Acórdão n.º 475/2007, de 05 de Novembro de 2007

Acórdáo n.o 475/2007

Processo n.o 475/2007

Acordam na 2.a Secçáo do Tribunal Constitucional:

Relatório. - No Tribunal Judicial do Cartaxo correu termos um processo de expropriaçáo movido pela Brisa - Auto-Estradas de Portugal, S. A., contra Helena Isabel de Vasconcelos e Sousa de Mendonça Ervideira e marido, José Afonso de Sousa Carvalho Ervideira, Francisco Manuel Vasconcelos e Sousa de Mendonça e Manuel José Vasconcelos e Sousa de Mendonça e ainda contra o Fundo de Fomento Florestal, este na qualidade de credor hipotecário, com vista à expropriaçáo e determinaçáo da indemnizaçáo devida pela expropriaçáo de duas parcelas de terreno com as áreas de 16 092 m2 e 26 136 m2, cada uma delas, por sua vez, constituída por várias fracçóes, a destacar do prédio rústico denominado «Paul da Ota e Vale Mouro», com a área total de 1082 ha e 6600 m2, antes descrito na Conservatória do Registo Predial da Azambuja sob o n.o 25 619, a fl. 198 do livro B-65 (Alenquer), e actualmente descrito sob o n.o 01894/230296 da Azambuja e sob o n.o 00271/0902967 de Vila Nova da Rainha e inscrito na matriz rústica da freguesia da Azambuja sob o artigo 1.o, secçóes I

a III, e na matriz rústica da freguesia de Vila Nova da Rainha sob o artigo 1.o, secçóes A a A5, sendo que a primeira das parcelas seria a destacar da parte sita na freguesia da Azambuja e a segunda da sita na freguesia de Vila Nova da Rainha.

Segundo a declaraçáo de utilidade pública, tais parcelas eram necessárias à construçáo de terceiras vias (alargamento) do sublanço Carregado-Aveiras de Cima da Auto-Estrada do Norte.

Nesse processo foi proferida sentença em 31 de Maio de 2001, fixando a indemnizaçáo devida pela expropriante aos expropriados em 8 202 114$, ou seja, em E 40 911,97.

Os expropriados recorreram desta decisáo e o Tribunal da Relaçáo de Évora, no Acórdáo de 6 de Outubro de 2003, deliberou anular a avaliaçáo pericial e a sentença recorrida e ordenar nova avaliaçáo.

Repetida a peritagem, foi proferida nova sentença, fixando a indemnizaçáo devida em E 52 313,45 - sem qualquer actualizaçáo por reportar os valores à data da avaliaçáo -, assim constituída:

E 40 652 de capitalizaçáo do rendimento fundiário médio anual; E 1 401,53 de potencial idade edificativa;

E 259,92 de desvalorizaçáo de parte sobrante temporariamente utilizada.

Contra tal sentença recorreram os expropriados, a título principal, e a expropriante, a título subordinado, tendo o Tribunal da Relaçáo de Évora proferido novo acórdáo em 12 de Outubro de 2006 que julgou parcialmente procedente a apelaçáo principal dos expropriados, reportando o cálculo da indemnizaçáo à data da publicaçáo da DUP e actualizando-o depois de deduzida a importância entretanto entregue aos expropriados, e julgou procedente a apelaçáo subordinada da expropriante, desconsiderando factores de edificabilidade na deter-minaçáo do montante indemnizatório do solo classificado como apto para outros fins, fixando a indemnizaçáo devida aos expropriados em E 40 911,92, sem prejuízo da deduçáo e actualizaçáo acima referidas.

Desta sentença recorreram os expropriados para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.o, n.o 1, alínea b), da LTC, com fundamento na inconstitucionalidade do artigo 24.o, n.o 5, do CE, na interpretaçáo que lhe foi dada pelo aresto recorrido, por violaçáo dos artigos 13.o e 62.o da CRP.

Convidados a enunciarem a interpretaçáo normativa cuja inconstitucionalidade pretendiam ver apreciada, os recorrentes apresentaram requerimento de correcçáo, com o seguinte teor:

Conforme resulta do requerimento de interposiçáo de recurso apresentado em 26 de Outubro de 2006, o presente recurso tem por objecto a questáo de inconstitucionalidade do artigo 24.o, n.o 5, do Código das Expropriaçóes, aprovado pelo Decreto-Lei n.o 438/91, de 9 de Novembro (CE 91): Através do presente recurso pretende-se questionar a dimensáo normativa do referido preceito legal, no sentido em que este foi interpretado e aplicado no douto acórdáo do Tribunal da Relaçáo de Évora, considerando-se excluídas da classificaçáo de 'solo apto para a construçáo' as parcelas expropriadas, destinadas à construçáo de uma auto-estrada e nas proximidades de uma estaçáo de serviço, máxime face ao disposto no artigo 24.o, n.o 2, do CE 91, por se ter entendido que 'a mera confinância com a auto-estrada (e even-tualmente áreas de serviço desta), náo é, só por si e sem mais, susceptível de determinar a conversáo de tal terreno em solo edificável, a mera construçáo e existência da área de serviço, adstrita ao serviço dos utentes da auto-estrada, náo permite atestar aí qualquer potencialidade edificativa relevante'.

