Acórdão nº 8499/2006-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Novembro de 2006
Magistrado Responsável | ANA LUÍSA GERALDES |
Data da Resolução | 23 de Novembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - 1. M…, instaurou acção com processo ordinário contra: D… Pedindo a condenação da Ré em PTE 180.000.000$00, correspondente a: a) PTE 50.000.000$00, relativo ao lucro que a A. não obteve por culpa da Ré, e à perda de mais valia de prestígio e oportunidades de novos negócios para a A.; b) PTE 4.575.000$00, referente às despesas com a elaboração da candidatura; c) PTE 37.720$00 referente ao pagamento do serviço não prestado.
Pede ainda (conforme correcção efectuada na audiência preliminar - cfr. fls. 226) que seja declarado nulo o contrato, atento o incumprimento do dever de informação, e que sejam declaradas nulas diversas cláusulas por violarem disposições do Dec. Lei nº 446/85, de 25/10.
Alega, para o efeito, ter contratado com a R. a entrega por esta de documentos para uma candidatura da A. em Brasília, Brasil, a um concurso público internacional.
Com tal candidatura esperava a A. obter bons proveitos, mas as suas fundadas expectativas foram frustradas em virtude de a R. não ter entregue a respectiva documentação no prazo estabelecido, do qual estava bem ciente, assim lhe causando avultados prejuízos.
Circunstâncias agravadas pelo facto de a Ré sempre ter feito chegar à A. a informação de que conseguia colocar em Brasília a documentação necessária ao referido concurso, quando não o fez nem podia fazer.
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Contestou a R. argumentando, em síntese, que a A. não tem qualquer razão, porquanto, contrariamente ao que diz, nunca se obrigou perante a A. a prestar os seus serviços dentro de prazos pré-estabelecidos.
Por outro lado, a culpa foi da A. que só lhe entregou a encomenda/documentação muito depois, e numa altura em que, por causa do denso nevoeiro que se fez sentir nos Aeroportos de Lisboa e de Madrid, os aviões não puderam levantar voo. Tratando-se de um problema relativo ao tráfego aéreo a Ré não tem qualquer responsabilidade por eventuais atrasos.
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Na réplica (cf. fl. 211, do II vol.) manteve a A. a sua posição.
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Na audiência preliminar, a A. reformulou o seu pedido inserido na p.i. pedindo também, conforme se referiu supra, que: a) sejam declaradas nulas as cláusulas do contrato sobre as quais não foi dado cumprimento ao dever de informação e que a Ré não comunicou à A. com a devida antecedência; b) e que sejam declaradas nulas as cláusulas inseridas no formulário depois da assinatura de um dos contratantes, por violarem o disposto no Dec. Lei nº 446/85, de 25/10 - cf. fls. 226, do II vol.
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A Ré opôs-se argumentando que tal nulidade não pode ser considerada por se mostrar incompatível com o pedido inicialmente formulado, o que acarreta a ineptidão da p.i..
Seguidamente, foi interposto recurso de Agravo pela R.
do despacho que admitiu a resposta da A. à pronúncia da R. sobre o requerimento de reformulação da petição inicial (cf. fls. 231).
As alegações do Agravo constam a fls. 372, do II vol.
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O Tribunal "a quo" exarou despacho saneador onde foram conhecidas as excepções invocadas pela R., salvo a relacionada com a alegada caducidade da reclamação apresentada pela A. (fls. 337).
Aí se julgou improcedente a arguição da ineptidão da petição inicial quer pela "pretensa cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis, quer pela contradição entre alguns pedidos de declaração de nulidade de cláusulas contratuais e a causa de pedir, seja pelo carácter vago ou abstracto de tais pedidos de declaração de nulidade de cláusulas contratuais" - cf. fls. 327 a 366, do II vol.
Seguiram-se os factos assentes e a elaboração da base instrutória.
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Foram interpostos novos Agravos pela R.
do despacho que indeferiu a questão prévia da suspensão da instância (fls. 367), assim como do despacho saneador na parte em que julgou improcedente a excepção de ineptidão da p.i. alegada pela Ré - cf. fls. 368, do II vol., com alegações a fls. 486 a 496 e 497 a 542, do III vol.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Tendo-se procedido a julgamento, e a Ré alegado por escrito (cf. fls. 1080 e segts do V vol.), o Tribunal "a quo" julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido.
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Inconformada, a Autora Apelou, tendo formulado, em síntese, as seguintes conclusões - cf. fls. 1157, do V vol.: a) A decisão efectuou errónea interpretação das normas do Dec. Lei nº 446/85, de 25/10, aplicáveis ao contrato celebrado entre a Autora e a Ré; b) O contrato é nulo por não incluir a totalidade dos termos e condições; c) O contrato é nulo face ao não cumprimento do dever de informação, dado que tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas do mesmo, a R. não as comunicou à A. com a antecedência necessária; d) O contrato é nulo por as respectivas cláusulas se encontrarem inseridas num formulário, depois da assinatura de um dos contratantes, e assim se considerarem excluídas do contrato; e) É nula a cláusula 1ª do contrato, por violação do disposto no n° 1 do art. 5° do citado diploma, com as consequências dos arts. 8° e 9° do mesmo diploma; f) É nulo o segundo parágrafo da cláusula 4ª do contrato, por violação do disposto no n° 1 do art. 5° do citado diploma, com as consequências dos arts. 8° e 9° do mesmo diploma; g) É nula a cláus. 7ª do contrato, por violação do princípio da boa-fé, nos termos do art. 16° do citado diploma; h) São nulas as cláusulas 8°, 9°, 11°, 12° e 13° do contrato, por se tratarem de cláusulas absolutamente proibidas, nos termos das als. b), c), d), h) do art. 18° e art. 12° do citado diploma; i) Ao não entregar a encomenda da A. dentro do prazo a R.
incumpriu o contrato; j) A R. é a exclusiva culpada da não entrega atempada da encomenda, pelo que deve indemnizar a A.
