Parecer n.º 10/2016
Data de publicação | 13 Julho 2016 |
Seção | Parte D - Tribunais e Ministério Público |
Órgão | Ministério Público - Procuradoria-Geral da República |
Parecer n.º 10/2016
Partido político - Personalidade jurídica - Estatuto constitucional - Coligação partidária - Assembleia da República - Eleições - Financiamento público - Subvenção pública - Campanha eleitoral - Requisitos - Interpretação da lei - Analogia.
1 - Os partidos políticos no sistema jurídico português constituem veículo de exercício do direito fundamental de participação política (artigo 51.º, n.º 1, da Constituição) e são um instrumento de organização e expressão da vontade popular, no respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade do Estado e da democracia política, nos termos do artigo 10.º, n.º 2, da Constituição.
2 - Os partidos políticos são entes jurídicos cuja personalidade e autonomia são diretamente reconhecidas na Constituição, regulados por várias prescrições constitucionais como a proibição de uma pessoa estar inscrita simultaneamente em mais de um partido político (artigo 51.º, n.º 2 da Constituição) e a obrigação de se regerem pelos princípios da transparência, da organização e da gestão democráticas e da participação de todos os seus membros (artigo 51.º, n 5, da Constituição).
3 - A densidade constitucional da personalidade jurídica dos partidos políticos conforma-os como centros de um conjunto de direitos e deveres próprios, alguns dos quais lhes estão reservados em exclusividade como o monopólio do direito de apresentação de candidaturas nas eleições para a Assembleia da República (artigo 151.º, n.º 1, da Constituição), que implica que todos os candidatos a lugares elegíveis sejam apresentados por um específico partido, existindo, ainda, regras específicas apenas dirigidas aos partidos com representação parlamentar enquanto figura inconfundível com qualquer outro ente jurídico coletivo (artigos 40.º, n.º 2, 114.º, n.º 3, 133.º, alínea e), da Constituição).
4 - O estatuto constitucional dos partidos políticos é objeto de desenvolvimento legal, nomeadamente, na Lei dos Partidos Políticos (LPP), aprovada pela Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto, e revista pela Lei Orgânica n.º 2/2008, de 14 de maio, na Lei Eleitoral para a Assembleia da República (LEAR), aprovada pela Lei n.º 14/79, de 16 maio e objeto de alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, Lei n.º 14-A/85, de 10 julho, Decreto-Lei n.º 55/88, de 26 fevereiro, Lei n.º 5/89, de 17 março, Lei n.º 18/90, de 24 julho, Lei n.º 31/91, de 20 julho, Lei n.º 72/93, de 30 novembro, Lei n.º 10/95, de 7 abril, Lei n.º 35/95, de 18 agosto, Lei Orgânica n.º 1/99, de 22 junho, Lei Orgânica n.º 2/2001, de 25 agosto, Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de dezembro, Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho, e Lei Orgânica n.º 10/2015, de 14 de agosto e na Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais (LFPPCE) aprovada pela Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, e revista pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, e Lei Orgânica n.º 5/2015, de 10 de abril, estabelecendo regimes normativos conformados pela autonomia conceptual e normativa dos partidos enquanto realidades inconfundíveis com outras figuras como as coligações de partidos políticos.
5 - Os partidos têm direito a constituir coligações (artigo 10.º, n.º 1, alínea d), da LPP), as quais se dividem em duas categorias:
a) Coligações duradouras, constituídas por um período de tempo determinado no momento da sua constituição, o qual pode ser prorrogado ou antecipado (artigo 11.º, n.º 2, da LPP);
b) Coligações pontuais para fim eleitoral específico, regendo-se, nesse caso, pelo disposto na respetiva lei eleitoral, a qual no caso das eleições para a Assembleia da República determina que essas coligações deixam de existir logo que for tornado público o resultado definitivo das eleições (artigo 11.º, n.º 5, da LPP e artigo 22.º, n.º 2, da LEAR).
6 - Os partidos políticos gozam de personalidade jurídica e são constituídos por tempo indeterminado, em contraponto as coligações de partidos não gozam de personalidade jurídica e são constituídas por tempo determinado (cf. artigos 3.º e 11.º da LPP).
7 - Nas eleições para a Assembleia da República o monopólio partidário compatibiliza-se com o direito de partidos políticos apresentarem os seus candidatos em listas isoladas em determinados círculos eleitorais e em listas conjuntas com candidatos de outros partidos noutros círculos eleitorais (artigo 151.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e artigos 21.º, n.º 1, 22.º, n.º 2, e 24.º, n.º 1, da LEAR).
8 - Todos os candidatos no sufrágio para a Assembleia da República são apresentados por partidos políticos independentemente de se apresentarem integrados em lista isolada ou em lista conjunta derivada de coligação com outro(s) partidos(s) caso em que é obrigatória a discriminação do partido que propõe cada um dos candidatos, não podendo nenhum partido apresentar mais de uma lista de candidatos no mesmo círculo eleitoral (artigos 21.º, n.os 1 e 2, e 24.º, n.º 1, da LEAR).
