Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de Dezembro de 2004

Decreto-Lei n.º 240/2004 de 27 de Dezembro As bases de organização e os princípios reguladores do exercício das actividades que integram o Sistema Eléctrico Nacional (SEN) encontram-se actualmente estabelecidos nos Decretos-Leis n.os 182/95, 183/95, 184/95 e 185/95, todos de 27 de Julho, diplomas que foram já objecto de várias alterações.

Porém, essas bases e princípios devem continuar a evoluir no sentido de adequar a estrutura do SEN e orientar a sua forma de funcionamento para um regime de mercado eficiente, livre e concorrencial, em conformidade com as directrizes já estabelecidas no Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de Agosto.

Essa evolução depende da transposição para a ordem jurídica nacional da Directiva n.º 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho, que estabeleceu regras comuns para o mercado interno da electricidade.

Por outro lado, importa dar consagração legal aos princípios estabelecidos no Protocolo de Colaboração e no Acordo para a Constituição de Um Mercado Ibérico de Electricidade (MIBEL), celebrados entre Portugal e Espanha, respectivamente em 14 de Novembro de 2001 e 20 de Janeiro de 2004, este último aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 33-A/2004 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 19-B/2004, ambos de 20 de Abril, e, mais recentemente, o acordo celebrado em 1 de Outubro de 2004, no âmbito da Cimeira Luso-Espanhola realizada em Santiago de Compostela.

No contexto do desenvolvimento daquelas regras e princípios foram identificados alguns aspectos legislativos e administrativos que importa harmonizar, tendo em vista a desejável convergência dos sistemas eléctricos, em particular, entre os dois países ibéricos. Um desses aspectos consiste na introdução de alterações significativas no domínio da gestão dos centros electroprodutores nacionais em virtude da cessação da relação comercial com a entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Eléctrica (RNT).

Com efeito, no actual modelo organizacional do SEN, os produtores englobados no Sistema Eléctrico de Serviço Público (SEP), adiante designados por produtores, mantêm uma relação comercial exclusiva com a entidade concessionária da RNT. Essa relação comercial é consubstanciada em contratos de vinculação de longo prazo, designados por contratos de aquisição de energia (CAE), nos quais são reconhecidos tanto os proveitos expectáveis dos produtores como as compensações a que as partes têm direito em caso de incumprimento, alteração ou rescisão por motivos que não lhes sejam imputáveis.

Contudo, o estabelecimento das regras comuns para o mercado interno de electricidade e a construção do MIBEL obrigam a alterar, de forma substancial, a relação comercial entre a entidade concessionária da RNT e os produtores que operam no SEP, impondo-se a estes últimos a transição do actual sistema de relação comercial exclusiva para um novo modelo concorrencial, em que as transacções comerciais entre agentes de mercado são realizadas quer em torno de um mercado organizado, quer mediante recurso a formas de contrataçãobilateral.

A introdução deste novo modelo de relação comercial dos produtores de energia eléctrica com outros agentes de mercado implica a cessação antecipada dos CAE, com a consequente afectação da base contratual que estes contratos proporcionavam a ambas as partes.

Nestes termos e em execução do disposto no artigo 13.º do citado Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de Agosto, o presente diploma vem, ao abrigo da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 52/2004, de 29 de Outubro, proceder à definição das condições da cessação antecipada dos CAE e à criação de medidas compensatórias que assegurem a apropriada equivalência económica relativamente à posição de cada parte no CAE.

O presente diploma vem, assim, atribuir a um dos titulares dos CAE, entidade concessionária da RNT ou produtores, o direito ao recebimento, mediante um mecanismo de repercussão universal nas tarifas eléctricas, de compensações pela cessação antecipada destes contratos, estabelecendo-se ainda a metodologia de determinação do montante dessas compensações, bem como as formas e o momento do seu pagamento e os efeitos de eventuais faltas de pagamento.

A solução legal consagrada no presente diploma visa possibilitar que o processo de cessação antecipada dos CAE e a atribuição das correspondentes compensações seja favorável para os consumidores, quer porque viabiliza a liberalização e o aumento da concorrência no sector eléctrico quer porque os custos com a compensação dos produtores têm por contrapartida a cessação dos custos inerentes aos CAE, quer ainda por a repercussão dos primeiros na tarifa se efectuar de forma diluída, por um período previsto de 23 anos, de modo a tutelar adequadamente os direitos e os interesses económicos dos consumidores de energia eléctrica.

