Lei n.º 8/2018

Data de publicação02 Março 2018
SectionSerie I
ÓrgãoAssembleia da República

Lei n.º 8/2018

de 2 de março

Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado)

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei:

a) Cria o Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE);

b) Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (Código do IRC) e o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (Código do IVA);

c) Define a responsabilidade por dívidas tributárias dos administradores judiciais e titulares de órgãos de administração de uma pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado, que sejam investidos nessas funções na sequência de acordo celebrado nos termos do RERE, da aprovação de plano de revitalização homologado no âmbito de Processo Especial de Revitalização (PER) ou de plano de recuperação aprovado no âmbito de processo de insolvência.

Artigo 2.º

Âmbito objetivo de aplicação do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

1 - O RERE regula os termos e os efeitos das negociações e do acordo de reestruturação que seja alcançado entre um devedor e um ou mais dos seus credores, na medida em que os participantes manifestem, expressa e unanimemente, a vontade de submeter as negociações ou o acordo de reestruturação ao regime previsto na presente lei.

2 - Entende-se por acordo de reestruturação, para os efeitos do número anterior, o acordo com vista à alteração da composição, das condições ou da estrutura do ativo ou do passivo de um devedor, ou de qualquer outra parte da estrutura de capital do devedor, incluindo o capital social, ou uma combinação destes elementos, incluindo a venda de ativos ou de partes de atividade, com o objetivo de permitir que a empresa sobreviva na totalidade ou em parte.

Artigo 3.º

Âmbito subjetivo de aplicação do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

1 - O RERE aplica-se às negociações e aos acordos de reestruturação que envolvam entidades devedoras que, cumulativamente:

a) Estejam referidas nas alíneas a) a h) do n.º 1 do artigo 2.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, com exceção das pessoas singulares que não sejam titulares de empresa, na aceção do artigo 5.º do mesmo diploma;

b) Estejam em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente.

2 - Não podem submeter-se ao RERE as negociações nem os acordos de reestruturação quando o devedor seja uma das entidades referidas no n.º 2 do artigo 2.º do CIRE.

3 - Para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1, a situação do devedor é aferida de acordo com o estabelecido no artigo 3.º e no artigo 17.º-B do CIRE.

4 - Para efeitos da presente lei, são credores do devedor os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre este, vencidos, vincendos e sob condição, tal como definidos no n.º 1 do artigo 50.º do CIRE, qualquer que seja a sua nacionalidade ou domicílio.

5 - Na medida do que seja necessário à prestação de consentimento relativo a alteração dos termos e condições da garantia, podem intervir nas negociações e no acordo de reestruturação os titulares de garantias sobre bens do devedor, mesmo não sendo credores do devedor.

6 - Podem ser admitidos a intervir nas negociações e no acordo de reestruturação os sócios do devedor, na medida em que, em virtude da lei ou dos estatutos do devedor, seja necessária a sua intervenção ou consentimento.

7 - Para efeitos do acordo de reestruturação, admite-se que grupos de credores sejam representados coletivamente por entidade que esteja mandatada por estes, no caso dos trabalhadores, as organizações representativas dos trabalhadores, para atuar como agente de financiamento e que grupos de beneficiários de garantias sobre bens do devedor sejam representados coletivamente por entidade que esteja mandatada por estes para atuar como agente de garantias.

Artigo 4.º

Natureza voluntária do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

1 - As partes são livres de sujeitar ao RERE os efeitos do acordo de reestruturação que alcancem, bem como os efeitos decorrentes das negociações.

2 - A participação nas negociações e no acordo de reestruturação é livre, podendo o devedor para o efeito convocar todos ou apenas alguns dos seus credores, segundo o que considerar mais apropriado a alcançar o acordo de reestruturação, sem prejuízo do disposto nos n.os 5 e 6 do artigo 7.º

Artigo 5.º

Princípios orientadores

1 - O acordo de reestruturação e as respetivas negociações devem pautar-se pelo princípio da boa-fé e pelos Princípios Orientadores da Recuperação Extrajudicial de Devedores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 43/2011, de 25 de outubro, sem prejuízo de as partes envolvidas nas negociações poderem, a todo o tempo, adotar um código de conduta.

2 - No decurso das negociações, o devedor deve fornecer às demais partes envolvidas informação atual, verdadeira e completa, que permita aferir com rigor a sua situação económico-financeira e os credores devem partilhar entre si, de forma transparente, a informação que possuam sobre o devedor, sem prejuízo das limitações legais decorrentes de deveres de sigilo a que estejam vinculados.

