Factos Assentes).
d) Por isso, o ora R. Dr. […], em 19 de Abril de 1995, apresentou nos autos de traslado que correram pelo 3º Juízo Cível do Tribunal da Comarca de Cascais, sob o nº […], requerimento solicitando que fosse notificada a Caixa Geral de Aposentações para proceder mensalmente ao desconto da importância de Esc.: 140.000$00 na pensão do Requerido, sendo Esc.: 80.000$00 respeitantes à pensão mensal respectiva e Esc.: 60.000$00 para amortização das prestações já vencidas, requerimento esse parcialmente deferido já que o Tribunal ordenou, uma vez que o Requerido devidamente notificado não negou a dívida, o desconto directo, pela Caixa Geral de Aposentações do montante da pensão fixada (40.000$00 para cada filho, no total de 80.000$00) até à sua maioridade (alínea E) e F) dos Factos Assentes).
e) Em 6 de Novembro de 1995 o Dr. […] foi notificado para indicar o montante global dos alimentos em dívida o que fez por requerimento de 9 de Novembro de 1995 onde esclareceu que o montante dos alimentos em dívida ascendia a Esc.: 1.960.000$00, montante correspondente, às prestações devidas entre 15 de Julho de 1993 e Julho de 1995, inclusive (alínea H) e I) dos Factos Assentes).
f) Por Despacho de 19 de Janeiro de 1996 foi indeferido o desconto das prestações de alimentos em dívida por os descontos mensais a que se procedia se aproximarem já dos 50% do valor da pensão recebida e por se entender que a Requerente poderia exercer o seu direito à execução de alimentos em dívida, coercivamente, nos termos do artigo 190º nº 4 do O.T.M. e 1118º do C.P.C. (alínea J) dos Factos Assentes).
g) Através de requerimento inicial, entrado em 29 de Junho de 2000, o Dr. […] instaurou execução por alimentos contra C.[…], pelo montante de 3.385.000$00, incluindo juros moratórios vencidos até 1 de Julho de 2000, calculados à taxa legal supletiva acrescidos de 5% correspondentes à sanção pecuniária compulsória do art. 829º-A C.C., nomeando à penhora a meação do requerido nos bens comuns do casal, execução essa que o executado embargou arguindo as excepções de ilegitimidade e de prescrição da dívida (alíneas N) e O) dos Factos Assentes).
h) O Dr. […] contestou os embargos sustentando a improcedência de qualquer das excepções alegando, designadamente, que a dívida tinha sido reconhecida por sentença proferida nos Autos de Regulação de Poder Paternal, de 24 de Fevereiro de 1995 (Doc. nº 7 junto com a contestação do Dr. […] […]).
i) O Tribunal de Cascais decidiu, porém, que se verificava a prescrição porquanto "A norma constante do art. 311º/1 do Código Civil não pode ser invocada pois a sentença condenou no pagamento das prestações alimentares, não tendo reconhecido qual o montante que se encontrava em dívida" (alínea S) dos Factos Assentes).
j) Tal decisão foi revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a recurso do Dr. […], tendo aquele decidido que se não verificava a prescrição ex-vi do nº 1 do artigo 311º do Cód. Civil (alínea U) e V) dos Factos Assentes).
k) Da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa foi pelo Requerido interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, recurso este que o Dr. […] já não acompanhou mas que procedeu tendo aquele Venerando Tribunal decidido manter a decisão de 1ª instância (alínea X) e Z) do factos assentes).
l) A acção de Regulação do Exercício do Poder Paternal foi proposta em 14 de Julho de 1993 e a sentença proferida em 24 de Fevereiro de 1995, tendo nesta sido decidido que as prestações alimentares a partir de 1 de Janeiro de 1996 seriam actualizadas de acordo com o índice de preços no consumidor (doc. nº 1 junto com a douta petição).
m) Por sua vez, pela execução por alimentos a Cliente do Dr. […] e ora A. pretendia ser paga das prestações alimentícias vencidas entre 15 de Julho de 1993 e Julho de 1995, reconhecidas na sentença referida na conclusão anterior e, porque anteriores a 1 de Janeiro de 1996, não sujeitas a qualquer actualização, logo encontrando-se reconhecido o montante que se encontrava em dívida.
n) Consequentemente, a norma do nº 1 do artigo 311º do Código Civil é aplicável "de pleno" à hipótese em causa.
o) Acresce que o Dr. […] ao apresentar Requerimento em que solicitava que a Caixa Geral de Aposentações procedesse aos adequados descontos, em 19 de Abril de 1995, Requerimento esse sobre o qual recaiu o Despacho de 26 de Junho de 1995 o qual foi notificado ao Requerido C.[…] em 3 de Julho de 1995, praticou um acto no processo pelo qual manifestou a intenção da Autora pretender ser paga das prestações em dívida pelo que, mesmo a admitir-se que o prazo prescricional era de cinco anos, tal prazo tem de haver-se por interrompido antes de decorridos os cinco anos sobre a data da constituição da dívida (prestações alimentícias vencidas entre 15 de Julho de 1993 e Julho de 995).
p) E novo acto interruptivo da prescrição foi ainda praticado quando o Dr. […] apresentou em 9 de Novembro de 1995 novo Requerimento indicando o valor global das prestações alimentícias em dívida sobre o qual recaiu o Despacho de 19 de Junho de 1996 que indeferiu o desconto das prestações devidas do qual igualmente notificado foi, em 8 de Fevereiro de 1996, o C.[…].
q) Na verdade, ambos os requerimentos, praticados em processo judicial e demonstrativos de que o credor pretende exercer o seu direito em relação ao devedor, interrompeu, por força do disposto no nº 1 do artigo 323º do Código Civil a prescrição.
r) Mas, ainda a não se entender assim, sempre se extrai da resposta ao quesito 10º onde se deu como provado que notificado dos referidos Despachos o C.[…] nada requereu, que houve um reconhecimento tácito da dívida, o qual é relevante face ao disposto no nº 2 do artigo 323º do Código Civil.
s) Constata-se, em resumo, que não era de prever que, perante a factualidade exposta, o Supremo Tribunal de Justiça viesse a decidir no sentido de que se encontrava prescrito o direito de crédito às prestações alimentícias.
t) Como se constata que o Dr. […] conhecia as disposições supra-referidas...
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