Princípio do contraditório
Autor | Helder Martins Leitão |
Cargo do Autor | Advogado |
Páginas | 47-55 |
- «Um homem firme É firme até no céu E até diante Do Criador».
Miguel Torga
Page47
Poder-se-á entroncar no direito romano o princípio do contraditório ou da audiência bilateral. Com efeito, dizeres romanos, como «audiatur et altera pars» e «nemo condenatur sine detegere», constituem expressão da preocupação de verter no processo em geral aquele princípio.
E, poder-se-á dizer que a partir de então, não mais o princípio do contraditório deixou de ser uma constante inserida nos sistemas jurídicos de todas as sociedades civilizadas. Aliás, quando se mitiga ou mesmo desaparece o princípio, tal facto constitui prova insofismável da postergação dos direitos de defesa e de que, portanto, o sistema é totalitário.
Foi assim no Ancien Régime e é ainda em todos aqueles que continuam a obstar à inclusão nos respectivos elencos jurídicos deste princípio.
Aliás, o princípio do contraditório é tão importante que para além de se encontrar diluído entre os vários textos legislativos ordinários, desde logo, é proclamado nas próprias constituições, como sinal evidente de que jamais pode ser olvidado, de que as leis hierarquicamente inferiores se lhe subordinam.
A Constituição da República Portuguesa acolhe, igualmente, o princípio do contraditório, estabelecendo a via judicial para a defesa de direitos, podendo ser usada pelo cidadão contra actos lesivos dos seus direitos, quer através de actos jurisdicionais, quer de actos legislativos. 58
É tão importante a consagração do direito de defesa que quando surja na lei alguma lacuna sobre qual o tribunal competente para defesa de determinado direito, o hiato é suprido com a atribuição de competência aos tribunais judiciais (cfr. art. 211.º, n.º 1 C.R.P.).
E nem poderia o concerto das Nações ficar alheio à defesa dos cidadãos, de forma tal que a Declaração Universal dos Direitos do Homem, vem proclamar em seu art. 8.º que «toda a pessoa tem direito a um recurso efectivo para as jurisdições nacionais competentes contra os actos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela constituição ou pela lei».Page48
E acrescenta no seu art. 10.º que «toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida».
O princípio do contraditório mais não é que a concessão a cada uma das partes da mesma «quantidade» e «qualidade» de oportunidades para intervir no processo. 59
A cada «acção», a sua «reacção». 60
O processo na ideia de Manuel de Andrade 61 reveste a forma de um debate ou discussão entre as partes (audiatur et altera pars), muito embora se admita que as deficiências e os transvios ou abusos da actividade dos pleiteantes, sejam supridos ou corrigidos pela iniciativa e autoridade do juiz. Cada uma das partes é chamada a deduzir as suas razões (de facto e de direito), a oferecer as suas provas, a controlar as do adversário e a discretear sobre o valor e o resultado de umas e outras.
No processo contemporâneo, conjuntamente com o direito de acção, de acesso ao direito, reconhece-se o direito de defesa que em sua aplicação se subdivide no direito da auto-defesa, na escolha de um advogado, no direito ao conhecimento prévio do pedido, no direito à contestação da pretensão (para o que o demandado deve ser regularmente citado), no direito à última palavra 62 e no direito a que a decisão seja congruente com o pedido e a defesa.
O princípio do contraditório, encontra-se patente na actual legislação portuguesa em todas as instâncias e em todos os momentos do processo: no tribunal de comarca, como no Supremo Tribunal de Justiça; na contestação, nas provas, nas alegações.
Ele encontra-se consagrado no art. 3.º, n.º 1 do C.P.C., quando afirma que «o tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição».Page49
Não se esquecerá que para o princípio do contraditório se exercer em toda a sua plenitude, de ser mais do que mera parangona, deverá ser completado pelo princípio de igualdade de tratamento, 63 segundo o qual para que a contradição se efective, é imperioso que ambas as partes tenham as mesmas possibilidades, possam manusear os mesmos instrumentos, todos os actos e carrear todas as provas.
E assim, há que proibir o desaforamento, o tratamento especial de pessoas ou classes de pessoas, a auto-execução das sentenças e tudo quanto possa encaputar privilégios ou desigualdades na aplicação da justiça.
O princípio do contraditório que supra dissemos se encontrar consagrado no n.º 1, do art. 3.º do C.P.C., tem ocorrências nos arts. 517.º, 521.º, n.º 2 e 645.º, n.º 2 do mesmo diploma.
Desta forma, pelo princípio da audiência contraditória, eleito no art. 517.º, as provas não serão admitidas nem produzidas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas.
Porque o direito de defesa é uma garantia fundamental da ordem jurídica, o princípio da audiência contraditória é, na verdade, uma expressão e uma consagração daquele direito; pela mesma razão porque o art. 3.º não consente que a acção seja julgada sem que o réu seja citado para deduzir oposição, o art. 522.º (reportado a 1939, hoje o art. 517.º) exige a audiência contraditória para que a prova seja oponível com eficácia plena. 64
Não obstante, diga-se ainda, que a parte contrária deve ficar convencida quanto à correcção e legalidade em que ocorreu a produção de prova. Por isso mesmo, pode a parte não só assistir, mas também fiscalizar a produção de prova.
Indagação que se poderá fazer será esta: como se torna efectivo o princípio do...
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