Cremos que os referidos sentido e dimensáo normativa náo podem ser adoptados, por serem incompatíveis com as normas e princípios constitucionais consagrados no artigo 62.o da CRP [v. artigo 70.o, n.o 1, alínea b), da LTC].

Com efeito, o disposto no artigo 24.o, n.o 5, do CE 91 náo pode implicar que a circunstância de parte das parcelas expropriadas se destinar a uma auto-estrada afaste a sua avaliaçáo como solo apto para construçáo ou pelo menos as potencialidades edificativas inerentes aos fins a que se destina, impondo-se assim a sua classificaçáo e avaliaçáo como solo apto para a construçáo (v. artigo 62.o da CRP).

Concluíram, do seguinte modo, as suas alegaçóes:

1.o A CRP apenas permite a expropriaçáo mediante o pagamento de justa indemnizaçáo, a qual deve ser fixada com base no valor real e corrente dos bens expropriados, o que leva necessariamente à consideraçáo do ius aedificandi como um dos factores de fixaçáo valorativa (v. artigo 62.o da CRP; cf. artigo 22.o do CE 91 e artigo 23.o do CE 99);

2.o Nos termos do n.o 2 do artigo 24.o do CE 91, considerava-se solo apto para a construçáo, além do mais:

O que dispóe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificaçóes nele existentes ou a construir

[v. artigo 24.o,n.o 2, alínea a)];

O que apenas dispóe de parte das infra-estruturas referidas na alínea anterior, mas se integra em núcleo urbano existente (v. artigo 24.o,n.o 2, alínea b)] - cf. texto n.o 2;

3.o A classificaçáo do solo como apto para a construçáo náo depende da existência de todas as infra-estruturas referidas na alínea a) do n.o 2 do artigo 24.o do CE 91 - acesso rodoviário, rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento

(v. Acórdáo da Relaçáo do Porto de 20 de Novembro de 1997, Colectânea de Jurisprudência, 1997, V, p. 199; cf., do signatário, Expropriaçóes por Utilidade Pública, pp. 187);

4.o O sentido normativo fixado pelo Acórdáo do Tribunal da Relaçáo de Évora de 20 de Dezembro de 2006, relativamente à disposiçáo contida no artigo 24.o, n.o 5, do CE 91, é claramente inconstitucional, pois implica a desconsideraçáo das efectivas capacidades edificativas de bens sujeitos a expropriaçáo, face a normas regulamentares preparatórias e pré-ordenadas à própria expropriaçáo, em clara violaçáo dos princípios da igualdade e da justa indemnizaçáo constitucionalmente consagrados (v. artigos 13.o e 62.o da CRP);

5.o Como se reconheceu expressamente no douto acórdáo recorrido, nas proximidades das parcelas expropriadas foram construídas, em ambos os sentidos da auto-estrada, as instalaçóes da área de serviço de Aveiras de Cima, situando-se entre 500 m a 3 km de distância de Aveiras de Cima, pelo que as suas potencialidades edificativas 'configuram-se bem definidas e próximas' (v. Acórdáos da Relaçáo do Porto de 31 de Janeiro de 1991, Boletim do Ministério da Justiça, n.o 403, p. 483, e da Relaçáo de Évora de 18 de Outubro de1990, Colectânea de Jurisprudência,1990, IV, p. 292), náo podendo deixar de ser consideradas in casu (v. artigos 13.o e 62.o da CRP);

6.o A consideraçáo das capacidades edificativas do imóvel expropriado sempre resultaria do disposto no artigo 26.o,n.o 12, do CE 99, bem como do princípio constitucional da igualdade (v. artigo 13.o da CRP).

A entidade expropriante apresentou as seguintes conclusóes nas suas contra-alegaçóes:

a) Sáo as parcelas expropriadas - constituídas por 31 pequenas fracçóes que se estendem ao longo da Auto-Estrada do Norte (sublanço Carregado-Aveiras de Cima) - a destacar de um prédio rústico, com a área de 10 836 400 m2, denominado 'Paul da Ota' e 'Vale de Mouros', sito nas freguesias de Vila Nova da Rainha e Azambuja;

31 976 b) Estavam incultas à data da DUP e apenas ocupadas por vegetaçáo espontânea, apresentando os solos aptidáo para as culturas arvenses de sequeiro; c) Náo sáo dotadas de quaisquer infra-estruturas urbanísticas, nelas náo existem benfeitorias - muito embora nas suas proximidades existam...

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