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Houve contra-alegações (cf. fls. 1170, do VI vol.).
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Corridos os Vistos legais, Cumpre Apreciar e Decidir.
II - OS FACTOS (organizados de forma lógica e/ou cronológica): 1. Actualmente (dados de Dezembro de 1998) a Ré D… opera em 224 países, empregando cerca de 60.000 funcionários e dispõe de mais de 2.000 Centros de Serviço - 80º; 2. Gere uma frota aérea com mais de 200 aviões e cerca de 15.000 veículos, detendo 40% do tráfego aéreo do mercado internacional da sua categoria - 81º; 3. A D… efectua 200 entregas por cada 60 segundos - 82º; 4. Em termos práticos, isso equivale a 100.000.000 de documentos e encomenda expedidos por ano - 83º; 5. A D… procede a entregas de documentos e pequenas encomendas em qualquer lado do mundo e em tempo que, na Europa, por exemplo, não excede 24 horas estimadas - 84º; 6. Estes documentos e encomendas têm ou destino em Portugal e origem em qualquer país do mundo, ou origem em Portugal e destino em qualquer país de Mundo - 85º; 7. A entrega dos documentos e encomendas é assegurada por um misto de meios de transportes, cujo núcleo central é o avião - 86º; 8. Em termos práticos, o cliente contrata a colocação de um determinado documento ou encomenda em qualquer local do mundo, competindo à D… colocar tal documento ou encomenda no local solicitado, no prazo mais curto possível, possuindo, em face da sua experiência, tempos médios de envio estimados em relação a cada trajecto específico - 87º; 9. Na actividade que desenvolve em Portugal, a D… funciona predominantemente como entreposto comercial de envio ou de recepção de encomendas - 92º; 10. Os programas de entregas regulares que a A. adoptou são elaborados com base em critérios de normalidade em relação à meteorologia, aos transportes, à logística dos aeroportos e da própria D…, serviços de handling, fiabilidade dos transportes utilizados no envio, controlo alfandegário, conjuntura política nos países de trânsito, etc. - 17º; 11. Sempre que um cliente solicita um determinado serviço à D… esta elabora uma estimativa do tempo que demorará a proceder a entrega, estimativa essa que tem como suporte os referidos programas de entregas regulares - 19º e 20º; 12. O tempo de trânsito estimado para uma entrega de encomenda que tenha origem em Portugal e destino Brasília são 3 a 4 dias úteis - C); 13. O tempo de trânsito estimado é sempre fornecido em dias úteis - 23º; 14. Tal circunstância, porém, não determina que a actividade da D… paralise durante o fim-de-semana; muitas vezes, os dois dias do fim-de-semana são aproveitados para acelerar o processamento e entrega dos envios - 25º; 15. Não existe, no programa de entregas regulares da D… qualquer destino onde o tempo de trânsito seja 15 dias de calendário, ou sequer 10 dias úteis - 97º; ___________ 16. No dia 3-12-98, a A., através do Dr. I…, perguntou à R. qual o dia em que tinha de ser entregue uma encomenda de forma a estar em Brasília, o mais tardar, no dia 17-12-98 - A); 17. A funcionária da R. respondeu que o prazo estimado para a entrega de uma encomenda com destino ao Brasil era de 3 a 4 dias úteis - B); 18. De acordo com o programa referido, estava previsto que a encomenda confiada à R. pela A. saísse de Lisboa no dia 12-12-98, Sábado - 26º; 19. Na ocasião referida na al. A), a funcionária da R. referiu ao Dr. I… que o melhor seria expedir a encomenda no dia 11-12-98 (6ª Feira), para ser mais seguro - D); 20. A funcionária da R. confirmou à A. que se a documentação fosse entregue no dia 14-12-98 (2ª Feira) ainda estaria a tempo de estar em Brasília a 17-12-98 - 1º; 21. Na mesma ocasião, a R. informou a A. de que colocaria um alerta no processo quanto ao facto de a encomenda conter documentação para concurso público - 2º; 22. Na conversa referida nas als. A) e B), a funcionária da R. não assegurou ao Dr. Isidro … a certeza na entrega do documento dentro do prazo de 3 a 4 dias úteis referido na al. C) - 21º; ______________ 23. No dia 11-12-98 (Sexta-Feira), entre as 19h e 30 m e as 19h e 50m, a A. entregou à R. um documento constituído por 5 volumes e com 12,5 kg de peso total, a fim de ser por esta entregue em Brasília-Brasil - E), F) e 6º; 24. A essa hora já não...
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