Acórdão nº 00343/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Abril de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCasimiro Gonçalves
Data da Resolução05 de Abril de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

RELATÓRIO 1.1. L..., com os sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Mmo. Juiz da 2ª secção do 1º Juízo do então TT de 1ª instância do Porto, lhe julgou improcedente a impugnação judicial que deduzira contra a liquidação adicional de IRS do ano de 1991 e correspondentes juros compensatórios, tudo no montante de 29.048.947$00.

1.2. Alegou o recurso e termina formulando as Conclusões seguintes:

  1. A douta sentença sob recurso incorre em erro de julgamento da matéria de facto ao não dar como provado que na data da outorga da escritura que formaliza o contrato de trespasse (23/02/90) foi também celebrado contrato promessa de trespasse em que figuram como promitente trespassante a ora recorrente e como promitentes trespassários M...e A....

  2. A douta sentença sob recurso incorre igualmente em erro de julgamento da matéria de facto ao não dar expressamente como provado que na mesma data de 23/02/90 foi subscrita pela impugnante e pelo seu marido, de um lado, e pelos referidos Fernanda e António, do outro, declaração em que todos os declarantes "reconhecem expressamente que a propriedade real da aludida farmácia pertence exclusivamente" a M...e A... "que dela poderão dispor livremente e para quem entenderem".

  3. Ocorre também erro de julgamento em matéria de facto ao não dar como assente que as declarações contidas nos contratos de trespasse de 23/02/90 e de 04/07/91 bem como na procuração de 23/02/90 não têm correspondência com a real vontade dos declarantes e foram prestadas para tornear o regime legal de transmissão da propriedade das farmácias.

  4. A douta sentença enferma ainda de erro de julgamento em matéria de facto ao não dar como assente que na mesma data de 23/02/90 ocorreu a tradição (transmissão da posse) do estabelecimento de farmácia para os promitentes trespassários M...e A..., quer se entenda que a posse foi transmitida pela impugnante quer se entenda que o foi pela anterior legal proprietária, Maria Adelaide Martins do Rosário Pedro Costa.

  5. O art. 32° do CPT (como, actualmente, o art. 39°, nº 2, da Lei Geral Tributária) não impõe a tributação de acordo com o negócio nulo antes de decisão judicial, contendo antes e somente um comando dirigido à Administração Fiscal no sentido de a impedir de desconsiderar, por sua iniciativa, os efeitos do negócio jurídico nulo constante de documento autêntico sem prévia declaração judicial.

  6. A douta decisão judicial ao formular entendimento e decidir de modo diferente interpretou erradamente e violou, pois, o preceituado naquela disposição legal.

  7. O negócio jurídico nulo por simulação não produz ab initio e ipso jure um qualquer efeito jurídico, não carecendo a nulidade de declaração judicial (arts. 242°, n° 1, e 286° do Código Civil).

  8. O Tribunal Tributário - como, aliás, todo e qualquer tribunal - é competente para conhecer incidentalmente da nulidade por simulação de um qualquer negócio jurídico e, em especial, dos contratos de trespasse e da procuração referidos nos autos.

  9. A douta sentença sob recurso, ao abster-se de conhecer da nulidade dos referidos negócios jurídicos interpretou erradamente e violou o preceituado nos arts. 242°, n° 1, e 286° do Código Civil.

  10. Estando demonstrado que, independentemente da validade ou invalidade dos contratos de trespasse e da procuração, os promitentes trespassários (Fernanda e António) tomaram posse do estabelecimento de farmácia em 23/02/90, atento o disposto nos arts. 1° e 4° do CIRS e art. 42°, n° 5, do CIRC (ex-vi do art. 31° do CIRS), nas redacções então vigentes, e que a recorrente não explorou de facto nem trespassou de facto a farmácia, não se verificou relativamente à recorrente um qualquer facto tributário seja enquanto lucro decorrente da exploração da farmácia seja enquanto mais-valias (a incluir no lucro) decorrentes do seu trespasse pelo menos no que respeita ao ano de 1991.

  11. A douta sentença, ao decidir de modo diferente, violou o disposto nesses preceitos legais.

  12. A douta sentença sob recurso, ao ter como justificada a dispensa do direito de audição antes da decisão da reclamação graciosa, também interpretou erradamente e violou o preceituado no art. 60°, n°s. 1, al. b), e 2, da Lei Geral Tributária.

  13. Ao considerar adequadamente fundamentada a decisão da reclamação graciosa, a douta sentença sob recurso, interpretou e aplicou erradamente o preceituado nos arts. 21° e 82° do CPT e 77° n° 1, da LGT.

Termina pedindo a procedência do recurso e a consequente procedência da impugnação.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O EMMP emite Parecer no sentido do não provimento do recurso.

