Decreto-Lei n.º 48/78, de 21 de Março de 1978

Decreto-Lei n.º 48/78 de 21 de Março 1. A reestruturação do Ministério do Trabalho realizada através da Lei Orgânica aprovada nesta data tem como parte integrante da sua estrutura a Inspecção do Trabalho, e aí se definem as atribuições e competências genéricas desta.

A necessidade de regulamentar a sua actividade, de modo a adequá-la às novas realidades sociais ocorridas no mundo das relações de trabalho, justifica por si a feitura deste diploma legal específico, através do qual se revogará a legislação anterior e se estabelecem as bases definidoras do seu estatuto, da sua hierarquia e dos princípios informadores da sua acção.

  1. Se o reconhecimento pelos Estados modernos saídos da 1.' Guerra Mundial da necessidade de organização de um serviço de inspecção do trabalho foi formalmente estabelecido no Tratado de Versalhes, isso resultou de um sedimento anterior, intimamente ligado à luta progressiva e eficaz das organizações sindicais europeias.

    Com efeito, a revolução industrial moderna determinou entre os trabalhadores, por aquilo que representou de exploração desenfreada, acções adequadas à defesa dos seus interesses, visando objectivos políticos, económicos e sociais que estão na base da implantação de estruturas e instituições que hoje salvaguardam a segurança, higiene e medicina no trabalho, fixam a duração dos tempos do trabalho, regulam os salários mínimos e estabelecem regalias sociais de toda a ordem.

    No decurso de um século as modificações foram radicais. Às associações mútuas das organizações de trabalhadores, para sua defesa na doença, na velhice ou no desemprego, substituíram-se organizações estatais e paraestatais de âmbito mais vasto, muitas vezes de natureza técnica e específica.

    Dos mecanismos opressivos de exploração do trabalho e do papel passivo das forças do trabalho caminha-se a passos largos para uma participação social activa, segundo o princípio de que ao crescimento económico deve corresponder o progresso social. A própria estabilidade das sociedades depende da contribuição simultânea dos parceiros sociais - entidades patronais e trabalhadores - e do diálogo permanente entre si.

    Em Portugal o processo não foi diferente, embora lento e difícil.

    Já na Conferência de Berlim de 1890 se reconhecia a necessidade de os Estados criarem um corpo de funcionários qualificados e independentes do patronato e dos sindicatos para velarem sobre as condições de trabalho, e também em Portugal se deram, por essa época, os primeiros passos em tais matérias, com o objectivo de defender as condições de trabalho de menores e de mulheres.

    É forçoso reconhecer, no entanto, que é à OIT que se deve o grande impulso para a criação da Inspecção do Trabalho e daquilo que hoje constitui um conjunto notável de normas de direito social adoptadas pela generalidade dos Estados, consubstanciadas essencialmente na Convenção n.º 81, adoptada em 11 de Julho de 1947 pela Terceira Conferência, em Genebra.

    Antes da ratificação por Portugal da Convenção n.º 81 foram publicados os Decretos-Leis n.os 37244 e 37245, de 27 de Dezembro de 1948, que criaram e definiram a orgânica da Inspecção do Trabalho, e o Decreto-Lei n.º 37747, de 30 de Janeiro de 1950, que aprovou o seu regulamento.

    A Inspecção do Trabalho foi incluída como peça da organização corporativa, em íntima ligação funcional e hierárquica ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência.

  2. Na letra das leis referidas são atribuídas à Inspecção competências de acção no que respeita a segurança e higiene no trabalho, acidentes de trabalho e doenças profissionais, vigilância no cumprimento das leis, informação e esclarecimentos, etc.

    Contudo, tais competências quase se esgotavam num papel burocrático, que, salvo poucas excepções, prevaleceram na estrutura actual, ao que acresce a exiguidade dos quadros, a ausência de meios materiais, de instalações e de formação qualificada de pessoal técnico, tornando praticamente inócua a actuação da Inspecção.

    O desmembramento do Ministério das Corporações e Previdência Social trouxe consequências na acção e orgânica da Inspecção do Trabalho, permanecendo, contudo, a sua desarticulação hierárquica e a indefinição de competências.

    Com efeito, apesar da extinção do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, mantiveram-se as estruturas, continuando os delegados a orientar a Inspecção do Trabalho dentro das áreas regionais respectivas.

    A falta de contacto e de articulação com o corpo central implica a falta de uniformidade de actuações, a falta de uniformidade de interpretação dos textos legais e o próprio desconhecimento de métodos uniformes de trabalho.

    Por outro lado, a ausência de lei definidora das suas atribuições torna os seus funcionários dependentes da iniciativa dos delegados, ora fazendo o papel de conciliadores de conflitos sociais, ora o de vigilantes do cumprimento da lei, ora o de agentes repressivos das infracções legais, mas permanecendo, no essencial, um corpoburocrático-administrativo.

