Decreto-Lei n.º 115/2010, de 22 de Outubro de 2010

Decreto-Lei n. 115/2010

de 22 de Outubro

O presente decreto -lei aprova o quadro para a avaliaçáo e gestáo dos riscos de inundaçóes, com o objectivo de reduzir as suas consequências prejudiciais, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n. 2007/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro, e indo igualmente ao encontro da preocupaçáo relativa à mitigaçáo dos efeitos das inundaçóes, estabelecida na Directiva n. 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro.

A aprovaçáo da Directiva n. 2007/60/CE veio evidenciar a necessidade de se reforçar o actual quadro legal em vigor, no que respeita ao fenómeno das inundaçóes, trazendo preocupaçóes acrescidas de avaliaçáo, gestáo e mitigaçáo de riscos de inundaçóes.

As inundaçóes sáo um fenómeno natural que náo pode ser evitado, mas que pode pôr em causa a segurança de pessoas, de bens e do ambiente, podendo provocar desalojados e a perda de vidas humanas e ser responsável por impactos sócio -económicos relevantes. É, no entanto, possível e desejável reduzir o risco e as consequências prejudiciais que lhes estáo associadas, especialmente para a saúde e a vida humanas, o ambiente, o património cultural, as actividades económicas e as infra -estruturas.

Assim, nos termos do presente decreto -lei, em cada regiáo hidrográfica ou em cada unidade de gestáo que venha a ser definida, será avaliado o risco de inundaçáo e as respectivas medidas suplementares para a sua mitigaçáo, determinando -se para o efeito a elaboraçáo, pelas Administraçóes das Regióes Hidrográficas, de cartas de zonas inundáveis e de cartas de riscos de inundaçóes, indicativas das potenciais consequências prejudiciais associadas a diferentes cenários de inundaçóes, incluindo a avaliaçáo

das actividades que provocam o aumento dos riscos de inundaçóes.

A fim de evitar e reduzir os impactos negativos das inundaçóes nas zonas em causa, as Administraçóes das Regióes Hidrográficas devem, também, elaborar planos de gestáo dos riscos de inundaçóes, centrados na prevençáo, protecçáo, preparaçáo e previsáo destes fenómenos, em estreita articulaçáo com os planos de gestáo das bacias hidrográficas. Os planos de gestáo de riscos de inundaçóes devem ter em conta as características próprias das zonas a que se referem e prever soluçóes específicas para cada caso, bem como o disposto nos planos de emergência de protecçáo civil.

O presente decreto -lei tem em consideraçáo a preocupaçáo com a salvaguarda do risco associada às inundaçóes que já existe há várias décadas no nosso país. Com efeito, para além das convençóes internacionais ratificadas por Portugal acerca desta matéria, o Decreto -Lei n. 468/71, de 5 de Novembro, alterado pelos Decretos -Leis n.os 53/74, de 15 de Fevereiro, e 89/87, de 26 de Fevereiro, e pela Lei n. 16/2003, de 4 de Junho, unificou o regime dos terrenos incluídos no domínio público hídrico e criou a figura das zonas adjacentes, determinando a sujeiçáo a restriçóes de utilidade pública dos terrenos considerados como ameaçados pelo mar ou pelas cheias.

A Reserva Ecológica Nacional, criada pelo Decreto -Lei n. 321/83, de 5 de Julho, cujo regime foi aprofundado pelo Decreto -Lei n. 93/90, de 19 de Março, e posteriormente revisto pelo Decreto -Lei n. 166/2008, de 22 de Agosto, numa perspectiva preventiva, veio a considerar as zonas ameaçadas pelas cheias como áreas de risco, integrando as áreas ainda livres de ocupaçáo, as quais passaram, assim, a constituir uma restriçáo de utilidade pública.

Por sua vez, e sem prejuízo do processo de classificaçáo das zonas adjacentes, previsto no Decreto -Lei n. 468/71, de 5 de Novembro, o Decreto -Lei n. 364/98, de 21 de Novembro, veio determinar a obrigaçáo de os municípios com aglomerados urbanos atingidos por cheias num período de tempo que, pelo menos, incluísse o ano de 1967 e que ainda náo se encontrassem abrangidos por zonas adjacentes, elaborarem cartas de zonas inundáveis abrangendo os perímetros urbanos, visando a adopçáo de restriçóes à edificaçáo face ao risco de cheia.

A Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos, aprovada pela Lei n. 54/2005, de 15 de Novembro, revogou parcialmente o Decreto -Lei n. 468/71, de 5 de Novembro, mantendo e desenvolvendo o regime jurídico aplicável às zonas adjacentes, estabelece que o Governo pode classificar como zona adjacente as zonas ameaçadas pelo mar e as zonas ameaçadas pelas cheias, sujeitando -as a restriçóes de utilidade pública.

A Lei da Água, aprovada pela Lei n. 58/2005, de 29 de Dezembro, estabelece, em sede de medidas de protecçáo contra cheias e inundaçóes, a obrigaçáo de nos instrumentos de planeamento dos recursos hídricos e de gestáo territorial serem demarcadas as zonas inundáveis ou ameaçadas pelas cheias - incluindo -se, nestas últimas, as zonas ameaçadas pelo mar -, as quais devem ainda ser classificadas nos termos da Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos, ficando sujeitas às restriçóes prevista nesta lei.

