Parecer n.º 11/2016

Data de publicação01 Junho 2016
SeçãoParte D - Tribunais e Ministério Público
ÓrgãoMinistério Público - Procuradoria-Geral da República

Parecer n.º 11/2016

Estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de nível não superior - Contrato de associação - Contrato administrativo - Interpretação - Declaração negocial - Lei de valor reforçado - Lei de bases - Decreto-lei de desenvolvimento.

1.ª Os contratos de associação celebrados entre o Estado Português, através da Direção-Geral da Administração Escolar e as entidades titulares de estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de nível não superior revestem a natureza de contratos administrativos.

2.ª A Administração não detém o poder de fixar com obrigatoriedade o sentido dos contratos administrativos, sendo as declarações do contraente público sobre a interpretação destes contratos meras declarações negociais - Cfr. artigo 307.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.

3.ª Estando em causa a celebração de contratos de associação para os anos letivos de 2015/2016, de 2016/2017 e de 2017/2018 precedida de procedimento concursal em que o número de turmas colocadas a concurso o foi, em cada área geográfica, por ciclo de ensino e ano de escolaridade, sendo contemplados o 2.º ciclo e o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário, ocorre que, quer o 3.º ciclo do ensino básico, quer o ensino secundário, têm a duração de três anos, mas o 2.º ciclo do ensino básico tem a duração de apenas dois anos (5.º e 6.º anos de escolaridade).

4.ª Assim, sendo os contratos trienais, o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário ajustam-se perfeitamente ao período de vigência dos contratos, sendo certo que, de acordo com o n.º 2 da cláusula 2.ª dos contratos, «nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.».

5.ª Mas tal já não sucede relativamente ao 2.º ciclo do ensino básico, dado que, no ano letivo de 2017/2018, ainda abrangido pelos contratos, terá de iniciar-se novamente o 5.º ano de escolaridade.

6.ª Ora, tendo sido fixados, no aviso de abertura do concurso, idênticos números de turmas para os três anos letivos abrangidos e reportando-se o apoio financeiro ao período compreendido entre 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018, sendo nos contratos de associação contemplado o pagamento do financiamento de turmas do 2.º ciclo do ensino básico durante o ano letivo de 2017/2018, ter-se-á de concluir que, em tais contratos, se contempla o funcionamento de turmas do 5.º ano de escolaridade (primeiro do dois anos que integram o 2.º ciclo do ensino básico) nesse ano letivo, sendo certo que, nos termos do artigo 13.º, n.º 2, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, «no final do contrato, os seus efeitos mantêm-se até à conclusão do correspondente ciclo de ensino».

7.ª Não se contemplando em tais contratos, no que ao 3.º ciclo do ensino básico e ao ensino secundário concerne, o direito de os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo iniciarem novos ciclos de ensino - 7.º e 10.º anos de escolaridade.

8.ª Nos termos do artigo 164.º, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, integra-se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre as bases gerais de ensino, sendo as leis de bases leis de valor reforçado (artigo 212.º, n.os 2 e 3, da Constituição).

9.ª E, nos termos do artigo 198.º da Constituição, no exercício de funções legislativas, compete, designadamente, ao Governo fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam [n.º 1, alínea c)], devendo estes decretos-leis de desenvolvimento invocar expressamente a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados (n.º 3).

10.ª Foi o que o Governo fez ao editar o Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que aprovou o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior invocando expressamente que o fazia no desenvolvimento do disposto no artigo 17.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovada pela Lei n.º 9/79, de 19 de março, no qual se prescrevera, designadamente, «dever o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei».

11.ª E não poderia o Governo, em tal decreto-lei de desenvolvimento, pôr em causa o disposto na Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo.

12.ª Ora, estabelecendo-se no artigo 6.º, alínea i), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior que compete ao Ministério da Educação e Ciência «permitir o acesso das famílias às escolas particulares e cooperativas, através da celebração de contratos e da concessão de apoios financeiros, bem como zelar pela sua correta aplicação, permitindo progressivamente o acesso às escolas particulares em condições idênticas às das escolas públicas», ocorre que, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos.»

13.ª E, para efeitos do disposto no artigo 6.º da Lei n.º 9/79, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas, celebrando, designadamente, contratos não só «com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar», mas também «com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos» (artigo 8.º, n.º 2, alíneas a) e b), respetivamente, da Lei n.º 9/79), sendo concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar (n.º 3 do mesmo artigo).

14.ª Ser concedida prioridade é, pois, o que se estabelece na Lei n.º 9/79, sendo certo que no artigo 14.º, n.º 1, Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) é que se estabelecia que «os contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas».

15.ª Sendo certo que no n.º 4 do artigo 10.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, que tem por epígrafe Princípios da contratação, se estabelece que, na celebração dos contratos, o Estado deve ter em conta as necessidades existentes.

16.ª Por seu turno, a Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, limitou-se a fixar as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro pelo Estado a estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, previstos na alínea c) (contratos de associação) do n.º 1 do artigo 9.º do mesmo Estatuto e, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º dessa Portaria, o aviso de abertura dos procedimentos, fixando as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contém, obrigatoriamente, «a área geográfica de implantação da oferta» [alínea d)], mais contendo, também obrigatoriamente, «o número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso» [alínea b)] e «os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso» [alínea c)].

17.ª Sendo na opção pelo número de turmas postas a concurso e pelos ciclos de ensino abrangidos, nas áreas geográficas que forem indicadas, que se coloca a questão de ter em conta as necessidades existentes.

18.ª Assim sendo, nem o Decreto-Lei n.º 152/2013, nem a Portaria n.º 172-A/2015, ostentam incompatibilidade com a Lei n.º 9/79, devendo ser aplicados em conformidade com o nela estabelecido e tendo especialmente em consideração o disposto nos seus artigos 6.º e 8.º

Senhora

Secretária de Estado Adjunta e da Educação,

Excelência:

I

Dignou-se Vossa Excelência solicitar à Senhora Conselheira Procuradora-Geral da República a emissão de parecer urgente deste corpo consultivo sobre o objeto dos contratos de associação celebrados com os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo para o triénio escolar 2015/2018, nos termos que se passam a transcrever:

«Compete ao Estado organizar anualmente a rede escolar, devendo para tal tomar "em consideração as iniciativas e os estabelecimentos particulares e cooperativos, numa perspetiva de racionalização de meios, de aproveitamento de recursos e de garantia de qualidade" (cfr. artigo 58.º, n.º 2, da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, na redação que lhe foi dada por último pela Lei n.º 49/2005, de 30 de agosto).

As reuniões anuais de definição da capacidade de acolhimento de alunos na rede escolar para o ano letivo 2016/2017 deverão concluir-se em breve, com vista a permitir a abertura de matrículas e renovações de matrícula que já se encontram em curso desde 15 de abril.

Neste sentido, solicita-se a V. Ex.ª urgência na emissão do parecer, no sentido de permitir responder às seguintes duas questões:

1. O objeto dos novos contratos de associação celebrados em 2015 - tal como descritos na exposição em anexo - compreende o direito dos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de iniciar novos ciclos de ensino (5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade), em todos e cada ano letivo de duração do contrato, podendo constituir para o efeito outras tantas turmas que irão cumular com as turmas constituídas no(s) ano(s) anterior(es) ou, diversamente, apenas compreende as turmas de início de ciclo no primeiro ano contratual e as respetivas turmas de continuidade nos dois remanescentes anos de duração do contrato (2015/2018)?

2. Os artigos 10.º, n.º 6 e 16.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, bem como os artigos 3.º, n.º 1, e 9.º, n.º 3, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de...

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