Do conteúdo da indemnização

AutorBernardo Sabugosa Portal Madeira
Páginas31-84

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Artigo 23.° Justa indemnização

1 - A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.Page 32

2 - Na determinação do valor dos bens expropriados não pode tomar-se em consideração a mais-valia que resultar:

  1. Da própria declaração de utilidade pública da expropriação;

  2. De obras ou empreendimentos públicos concluídos há menos de cinco anos, no caso de não tersido liquidado encargo de mais-valia e na medida deste;

  3. De benfeitorias voluptuárias ou úteis ulteriores à notificação a que se refere o n.° 5 do artigo 10.°;

  4. De informações de viabilidade, licenças ou autorizações administrativas requeridas ulteriormente à notificação a que se refere o n.° 5 do artigo 10.°.

    3 - Na fixação da justa indemnização não são considerados quaisquer factores, circunstâncias ousituações criadas com o propósito de aumentar o valor da indemnização.

    4 - Ao valor dos bens calculado por aplicação dos critérios referenciais fixados nos artigos 26.° eseguintes, será deduzido o valor correspondente à diferença entre as quantias efectivamente pagasa título de contribuição autárquica e aquelas que o expropriado teria pago com base na avaliaçãoefectuada para efeitos de expropriação, nos últimos cinco anos.

    5 - Sem prejuízo do disposto nos n. os 2 e 3 do presente artigo, o valor dos bens calculado de acordocom os critérios referenciais constantes dos artigos 26.° e seguintes deve corresponder ao valor reale corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo a entidade expropriante e o ex propriado, quando tal se não verifique requerer, ou o tribunal decidir oficiosamente, que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar aquele valor.

    6 - O Estado garante o pagamento da justa indemnização, nos termos previstos no presente Código.

    7 - O Estado, quando satisfaça a indemnização, tem direito de regresso sobre a entidade expropriante, podendo, para o efeito, proceder à cativação de transferências orçamentais, independentemente de quaisquer formalidades.

    COMENTÁRIOS:

    A justa indemnização e o valor de substituição

    Este artigo do C.E., espécie de preâmbulo sobre a forma de cálculo do montante da indemnização é geralmente pacífico e bem aceite, encerrando a súmula de toda a razão de existir do C.E: "garantir que o expropriado é ressarcido do prejuízo que lhe advém em resultado da expropriação, com uma contrapartida correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal ". Ou seja, o valor de mercado, como sendo o valor a atribuir independentemente de qualquer regra ou cálculo que o próprio C.E. sugira.

    Alípio Guedes (Valorização de bens expropriados, Almedina, 2001), em nossa opinião, vai no caminho certo ao referir que se deve salvaguardar que demonstrando-se que o quantum indemnizatório é insuficiente para a aquisição de outra habitação semelhante ele seja acrescido até ser possível satisfazer esse direito.Page 33

    Em nosso entender, a garantia de uma justa indemnização não deve corresponde apenas ao valor de mercado do bem, mas deveria incluir também outros factores que a ela conduzam, ressarcindo outras despesas que sejam atendíveis! 5

    No entanto, o Acórdão do STJ 810/98 considerou que a justa indemnização corresponde ao valor real e corrente do bem, não se tratando " de uma verdadeira indemnização, uma vez que não deriva do funcionamento do instituto da responsabilidade civil ". Apesar de tudo, consideramos que sendo a expropriação um acto contra vontade do vendedor o simples valor do bem não ressarce totalmente a perda, na medida em que não forem atendidas as despesas a que o proprietário se viu forçado, como a mudança de móveis, os honorários de advogado, pareceres técnicos, isto já sem considerar as despesas de escritura que a aquisição de um novo bem vai implicar, o que naturalmente ataca a integridade da própria indemnização. Só assim se respeitaria a letra da Lei no Artigo 23.° " ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação ".

    Também J. A. Santos ( Código das Expropriações , DisLivro, 2000) considerou que " a justa indemnização há de corresponder ao valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda que a transferência do bem que lhe pertencia para outra esfera dominial lhe acarreta " a qual " só ficará garantida se a generalidade das expropriações se fizer por forma a que as indemnizações atribuídas a final assegurem, em relação a cada caso concreto e tendo em atenção as respectivas circunstâncias específicas, a adequada reconstituição da lesão patrimonial infligida ao expropriado. ". Ora essa reconstituição impõe o ressarcimento de outros prejuízos patrimoniais causados pelo acto expropriativo os quais mesmo que existissem numa situação normal de mercado tinham sido resultado da vontade do proprietário e não fruto de uma imposição administrativa.