1.5. Correram os Vistos legais e cabe decidir.

FUNDAMENTOS 2.1. A sentença recorrida julgou provados os factos seguintes: 1 - A impugnante foi objecto de fiscalização por parte dos SPIT a qual abrangeu os exercícios de 1990 e 1991; 2 - No decurso daquela acção inspectiva apurou-se que: 2.1 - aquela, por escritura pública de 23/02/90, adquiriu, pelo preço de 5.000.000$00, um estabelecimento comercial de farmácia denominado "Farmácia Maria Adelaide", sita no lugar de Vilarinho de Cima, freguesia de Gandra, concelho de Paredes; naquela mesma data a impugnante e marido constituíram seus procuradores M...e Dr. A... - cfr. o teor de fls. 17/19 do apenso, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos; 2.2 - e, por escritura pública celebrada em 04/07/91, a impugnante trespassou o referido estabelecimento pelo montante de 50.000.000$00; 2.3 - no período de tempo que medeia a aquisição e o trespasse, a impugnante desenvolveu o exercício normal da actividade de farmácia, tendo apresentado a declaração de início e posteriormente a de cessação de actividade para efeitos de IVA, ambas reportadas às datas das mencionadas escrituras; 2.4 - aquela, só em 16/07/92 regularizou a sua situação tributária para efeitos de IVA, tendo então apresentado as declarações periódicas modelo C, respeitantes a cada um dos trimestres, tendo apurado um crédito de imposto global de Esc. 942.155$00, resultante do facto de a maior parte das suas transmissões serem isentas de IVA, de se tratar de bens da lista I, e de se permitir a dedução global dos seus inputs; 2.5 - em 31/05/95, a ora impugnante foi pessoalmente notificada para apresentar os livros e demais documentos relacionados com a sua contabilidade pelo exercício da dita actividade, bem como para apresentar as declarações modelo 2 de substituição; 2.6 - em resposta àquela notificação, enviou aos Serviços, em 02/06/95, uma carta onde, no essencial, referia que: - nunca exerceu qualquer actividade, dado que os contratos em causa eram simulados, sendo a actividade de facto exercida por terceiros; - não era possuidora de quaisquer elementos de escrita, nem havia apresentado qualquer declaração para feitos de IRS; 2.7 - em consequência destes factos e tendo também em conta o exercício de facto de uma actividade de natureza comercial, já tributada em sede de IVA, os Serviços procederam à determinação do rendimento colectável da categoria C, para o exercício de 1991, através dos métodos indiciários; 2.8 - e, partindo dos elementos apresentados nas declarações periódicas mod. C, para aquele ano, fixaram o rendimento colectável para efeitos de IRS com referência ao ano de 1991 no montante de 51.639.750$00 - cfr. o teor do relatório de fls. 27/30 do apenso, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos.

3 - Inconformada com essa fixação a aqui impugnante reclamou para a Comissão de Revisão - fls. 59/63 do apenso; 4 - Tal reclamação foi parcialmente atendida, tendo sido fixado o rendimento colectável em 46.604.550$00 - fls. 79 e segs. do apenso; 5 - Em consequência, em 27/11/96, foi efectuada a liquidação de IRS do ano de 1991 no valor de 16.914.570$00, acrescido de 12.098.465$00 de juros compensatórios, num total de 29.048.947$00, cuja data limite de pagamento ocorreu em 15/01/97 - fls. 69 do apenso; 6 - Na falta do pagamento daquele quantitativo foi extraída a certidão de relaxe n° 970166692; 7 - Inconformada com a liquidação referida em 5), a impugnante apresentou reclamação graciosa que foi indeferida por despacho proferido em 15/07/99, pela Sra. Administradora Tributária, no uso de poderes delegados pelo Sr. Director de Finanças do Porto - cfr. o teor de fls. 78 do apenso, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos; 7.1 - Nesse despacho foi ainda dispensado o direito de audição; 8 - A impugnante foi notificada daquele despacho em 31/08/99.

2.2. Em sede de fundamentação dos factos provados, a sentença exarou que os mesmos resultam «Dos elementos contidos nos autos e no processo de reclamação apenso - documentos, informações oficiais, relatório da fiscalização, acta da Comissão de Revisão e demais despachos proferidos em sede de reclamação graciosa».

2.3. A sentença julgou não provados «os restantes alegados pela autora».

E quanto à fundamentação destes exarou: «efectivamente os depoimentos das testemunhas ouvidas e os documentos particulares juntos ao apenso - contrato-promessa de trespasse e declaração de fls. 15 - não lograram abalar a matéria fáctica recolhida pela AF, tanto mais que a procuração supra mencionada - ponto n° 2.1 - representa, além do mais, uma delegação de poderes de gestão, de administração e de representação efectuada pela titular do estabelecimento de farmácia ora em causa, isto é, a impugnante.» 3. Enunciando como questões a decidir a (i) da inexistência de facto tributário (ii); a dos métodos indiciários (iii); a da insuficiência de fundamentação do acto; (IV) a da violação do direito de audição; e (V) a do reconhecimento do direito a juros...

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