Neste enquadramento, e por forma a garantir a eficácia das medidas de reduçáo dos riscos de inundaçóes previstas no presente decreto -lei, devem as mesmas ser, tanto quanto possível, coordenadas à escala das bacias hidrográficas, e devidamente articuladas com os regimes legais

4758 em vigor, considerando os vários tipos de fenómenos de inundaçóes.

Encontrando -se actualmente em curso a revisáo dos planos de gestáo das bacias hidrográficas, e tendo em vista a compatibilidade e concertaçáo dos trabalhos a realizar, determina -se que a avaliaçáo do risco de cheia a elaborar no âmbito destes planos deve, desde já, respeitar os critérios e objectivos do presente decreto -lei.

Os procedimentos de elaboraçáo ou revisáo dos planos municipais de ordenamento do território, bem como a elaboraçáo das cartas da reserva ecológica nacional, cumprem o disposto no quadro legal actualmente em vigor, para efeitos da delimitaçáo das zonas inundáveis, das zonas ameaçadas pelas cheias e das zonas ameaçadas pelo mar.

A elaboraçáo dos planos de gestáo dos riscos de inundaçóes deve aproveitar os trabalhos já produzidos anterior-mente naquele âmbito e fornecerá informaçáo adicional que beneficiará a actualizaçáo dos instrumentos legais preexistentes.

O presente decreto -lei constitui, assim, uma ferramenta valiosa para estabelecer prioridades e para tomar decisóes técnicas, financeiras e políticas ulteriores em matéria de gestáo de riscos de inundaçóes, e vem responder à necessidade de se dispor, a nível nacional, regional e local, de informaçáo rigorosa e eficaz acerca de tais riscos.

Foram ouvidos os órgáos de governo próprio das Regióes Autónomas e a Associaçáo Nacional de Municípios Portugueses.

Foi ouvido, a título facultativo, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n. 1 do artigo 198. da Constituiçáo, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposiçóes gerais

Artigo 1.

Objecto

O presente decreto -lei estabelece um quadro para a avaliaçáo e gestáo dos riscos de inundaçóes, com o objectivo de reduzir as consequências associadas às inundaçóes prejudiciais para a saúde humana, incluindo perdas humanas, o ambiente, o património cultural, as infra -estruturas e as actividades económicas, e transpóe para a ordem jurídica interna a Directiva n. 2007/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro, relativa à avaliaçáo e gestáo dos riscos de inundaçóes.

Artigo 2.

Definiçóes

1 - Para efeitos de aplicaçáo do presente decreto -lei, entende-sepor:

  1. «Edifícios sensíveis» os hospitais, lares de idosos, creches, infantários, escolas, edifícios de armazenamento ou processamento de substâncias perigosas (voláteis, inflamáveis ou explosivas, tóxicas ou reactivas em contacto com a água), infra -estruturas de gestáo de efluentes e de armazenamento ou transformaçáo de resíduos, e edifícios com importância na gestáo de emergências, nomeadamente quartéis de bombeiros, instalaçóes das forças de segurança e das forças armadas, da Cruz Vermelha, comando nacional

    e comandos distritais de operaçóes de socorro e serviços municipais de protecçáo civil;

  2. «Inundaçáo» a cobertura temporária por água de uma parcela do terreno fora do leito normal, resultante de cheias provocadas por fenómenos naturais como a precipitaçáo, incrementando o caudal dos rios, torrentes de montanha e cursos de água efémeros correspondendo estas a cheias fluviais, ou de sobreelevaçáo do nível das águas do mar nas zonas costeiras;

  3. «Leito normal» o terreno ocupado pelas águas com o caudal que resulta da média dos caudais máximos instantâneos anuais, sendo que no caso de águas sujeitas à influência das marés corresponde à zona atingida pela máxima preia -mar das águas vivas equinociais.

  4. «Risco de inundaçáo» a combinaçáo da probabilidade de inundaçóes, tendo em conta a sua magnitude, e das suas potenciais consequências prejudiciais para a saúde humana, o ambiente, o património cultural, as infra -estruturas e as actividades económicas, sendo as suas consequências prejudiciais avaliadas através da identificaçáo do número e tipo de actividade afectada, podendo por vezes ser apoiada numa análise quantitativa;

  5. «Unidade de gestáo» a regiáo de influência da drenagem topográfica ou de exposiçáo marítima que pela singularidade especial da sua vulnerabilidade justifique a sua autonomizaçáo para as etapas de avaliaçáo de risco previstas no presente decreto -lei;

  6. «Zonas densamente povoadas» o conjunto contínuo de freguesias, apresentando, cada uma, uma densidade populacional superior a 500 habitantes por quilómetro quadrado e possuindo, no seu conjunto, uma populaçáo total de, pelo menos, 50 000 habitantes.

    2 - Sem prejuízo das definiçóes do número anterior, sáo aplicáveis as definiçóes constantes do artigo 4. da Lei da Água, aprovada pela Lei n. 58/2005, de 29 de Dezembro.

    Artigo 3.

    Entidades competentes

    1 - Compete ao Instituto da Água, I...

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