Acórdão nº 0443636 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Março de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJACINTO MECA
Data da Resolução15 de Março de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acórdão Acordam, em audiência, os Juízes da 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.

B….. não se conformado com a sentença proferida pelo 3º Juízo Criminal das Varas de Competência Mista da Comarca de Vila Nova de Gaia que em recurso de contra-ordenação revogou parcialmente a decisão da entidade administrativa e lhe aplicou a coima de € 750,00 por violação do artigo 27º, nº 1, alínea a) e 5 do Decreto-lei nº 370/99, de 18.9, recorre mais uma vez, agora para o Tribunal da Relação, apresentando-se como síntese das suas razões de discordância, as seguintes conclusões: Da acusação na fase administrativa - auto de notícia - e da acusação na fase judicial - decisão administrativa - não consta a imputação de que não seja o arguido/recorrente titular de licença sanitária da Portaria nº 6.065.

Como se deu como provado nos autos, o estabelecimento em causa existe há mais de 100 anos.

Nos termos do artigo 27º, nº 1, alínea a) do Decreto-lei nº 370/99, o que constitui contra-ordenação, quanto a estabelecimentos pré-existentes é que estejam em funcionamento sem possuírem a licença de utilização que nesse diploma se prevê, o alvará de licença sanitária previsto na Portaria nº 6.065, de 30 de Março de 1929 ou sem autorização de funcionamento emitida ao abrigo da Portaria nº 22.970 de 20 de Outubro de 1967.

Considerar, assim na sentença proferida a circunstância de não possuir o estabelecimento do arguido/recorrente, é considerar facto que se integra no núcleo essencial da contra-ordenação, inteiramente diferente dos constantes da acusação, o mesmo é dizer que se trata de contra-ordenação diversa, ou seja, alteração substancial dos factos.

Tal circunstância foi considerada fora do contexto dos nºs 2 e 3 do artigo 359º do CPP aplicável por força do disposto no artigo 41º, nº 1 do Decreto-lei nº 433/82, de 27.10.

É pois nula a sentença recorrida nos termos do artigo 379º, nº 1, alínea b) do CPP, aplicável por remissão do artigo 41º, nº 1 do Decreto-lei nº 433/82.

No âmbito factual da nulidade acima arguida, cometeram-se dois erros notórios na apreciação da prova, relativamente aos quais constam do processo todos os elementos probatórios e que, por isso, não obstante se ter prescindido da documentação da audiência são susceptíveis de correcção no presente recurso, nos termos dos artigos 410º, nº 2, alínea c) e 431º, alínea a) do CPP, aplicáveis por remissão do artigo 41º, nº 1, do Decreto-lei nº 433/82.

O primeiro é o facto de, pelas razões em detalhe expostas no texto da presente motivação, se impor a alteração do facto considerado provado de que "ao estabelecimento em causa foi concedido atestado de Fiscalização Sanitária Anual, relativa ao ano económico de 1957, sendo naquele identificado como mercearia e vinhos para: Ao Estabelecimento em causa foram concedidos atestados de Fiscalização Sanitária Anual relativos aos anos económicos de 1955, 1956 e 1957, sendo naqueles identificados como mercearia e vinhos.

O segundo erro consiste no facto de se ter dado como provado que "o estabelecimento comercial do recorrente não possui alvará de licença sanitária previsto na Portaria nº 6.065, de 3º de Março de 1929" e que deve ser corrigido no sentido ou se considerar não provado esse facto, ou mesmo, no sentido contrário, de passar a dizer-se: o estabelecimento comercial do recorrente possui alvará de licença sanitária previsto na Portaria nº 6.065, de 30 de Março de 1929.

Pelas razões em detalhe expostas no texto da presente motivação, de que vale a pena destacar que todos os elementos probatórios produzidos a respeito da questão são constituídos, por um lado por dois ofícios da Câmara de Gaia e, por outro, pelos três atestados de fiscalização sanitária anual acima referidos em 10.

E que, quanto aos primeiros, sem que face ao seu teor se consiga perceber porque nunca a autora dos ofícios - que é a própria entidade administrativa - antes afirmara o que agora afirma, mesmo depois da pronúncia e do recurso de impugnação judicial do arguido/recorrente, em que o problema foi expressamente posto, sempre dependeria o seu relevo probatório de poder saber-se quais os elementos disponíveis que os basearam, sendo que, pedido a este respeito o respectivo esclarecimento, apenas se diz que os elementos disponíveis e que a rebuscada e insuficiente explicação para a existência dos atestados de fiscalização sanitária é anual e, como se vê, absolutamente infundada.

E quanto aos segundos, notando-se que o artigo 19º da Portaria nº 6.065 impõe que as Câmaras Municipais, emitidos os alvarás sanitários, deles envie cópia para a Direcção-geral de Saúde, a quem incumbe a fiscalização sanitária dos estabelecimentos nos termos do artigo 24º do mesmo diploma, efectivamente inculcam, segundo a lógica das coisas, que o estabelecimento a que respeitam possua o alvará sanitário.

