Com um exemplo se começa

AutorHelder Martins Leitão
Cargo do AutorAdvogado
Páginas11-37

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É mesmo, uma questão prática 1 vai marcar o início do presente trabalho. Segundo cremos, nada mais adequado e convincente para transmitir o pretendido: de que é possível, indispensável, aliás, denunciar o que está mal nas decisões do órgão da execução fiscal e(ou) em outras entidades da administração tributária.

Porque, na verdade, a reclamação quando e se acatada pode ter efeitos relevantes no desenrolar da execução. 2

E, ainda que não o tenha, sempre se deve pugnar pelo estrito cumprimento das regras estabelecidas.

Porque, na verdade, os processos tributários, em sua vertente administrativa, obedecem, têm que se subordinar, as estipulações pré-definidas que, de forma alguma, podem ser olvidadas, muito menos, obliteradas, postergadas.

Virar as costas a isto, é um atentado aos direitos, liberdades e garantias do contribuinte.

Se este deitar mão do direito que lhe assiste, do direito a que tem direito, permita-se a tautologia, talvez alguma coisa comece a mudar na relação Fisco/cidadão pagante.

Vamos, então, ao exemplo para, depois, alinharmos mais uns tantos dizeres.Page 12

PROC. n.º..................

PROC. n.º.....................

PROC. n.º.....................

EXECUÇÕES FISCAIS

6.º SERVIÇO DE FINANÇAS DO PORTO

EXMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO

ARTURINO VARINO e CRISOLINA BENQUERENÇA, executados nos autos em referência, vêm ao processo apresentar

RECLAMAÇÃO

nos termos dos arts. 276.º e segs. do C.P.P.T., com os seguintes fundamentos:

1.º

O Serviço de Finanças territorialmente competente para a elaboração dos processos executivos instaurados pela Administração Fiscal é o 3.º Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia.

2.º

Note-se, aliás, que foi ali que os processos foram instaurados.

3.º

Nos termos dos arts. 190.º, 191.º, 193.º e, sobretudo 194.º, n.º 3 e 192.º do C.P.P.T., o órgão de execução territorialmente competente para dirigir a execução é aquele 3.º Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia,

4.º

nomeadamente, para ordenar a citação edital, publicação de anúncios, afixação de éditos e demais termos.

5.º

Porém, não se procedeu dessa forma tendo o 6.º Serviço de Finanças do Porto assumido tais funções em manifesta violação da lei.

6.º

Por outro lado, os credores desconhecidos e os sucessores dos credores preferentes foram citados através do mesmo anúncio que serviu para citar os executados, para dar a conhecer a penhora em bens e a data da respectiva venda. Page 13

7.º

Não o tendo sido em anúncio diferente e com o tempo necessário - atente-se nos arts. 239.º e 240.º do C.P.P.T. - tal facto influi, decisivamente, no desenrolar e sucesso da venda, com manifesto prejuízo de todas as partes o que,

8.º

nos termos dos arts. 165.º do C.P.P.T e 201.º e 205.º do C.P.C. pode ocasionar nulidade do acto.

ACRESCE QUE,

9.º

segundo os anúncios feitos publicar, a aqui executada Crisolina Benquerença foi nomeada fiel depositária dos bens penhorados.

10.º

É facto sobejamente conhecido da Administração Tributária que a executada é residente no Brasil, deslocando-se a Portugal de quando em vez.

11.º

Assim, estará impossibilitada de cumprir as suas obrigações decorrentes de ter sido nomeada fiel depositária.

12.º

Mesmo que se considerasse que a executada nomeada fiel depositária nos termos dos anúncios, tem representante em Portugal, o que não é o caso, para os efeitos de cumprir as suas obrigações decorrentes daquele estatuto, sempre teria de estar disponível para mostrar os bens aos eventuais interessados.

13.º

É que, é obrigação dos contribuintes nomearem representante legal quando sejam residentes no estrangeiro mas, não é obrigação dos contribuintes, fazerem-no quando são indicados como fiéis depositários do que quer que seja.

14.º

No caso destes autos deveria ter sido indicado fiel depositário diferente.

15.º

Porque, na verdade, ninguém estará disponível para mostrar os bens penhorados a eventual interessado na compra.

16.º

Ou será que a Administração Tributária assegurará a vinda da executada do Brasil até Portugal?

Page 14

17.º

Facto notório é que fica posta em causa a publicidade da venda o que, influindo no seu sucesso e resultado, viola os arts. 239.º e segs. do C.P.P.T..

18.º

Ademais, os anúncios feitos publicar, traduzem factos que não são verdadeiros ao anunciar que a executada, também fiel depositária, mostrará os bens a quem assim o entender.

19.º

Foram assim violados os arts. 190.º, 191.º, 192.º, 193.º, 194.º do C.P.P.T. e 239.º e segs. do mesmo diploma legal, conjugados com os arts. 890.º e 891.º do C.P.C., estes de aplicação subsidiária.

20.º

Ora, as regras dos preceitos atrás enunciados existem para serem cumpridas e, no segundo caso, para dar a maior publicidade possível à venda e informar todas as particularidades que possam recair sob os imóveis em causa.

