Acórdão nº 0873/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelPAIS BORGES
Data da Resolução11 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: (Relatório) I. "A…", com sede em Gibraltar e domicílio fiscal na Av. …, nº … - …, em Faro, interpôs neste STA recurso contencioso de anulação do despacho do SECRETÁRIO DE ESTADO ADJUNTO E DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO, de 04.03.2003, que determinou a demolição da sua moradia construída no Lote nº …, na Praia …, …, Albufeira, imputando ao acto diversos vícios de violação de lei.

A autoridade recorrida sustentou, na resposta de fls. 189 e segs. a legalidade do acto recorrido.

Na sua alegação, formula a recorrente as seguintes CONCLUSÕES: 1. A recorrente é titular de um lote de terreno onde, por alvará de 1986, declarado compatível com o PROT do Algarve (PROTAL) em 1994, estava habilitada a construir.

  1. A recorrente obteve em 2001 uma licença de construção válida ao abrigo do PROTAL.

  2. Essa licença de construção deveria ser considerada também válida ao abrigo do POOC Burgau-Vilamoura (Resolução do Conselho de Ministros nº 33/99, de 27 de Abril) se prevalecesse a interpretação das normas pertinentes deste (arts. 9º e 20º, nº 1 e 91º) implicitamente sempre atribuída pela Câmara de Albufeira e em certo momento perfilhada (aparentemente) pela DRAOT.

  3. Caso esta interpretação das normas do POOC não seja julgada admissível e se conclua que elas são contraditórias com o PROTAL, então são nulas pelo efeito conjugado dos artigos 23º nº 2, 25º nº 2 e 102º nº 1 do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro.

  4. Na verdade, os planos regionais de ordenamento do território prevalecem sobre os planos especiais, como são os POOC (artigo 23º nº 2 do Decreto-Lei nº 380/99).

  5. Mesmo que se considerasse que as mencionadas normas do POOC podiam ter, no caso, derrogado as do PROTAL, as primeiras seriam inconstitucionais, por violação dos artigos 2º, 61º nº 1 e 165º nº 1, al. b) da Constituição.

  6. Tendo em conta a incontestável boa fé da recorrente, a ordem de demolição é, além do mais, injusta e desproporcionada, bem como discriminatória em relação a outras situações vizinhas idênticas.

  7. O despacho recorrido, de 4 de Março de 2003, do Secretário de Estado Adjunto e do Ordenamento do Território, deve ser anulado por ter sido dimanado com base em indevida interpretação dos artigos 9º, 20º nº 1 e 91º do POOC Burgau-Vilamoura, conjugados com o artigo 105º nº 1, alínea b) do Decreto-Lei 380/99.

  8. Em alternativa, se a interpretação destas normas for considerada correcta por esse Venerando Tribunal, o despacho é nulo por ter sido baseado em normas do POOC Burgau-Vilamoura que violam o PROTAL e a Constituição (artigos 2º, 61º nº 1, 62º nº 1 e 165º nº 1, alínea b), desta última).

    1. Contra-alegou a entidade recorrida (SEAOT), concluindo nos seguintes termos: Em conclusão, temos que improcede: i) a tese de alegada «contradição» e/ou «prevalência» do PROTAL sobre o POOC de Burgau-Vilamoura»; e, consequentemente, ii) a conclusão de que - com base na Licença emitida em momento posterior à entrada em vigor do referido «plano especial», e sem respeito pelo mesmo - se teria constituído na esfera jurídica da recorrente uma «habilitação», ou um «direito adquirido a construir» em zona de protecção às arribas; além de que, iii) permitindo a construção ex novo em área expressamente interditada para o efeito pelo art. 20º/1 b) do POOC, a referida será licença nula, e de nenhum efeito, nos termos do art. 103º do DL 380/99.

    2. O Exmo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu o douto parecer de fls. 256 e segs., no qual sustenta que o recurso não merece provimento.

