Decreto-Lei n.º 92/2019

Coming into Force11 Julho 2019
Data de publicação10 Julho 2019
ELIhttps://data.dre.pt/eli/dec-lei/92/2019/07/10/p/dre
SectionSerie I
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros

Decreto-Lei n.º 92/2019

de 10 de julho

A Estratégia Nacional para a Conservação da Natureza e Biodiversidade para 2030 (ENCNB 2030), aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/2018, de 7 de maio, propugna uma visão de longo prazo para a melhoria do estado de conservação do património natural, através de uma progressiva apropriação pela sociedade da importância e do valor da biodiversidade no desenvolvimento do país, identificando medidas destinadas a preservá-la face às principais ameaças que se perspetivam hoje e num futuro próximo. A proliferação das espécies exóticas que ameaçam os ecossistemas, habitats ou espécies é aí identificada como uma das principais ameaças à biodiversidade e que afeta os valores naturais no território, sendo a revisão do quadro legislativo nacional uma das medidas preconizadas para a combater e reforçar a conservação da natureza.

O presente decreto-lei, ao proceder à revisão do regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 565/99, de 21 de dezembro, concretiza uma das medidas previstas na ENCNB 2030, permitindo, simultaneamente, dar plena execução no ordenamento jurídico nacional ao regime instituído pelo Regulamento (UE) n.º 1143/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2014, relativo à prevenção e gestão da introdução e propagação de espécies exóticas invasoras.

Num quadro de necessária adaptação à rápida mutação da sociedade e à inovação dos regimes que têm vindo a ser desenvolvidos por instrumentos legislativos de âmbito nacional e internacional, mantêm-se, ainda assim, institutos preventivos do regime que tem vigorado nas últimas duas décadas no nosso país, sobretudo o de restrição máxima à introdução na natureza de espécies exóticas, que apenas deve ser equacionada como uma situação de último recurso e de absoluta excecionalidade da utilização de espécies invasoras, tendo presente que a preservação da biodiversidade depende da efetiva salvaguarda das espécies autóctones que devem ser amplamente protegidas.

Com efeito, num mundo pautado pelo comércio global e pelas alterações climáticas, a complexidade ou impossibilidade de prever com rigor o comportamento de determinadas espécies exóticas, quando livremente transacionadas ou introduzidas na natureza, obriga a uma especial cautela por parte das entidades competentes, quer através da contínua investigação e estudo que permitam um grau de conhecimento razoável para fundamentar uma decisão ponderada sobre a possibilidade de fixação de novas espécies no território, quer através da exigência de especiais requisitos para o efeito e do estabelecimento de condições resolutivas que permitam a todo o tempo fazer cessar e conter qualquer efeito adverso não esperado para a biodiversidade.

Presidiu, portanto, à formulação das soluções consagradas no presente decreto-lei um equilíbrio indispensável à luz da atual sociedade de risco e de incerteza, não deixando de se permitir, por um lado, a inovação, a iniciativa privada e a exploração económica, mas consagrando, por outro lado, regras e mecanismos que assegurem a salvaguarda dos interesses públicos ambientais, de tal modo que esses empreendimentos não comprometam a preservação da biodiversidade e contribuam para um desenvolvimento sustentável dos territórios e do país.

Assim, a introdução na natureza de espécies exóticas é escrutinada à luz do princípio da função social e pública do património natural, bem como do princípio da precaução e, deste modo, restringida às situações em que é demonstrada a sua inocuidade, dependendo para este efeito de autorização do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, I. P. (ICNF, I. P.), ouvido o Instituto Português do Mar e da Atmosfera, I. P. (IPMA, I. P.), no que respeita às espécies marinhas ou que habitam águas de transição.

No que diz respeito à detenção, criação ou cultivo de espécies exóticas, institui-se um sistema de licenças para a criação de animais para a produção de plantas ou para a detenção de espécies exóticas com fins comerciais, científicos ou pedagógicos, fundado na verificação de determinados pressupostos que excluam o risco de evasão e disseminação ou que o reduzam a uma expressão mínima aceitável. Este licenciamento deverá contribuir para um recenseamento dos criadores e viveiristas de espécies exóticas no nosso país e para o devido acompanhamento, pelas entidades competentes, da sua atividade relativa à reprodução de espécimes de espécies de fauna ou de flora e à respetiva circulação no território nacional. Para esse efeito, é estabelecido como condição de licenciamento a entrega pelos criadores e viveiristas dos elementos necessários à organização de um registo atualizado por parte da autoridade nacional para a conservação da natureza e da biodiversidade.

