Decreto-Lei n.º 73/2009

Act Number73/2009
ELIhttps://data.dre.pt/eli/dec-lei/73/2009/03/31/p/dre/pt/html
Official Gazette PublicationDiário da República n.º 63/2009, Série I de 2009-03-31
ÓrgãoMinistério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas

O final do século passado acrescentou às concepções clássicas de solo e de terra, uma nova visão mais dinâmica e abrangente, apontando para uma multiplicidade de funções sociais e de preservação para além do desempenho das funções tradicionais que lhes são inerentes - produção de bens alimentares, fibras e madeira.

Atendendo não só à sua escassez como recursos naturais finitos -, acrescem ao solo e à terra funções nucleares na regulação do ciclo da água e na manutenção da sua qualidade igualmente o ressurgir de aplicações na produção de energia, como é o caso dos biocombustíveis, o papel fundamental na redução das emissões de carbono, o suporte da biodiversidade, bem como a sua procura para actividades de lazer das populações.

Assim, com o acréscimo da sensibilidade ambiental por parte da sociedade e em especial no sector agrícola e florestal o solo passou a ser assumido como um recurso precioso, escasso e indispensável à sustentabilidade dos nossos ecossistemas e à salvaguarda do planeta.

É assim fundamental e estratégico, pelas profundas alterações geopolíticas que as sociedades actuais têm sofrido, pelo reflexo nas sociedades humanas e nos ecossistemas em geral que as alterações climáticas têm produzido, pela necessidade da manutenção de condições estratégicas básicas de vida das populações e da garantia da sustentabilidade dos recursos, que se promovam políticas de defesa e conservação dos terras e solos.

O desenvolvimento do mundo rural português pauta-se cada vez mais por critérios de utilização sustentável dos recursos naturais e pela sua conservação e recuperação quando necessário, concretizando o desejo profundo de as gerações vindouras poderem usufruir de terras e solos, água e ar em melhores condições assim como uma paisagem rural consentânea com os sentimentos históricos e culturais das populações.

Com o enquadramento dado por políticas nacionais, por políticas europeias e por compromissos assumidos ao nível das Nações Unidas, a utilização do solo obedece a regras, consubstanciadas quer em condicionantes definidas em regimes jurídicos específicos, assumindo designadamente a natureza de restrições de utilidade pública de âmbito nacional, quer em diferentes instrumentos de ordenamento do território e de política sectorial.

Face ao carácter não destrutivo, nem irreversível do uso florestal dos solos e considerando as orientações da União Europeia em torno do conceito de florestação das terras agrícolas, o presente decreto-lei considera a actividade florestal como integrante da actividade agrícola.

Considera-se pois necessário e premente reforçar a importância dos recursos pedológicos que devem estar afectos às actividades agrícolas e adaptar a realidade existente às actuais condições concretas da procura de solos para outras finalidades, tais como o lazer, a manutenção do ciclo da água e do carbono e a paisagem, desempenhando a Reserva Agrícola Nacional um papel fundamental na concretização dos objectivos principais da preservação do recurso do solo e sua afectação à agricultura.

Gera-se assim uma abertura para uma gestão mais eficaz e consensual dos espaços agrícolas, assente em cartografia digital como ferramenta de rigor e apoio à decisão, assegurando um maior controlo na gestão do território, compatibilizando-se com os restantes instrumentos de ordenamento e permitindo ainda uma mais fácil harmonização intermunicipal.

A RAN consubstancia-se, espacialmente, nos diversos instrumentos cartográficos existentes em Portugal, tanto na cartografia tradicional da Carta de Solos e da Carta de Capacidade de Uso dos Solos do ex-CNROA, como nos estudos e cartografias desenvolvidos mais recentemente em três regiões do País, Trás-os-Montes e Alto Douro, Entre Douro e Minho e Interior Centro, com classificação de terras internacional (FAO/WRB) assente em parâmetros técnicos completos, mais actuais e dinâmicos, prevendo-se a expansão dos trabalhos para assegurar uma cobertura nacional.

Considerando que a Reserva Agrícola Nacional é uma restrição de utilidade pública de âmbito nacional, inscrita nos instrumentos de gestão territorial, e tendo em conta a situação dinâmica desses mesmos planos, através da sua revisão, cria-se um regime transitório a fim de não ocorrer um hiato legal e material, tanto para os planos já revistos, como para os que se encontram em fase de revisão.

Será pois progressiva a introdução de um novo conceito de classificação dos solos.

O presente decreto-lei introduz medidas de simplificação e agilização dos procedimentos administrativos, no quadro SIMPLEX.

Foi ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses.

Foram ouvidos os órgãos de Governo próprio das Regiões Autónomas.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

Capítulo I Disposições gerais Artigos 1 a 5
Artigo 1º Objecto

O presente decreto-lei aprova o regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional, abreviadamente designada RAN.

Artigo 2º Conceito
  1. - A RAN é o conjunto das áreas que em termos agro-climáticos, geomorfológicos e pedológicos apresentam maior aptidão para a actividade agrícola.

  2. - A RAN é uma restrição de utilidade pública, à qual se aplica um regime territorial especial, que estabelece um conjunto de condicionamentos à utilização não agrícola do solo, identificando quais as permitidas tendo em conta os objectivos do presente regime nos vários tipos de terras e solos.

Artigo 3º Definições

Para efeitos do presente decreto-lei e legislação complementar, entende-se por:

  1. «Actividade agrícola» a actividade económica do sector primário que tem por fim a produção de bens de origem vegetal, lenhosa ou não lenhosa, ou animal utilizáveis como matérias-primas de diversas indústrias ou que chegam ao consumidor sem qualquer transformação;

  2. «Actividade conexa ou complementar à actividade agrícola» aquela que sendo realizada na exploração agrícola, utiliza os meios e as infra-estruturas à disposição da mesma, mas com objectivos distintos da produção de matérias primárias, nomeadamente as actividades relacionadas com a produção de outros bens ou serviços, que são parte integrante da economia da exploração, ou serviços de preservação do ambiente, do património e do espaço rural;

  3. «Agricultor» a entidade singular ou colectiva que exerça uma actividade agrícola, com ou sem recurso a trabalho assalariado e utilizando factores de produção próprios ou de terceiros, assumindo a responsabilidade jurídica e económica, como produtor agrícola, pela gestão de uma ou mais explorações agrícolas;

  4. «Alteração irreversível da topografia» a acção de aterro ou desaterro que modifique definitivamente a cota dos terrenos e o perfil dos solos, de forma que este deixe de estar apto para suportar determinadas actividades ou usos, nomeadamente os agrícolas;

  5. «Áreas cujo aproveitamento é determinante da viabilidade económica de explorações agrícolas» as áreas que, embora não correspondendo a solos com elevada ou moderada aptidão para a agricultura, ou seja, às classes A, B, e Ch da capacidade de uso do solo e A1 e A2 da metodologia da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), tenham uma ocupação cultural tal que as torne indispensáveis à economia da exploração;

  6. «Áreas submetidas a importantes investimentos destinados a aumentar a capacidade produtiva dos solos» as que sejam, ou tenham sido, abrangidas por acções tendentes a atenuar ou eliminar as suas limitações naturais e das quais resultem benefícios evidentes, quer para o empresário agrícola, quer para a comunidade rural, nomeadamente obras de rega, drenagem, enxugo, defesa e conservação do solo e despedregas;

  7. «Assento de lavoura» a área onde estão implantadas as instalações necessárias para atingir os objectivos da exploração agrícola;

  8. «Exploração agrícola» a unidade técnico-económica de produção, submetida a uma gestão única, com uma localização determinada, constituída por um ou mais blocos de terras, que integra, além das actividades agrícolas, as outras actividades produtivas directamente relacionadas com a actividade agrícola e que utilizem terras ou outros recursos da exploração;

  9. 'Habitação para residência própria e permanente' a edificação que se destina a satisfazer as necessidades de habitação própria do proprietário e do agregado familiar, na qual tem centralizada a organização da sua vida pessoal, familiar e social, com carácter de habitualidade e estabilidade;

  10. «Manchas de estrutura complexa» as áreas constituídas por solos de duas ou de três classes, cuja identificação cartográfica individual não é possível em virtude do seu modo de ocorrência;

  11. «Prédio misto» o terreno constituído por parte rústica e parte urbana, sem que qualquer das partes possa separadamente ser classificada como prédio rústico ou prédio urbano;

  12. «Prédio rústico» o terreno situado fora de um aglomerado urbano, que não se possa considerar como terreno para construção e desde que tenha como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, ou aqueles que não possuindo a afectação indicada, não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios rurais de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor e ainda as águas, as plantações e os edifícios e construções rurais directamente afectos à produção de rendimentos agrícolas, pecuários ou florestais, nele localizados, que inclui os assentos de lavoura;

  13. «Solo» a camada...

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