    Refere, em primeiro lugar, que não devem ser conhecidos os vícios de violação de lei decorrentes da invocada violação de direitos adquiridos através da aprovação do loteamento em que se integrava o lote onde a moradia foi construída, reforçada pela declaração de compatibilidade com o PROTAL, cuja arguição deve ter-se por abandonada nas alegações, bem como a matéria levada à conclusão 3ª, por a mesma não ter sido objecto de arguição na petição de recurso.

    Refere, seguidamente, que os planos especiais (como o POOC) e os planos regionais (como o PROT), "têm níveis de incidência e objectivos próprios e distintos, sem prejuízo de dever ser assegurada a necessária compatibilização entre eles, a concretizar, no que aos planos especiais respeita, pelo dever de «indicar expressamente quais as normas daqueles (planos) que revogam ou alteram» (arts. 23º, nº 2 e 25º, nº 2 do DL nº 380/99, de 22 de Setembro), decorrendo deste último normativo, contrariamente ao sustentado pela recorrente, a prevalência normativa dos planos especiais, sem que do eventual incumprimento da recomendação de indicação expressa das normas revogadas se possa concluir pela invalidação das normas inovatórias.

    Refere, por fim, que não ocorre a alegada violação dos preceitos constitucionais invocados, nem dos princípios da igualdade, justiça e proporcionalidade.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    (Fundamentação) OS FACTOS Com relevância para a decisão a proferir, consideram-se provados os seguintes factos: 1- Por escritura de compra e venda de 16.01.98, lavrada no Décimo Segundo Cartório Notarial de Lisboa, foi adquirido pela recorrente um lote de terreno para construção, designado por "lote …", sito em …, concelho de Albufeira (doc. de fls. 66 e segs., cujo conteúdo se dá por reproduzido); 2- Este lote de terreno está integrado no loteamento licenciado pelo alvará nº 6/86 da C.M.Albufeira, no qual ficou consignado que "È autorizada a construção de moradias unifamiliares com o máximo de dois pisos, nos lotes … … a … inclusivé" (doc. de fls. 70 e segs., cujo conteúdo se dá por reproduzido); 3- Após a publicação do DL nº 351/93, de 7 de Outubro, foi requerida a compatibilidade do referido alvará de loteamento com as regras de Uso, Ocupação e Transformação do Solo, constantes do PROTAL, aprovado pelo DR nº 11/91, de 21 de Março; 4- Este requerimento foi deferido por despacho do SEALOT, de 28.04.94, do seguinte teor: "Declaro a COMPATIBILIDADE do Alvará acima referido com o Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve, aprovado pelo Decreto-Regulamentar nº 11/91 de 21 de Março". (doc. de fls. 88, cujo conteúdo se dá por reproduzido); 5- Por Resolução do Conselho de Ministros nº 33/99, de 27 de Abril, foi aprovado o Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) de Burgau-Vilamoura, e Regulamento anexo, publicado no DR, Série I-B, Nº 98/99 (doc. de fls. 89 e segs., cujo conteúdo se dá por reproduzido); 6- Em 05.08.99, a recorrente apresentou na C.M.Albufeira um pedido de licenciamento de obras de construção de uma moradia unifamiliar, piscina e muro de vedação, para o referido lote nº…, em …, Albufeira; 7- Este pedido veio a ser deferido por deliberação camarária de 24.10.2000 (doc. de fls. 112 e segs., cujo conteúdo se dá por reproduzido); 8- Tendo sido emitido, a 08.03.2001, o competente alvará de licença de construção nº 102/2001 (doc. de fls. 117, cujo conteúdo se dá por reproduzido); 9- Em 01.06.2001, na sequência de acção de fiscalização, a Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território (DRAOT) do Algarve questionou a C.M.Albufeira sobre o indicado licenciamento, chamando a atenção para as disposições do Regulamento do POOC de Burgau-Vilamoura relativas à construção na faixa de protecção à arriba; 10- Após reunião com a DRAOT, a C.M.Albufeira...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT