O consumidor e o mercado interno - perspectiva do Comité Económico e Social Europeu

AutorJ. Pegado Liz
CargoMembro do CESE (Bruxelas) Presidente da CCMI
Páginas13-58
13
RPDC , Março de 2012, n.º 69
RPDC
Revista Portuguesa
de Direito do Consumo
J. PEGADO LIZ
Membro do CESE (Bruxelas)
Presidente da CCMI
DOUTRINA
CONFERÊNCIA 30 ANOS DEFESA DO CONSUMIDOR
DIRECÇÃO GERAL CONSUMIDOR
24 JANEIRO 2012
O CONSUMIDOR E O MERCADO INTERNO
PERSPECTIVA DO COMITÉ ECONOMICO
E SOCIAL EUROPEU
1. QUE MERCADO INTERNO PARA QUE CONSUMIDORES.
A) A descoberta tardia e tímida dos consumidores na Euro-
RPDC , Março de 2012, n.º 69
14
RPDC
Revista Portuguesa
de Direito do Consumo
pa. B) Principais etapas na política comunitária dos consumi-
dores. C) O mercado interno não foi pensado para nem com
os consumidores. D) Antes pelo contrário, foi feito contra os
consumidores. 2. ONDE ESTAMOS NA CONCRETIZAÇÃO DO
MERCADO INTERNO. A) 20 Anos depois de 1992 af‌i nal que
mercado interno temos. B) Repensar o mercado interno. 3.
UM NOVO PARADIGMA PARA UM MERCADO INTERNO INCLU-
SIVO. A) A anunciada nova visão da Comissão para o mercado
interno. B) Uma verdadeira aproximação cidadã e humanista
à politica do mercado interno. 4. UM MERCADO INTERNO
ORIENTADO PARA OS CONSUMIDORES. A) Uma perspectiva
de médio/longo prazo no horizonte de 2030/2050. Algumas
questões de actualidade. Uma nova forma de fazer o direito
comunitário do consumo. a) Uma aproximação proactiva. b)
Os “instrumentos opcionais” (28° regime). D) Uma adequada
informação aos consumidores. E) Uma efectiva aplicação do
acervo comunitário. F) Meios ef‌i cazes de defender os direitos
individuais e colectivos dos consumidores.
1. QUE MERCADO INTERNO PARA QUE CONSUMIDORES
A) A descoberta tardia e tímida dos consumidores na Europa
A protecção dos consumidores só tardiamente foi considerada e assumida como uma
politica dos estados. Nos seus primórdios, na primeira metade do século 20 e mais par-
ticularmente nos anos que se seguiram à 2ª Grande Guerra, a defesa dos consumidores
foi, antes a preocupação de movimentos associativos em alguns países europeus, em
especial de “donas de casa”, no Norte da Europa.
Simbolicamente, o 15 de Março de 1962, com o célebre discurso de Kennedy ao Con-
15
RPDC , Março de 2012, n.º 69
RPDC
Revista Portuguesa
de Direito do Consumo
gresso Norte-americano1, marca o início do reconhecimento de direitos aos consumido-
res e de correspondentes obrigações do Estado. No princípio apenas nos EUA.
Os Estados Europeus acordam tardiamente para esta realidade e até à sua consagra-
ção constitucional, mesmo assim em apenas alguns estados europeus2, foi necessário
esperar muito.
Mais lenta ainda foi a “descoberta” dos consumidores pela Comunidade Económica
Europeia, totalmente ausentes que eram do primitivo Tratado de Roma. Só depois de o
Conselho da Europa ter publicado, a 17 de Maio de 1973, a sua ainda hoje célebre “Carta
de Protecção do Consumidor”, e apenas em 14 de Abril de 1975, é que o Conselho Euro-
peu, sobre proposta da Comissão, adopta o seu 1° Programa Comunitário de Protecção e
de Informação dos Consumidores.3
1 Foi, com efeito, a 15 de Março de 1962 que o Presidente Kennedy, numa mensagem dirigida ao Congresso,
proclamaria, pela primeira vez, uma espécie de Carta dos direitos dos consumidores, enunciando, como
seus direitos fundamentais, o direito à segurança (protecção contra os produtos que podem causar dano
à vida e à saúde), o direito à informação (protecção contra a publicidade enganosa ou falsa e a garantia
de uma informação objectiva), o direito à livre escolha (garantia do acesso a uma variedade de bens e de
serviços a preços concorrenciais e garantia de uma oferta suf‌i ciente e vantajosa em termos de qualidade
e de preços) e, por f‌i m, o direito a ser ouvido (por forma a que os interesses dos consumidores sejam
tomados em consideração na elaboração das políticas governamentais e pelas autoridades adminstrativas
encarregadas de as aplicar). Nessa mesma mensagem o Presidente Kennedy proferiria a célebre frase “somos
todos consumidores”, que está na origem de toda uma série de interpretações equivocas do conceito de
consumidor, que tem feito correr rios de tinta dos académicos, com inf‌l uencia decisiva nos textos legislativos
nacionais e comunitários.
2 Foi o caso da Constituição Portuguesa
3 Este Programa foi buscar o seu fundamento ao artigo 2° do Tratado de Roma, quando refere que a
Comunidade tem por missão “uma expansão contínua e equilibrada e uma subida acelerada do nível
de vida”, e, considerando que “a melhoria qualitativa das condições de vida (...) implica a protecção
da saúde, da segurança e dos interesses económicos dos consumidores”, tal obriga a uma “política de
protecção e informação do consumidor”.
Retomando a formulação da Carta do Conselho da Europa, o Programa parte da af‌i rmação que “doravante
o consumidor já não é considerado apenas como um comprador e um utilizador de bens e serviços, para
uso pessoal, familiar ou colectivo, mas como uma pessoa a quem dizem respeito os diferentes aspectos da
vida social que podem directa ou indirectamente afectá-lo na qualidade de consumidor”, para enunciar as
cinco categorias de direitos fundamentais: direito à protecção da saúde e da segurança, direito à protecção
dos interesses económicos, direito à reparação dos prejuízos, direito à informação e à educação e direito à
representação (direito a ser ouvido).
Acrescenta, no entanto, uma ideia nova, que, ao longo dos anos, irá ganhar consistência – a de que “todos
estes direitos devem ser garantidos por meio de acções conduzidas no quadro de políticas específ‌i cas da
Comunidade, tais como, por exemplo, a política económica, a política agrícola comum, a política social,

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT