Acórdão nº 02B4565 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMÕES FREIRE
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" com sede em Lisboa, intentou a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário contra B, com sede em Lisboa , C, com sede em Lisboa, D, com sede em Lisboa, e E, com sede em Lisboa pedindo que sejam a 2.ª e a 3.ª rés - e estas de acordo com a quota-parte respectiva na distribuição do co-seguro (2.ª Ré = 60% a 3.ª ré = 40%) - condenadas a pagar à A. a quantia de Esc. 1.482.565$00 com a seguinte discriminação: a) Esc. 506.249$00. valor global das rendas vencidas e não pagas e respectivo IVA. até à resolução do contrato pela A; b) Esc. 98. 463$00 valor dos juros de mora vencidos até 6.12.95 sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, a que acrescerão os vincendos, a calcular à mesma taxa, até integral pagamento; c) Esc. 848.585$00 valor correspondente à soma das rendas vincendas; d) Esc. 29.268$00 valor dos juros de mora vencidos até 06.12.95 sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior a que acrescerão os vincendos até integral pagamento. Caso assim não se entenda, formula o seguinte pedido subsidiário: Serem a 2.ª e a 3.ª RR. - e estas de acordo com a quota-parte respectiva na distribuição do co-seguro - condenadas a pagar à A. a quantia de Esc. 789.225$00 com a seguinte discriminação: a) Esc. 506.249$00 valor global das rendas vencidas e não pagas e respectivo IVA até à resolução do contrato pela A.; b) Esc. 98.463$00 valor dos juros de mora vencidos até 06.12.95. sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior, a que acrescerão os vincendos a calcular à mesma taxa até integral pagamento; c) Esc.162.478$00 valor da indemnização calculada nos termos do art.º 15° n° 2 das "Condições Gerais" do contrato de locação financeira junto como doc. nº 1 a esta PI. que corresponde a 20% da soma das rendas vincendas e do valor residual do veículo locado; d) Esc.: 22.035$00 valor dos juros de mora vencidos até 6.12.95, sobre o capital em dívida mencionado na alínea anterior a que acrescerão os vincendos até integral pagamento. Pede ainda a condenação da 1.ª ré e 4.º réu a entregar-lhe o veículo com a matrícula ...-CL. Como fundamento dos pedidos alega que deu em locação financeira à 1.ª ré o veículo FORD modelo FIESTA com a matrícula ...-CL e esta não pagou as rendas vencidas em 10.8.94 e 10.11.94 num total de 506.249$00. Tendo resultado infrutíferas todas as tentativas da autora junto da 1.ª R. para cobrar os referidos créditos aquela viu-se forçada a resolver o contrato de locação financeira. Na carta de resolução a autora exigiu à primeira ré o pagamento das rendas vencidas e respectivos juros de mora e ainda a indemnização devida. A primeira ré celebrou com as 2.ª e 3.ª rés, por imposição da A., contrato de seguro-caução para garantia das obrigações assumidas pela B, tendo a autora reclamado da 2 tI R. o pagamento da indemnização devida nos termos da apólice de seguro-caução. Nem a segunda nem terceira rés pagaram a quantia reclamada pela autora. Citadas as rés contestou a ré B dizendo, em síntese, que a A. exigiu que apresentasse caução para assegurar o cumprimento da obrigação de pagamento da totalidade das rendas dos contratos de locação financeira. equivalente ao preço do veículo, caução que foi prestada, mediante seguro caução. A A. vinculou-se perante a 1.ª ré a não resolver o contrato celebrado em caso de incumprimento, optando por accionar a caução existente. A autora celebrou o contrato de locação financeira por intermédio da ré, celebrando esta um contrato de aluguer de longa duração. Ao demandar directamente a R. esquecendo o seguro-caução a A. age com abuso de direito. As rés C e D contestaram alegando, em resumo, por impugnação que a locação financeira só pode ser praticada por sociedades de leasing e os bens objecto de locação só podem ser de equipamento, não estando incluídos os veículos automóveis. Para contornar a disposição legal que impede a locação financeira de automóveis a autora recorreu à ré B. A ré foi contactada pela ré B que alegou dedicar-se à actividade de aquisição às sociedades de leasing e que alugava esses veículos a clientes e estabelecia com eles um contrato-promessa de compra e venda pelo qual prometia vender ao locatário e este prometia comprar os mesmos veículos. Propôs-lhe o seguro das prestações a pagar pelos clientes, com as seguintes condições: os seguros seriam feitos com a indicação dos meios financeiros dos clientes e a B obrigava-se a transferir a propriedade do veículo locado para a C no caso de incumprimento dos clientes; por outro lado o risco estava distribuído por várias entidades e não só pela C. Nas negociações nunca se veio a pôr a questão de vir a pagar a responsabilidade da B perante as sociedades Leasing que lhe forneciam os veículos, situação que a ré nunca aceitaria. E esse acordo foi o clausulado nas apólices emitidas. A partir de Novembro de 1992 foi introduzido um regime de co-seguro em virtude do qual ficaram a garantir o mesmo risco as rés D e C. Em 1993 foi estabelecido novo protocolo que estabeleceu o alcance dos anteriores. Não assumiram assim as obrigações da B para com a autora. Foi este o sentido do contrato de locação financeira celebrado entre a B e as rés, relativamente ao veículo Ford Fiesta locado a E, facto de que a autora tinha conhecimento. Em qualquer das circunstâncias nunca poderia a responsabilidade das seguradoras recair sobre as rendas vincendas e o valor residual. Por outro lado a apólice foi cancelada em 31-8-1994, pelo que o máximo que poderia pedir-se às rés eram as rendas vencidas em 10-8-1994. Em reconvenção pedem que a A. seja condenada a pagar-lhes as indemnizações que vierem a liquidar-se em execução de sentença, equivalente, no mínimo, ao montante pelo qual viesse a responder por força da apólice fundamentando este pedido no facto de a B ter vindo a receber do locatário a quem cedeu o veículo em ALD os alugueres, apropriando-se das respectivas importâncias e não pagando as rendas à A. Na réplica a autora manteve, no essencial, a posição inicialmente expressa. Por despacho de fols. 143 e seguintes os pedidos reconvencionais foram liminarmente indeferidos. A autora desistiu do pedido em relação à B e ao E a folhas 142. Prosseguindo os autos os seus termos veio a ser proferida sentença em primeira instância que condenou solidariamente as rés C e D a pagarem à autora a quantia de 1.482.565$00. Interposto recurso pelas rés foram confirmadas as decisões de primeira instância, negando-se provimento ao agravo e improcedente o recurso da decisão final. Veio a ré C interpor recurso de revista e vem alegado pelas duas rés (C e D), pelo que se vê ter havido lapso manifesto em incluir apenas a primeira ré no requerimento de interposição. Nas suas alegações, concluem: O contrato de seguro dos autos, como contrato formal que é, está corporizado em documento que constitui a respectiva apólice, onde a obrigação a que o mesmo se reporta, está claramente identificada sob o sugestivo título de objecto da garantia, como consistindo no "Pagamento das Rendas Referentes ao Aluguer de Longa Duração do Veículo Ford Fiesta 1. 1, Matricula ...-CL"; A decisão proferida vai frontalmente contra esta definição clara e directa da obrigação a que se reporta o seguro, assim violando a alínea b), do n° 1, do artigo 8.º do DL 183/88 de 24 de Maio; O Tribunal cometeu um lapso manifesto na análise da definição do objecto da garantia constante das condições particulares da apólice, que não faz referência, nem ao número, nem à periodicidade das rendas garantidas, que são claramente identificadas como consistindo naquelas referentes ao aluguer de longa duração do veículo; Sendo embora verdade que da análise isolada dos artigos 1.º e 2.º das condições gerais da apólice poderíamos ser levados a concluir que a garantia prestada consiste no pagamento das importâncias que a autora tem a receber da B, não deixa de ser igualmente verdade que estamos aí na presença de definições genéricas que carecem de concretização nas condições particulares, o que aconteceu da forma acima descrita; Seja como for, se houvesse qualquer contradição entre o objecto da garantia definido nas condições particulares e as definições genéricas das condições gerais da apólice, sempre as primeiras prevaleceriam sobre as segundas, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, verdadeira trave mestra do direito dos contratos, de que o artigo 405° do Código Civil constitui afloramento; E no caso em apreço a conclusão tem ainda mais força por estarmos, no que respeita às Condições Gerais da apólice, claramente perante cláusulas contratuais gerais ou cláusulas de adesão, objecto de regulamentação especifica através do decreto-lei n° 446/85 de 25 de Outubro, que, entre outras regras e limitações, estabelece que em caso de contradição entre as cláusulas de adesão e aquelas sujeitas a negociação entre as partes, prevalecem estas últimas sobre as primeiras (artigo 7.º); Um declaratário de normal diligência e medianamente instruído, colocado na posição de bom pai de família, certamente não interpretaria a declaração constante das condições particulares da apólice sob o título "objecto da garantia" como consubstanciando uma garantia ao pagamento das rendas referentes à locação financeira do veículo aí identificado; A interpretação sugerida pelas ora Recorrentes está em perfeita sintonia com as regras de interpretação dos negócios formais (artigo 238º do Código Civil), pois tem no texto da apólice, muito mais do que um mínimo de correspondência, uma total correspondência, reforçada pelos elementos auxiliares de interpretação; A decisão não foi acompanhada da necessária análise crítica...

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