    O eclodir de novas realidades sociais no mundo das relações do trabalho gerou processos sobre processos, conflitos sobre conflitos, para os quais a Inspecção do Trabalho não estava apetrechada.

    Se no regime corporativo se assistiu à instrumentalização da Inspecção do Trabalho, com o 25 de Abril assistir-se-á, mercê de um fenómeno de coacção psicológica da evolução social, à sua subordinação aos sindicatos, sendo estes quase quem dirige as iniciativas e aconselha o procedimento.

  3. O principal objectivo da reestruturação da Inspecção do Trabalho é delinear as bases que farão superar as deficiências atrás apontadas e projectar a estrutura do novoedifício.

    Nesse sentido, se cria um único corpo da Inspecção do Trabalho, a que haverá de corresponder uma descentralização estendida regionalmente pelo País, tendo em conta a concentração empresarial e a diversificidade de actividades profissionais.

    A esse corpo de inspecção terá de corresponder um aparelho burocrático eficaz e centralizado nos aspectos de difusão da informação, da legislação e das formas genéricas de procedimento.

    Como consequência, far-se-á a articulação directa das hierarquias, o seu contacto regular, o conhecimento de trabalho realizado pelos funcionários e a uniformização de actuações, sem interferência de qualquer outra hierarquia de outros serviços. Terão também os funcionários de elaborar periódica e regularmente informações, mapas e dados estatísticos através dos escalões hierárquicos, para uma visão global dos problemas sócio-económicos da sua competência.

    A vigilância do cumprimento das leis do trabalho, missão fundamental prevista no artigo 3.º da Convenção n.º 81, requer mobilidade e desafectação de tarefas burocráticas, prestígio e um conhecimento profundo das condições de trabalho e do meio sócio-económico em que os funcionários da Inspecção do Trabalho actuarão.

    A Inspecção do Trabalho terá igualmente uma missão pedagógica e informativa muito importante, que exigirá conhecimentos específicos, devendo constituir tal actuação factor primordial de estabilidade social nas empresas, ao mesmo tempo que isso implica a responsabilização dos parceiros sociais.

    Antes de se actuar repressivamente é por vezes mais eficaz a acção dissuasora. E neste campo o papel da Inspecção do Trabalho deve ser também preponderante. Tais conselhos, dados directamente nos locais de trabalho ou por correspondência oficial, deverão constituir um hábito, que muito ajudará ao prestígio da sua actuação.

    Sabemos, no entanto, que a Inspecção do Trabalho não será o milagre da estabilidade das relações sociais do trabalho.

    Os sindicatos e as associações patronais têm que assumir as suas responsabilidades e colaborar, seja com a Inspecção do Trabalho, seja com o Governo, na obtenção dos objectivos comuns: o progresso social e a consolidação de uma sociedade democrática.

    Mas é evidente que sem autoridade, sem meios coercivos, qualquer direito está votado ao fracasso. Tratando-se de direito social, sujeito a implicações humanas e à infracção, a sanção é o seu instrumento de eficácia. Daí apontarmos para a outorga de um estatuto de autoridade própria à Inspecção do Trabalho, nomeadamente o poder executivo imediato para certos casos atribuídos às categorias superiores, capaz de desencorajar a infracção e diminuir o conflito possível.

  4. Tal como preconiza o artigo 6.º da Convenção n.º 81, é atribuído à Inspecção do Trabalho um estatuto de independência que não coloque os seus funcionários sujeitos às contingências do poder político ou da força organizada dos parceiros sociais.

    Nesse sentido se elabora uma carreira adequada, permitindo o acesso ao longo das diversas categorias, às quais corresponde um nível justificativo das suas atribuições próprias e da necessária independência económica dos seus funcionários.

    E vai-se ainda mais longe ao estabelecer formas exclusivas de notação profissional, no sentido de incentivar a dignidade do seu corpo.

    Considerando que a Constituição Política Portuguesa, nos seus artigos 53.º e 54.º, institucionaliza o direito a férias, salários mínimos, a condições de segurança e higiene no trabalho, bem como à protecção de menores e de mulheres grávidas; Considerando que esse objectivo, bem como a eficácia das normas do direito do trabalho e a harmonização das relações e condições laborais poderão ser atingidos através de uma Inspecção do Trabalho independente, forte e dotada de autonomia: O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte: REGULAMENTO DA INSPECÇÃO DO TRABALHO CAPÍTULO I A organização dos serviços Artigo 1.º - 1 - A Inspecção do Trabalho, a que se refere o capítulo III da Lei Orgânica do Ministério do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 47/78, de 21 de Março, rege-se pelo disposto naquele diploma e no presente Regulamento.

    2 - A Inspecção do Trabalho, no desempenho das respectivas atribuições, exerce a sua competência na área de todo o território nacional em todos os ramos de actividade, nas empresas...

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