Acresce que a solução mais eficiente para reduzir o impacte económico associado ao pagamento das compensações devidas pela cessação antecipada dos CAE no âmbito deste processo de liberalização do mercado consiste no recurso facultativo a operações de titularização, pelo que se definiram algumas regras especiais aplicáveis à realização de eventuais operações dessa natureza dos direitos de crédito conferidos no presente diploma, sendo essas regras, bem como as compensações que venham a ser atribuídas aos produtores, intangíveis, de harmonia com o princípio da confiança legítima.

Foram ouvidos a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) e a Autoridade da Concorrência (AC).

Assim: No uso da autorização legislativa concedida pelos artigos 1.º, 2.º e 3.º da Lei n.º 52/2004, de 29 de Outubro, e nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte: CAPÍTULO I Custos para a manutenção do equilíbrio contratual Artigo 1.º Objecto e âmbito 1 - O presente diploma estabelece as disposições aplicáveis à cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia (CAE) celebrados ao abrigo do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de Julho, entre a entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Eléctrica (RNT) e as entidades titulares de licenças vinculadas de produção de energia eléctrica que abastecem o Sistema Eléctrico de Serviço Público (SEP), adiante designados porprodutores.

2 - Para efeitos do número anterior, o presente diploma procede à atribuição, a um dos contraentes dos CAE, do direito a uma compensação em virtude da cessação antecipada destes contratos, à definição da metodologia de determinação do respectivo montante, das formas e momento do seu pagamento, dos efeitos de eventuais faltas de pagamento, da sua repercussão nas tarifas eléctricas e ao estabelecimento das regras especiais aplicáveis à possível titularização dos direitos respeitantes ao seu recebimento.

Artigo 2.º Cessação dos CAE e atribuição do direito a compensação 1 - Os CAE celebrados entre a entidade concessionária da RNT e os produtores são objecto de cessação antecipada nos termos previstos no presente diploma, a qual apenas produz efeitos após a verificação das circunstâncias previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 9.º, no n.º 4 do artigo 10.º e no artigo 14.º, e em conformidade com os termos e condições previstos no respectivo acordo de cessação que venha a ser celebrado nos termos estabelecidos nos artigos 9.º e 10.º 2 - A cessação de cada CAE confere a um dos seus contraentes, entidade concessionária da RNT ou produtor, o direito a receber, a partir da data da respectiva cessação antecipada, uma compensação pecuniária, designada por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), destinada a garantir a manutenção do equilíbrio contratual entre as partes contraentes, subjacente ao respectivo CAE, e a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados por esse contrato que não sejam adequadamente assegurados através das receitas expectáveis em regime de mercado.

3 - A mora de qualquer entidade no pagamento pontual dos montantes dos CMEC e demais encargos previstos nos n.os 4 a 6 do artigo 5.º, incluindo no pagamento ao titular do direito ao recebimento desses montantes, constitui a parte faltosa no dever de pagar juros moratórios à taxa legal supletiva dos juros comerciais ou à taxa de juro prevista na alínea b) do n.º 4 do artigo 5.º, consoante a que seja mais elevada, sem prejuízo de indemnização pelos prejuízoscausados.

4 - Um produtor, ao qual tenha sido atribuído o direito a compensação pela cessação antecipada dos CAE, pode ser obrigado a entregar um montante financeiramente equivalente à totalidade ou a parte do montante da compensação remanescente atribuída mediante decisão do membro do Governo responsável pela área de energia que fixe os termos e as condições para o respectivo pagamento, ouvida a Direcção-Geral de Geologia e Energia (DGGE) e a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), caso se verifique qualquer uma das seguintes situações relativas a esse contraente do CAE: a) Perda da licença de produção relativa ao centro electroprodutor correspondente; b) Incumprimento doloso, por acção ou omissão dos deveres estabelecidos no acordo de cessação, caso o produtor não sane esse incumprimento no prazo de 60 dias após recepção da competente notificação da entidade concessionária da RNT ou não evidencie que durante esse período iniciou as diligências necessárias para sanar a situação; c) Declaração de insolvência do produtor.

5 - No caso previsto na alínea c) do número anterior, o valor pago pelo produtor deve ser revertido para a tarifa de uso global do sistema (tarifa UGS) nos termos do n.º 6 do artigo 5.º, sendo o seu pagamento feito com prioridade em relação a qualquer outra dívida que integre a massa insolvente do produtor.

6 - O disposto nos n.os 4 e 5 do presente artigo não prejudica o direito à compensação pela cessação antecipada dos CAE, nem a continuidade da cobrança através da tarifa UGS e entrega ao respectivo titular dos...

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