Acórdão nº 046498 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Outubro de 2003
Magistrado Responsável | VÍTOR GOMES |
Data da Resolução | 16 de Outubro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. A...
e mulher ..., ..
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e marido ...
recorrem do acórdão de 26/6/02 (fls. 784/808) que negou provimento a recurso contencioso interposto do indeferimento tácito imputado ao Ministro do Equipamento e Planeamento de requerimento datado de 13/5/99 no qual pediram a reversão de diversas parcelas que haviam sido objecto de expropriação por utilidade pública com vista à construção da variante à EN-1, Coimbra-Sargento Mor, acesso norte à ponte-açude de Coimbra.
Sustentam que o acórdão deveria ter concedido provimento ao recurso, porque o indeferimento do pedido de reversão viola o artigo 5. °, n.º 1 do Decreto-lei n. ° 438/91, de 9 de Novembro, uma vez que o terreno expropriado não serve exclusivamente o fim que justificou a expropriação (construção de um viaduto pela ex-JAE) mas também um autónomo e lucrativo fim comercial (parque de estacionamento pago, explorado pelo Município de Coimbra), concluindo nos termos seguintes:
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Na interpretação do douto acórdão a quo, desde que o terreno expropriado seja destinado ao fim que justificou a expropriação, nunca haverá desvio de fim. Ou seja, a afectação do terreno ao fim que justificou a expropriação é condição necessária e suficiente para afastar qualquer desvio de fim. Trata-se, salvo melhor opinião, de uma interpretação incorrecta do artigo 5. °, n.° 1 do Decreto-lei n.º 438/91, de 9 de Novembro.
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Diversamente, na convicção dos recorrentes, o conceito de "fim que determinou a expropriação" utilizado no art. 5. ° só pode ser aquele fim concreto e delimitado constante da declaração de utilidade pública e não qualquer outro fim autónomo. A afectação a outro fim autónomo é sempre um desvio de fim, um fim que não justificou a expropriação, um vício que, observados os demais requisitos, faz nascer o direito de reversão a favor do proprietário expropriado.
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As áreas identificadas no artigo 3. ° da petição de recurso foram expropriadas aos requerentes para um fim claro, específico e simples: destinavam-se à construção de um viaduto de acesso à Ponte Açude de Coimbra, na Variante da E.N. n.º 1, entre Coimbra e Sargento-Mor. Tais parcelas estão hoje afectas ao fim que motivou a expropriação e estão ainda afectas a uma exploração comercial de um grande parque de estacionamento pago, onde funciona o sistema de transporte urbano.
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Ou seja as parcelas expropriadas para um simples e específico fim - construção de um viaduto - estão agora afectas a um fim complexo e plural tanto servem o fim expropriativo inicial, como servem um fim comercial e lucrativo. Pelo que se violou o artigo 5. °, n.º 1 do Decreto-lei n. ° 438/91, de 9 de Novembro.
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A prova de que há desvio de fim resulta clara logo do facto de os bens expropriados estarem a ser usados para fins alheios às atribuições e competências da entidade expropriante. O uso que a Câmara Municipal de Coimbra está a fazer das parcelas expropriadas não podia ser desenvolvido pela entidade expropriante. A JAE e os Institutos públicos que lhe sucederam não podiam montar nos terrenos expropriados um parque de estacionamento a pagar pelos utentes integrado no sistema de transportes urbanos da cidade de Coimbra.
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Procedendo o direito de reversão em relação ao terreno originariamente expropriado, nos termos do 5. °, n.º 1 do Decreto-Lei n. ° 438/91, de 9 de Novembro, aos recorrentes assiste igualmente o direito à reversão das parcelas sobrantes, isto é, de todo o terreno que outrora lhes pertencia.
Contra-alegaram a autoridade recorrida, o Instituto de Estradas de Portugal ( IEP, que sucedeu nas atribuições da JAE) e o Município de Coimbra, sustentando que no Acórdão recorrido se procedeu a uma correcta interpretação dos pressupostos enunciados no n° 1 do art°. 5° do Decreto-Lei 438/91, de 9 de Novembro, em síntese, pelo seguinte:
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O acórdão recorrido procedeu a uma correcta interpretação do n° 1, do art°. 5° do Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, ao considerar que desde que o terreno expropriado seja destinado ao fim que justificou a expropriação não ocorre desvio de fim, independentemente, de concomitantemente, lhe ser dada uma outra utilização.
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A expropriação das parcelas ocupadas pela construção do viaduto compreende o conjunto de faculdades ou poderes jurídicos ínsitos no direito de propriedade, designadamente o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo, tal como dispõe o art°. 1344° do Código Civil.
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As parcelas objecto da expropriação foram afectas ao fim de utilidade pública que lhe esteve subjacente - a construção do viaduto. O facto do viaduto assentar sobre pilares não permite considerar que houve uma alteração do seu fim.
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O art°. 5° do Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, exige, tão-somente, que o bem objecto da expropriação seja e se mantenha afecto ao fim da mesma, não impedindo que concomitantemente lhe seja dada uma outra utilização.
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O legislador pretendeu, apenas, impor a afectação do bem ao fim constante da declaração de utilidade pública, independentemente da sua utilização para um outro fim ainda que diferente ou autónomo do originário.
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Este entendimento pode ser confirmado no presente caso, na medida em que, não obstante a construção do viaduto não ocupar todo a superfície, todo o espaço aéreo correspondente encontra-se ocupado, como decorre necessariamente, das características da obra.
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Consistindo a reversão no poder legalmente conferido ao expropriado de readquirir o bem objecto da expropriação, este terá de ser restituído no todo ou em parte.
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Desta forma, in casu, a ser possível a reversão, os Recorrentes, quando muito, seriam investidos numa figura parcelar do seu direito de propriedade, já que o seu domínio sobre o bem ficaria desmembrado atenta a ocupação de todo o espaço aéreo das parcelas expropriadas.
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Assim, sobre as parcelas expropriadas incidiria um direito privado sobre o domínio do solo e o domínio público sobre o viaduto que as cobre, afastando o direito de reversão.
A Exma Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer: Em nosso entender o recurso jurisdicional não merece provimento.
A censura que é dirigida ao acórdão recorrido apenas respeita à área expropriada situada por debaixo da variante fixada em pilares, e, ocupada por parque de estacionamento; já no que concerne às partes restantes aceitam os recorrentes a decisão do acórdão, conforme é expressamente referido no ponto 5 das alegações.
Como os próprios recorrentes reconhecem, aquela área situada sob o viaduto da variante está afecta ao fim que motivou a expropriação (cfr conclusão C das alegações). Simplesmente, pela circunstância de essa área também estar a ser utilizada para parque de estacionamento explorado comercialmente, entendem os recorrentes que há fundamento para o exercício do direito de reversão.
Mas não têm razão.
Conforme escreve José Vieira Fonseca (in Principais Linhas Inovadoras do Código das Expropriações de...
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