9 - A vaga supervenientemente aberta por candidato eleito por partido que no específico círculo eleitoral concorreu coligado com outro partido é ocupada pelo cidadão imediatamente a seguir na lista apresentada naquele círculo eleitoral pelo mesmo partido pelo qual havia sido eleito o que cessou ou suspendeu o mandato, ainda que figure em lugar superior da referida lista conjunta um candidato não eleito apresentado por outro partido da coligação (artigo 18.º, n.º 1, da LEAR).
10 - A coligação de partidos políticos não constitui entidade distinta da dos partidos políticos que a integram (artigo 11.º, n.º 3, da LPP e do artigo 22.º, n.º 3, da LEAR), por esse motivo as coligações apenas emergem como realidades tuteladas para determinados efeitos especificamente previstos em normas legais que as referem de forma expressa.
11 - A Lei Eleitoral para a Assembleia da República atende em múltiplos lugares à distinção conceptual e de categorias entre partidos políticos e coligações de partidos, discriminando estas quando se reporta a exercícios em que operam em lugar paralelo ou a par dos partidos políticos (artigos 18.º, n.os 1 e 2, 21.º, n.º 1, 22.º, n.os 1 a 3, 22.º-A, n.os 1 e 3, 24.º, n.os 1, 3 e 4, 46.º, n.º 2, 55.º, n.º 3, 56.º, 62.º, n.os 1 e 2, 63.º, n.os 1 a 3, 65.º, n.os 2 e 3, 67.º, 74.º, n.º 1, 95.º, n.os 2 e 3, 97.º, n.º 4, 115.º, alíneas e) a g), 130.º e 134.º, n.º 1, da LEAR).
12 - A Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais atende em vários preceitos à diferença conceptual entre partidos políticos e coligações, distinção revelada em múltiplas normas reportadas de forma expressa a coligações (artigos 5.º, n.os 1, 3 e 5, 14.º, n.º 2, alínea a), 15.º, n.º 4, 17.º, n.os 3 e 6, 18.º, n.º 3, 20.º, n.os 4 e 5, 21.º, n.º 4, 22.º, n.º 2, e 27.º, n.os 2 e 3, da LFPPCE).
13 - O ordenamento jurídico português estabelece duas categorias específicas de financiamento público para a realização dos fins próprios dos partidos políticos: (a) as subvenções para financiamento dos partidos políticos, e (b) as subvenções para as campanhas eleitorais (artigos 2.º, 3.º, n.º 1, alínea c), e artigo 4.º, alíneas a) e b) da LFPPCE).
14 - A subvenção pública para financiamento dos partidos políticos é atribuída aos partidos em função do resultado na mais recente eleição de deputados à Assembleia da República sendo um direito próprio de todos os partidos políticos independentemente de terem concorrido nessa eleição (a) isoladamente em todos os círculos, (b) em coligação com outro(s) partido(s) ou (c) integrados em coligações pontuais em alguns círculos e isoladamente noutros (artigo 5.º, n.os 2 e 3, da LFPPCE).
15 - Entre os fins próprios dos partidos políticos encontra-se a apresentação de candidaturas para a Assembleia da República tendo direito para a realização desse fim a uma subvenção pública para a campanha eleitoral desenvolvida para cada específica eleição para a Assembleia da República, devendo, para esse efeito, preencher requisitos especificados em termos de resultados (ao nível nacional) no respetivo ato eleitoral os quais são relevantes para constituir o direito à subvenção e a percentagem do valor global distribuído que determinará o limite máximo da subvenção que cada partido poderá receber (artigos 17.º, n.º 2, e 18.º, n.º 1, da LFPPCE).
16 - A exigência de representação parlamentar do concreto partido constitui um requisito comum para o poder beneficiar da subvenção anual atribuída para financiamento dos partidos (artigo 5.º, n.º 1, da LFPPCE) e da subvenção para financiamento de campanha eleitoral para a Assembleia da República (artigo 17.º, n.º 2, da LFPPCE).
17 - Esse requisito implica que em ambos os casos as subvenções sejam atribuídas a partidos porque as coligações nunca poderiam preencher o requisito sobre representação parlamentar própria para beneficiarem da subvenção pública para campanha eleitoral, atendendo, nomeadamente, a que (a) todos os candidatos a deputados são apresentados por um determinado partido político, (b) as coligações (incluindo as duradouras) não constituem entidade distinta dos partidos políticos que as integram (artigos 11.º, n.º 3, e 22.º, n.º 3, da LEAR) e (c) as coligações pontuais constituídas para eleição para a Assembleia da República deixam de existir logo que for tornado público o resultado definitivo das eleições (artigos 11.º, n.º 5, e 22.º, n.º 2, da LEAR).
18 - Uma segunda característica comum aos requisitos e critérios para atribuição da subvenção anual para financiamento dos partidos políticos e da subvenção da campanha eleitoral para a Assembleia da República é a ideia de unidade e singularidade desses financiamentos públicos de caráter nacional, respetivamente, por ano ou por ato eleitoral, sendo necessário fazer um cômputo nacional relativo a cada partido individualmente considerado dos respetivos resultados nas várias frações constituídas pelos diversos círculos...
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