CAPÍTULO II

Negociação do acordo de reestruturação

SECÇÃO I

Sujeição das negociações ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

Artigo 6.º

Opção pela sujeição das negociações ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas e depósito

1 - Caso as partes pretendam que as negociações destinadas a alcançar um acordo de reestruturação produzam os efeitos previstos na secção seguinte, podem sujeitá-las ao RERE, devendo o devedor e credores que representem pelo menos 15 % do passivo daquele que, de acordo com o CIRE, seja considerado não subordinado, para o efeito, assinar um protocolo de negociação e promover o seu depósito na Conservatória do Registo Comercial.

2 - O depósito do protocolo de negociação, do protocolo de alteração e das declarações de adesão podem ser feitos a todo o tempo, por qualquer interessado, segundo o Processo Especial de Depósito do RERE.

3 - As declarações de adesão constantes dos n.os 5 e 6 do artigo 7.º podem ser feitas durante o período em que decorrerem as negociações, por qualquer interessado.

4 - Para verificação do requisito previsto no n.º 1, deve o devedor anexar ao protocolo de negociação uma declaração de um contabilista certificado ou revisor oficial de contas emitida há 30 dias ou menos.

5 - O prazo das negociações resultante do protocolo de negociação, incluindo a prorrogação em que as partes acordem, não pode exceder três meses contados desde a data em que for requerido o respetivo depósito na Conservatória do Registo Comercial.

Artigo 7.º

Protocolo de negociação

1 - O conteúdo do protocolo de negociação é estabelecido livremente entre as partes e contém, pelo menos, os seguintes elementos:

a) Identificação completa do devedor, dos credores participantes, dos representantes do devedor e dos representantes dos credores para efeitos do RERE;

b) Prazo máximo acordado para as negociações, com o limite previsto no n.º 5 do artigo anterior;

c) Passivo total do devedor, apurado de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 3.º;

d) Responsabilidade pelos custos inerentes ao processo negocial, incluindo o custo com a assessoria técnica, financeira e legal, e modo de repartição dos mesmos;

e) Acordo relativo à não instauração pelas partes, contra o devedor no decurso do prazo acordado para as negociações, de processos judiciais de natureza executiva, de processos judiciais que visem privar o devedor da livre disposição dos seus bens ou direitos, bem como de processo relativo à declaração da insolvência do devedor;

f) Data e assinaturas reconhecidas.

2 - O protocolo de negociação pode, adicionalmente, incluir os seguintes elementos:

a) Lista dos fornecedores dos serviços essenciais referidos no artigo 12.º e identificação completa dos respetivos contratos de prestação de serviços;

b) Autorização dos credores participantes para que o devedor divulgue a existência e conteúdo do protocolo de negociação junto dos seus credores, na medida do que o devedor considere necessário à participação de outros credores no processo de negociação ou no acordo em negociação.

3 - O protocolo de negociação é acompanhado, pelo menos, dos seguintes documentos:

a) Certidão do registo comercial do devedor ou código de acesso à respetiva certidão eletrónica e estatutos, se aplicável;

b) Documentos de prestação de contas do devedor relativos aos três últimos exercícios;

c) Declaração do devedor a indicar o detalhe do seu passivo, apurado de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 3.º, designadamente, nome de todos os credores, proveniência, montante e natureza dos créditos, e garantias associadas;

d) Lista de todos os processos judiciais e arbitrais nos quais o devedor seja parte;

e) Justificação para a não apresentação de algum destes documentos, se não forem apresentados com o protocolo de negociação.

4 - O protocolo de negociação e qualquer documento que o altere podem conter os seguintes elementos:

a) Manifestação da opção pela publicidade da existência de negociações nos termos do n.º 1 do artigo 8.º;

b) Identificação do credor líder e do mediador de recuperação de empresas que possa ter sido nomeado;

c) Identificação dos credores que integram o comité de credores e das competências que lhe são atribuídas;

d) Identificação do assessor jurídico e/ou do assessor financeiro nomeado para assistir as partes subscritoras do protocolo de negociação e respetivos termos e condições;

e) Termos e condições aplicáveis ao novo financiamento a conceder no decurso das negociações e respetivas garantias.

5 - Enquanto decorrerem as negociações, qualquer credor do devedor pode, a todo o tempo, aderir ao protocolo de negociação, através de uma declaração de adesão.

6 - Apenas se admitem adesões integrais ao protocolo de negociação, considerando-se não...

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