Acórdão nº 06A3790 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelSILVA SALAZAR
Data da Resolução29 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA e mulher, BB, CC e mulher, DD, e EE, intentaram em 1/7/96 a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra Banco ..., SA, E..., SA - Construção Civil e Obras Públicas, e C... Insurance - Company of Europe, SS - NV, pedindo a sua condenação: - a pagarem-lhes a quantia de Esc. 5.569.557$00 pelos danos causados nas partes comuns do seu prédio, discriminados nos artigos 16º a 24° inclusive da petição inicial, sito na Rua Parque da República, n.ºs 50 e 52, em Vila Nova de Gaia; e - a procederem à demolição do edifício que construíram no limite e a poente do seu prédio, ou, em alternativa, a pagarem-lhes uma indemnização em quantia não inferior ao montante de Esc. 10.000.000$00 pela desvalorização do seu prédio, acrescido de juros desde a citação.

Para tanto alegaram, fundamentalmente, o seguinte: Os autores são donos, respectivamente, das fracções autónomas "A", "B" e "C" do prédio urbano sito na Rua Parque da República, n.ºs 50 e 52, constituído em regime de propriedade horizontal, descrito na 2a Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n° ... e omisso na matriz da freguesia de Mafamude de Vila Nova de Gaia.

Por si e seus antepossuidores, encontram-se na posse pública, pacífica, continuada e de boa fé, desse prédio, há mais de 15, 20 e 30 anos, sem qualquer interrupção, sem oposição de ninguém, com o conhecimento de toda a gente e na convicção de estarem a exercer um direito próprio.

O Réu Banco está a levar a efeito no terreno contíguo ao seu prédio, pelo lado poente, do qual aquele é proprietário, a construção de um edifício composto de oito pisos, tendo tal obra de construção sido adjudicada à Ré E..., cuja execução esta está a levar a efeito.

Os Réus, ao procederem à demolição do edifício antigo nesse terreno existente e à construção do edifício novo, causaram danos avultados quer nas partes comuns, quer nas partes privativas do prédio dos Autores.

No tocante, porém, aos danos provocados nas partes privativas do prédio, nas fracções dos Autores, foram já estes ressarcidos pela Ré C..., na sua qualidade de seguradora e ao abrigo do contrato de seguro titulado pela apólice ... através da qual o Réu Banco transferiu para esta seguradora a sua responsabilidade pelos danos causados com a execução da obra.

O mesmo não aconteceu com os danos provocados nas partes comuns do prédio.

De facto, devido à execução das obras de construção e por força dos consideráveis desaterros efectuados no espaço de construção, foram provocadas fissuras em várias partes do prédio dos Autores.

Nomeadamente, foram provocadas várias rachadelas que atravessam todo o terreno exterior (transversais e longitudinais) e que se estendem até à parede do prédio vizinho situado a nascente, no logradouro, desde o muro divisório até à parede do prédio dos Autores.

Foi também provocada uma enorme fenda que atravessa as garagens situadas ao fundo do terreno e que se estende até ao muro do lado oposto, a nascente.

Nas garagens do prédio dos Autores foram causadas fendas nas lajes de cobertura, as quais permitem a infiltração das águas das chuvas.

Na garagem n° 1 foi ainda causada fissuração ao nível dos azulejos da parede lateral esquerda e no pavimento.

Na garagem n° 2, foi também provocada fissuração ao nível do pavimento.

Na garagem n° 3, igualmente foi provocada fissuração ao nível do tecto, nas paredes laterais e ainda nas paredes dos fundos.

São ainda perfeitamente visíveis fissuras em todas as paredes exteriores do prédio dos Autores e também uma enorme rachadela na parede exterior do mesmo, do lado poente.

A reparação dos danos atrás descritos, causados no prédio dos Autores, orça em Esc. 5.568.557$00.

