Acórdão nº 0742/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Março de 2006

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução21 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., identificada nos autos, inconformada com o acórdão da 3ª Subsecção que negou provimento ao RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO da deliberação do CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, recorreu para o Pleno da 1ª Secção, formulando em síntese as seguintes conclusões:

  1. Omissão de pronúncia - os factos imputados à recorrente foram objecto de sanção através do acórdão proferido pela entidade recorrida em 19-11-2001, acórdão este que posteriormente veio a ser revogado pelo acórdão proferido em 19 de Setembro de 2002; - o acórdão revogado, de 19-11-2001 foi proferido na vigência dos artigos 98º e 110º, al. a) ambos do Dec. Lei 343/99, de 26/8, normas estas que foram declaradas inconstitucionais pelo Acórdão n.º 73/2002 do Tribunal Constitucional; - torna-se necessário saber se a revogação do acto administrativo em causa, colide ou não com os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, tal como vem arguida no recurso mas que não obteve qualquer pronúncia.

    - o acórdão recorrido no juízo que tece à volta do vertido nas conclusões formuladas sob os n.ºs 7º, 8º e 9º ficou aquém do objecto do recurso, deixando de se pronunciar sobre um elemento preponderante atinente à fundamentação crítica do apuramento do juízo de culpabilidade, qual seja a valoração crítica dos registos disciplinares, quer da recorrente quer do técnico de justiça adjunto, os quais não foram juntos aos autos, apesar de ter sido solicitada a sua junção; b) Inconstitucionalidade material Os artigos 98º e 11º do Dec. Lei 343/99, de 26 de Agosto (Estatuto dos Oficiais de Justiça), na redacção que lhe foi dada pelo art. 1º do Dec. Lei 96/2002, de 12/04, padecem de inconstitucionalidade material, por violação do art. 218º, 3 da CRP; c) Inaplicabilidade da lei nova aos factos em causa O Dec. Lei 96/2002, de 12/04 não se aplica aos factos que originaram o presente procedimento, os quais são anteriores à data da sua entrada em vigor, sendo que a lei nova só dispõe para o futuro; d) Invalidade do procedimento desde a sua origem; A declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral torna inválidos os actos jurídicos praticados ao abrigo dessa lei, pelo que o procedimento é inválido desde a sua origem; e) Ilegalidade por violação do art. 106º do CPA O COJ carece de legitimidade para proferir a decisão, ora em recurso, face ao disposto no art. 106º do CPA esgotou a sua competência, não lhe sendo possível arguir a nulidade da sua decisão e proferir nova decisão apoiada nos mesmos factos; f) O aproveitamento do processo disciplinar implica a violação do contraditório e suspeição do instrutor.

    A nulidade do processo disciplinar desde o seu início implica que a nova decisão tenha sido proferida sem respeito pelo princípio do contraditório, e ainda a suspeição do instrutor nomeado; g) Violação do art. 133º, 1 do CPA A deliberação é nula no que concerne à imputação da violação do dever geral de zelo; h) Falta de fundamentação A deliberação do COJ não está suficientemente fundamentada, quanto aos factos relativos à violação do dever especial de colaboração; quanto ao juízo material de culpa e quanto à medida e graduação da pena aplicada.

    Não foram produzidas contra alegações.

    Por acórdão de fls. 148 e 149 entendeu a Subsecção não ter cometido a nulidade de omissão de pronúncia.

    O Ex.mo Procurador-geral Adjunto, neste Supremo Tribunal, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais foi o processo submetido ao Pleno da 1ª Secção.

    2. Fundamentação 2.1. Matéria de facto O Acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto: 1 A Recorrente é técnica de justiça auxiliar nos serviços do M.P. do Tribunal de Felgueiras, sendo que o quadro desses serviços é constituído por dois técnicos de justiça adjuntos e dois técnicos de justiça auxiliares.

    2 Por orientação dos respectivos Srs. Magistrados e aceitação dos funcionários foram constituídas duas equipas, cada uma coordenada pelo técnico de justiça adjunto, sendo que a equipa em que foi integrada a Recorrente era constituía por ela, como técnica de justiça auxiliar, e pelo técnico de justiça adjunto Sr. ... a qual ficou a trabalhar nos processos afectos à Exma. Procuradora Adjunta Dr.ª ... e nos processos ímpares da Sr.ª Procuradora Dr.ª ....

    3 Inexistindo qualquer provimento ou ordem verbal que atribua tarefas específicas a cada um daqueles funcionários cabia, habitualmente, à Recorrente a entrada de papeis e a expedição do correio. As demais tarefas eram-lhe atribuídas pelo Sr. ....

    4 No dia 13/4/00, o Sr. ... atribuiu à Recorrente a elaboração dos mapas estatísticos relativamente aos processos administrativos.

    5 A Recorrente recusou fazer essa tarefa, facto que o Sr. ... deu conhecimento à Exª Procuradora Dra. ....

    6 Esta Sr.ª Procuradora proferiu provimento ordenando à Recorrente a elaboração dos referidos mapas.

    7 Elaborados os mapas o Sr. ... solicitou à Recorrente que fizesse os ofícios para remessa da estatística tendo-lhe esta respondido que havia ofícios «chapa» no computador, vindo unicamente a fazer o ofício relativo aos mapas que ela elaborou.

