Parecer (extrato) n.º 18/2020

Data de publicação24 Novembro 2020
SectionParte D - Tribunais e Ministério Público
ÓrgãoMinistério Público - Procuradoria-Geral da República

Parecer (extrato) n.º 18/2020

Sumário: Pagamento de trabalho suplementar aos médicos com formação especializada em Saúde Pública sujeitos ao regime de disponibilidade permanente.

Conclusões:

1.ª - O direito internacional consagra normas convencionais que regulam as matérias da organização e duração do trabalho, dentre as quais avulta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada e proclamada, em 10 de dezembro de 1948, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, que, nos seus artigos 23.º e 24.º, proclama um elenco de direitos fundamentais do cidadão trabalhador, relacionados, designadamente, com os direitos ao trabalho, a uma justa remuneração, à proteção no desemprego, à filiação em sindicatos e, do mesmo passo, ao descanso, ao lazer e a férias periódicas pagas.

2.ª - Por sua vez, o artigo 7.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, adotado pela Organização das Nações Unidas, aprovado para ratificação pela Lei n.º 45/78, de 11 de julho, reconhece o direito de todas as pessoas de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, que assegurem, em especial, repouso, lazer e limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas pagas, bem como remuneração nos dias de feriados públicos.

3.ª - No âmbito do direito europeu, o artigo 31.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, atinente às condições de trabalho justas e equitativas, determina que todos os trabalhadores têm direito a condições de trabalho saudáveis, seguras e dignas e a uma limitação da duração máxima do trabalho e a períodos de descanso diário e semanal, bem como a um período anual de férias pagas.

4.ª - No direito português, o artigo 59.º da Constituição da República constitui um corolário da proclamação destes direitos fundamentais inscritos nas convenções internacionais, ao consagrar o direito ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas, os quais estão compreendidos entre os direitos análogos aos direitos, liberdades e garantias proclamados no artigo 17.º dessa Lei Fundamental.

5.ª - O artigo 197.º do Código do Trabalho de 2009 (CT) vem fornecer o conceito de tempo de trabalho como sendo qualquer período durante o qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos aí especificadamente previstos.

6.ª - Esta noção foi, igualmente, acolhida no artigo 102.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), a qual, no respetivo artigo 101.º, manda aplicar, aos trabalhadores com vínculo de emprego público, o regime desse Código, em matéria de organização e tempo de trabalho, com as necessárias adaptações.

7.ª - E os limites máximos dos períodos normais de trabalho foram fixados, em regra, em oito horas por dia e quarenta horas por semana, de harmonia com o que dispõem os artigos 203.º do CT e 105.º da LTFP.

8.ª - O artigo 210.º do CT contempla as exceções aos limites máximos do período normal de trabalho, constantes do referido artigo 203.º, que só podem ser ultrapassados nos casos expressamente previstos nesse diploma, ou quando instrumento de regulamentação coletiva de trabalho o permita, nas situações aí concretamente tipificadas (cf. as alíneas a) e b) do n.º 1 e o n.º 2).

9.ª - A Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas não definiu em que consiste o trabalho extraordinário ou - na designação atual - o trabalho suplementar, optando por importar esse conceito do direito do trabalho privatístico, que, também nesta matéria, é aplicável aos trabalhadores com vínculo de emprego público, por força do que dispõe o n.º 1 do artigo 120.º da referida Lei.

10.ª - Destarte, a noção de trabalho suplementar é-nos dada na norma do n.º 1 do artigo 226.º, do aludido Código, que o circunscreve ao que for prestado fora do horário de trabalho, sendo que os respetivos limites se mostram, estrita e rigorosamente, circunscritos pela lei, seja na fixação da duração do trabalho suplementar, seja no estabelecimento de um período mínimo de descanso entre dois períodos diários de trabalho consecutivos do trabalhador a ele sujeito, seja na correspetiva remuneração.

11.ª - Assim sendo, o regime do trabalho suplementar dos trabalhadores detentores de um vínculo de emprego público é recortado, por um lado, através da conjugação do disposto nos artigos 120.º e 162.º da LTFP, que contemplam, respetivamente, os limites de duração do trabalho suplementar e os correspondentes acréscimos remuneratórios e, por outro, das normas de direito laboral privado que disciplinam estas matérias, constantes dos artigos 226.º, 227.º, 229.º e 230.º do Código do Trabalho de 2009.

12.ª - Esse regime estriba-se, em primeira linha, na obrigação que impende sobre o trabalhador de prestar trabalho suplementar, a fim de colmatar as necessidades acrescidas, de cariz pontual e transitório, da sua entidade empregadora, sem prejuízo dos casos em que, por esta, lhe seja concedida a respetiva dispensa, casos esses relativos, v. g., às trabalhadoras grávidas, aos trabalhadores ou trabalhadoras com filho de idade inferior a doze meses, às trabalhadoras, durante todo o tempo que durar a amamentação, aos trabalhadores menores, aos portadores de deficiência ou afetados por doença crónica, ou aos trabalhadores-estudantes...

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