Atualiza-se, ainda, a terminologia de harmonia com a mais recente legislação que tem vindo a ser aprovada relativamente a espécies exóticas e investe-se numa cultura preventiva, definindo e clarificando as regras e os procedimentos a cumprir pelos interessados na investigação, na produção e no comércio de espécies não autóctones.

Em complemento a este sistema de prevenção, instituem-se mecanismos de monitorização, deteção precoce e reação rápida para conter a propagação de espécies invasoras, que envolve a participação em rede de diversos setores de atividade e níveis de governação, a que acresce a manutenção dos planos de controlo, contenção e controlo e erradicação já previstos nos regimes jurídicos anteriores, mas cuja elaboração ganhará agora uma maior efetividade.

Devido à posição de charneira biogeográfica, Portugal tem uma localização especialmente sensível no que diz respeito à probabilidade de aclimatação de espécies não indígenas disseminadas na natureza, cingindo-se, pois, a utilização de espécies invasoras a situações de absoluta excecionalidade e aos territórios com ocorrências confirmadas em momento prévio ao regime que agora se estabelece. É nestes termos que se prevê um licenciamento excecional para a investigação de espécies invasoras ou para a sua exploração económica, tendo em conta os benefícios sociais e económicos relevantes e procurando acautelar os potenciais efeitos indesejáveis para a manutenção da biodiversidade, nomeadamente através da adoção de mecanismos de monitorização que permitam uma deteção precoce e uma reação rápida face a situações de evasão ou disseminação.

Este regime tem por base uma Lista Nacional de Espécies Invasoras que, sem prejudicar a efetividade e autonomia da lista das espécies que causam preocupação na União, constitui um importante referencial cujo conteúdo é sujeito a alterações no tempo de acordo com a dinâmica inerente ao desenvolvimento do conhecimento científico sobre a fauna e flora não autóctone e à propagação destas no território.

É, ainda, criado um regime específico para a produção de espécies que são atualmente usadas na aquicultura e na agricultura, incluídas no anexo III ao presente decreto-lei, com vista à salvaguarda de efeitos indesejados na conservação da natureza e da biodiversidade. A produção destas espécies pode ocorrer, assim, apenas nas áreas fixadas para o efeito nos instrumentos de gestão territorial e nos instrumentos de ordenamento marítimo, para as quais são elaborados planos de controlo.

Em contraponto, e em benefício de uma maior clareza e segurança jurídicas, é instituída, em termos inovadores, uma lista com as espécies exóticas cuja introdução e ocorrência sem efeitos adversos no território nacional, ou parte dele, estão já identificadas e confirmadas, não justificando, assim, a aplicação das regras do presente regime e do qual ficam isentas.

Por fim, adapta-se o quadro sancionatório ao regime das contraordenações ambientais constante da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, na sua redação atual.

Foram ouvidos os órgãos próprios de Governo das Regiões Autónomas.

Foi promovida a audição da Associação Nacional de Municípios Portugueses.

Assim:

No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.º 19/2014, de 14 de abril que aprovou as Bases da Política do Ambiente, e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto e âmbito de aplicação

1 - O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico aplicável ao controlo, à detenção, à introdução na natureza e ao repovoamento de espécies exóticas e assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE) n.º 1143/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2014, relativo à prevenção e gestão da introdução e propagação de espécies exóticas invasoras.

2 - O regime jurídico referido no número anterior abrange todas as espécies exóticas, incluindo as espécies invasoras identificadas nos termos do presente decreto-lei.

3 - O regime jurídico referido no n.º 1 não se aplica à introdução na natureza, à detenção ou utilização de:

a) Organismos geneticamente modificados, ou de produtos que os contenham, objeto de legislação própria;

b) Organismos patogénicos causadores de doenças animais ou humanas, objeto de legislação própria de proteção sanitária ou saúde humana;

c) Organismos prejudiciais aos vegetais e produtos vegetais, objeto de legislação própria de proteção fitossanitária;

d) Microrganismos fabricados ou importados para utilização em produtos fitofarmacêuticos já autorizados na União Europeia ou em relação aos quais esteja em curso uma avaliação nos termos do Regulamento (CE) n.º 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado;

e) Microrganismos fabricados ou importados para utilização em produtos biocidas já autorizados na União Europeia ou em relação aos quais esteja em curso uma avaliação nos termos do Regulamento (UE) n.º 528/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2012, relativo à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas;

f) Organismos utilizados como auxiliares na luta biológica...

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