    8 Comunicado este facto à Exma. Procuradora esta determinou que os demais ofícios fossem elaborados pelo Sr. ... e ordenou que se extraísse cópia do mencionado provimento e se remetesse ao COJ acompanhada de informação do Sr. ..., por considerar que se tratava de uma situação de indisciplina da Recorrente.

    9 O que motivou a instauração de procedimento disciplinar que veio a culminar com a deliberação do COJ, de 19/11/01, condenando a Recorrente no pagamento de uma multa no montante de 60.000$00 - fls.107 a 114 do Instrutor, que se dão por reproduzidas.

    10 Por deliberação de 11/7/02 o COJ "declarou nula" a punição referida no anterior ponto 9. - fls. 124 e 125 do Instrutor, que se dão por reproduzidas.

    11 E em função dessa deliberação foi julgada extinta a instância do o processo que corria no TAC do Porto referente àquela punição. - fls. 86 destes autos que se dá por reproduzida.

    12 Em 19/9/02 o COJ voltou a deliberar, condenando a Recorrente no pagamento de uma multa no montante de 299,28 euros. - vd. fls. 14 a 21 dos autos, que se dão por reproduzidas.

    13 Inconformada a Recorrente interpôs recurso hierárquico necessário para o Conselho Superior da Magistratura. - vd. 41 a 55, que se dão por reproduzidas.

    14 Este recurso foi recebido no Conselho Superior da Magistratura em 18/11/02 e logo nesse dia foi proferido despacho no seu rosto do seguinte teor "Dê entrada e após remeta ao CSMP com conhecimento à Recorrente " sem qualquer identificação do seu autor. - vd. instrutor apenso.

    15 Por deliberação de 23/1/03 aquele Conselho negou provimento ao recurso. - vd. fls. 57 a 66 dos autos, que se dão por reproduzidas.

    2.2. Matéria de direito A recorrente insurge-se contra o decidido na subsecção por entender que o acórdão aí proferido é (i) nulo por omissão de pronúncia; (ii) os artigos 98º e 11º do Estatuto dos Oficiais de Justiça, na redacção introduzida pelo Dec. Lei 96/2002, de 14/04, são materialmente inconstitucionais; (iii) a deliberação do COJ de 19-2-2002 é inválida, pois o Dec. Lei 96/2004, de 12/04 não tem aplicação a factos passados; (iv) por ter violado o art. 106º do CPA; (v) o instrutor do processo deveria ter sido afastado dado o pedido de suspeição oportunamente efectuado; (vi) não existiu o violação do dever geral de zelo; (vii) o acto punitivo não está fundamentado.

    Vejamos as questões levantadas nos autos, pela ordem da respectiva arguição.

    (i) Omissão de pronúncia.

    A recorrente entende que houve omissão de pronúncia por o acórdão se ter limitado a fazer um juízo positivo sobre o critério da legalidade da revogação do acto administrativo, deixando de pronunciar-se sobre uma questão nuclear conexa com a questão da revogação. Tendo o acto revogado (acórdão do COJ) sido proferido na vigência de normas declaradas inconstitucionais com força obrigatória geral, tornava-se necessário saber se a revogação do acto administrativo colide, ou não, com os efeitos da declaração de inconstitucionalidade (primeira omissão de pronúncia).

    Por outro lado, entende o recorrente que a decisão recorrida ficou aquém do objecto do recurso, não se pronunciando sobre a valoração crítica dos registos disciplinares da recorrente, os quais não foram juntos aos autos, apesar de ter sido requerida a sua junção (segunda omissão de pronúncia).

    Em acórdão proferido ao abrigo do disposto no art. 668º, 4 do C. P. Civil a Subsecção sustentou ter apreciado a eventual repercussão da nova redacção das referidos normas na marcha do procedimento disciplinar concluindo que tais disposições, expurgadas das inconstitucionalidades que o Tribunal Constitucional lhes apontou, se deviam aplicar ao caso sub judicio "…por as mesmas não terem introduzido alterações substantivas na disciplina dos factos que determinaram a punição da recorrente, nomeadamente nos aspectos relacionados com a competência para proferir a decisão" - fls. 149.

    Vejamos.

    As alegações finais da recorrente estão juntas a fls. 83 dos autos. Nesse articulado a recorrente deu como reproduzido o que alegara nos artigos 1º a 96º da sua petição de recurso, bem como o conteúdo vertido nas respectivas conclusões. A recorrente afirma não terem sido apreciadas as questões que levantou nas conclusões 4ª e 5ª (primeira omissão de pronúncia) e 7ª, 8ª e 9ª (segunda omissão de pronúncia).

    Nas conclusões 4ª e 5ª - fls. 11 e 11 verso - defendeu a ilegalidade do acto punitivo por violação do art. 106º do CPA, não sendo lícito ao COJ arguir a nulidade do acto anteriormente praticado e concomitantemente proferir nova decisão apoiada nos mesmos factos. A inconstitucionalidade com força obrigatória geral das normas que atribuíam competência ao COJ, implicava a elaboração de um novo procedimento instrutório.

    A questão referida nestas alegações dependia da resposta a uma questão mais vasta...

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