Pelo que de acordo com as regras do ónus da prova - artigo 72º, nº 1 do Decreto-lei nº 433/82 - mas sobretudo, como o impõe o princípio do in dubio pro reo, decorrente do princípio da presunção da inocência consagrada no artigo 32º e 41, nº 1 do Decreto-lei nº 433/82, não poderá deixar de corrigir-se o erro apontado, como acima em 11 se defendeu.

Assim sendo as coisas, como são, declarando-se, como se espera, a nulidade acima arguida em 1 a 6, necessariamente há que concluir que a factualidade imputada ao arguido e de que pode a sentença conhecer é absolutamente insuficiente para o preenchimento do tipo legal de contra-ordenação de que vem acusado o arguido - artigo 27º, nº 1, alínea a) do Decreto-lei nº 370/99.

Mas mesmo sem aquela declaração, notando-se, então, a acrescer ao que já se disse que, nunca, em momento nenhum, com convolação ou sem ela, imputou a autoridade administrativa ao arguido que não possua a autorização de funcionamento da Portaria nº 22.970, sempre haverá que concluir que, por um lado, a factualidade imputada ao arguido e de que a sentença pode conhecer é insuficiente para o preenchimento do tipo legal de contra-ordenação de que vem acusado o arguido - artigo 27º, nº 1, alínea a) do Decreto-lei nº 370/99 - e que, por outro lado não se provaram factos nucleares essenciais ao preenchimento desse tipo legal - a inexistência do alvará da Portaria nº 6.065.

Pelo que, de uma maneira ou de outra, ao contrário do decidido, não poderá o arguido recorrente deixar de ser absolvido.

Tendo o arguido/recorrente, desde sempre na pronúncia em sede de audiência prévia, como no recurso de impugnação judicial da decisão administrativa, colocado a questão de, por força do disposto no artigo 6º do Decreto-lei nº 379/99 de 18.9, exercendo no estabelecimento mais de uma actividade, ser necessário e suficiente o válido alvará para a actividade de taberna, essa questão como se vê, foi decidida na sentença recorrida de forma absolutamente infundada de facto e de direito.

Pelo que é, também, por aqui nula a sentença recorrida, agora nos termos do artigo 379º, nº 1, alínea a) e 374º, nº 2 do CPP aplicáveis por remissão do artigo 41º, nº 1 do Decreto-lei nº 433/82.

A este respeito, declarada essa nulidade e com vista à decisão definitiva da questão, sempre há que dizer que, como consta da matéria de facto provada, o estabelecimento do recorrente é um só de mercearia, taberna e casa de pasto e que possui o alvará nº 1005/94 do Governo Civil do Porto para a actividade de taberna.

Ora esse alvará, que é o emitido na sequência da autorização de abertura prevista no artigo 36º do Decreto-lei nº 326/86, de 30 de Setembro - cf. artigo 37º do mesmo diploma - manteve expressamente a sua validade, mesmo após a entrada em vigor do Decreto-lei nº 168/97, de 4 de Julho, nos termos do artigo 50º, desse diploma.

E de acordo com o artigo 6º do Decreto-lei nº 370/99 se num estabelecimento se exercerem mais do que uma actividade é necessário e suficiente apenas uma autorização.

Pelo que se impõe a conclusão que a final, o estabelecimento funciona legalmente.

E pelo que, também, por aqui ao contrário do infundamentadamente decidido, não poderá o arguido/recorrente deixar de ser absolvido.

Como quer, porém, que se entendam as coisas, o que são factos é que o estabelecimento do arguido existe há mais de 100 anos, que o despacho que originou a notificação do arguido a que, no auto de notícia, este é acusado de não ter dado cumprimento, foi revogado por decisão transitada em julgada do Tribunal Administrativo do Círculo do Porto, que o despacho que deu origem à segunda notificação no mesmo sentido - mas que é posterior à data dos factos - está também pendente de recurso, que o estabelecimento possui, pelo menos um, atestado de fiscalização sanitária anual - o que efectivamente inculca possua também o alvará de licença sanitária da Portaria nº 6.065, que o recorrente é titular de alvará válido para a actividade de taberna - sendo que, nos termos do artigo 6º do Decreto-lei nº 370/99, uma só autorização bastará para a exploração de várias actividades no mesmo estabelecimento e que, nunca antes do presente processo - e de forma comprometida como foi - havia a autoridade administrativa colocado ao recorrente o problema de não possuir o alvará daquela Portaria.

Pelo que sempre esteve - como está - o arguido absolutamente convicto da licitude de toda a sua actuação.

Não sendo a sentença proferida no primeiro recurso de impugnação judicial de contra-ordenação, nesse contexto e no seu próprio, de molde a poder alterar essa convicção.

Pelo que errou notoriamente a decisão recorrida, quanto aos factos, ao considerar provado que "o recorrente não actuou com o cuidado a que estava obrigado e de que era capaz" e que "o arguido agiu de modo livre, voluntária e conscientemente bem sabendo que tal conduta não lhe era permitida por lei".

Devendo ao contrário ter considerada provada aquela convicção de licitude, o que pode e deve, ser pela Relação alterado, nos termos do artigo 310º, nº 2, alínea c) do CPP aplicável por remissão do artigo 41º, nº 1 do Decreto-lei 433/82.

E pelo que haverá que concluir que o...

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