Acórdão n.º 231/2008, de 22 de Julho de 2008

Acórdáo n. 231/2008

Processo n. 337/06

Acordam na 3.ª Secçáo do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1 - EP - Estradas de Portugal, E. P. E., expropriante no processo de expropriaçáo por utilidade pública que a opóe aos expropriados Sandra Maria da Silva Ribeiro e Domingos Salgado Alves, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n. 1 do artigo 70. da Lei n. 28/82, de 15 de Novembro (LTC), do acórdáo do Tribunal da Relaçáo de Guimaráes que manteve a sentença que considerara que, no cálculo da indemnizaçáo por expropriaçáo de uma parcela de terreno em que estava implantado um edifício de habitaçáo, se incluem os montantes correspondentes à penalizaçáo que os expropriados tiveram de suportar em consequência da liquidaçáo antecipada e à perda de bonificaçáo de juros de um empréstimo bancário contraído para a construçáo da casa, bem como ao custo de registos e os emolumentos para aquisiçáo de nova casa e despesas de mudança.

2 - Prosseguindo o recurso, o expropriante apresentou alegaçóes em que conclui nos termos seguintes:

"1.ª Do princípio constitucional da justa indemnizaçáo decorre, para o legislador, a necessidade de, ao definir os respectivos critérios de cálculo, tomar em consideraçáo, quer a "vertente do interesse público" quer o "princípio da igualdade de encargos" entre os cidadáos.

  1. O critério fixado no Código das Expropriaçóes para alcançar a compensaçáo integral do sacrifício patrimonial infligido aos expropriados e para garantir que estes, em comparaçáo com outros cidadáos, náo sejam tratados de modo desigual e injusto, é o valor real e corrente do bem (artigo 23. do CE/99) - também designado valor venal, valor comum ou valor de compra e venda do bem expropriado, entendido náo em sentido estrito ou rigoroso, mas sim em sentido normativo.

  2. A observância do "princípio da igualdade dos cidadáos perante os encargos públicos" na expropriaçáo por utilidade pública exige que esta seja acompanhada de uma indemnizaçáo integral ou de uma compensaçáo total do dano infligido ao expropriado, em termos de o colocar na posiçáo de adquirir outro bem de igual natureza e valor.

  3. A teoria da substituiçáo funciona apenas em "sentido figurado" ou "abstractamente", já que o sujeito expropriado náo pode ser indemnizado do conjunto das despesas reais e concretas que tiver de fazer para readquirir um bem do mesmo tipo ou qualidade daquele de que se viu privado;

  4. Isto mesmo se consagra no artigo 23., n. 1, do actual Código das Expropriaçóes, ao impor que a justa indemnizaçáo visa «ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriaçáo, correspondente ao valor real e corrente do bem» (sublinhado nosso);

  5. Assim, ao contrário do que se sustentou no douto acórdáo em crise, náo integram o conceito de justa indemnizaçáo as quantias alegadamente gastas pelos expropriados por «circunstâncias relacionadas com o empréstimo» concedido para aquisiçáo da construçáo implantada na parcela, bem como os custos com «eventuais registos e emolumentos a

    despender com a aquisiçáo de uma nova residência e, bem assim, com os custos derivados da mudança de residência».

  6. É inconstitucional a norma contida no n. 1 do artigo 23. do Código das Expropriaçóes (1999), quando interpretada no sentido de incluir na justa indemnizaçáo o conjunto das despesas reais e concretas que o expropriado tiver de fazer para readquirir um bem do mesmo tipo e qualidade daquele de que se viu privado.

    Termos em que, deverá dar -se provimento ao presente recurso, devendo o acórdáo recorrido ser reformado em conformidade com o juízo de inconstitucionalidade da norma contida no n. 1 do artigo 23. do Código das Expropriaçóes (1999), quando interpretada no sentido de incluir na justa indemnizaçáo o conjunto das despesas reais e concretas que o expropriado tiver de fazer para readquirir um bem do mesmo tipo e qualidade daquele de que se viu privado, assim se fazendo justiça!"

    Os expropriados também alegaram, tendo concluído nos seguintes termos:

    "I.ª O disposto no artigo 23. n. 1 do C. E. tem de ser interpretado à luz do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13 da C.R.P.

    II.ª à luz deste princípio e na sua vertente da relaçáo externa da expropriaçáo, deve a indemnizaçáo por expropriaçáo ser fixada num montante tal que impeça um tratamento desigual entre os expropriados e os náo expropriados

    III.ª A observância do mesmo princípio, quanto à igualdade dos cidadáos perante os encargos públicos, exige que a expropriaçáo seja acompanhada de uma indemnizaçáo integral do dano sofrido.

    IV.ª Assim a única interpretaçáo constitucionalmente admissível para o artigo 23 n. 1 do Código de Expropriaçóes é a que aplicando o dito princípio de igualdade inclui no prejuízo suportado pelo Expropriado também as despesas que este terá para adquirir um bem de igual natureza e qualidade.

    V.ª O conceito de "justa indemnizaçáo" tem uma abrangência muito maior do que aquela que o limita à ideia de uma mera substituiçáo de um bem pelo seu valor real e corrente.

    VI.ª É dominante na doutrina sobre expropriaçóes o entendimento de que a reposiçáo da situaçáo patrimonial dos Expropriados, só se verificará na situaçáo de a indemnizaçáo englobar, além do valor de mercado do bem expropriado, também, o ressarcimento de outros prejuízos patrimoniais causados directa e necessariamente pela expropriaçáo na esfera jurídica patrimonial dos expropriados (desvalorizaçáo da parte sobrante, etc.) e, ainda, as despesas necessárias para substituir o bem expropriado por outro equivalente

    VII.ª Constitui imperativo constitucional, consagrado no C.E. e, ainda, na doutrina mais autorizada, ressarcir -se os Expropriados de todos os prejuízos e despesas, sofridos pela expropriaçáo, de modo a ficarem numa situaçáo semelhante à que possuíam antes de terem sido afectados com a expropriaçáo.

    VIII.ª O critério do valor de mercado contempla, apenas, o valor que seria necessário despender para adquirir um bem semelhante, esquecendo a perspectiva dos expropriados, que teráo de suportar uma série de despesas para substituir o bem que lhe foi subtraído."

    II - Fundamentos

    3 - Recordemos o essencial do litígio, no que respeita ao problema em que se insere a questáo de constitucionalidade.

    Num processo de fixaçáo da indemnizaçáo por expropriaçáo por utilidade pública de uma parcela em que estava implantada uma casa, os expropriados pediram que o montante indemnizatório incluísse, a mais do valor do bem, o correspondente a outros prejuízos que imputam ao acto expropriativo, a saber: os montantes que tiveram de suportar em consequência da perda da bonificaçáo do juro e da liquidaçáo antecipada de um empréstimo que haviam contraído para a construçáo da casa, bem como os custos de...

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