    De igual modo, Pedro Elias da Costa ( Guia das expropriações por utilidade pública , 2.a edição, Almedina, 2003), sublinha a opinião de Marcelo Caetano ao considerar " que o critério do valor venal não abrange todas as consequências económicas que a privação do direito de propriedade poderia produzir sobre o património do expropriado ".

    Aliás, de forma inovadora, o actual C.E. suprime a proibição das despesas de substituição que anteriormente vigorava, o que é um claro indicador de que o C.E. assume agora que podem ser atendidas outras despesas devidamente comprovadas como por exemplo a remoção de objectos pessoais e a sua reinstalação, escrituras e registos e outras despesas devidamente comprovadas.Page 34

    Citando ainda Pedro Elias da Costa, " uma indemnização que não englobe o valor de substituição do bem, não efectua a reposição da situação patrimonial infligida ao expropriado, nem assegura o princípio da igualdade " acrescentando que " a valorização de uma habitação deve ser efectuada numa perspectiva de determinação do seu valor de substituição e não apenas, o seu mero valor de mercado. (...) este princípio encontra-se subjacente ao disposto no artigo 30.°, n.° 2, que possibilita que o inquilino habitacional opte pelo realojamento. Não cremos que o legislador quisesse conceder ao arrendatário um tratamento diverso do dado ao proprietário da habitação ". 6

    Esta opinião vem finalmente sendo subscrita por alguma jurisprudência mais recente "

    A indemnização justa deverá proporcionar ao expropriado um valor monetário que o coloque em condições de adquirir outro bem de igual natureza e valor. " Acórdão TRL 2246/2006-6.

    Acrescente-se que o proprietário expropriado para a substituição do bem subtraído vai ainda ter de suportar o pagamento do IMT, o que naturalmente é uma redução do jus indemnizatório uma vez que diminui a capacidade para adquirir bem igual pelo mesmo preço. Este encargo deve ser atendido aquando da ponderação dos factores correctivos do artigo 26.° e atendido como uma desigualdade de tratamento para com proprietários não expropriados.

    Sugerimos que se isentasse de IMT as aquisições feitas por expropriados por um período razoavelmente curto a contar do momento em que recebam a totalidade da indemnização a que têm direito e tendo como limite o valor patrimonial da indemnização!

    A justa indemnização e o valor de mercado

    Durante décadas de expropriações os peritos e os Tribunais debateram-se com falta de informação sobre os valores de mercado dos imóveis.

    Nos laudos ainda é frequente os peritos apresentarem as suas avaliações invocando um preço da habitação praticado na área da expropriação sem apresentarem qualquer justificação ou mesmo documento probatório.Page 35

    Alguns fundaram-se e fundam-se nos valores referenciais citados no n.° 5 do artigo 26.°, que não se devem usar em expropriações a não ser em situações muito particulares.

    Frequentemente, e correctamente, são carreados para os processos recortes de jornais e folhetos avulsos de agências imobiliárias e até editais de hastas públicas em que a entidade expropriante é alienante. No entanto esta informação apesar de valiosa é dispersa e por vezes pouco consistente, servindo de indicador acerca da justeza de uma avaliação, mas não sendo por si só um elemento que permita efectuar a avaliação.

    Nos últimos anos diversas entidades começaram a efectuar compilações de preços de transacções e avaliações imobiliárias.

    O primeiro índice que reuniu alguma fiabilidade é produzido pelo jornal "Confidencial Imobiliário" que além de mensalmente publicar uma actualização dos preços das avaliações de um conjunto restrito de agencias imobiliárias associadas faz periodicamente compilações e estudos da evolução do mercado. Durante muitos anos o Jornal "Expresso" utilizou este indicador.

    No entanto, embora os valores deste índice nos pareçam bastante bem estruturados no contexto urbano das áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa, ele tem limitações nas restantes zonas, nomeadamente pelo número reduzido de dados aí recolhidos. Por outro lado a informação contida nesta publicação é restrita a assinantes, não sendo universal o seu acesso.

    Outra estatística semelhante, ou seja, a compilação de avaliações imobiliárias efectuadas por agências ou melhor, de valores pedidos por imóveis no mercado, é o índice publicado pela APEMIP, Associação de Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal o qual pode ser parcialmente consultado no "site" na "internet", ou obtido por solicitação. Também o site do banco BPI, uma das maiores base de dados de imóveis tem diversas ferramentas que permitem obter alguma informação estatística sobre a cotação de venda dos imóveis registados, não divergindo muito dos valores...

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