Para além disso, o prédio dos Autores era um prédio airoso, exposto ao sol e bem arejado. Isto porque entre o prédio dos Autores e o prédio que foi demolido existia um espaço livre que os separava numa extensão de 8 m e ainda porque esse mesmo prédio demolido possuía apenas 3 andares, o que permitia que o prédio dos Autores, na parte que deitava para o prédio demolido, tivesse, pelo menos ao nível do 2° andar, amplas vistas.

Por outro lado, tal afastamento permitia que os andares do prédio dos Autores se mantivessem arejados e com exposição ao sol.

A construção levada a efeito no local onde se encontrava esse prédio demolido, foi implantada no limite da separação entre os dois prédios, ou seja, no limite do prédio dos Autores, ficando apenas entre as empenas dos dois prédios a distância correspondente à rampa de acesso às garagens do prédio dos Autores e que tem três metros de largura, constituindo-se tal espaço num estreito e escuro corredor que não permite a entrada de luz natural e arejamento necessários às habitações dos Autores.

Por outro lado, o muro da construção, implantado no limite do terreno onde foi construído o novo edifício, possui uma altura de cerca de 10 metros, contra o anterior 1,80 m do primitivo muro que dividia as duas propriedades.

Tal situação não permite a entrada do sol no prédio dos Autores e impede o arejamento normal que anteriormente possuía, traduzindo, como consequência, a existência de constantes humidades e fungos no prédio dos Autores na parte voltada à construção. Da mesma forma, ficou o prédio dos Autores sombrio e privado de luz natural e manifestamente desvalorizado.

Na verdade, os Réus não respeitaram, na implantação da edificação levada a efeito, a distância que quer legal quer administrativamente lhes é imposta.

Ora, há mais de 30 anos que os Autores, por si e seus antepossuidores, possuem uma servidão de vistas relativamente ao prédio onde foi implantada a construção, pelo que adquiriram o respectivo direito à servidão de vistas.

Também há mais de 30 anos que através das janelas e portas do prédio dos Autores voltado à construção se fazia o arejamento e se expunha o mesmo à luminosidade, razão pela qual e pelo mesmo motivo, tais bens, porque essenciais, não podem ser retirados pela construção levada a efeito pelos Réus.

As razões aduzidas são suficientes para requererem a demolição do edifício construído pelos Réus a poente do prédio dos Autores. Ou, se assim não se entender, assiste aos mesmos Autores o direito a serem indemnizados pelos danos derivados da falta de arejamento, luz e ar e a consequente desvalorização do seu prédio. Tal indemnização não pode ser calculada em quantia inferior a Esc. 10.000.000$00.

*Contestaram os Réus, pugnando pela improcedência da acção e, consequentemente, pela sua absolvição do pedido.

*Replicaram os Autores, pugnando pela procedência da acção, tendo ainda a E... apresentado tréplica.

*Foi proferido despacho saneador, que julgou não haver excepções dilatórias - nomeadamente uma de nulidade por ineptidão da petição inicial, deduzida pela E... -, nem nulidades secundárias, após o que foram produzidos especificação e questionário, objecto de reclamações apresentadas pelos réus Banco e C..., as quais, após resposta dos autores, foram decididas por despacho de fls. 209/210.

Oportunamente teve lugar audiência de discussão e julgamento perante tribunal singular, no decurso do qual foi proferido um despacho a fls. 398 dos autos, pelo qual foi ordenado o aditamento de um novo quesito, na sequência da ampliação do primeiro pedido formulada pelos Autores para o montante de 40.664,92 euros (fls. 397).

No âmbito da audiência de discussão e julgamento foi outorgada uma transacção entre os autores e as rés E... e C... quanto ao primeiro pedido formulado (indemnização pelos danos causados nas partes comuns do prédio daqueles), a qual veio a ser homologada pelo Tribunal (fls. 429 a 430), prosseguindo a acção apenas para a apreciação do pedido principal de demolição e do pedido alternativo de indemnização e unicamente no que concerne ao 1º Réu, Banco ..., SA.

Foi proferido despacho respondendo à matéria de facto contida nos quesitos 11º a 21º e 25º (cfr. o despacho de fls. 431), - por os restantes terem sido eliminados em resultado da homologação da referida transacção -, o qual não...

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