21.º

Revela-se, com os preceitos atrás invocados, a preocupação de assegurar a maior concorrência possível à venda e a maior clareza das respectivas diligências.

22.º

Bem como, o êxito da venda que será tanto maior quanto mais numerosos forem os ofertantes, a quem deve ser assegurado o conhecimento concreto de todas as circunstâncias em que a venda vai ser efectuada, de modo a poderem apresentar-se ao acto com toda a liberdade e plenamente documentados sobre o bem em alienação.

23.º

Pretende-se, assim, no dizer de Alberto dos Reis in "Processo de Execução", 2.º volume, "...que a venda seja o mais rendosa possível, que os bens sejam adjudicados pelo preço mais elevado que possa conseguirse; é evidente que este resultado será tanto mais provável quanto maior for a publicidade que se der ao projecto de venda".

24.º

Assim, exige a lei a maior, melhor e mais correcta publicidade possível para que o maior número de pessoas que pretendam adquirir os bens se apresentem a fazer propostas, assegurando assim, a maior concorrência.

25.º

Sendo certo que, a falta de cumprimento de tais requisitos legais, prejudica o exequente pois o produto da venda poderá ser inferior quebrando as suas expectativas de conseguir ser pago integralmente do seu crédito, o executado que vê diminuídas as suas expectativas de ver as suas dívidas saldadas e os interessados potenciais, o público em geral, que vê frustradas as suas expectativas potenciais de adquirir algo que seja de seu interesse.Page 15

26.º

Por outro lado é, ainda, interessada na venda, a sociedade em geral na medida em que tem legítimo interesse em que a Fazenda Pública cobre na totalidade os créditos a que julga ter direito.

27.º

Assim, a quebra das regras atrás enunciadas integra omissão capaz de influir no resultado e sucesso da venda marcada.

Termos em que, requer a V. Exa. se digne dar sem efeito a penhora efectuada e a designada data para venda, por violação das normas supra indicadas, remetendo-se os processos ao 3.º Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia para aí serem cumpridos os demais termos após a penhora.

E.D.

O ADVOGADO, já com procuração junta nos processos executivos supra em referência e pendentes no 6.º Serviço de Finanças do Porto

O exemplo acabado de vazar e com o qual se pretende ilustrar a importância que há em ter na devida atenção as decisões tomadas no âmbito do processo executivo tributário por banda do órgão de execução fiscal, é uma peça dirigida ao competente Tribunal Administrativo e Fiscal. 3

No entanto há que esclarecer - e ver-se-á ao longo deste trabalho - que na reacção ao desempenho do órgão da execução fiscal e de outras autoridades da administração tributária, no âmbito do mesmo tipo processual, são igualmente possíveis outras formas de actuação, como sejam desde, por exemplo, o simples requerimento até ao recurso hierárquico.

E sobre, propriamente, a peça exemplificativa dada acima à estampa? Pensamos que ficou bem visível o pretendido pelos reclamantes: que seja dada sem efeito a penhora efectuada e, consequentemente, a data designada para venda.Page 16

Em confronto dois Serviços de Finanças; o 6º do Porto e o 3º de Vila Nova de Gaia. Neste, encontram-se a tramitar os processos executivos referenciados, enquanto que naquele, não sendo titular das execuções, apenas deveria ter sido chamado ao caso para proceder à penhora do bem executado pelo facto de em sua área territorial de competência se situar o imóvel propriedade dos executados. 4

O que, porém, na realidade sucedeu foi como que um extravasamento da competência do 6º Serviço de Finanças do Porto a quem tão-somente competia proceder às diligências conducentes à penhora e, obviamente, à efectivação da mesma.

Nunca proceder à publicação de anúncios, nem à citação edital, nem à nomeação de fiel depositário do imóvel penhorado.

A verdade é que tudo isto o fez.

Mais ainda praticou uma dupla violação da lei: citou os credores desconhecidos e os sucessores dos credores preferentes o que estava fora da sua competência e isto no mesmo anúncio que serviu para citar os executados, para anunciar a penhora de bens e a data da respectiva venda. 5

Melhor será, contudo, visionar o dito anúncio:

JN --- .../.../... --- Nº ...

DIRECÇÃO-GERAL DOS IMPOSTOS DDF DO PORTO

SERVIÇO DE FINANÇAS DO PORTO 6.º

MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

DIRECÇÃO-GERAL DOS IMPOSTOS

SERVIÇO FINANÇAS DO PORTO 6

Rua Gonçalo Sampaio, 291-4150-367 PORTO

ANÚNCIO

(VENDA JUDICIAL POR PROPOSTA EM CARTA FECHADA)

António João Vaz de Sousa, Chefe do Serviço de Finanças do Porto 6.

Faz saber, que por este Serviço de Finanças, nos termos do art. 192.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), correm éditos de 30 (trinta) dias, citando:Page 17

Arturino Varino e Crisolina Benquerença, com residência fiscal na Rua dos Coutos, 200 - Vila Nova de Gaia, executados nos Processos de Execução Fiscal n.º ................, ................. e .............., para no prazo de 30 dias subsequentes aos dos éditos, contados da última publicação deste anúncio, pagar a quantia de euros 299.443,27, acrescida dos respectivos juros de...

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