Assento n.º 5/95, de 20 de Maio de 1995

Assento n.° 5/95 Processo n.° 76 250 - 2.' Secção (O. B.) Acordam, em pleno, no Supremo Tribunal de Justiça: 1 - No recurso de revista n.° 74 513, da 2.' Secção, em que são recorrentes José Francisco Centeio Pintão, Lucília Dias Ferreira Martins e Joaquim de Matos e recorrido o Banco Fonsecas & Burnay, E. P., o Supremo Tribunal de Justiça veio a proferir o Acórdão de 11 de Julho de 1987, ora certificado a fls. 8 e seguintes e publicado no Boletim do Ministério da Justiça, n.° 368, pp.

499 e seguintes, no qual decidiu que a interrupção da prescrição da acção cambiária em relação ao subscritor da livrança não produz efeito relativamente ao seu avalista, e isso porque o artigo 71.° da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças (LULL) dispõe que a interrupção da prescrição só produz efeito em relação à pessoa para quem a interrupção foi feita, o que importa salientar face ao princípio da autonomia, que afasta quaisquer efeitos que pudessem resultar também do artigo 32.° da mesma lei.

E, consequentemente, concedeu a revista, revogando o acórdão da Relação na parte em que era objecto do recurso, absolvendo os recorrentes do pagamento da livrança aí em apreciação que, como avalistas, haviam subscrito e de que era dono e legítimo possuidor o Banco recorrido.

O Banco Fonsecas & Burnay, E. P., interpôs desse acórdão o presente recurso para o tribunal pleno com fundamento em oposição entre ele e o Acórdão, também deste Supremo Tribunal, de 10 de Maio de 1966, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, n.° 157, pp. 312 e seguintes, no qual se decidira que a prescrição da acção cambiária em relação ao aceitante produz também efeitos relativamente ao avalista deste, pois que, não mencionando o artigo 70.° da LULL os avalistas, também o artigo 71.° dessa lei, subordinado ao anterior, os não pode abranger, como se compreende face ao artigo 32.° do mesmodiploma.

Reconhecidos pelo Acórdão de 30 de Junho de 1988, a fls. 21 e 22, a invocada oposição e os demais requisitos do recurso para o tribunal pleno no presente caso, o ora recorrente Banco Fonsecas & Burnay, E. P., sustenta em alegações a tese do acórdão fundamento, o de 10 de Maio de 1966, concluindo no sentido de dever dar-se provimento ao presente recurso e consequentemente revogar-se o Acórdão recorrido, de 11 de Julho de 1987, mantendo-se o da Relação que este revogara, e tirar-se assento no sentido, que propõe, como redacção possível, de que, 'interrompida a prescrição quanto ao subscritor da livrança , tem de considerar-se interrompida quanto aos avalistas desse subscritor'.

Os ora recorridos não apresentaram alegações e o Ministério Público emitiu parecer (de fl. 37 a fl. 40) no qual sustenta a revogação do acórdão recorrido e a prolação de assento, para que sugere a seguinte redacção: A interrupção da prescrição da obrigação cambiária em relação ao subscritor de uma livrança produz também efeito em relação ao respectivo avalista; 2 - A admissibilidade de recurso para tribunal pleno depende da verificação cumulativa dos requisitos previstos no artigo 763.° do Código de Processo Civil, o que, como se disse, foi reconhecido no Acórdão da Secção, já citado, de 30 de Junho de 1988.

Não há motivo para agora se entender de modo diferente, e por isso cabe conhecer do mérito.

3 - Está em causa a interpretação do artigo 71.° da LULL no sentido de se determinar se na regra de pessoalidade da eficácia interruptiva da prescrição cambiária se inclui ou não o avalista, isto é, se interrompida a prescrição contra o avalizado se interrompe ou não contra o respectivo avalista.

Para além de referências gerais sobre a extensão dessa regra, na LULL ou em disposições similares de outros ordenamentos jurídicos [cf., v. g., entre nós: Gonçalves Dias, Da Letra e da Livrança, vol. X, n.° 891, p. 306; José Gabriel Pinto Coelho, Suplemento às Lições ao Direito Comercial, as Letras, 2.' parte, 2.' ed., actualizada, Lisboa, 1962, § 9.°, III, n.° 9, pp. 221 e segs.; no estrangeiro: em Itália (artigo 95.° da Lei Cambiária), António Payone da Rosa, 'Cambiale', in Enciclopedia del Diritto, vol. V, Guiffrè Editore, Milão, 1959, p. 907, Tulio Ascarelli, 'Cambiale', Novissimo Digesto Italiano, 3.' ed., Utet, 1957, II, n.° 100, p. 751], convirá consignar, numa possível e não exaustiva recensão, elementos de jurisprudência e de doutrina sobre a específica questão ora em causa.

3.1 - No sentido de a interrupção da prescrição contra o avalizado ter eficácia contra o avalista, podem citar-se:

  1. Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, além do acórdão fundamento, os seguintes, todos relativos a aval pelo aceitante: 8 de Outubro de 1943, no Boletim do Ministério da Justiça, III, p. 406; 24 de Abril de 1951, no Boletim do Ministério da Justiça, n.° 24, p. 354; 10 de Abril de 1959, idem, n.° 86, p. 418, e também na Revista dos Tribunais, ano 77.°, p. 245; 10 de Maio de 1966, mesmo Boletim, n.° 157, p. 302; 3 de Junho de 1969, idem, n.° 188, p. 195; b) Na doutrina, entre nós, José Gualberto de Sá Carneiro, na Revista dos Tribunais, anos 61.°, 1943, p. 347, e 89.°, 1971, pp. 438 e segs., sob o título 'Prazo de prescrição do avalista que pagou a letra', em anotação ao referido Acórdão de 3 de Junho de 1969; em França, René Roblot, Les Effects de Commerce, p. 215, apud Justino F. Duque Dominguez, 'El aval de la letra de cambio', in Documentación Juridica, t. XIII, Janeiro-Junho, 1986, p.

    49, nota 120, e Hamel, Lagarde et Jaufret, Traité de Droit Commercial, II, 1966, n.° 1484-A, apud Vaz Serra, Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 103.°, p. 429, nota 2, também mencionado pelo recorrente, reportando-se ao artigo 179.°, n.° 5, do Código Comercial francês (igual ao artigo 71.° da LULL); 3.2 - No sentido de a interrupção da prescrição contra o avalizado não ter eficácia contra avalista: I - Em Portugal podem referir-se:

  2. Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, além do acórdão recorrido, os seguintes, todos relativos a aval prestado ao subscritor de livrança: 11 de Abril de 1986, no Boletim do Ministério da Justiça, n.° 356, p.

    412; 29 de Novembro de 1988, processo n.° 76 148, inédito; e 27 de Junho de 1989, mesmo Boletim, n.° 388, p. 548; b) Na doutrina, Vaz Serra, em anotação ao Acórdão, já citado, de 3 de Junho de 1969, na Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 103.°, pp. 421 e segs. (números 6 e segs.).

    II - No estrangeiro: Em Espanha: Casalis Collde Carrera, Estudios de Oposición Cambiaria, III, Bosch/Barcelona, 1987, n.° 388, d); No Brasil: João Eunápio Borges, Do aval, 3.' ed., Rio de Janeiro, 1960, n.° 77, p. 183; Em Itália: na doutrina: Vitali, apud Casalis, ob. cit., n.° 388; António Pavone la Rosa, 'La cambiale', vol. XXXIX, t. 1 do Trattato di Diritto Civile e Commerciale, de Cicu, Messineo e Mengoni, Giuffrè Editore, Milão, 1982, p.

    377, nota 48, e também apud Justino F. D. Dominguez, ob. cit., p. 49, nota 121; Vittorio Angeloni, La Cambiale e il Vaglia cambiario, 4.' ed., Giuffrè, Milão, 1964, p. 620, n.° 420; Giorgio de Semo, Trattato di Diritto Cambiario, 3.' ed., Pádua, 1963, I, p. 211, n.° 236; e as decisões da cassação de 20 de Janeiro de 1942, referida por Vaz Serra, loc. cit., p. 427, col. 2.', nota 1, por A. P. la Rosa, ob. cit., p. 654, nota 224, e Ascarelli, loc. cit., p. 751, nota 2, e de 22 de Abril de 1963, apud A. P. la Rosa, ibid., e V. Angeloni, ob. cit., p. 620, nota 7; 4 - A norma do artigo 71.° da LULL exprime a pessoalidade da interrupção da prescrição cambiária e a questão a resolver consiste em saber se no âmbito de aplicação da respectiva estatuição cabe o avalista, ou dele se exclui, em caso de a interrupção se verificar contra o avalizado.

    Têm sido dadas ambas as respostas, como se viu, cabendo registar, sumariamente, os fundamentos invocados em apoio de uma e de outra (infra, números 4. 1 e 4.2), de seguida, tomar posição (infra, n.° 4.3) e por último decidir do presente recurso (infra, n.° 5).

    4.1 - A tese da eficácia também contra o avalista do facto interruptivo de prescrição contra o respectivo avalizado tem-se apoiado na seguinte argumentação, em resumo: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Abril de 1959: respondendo o dador de aval da mesma maneira que a pessoa afiançada, nos termos do artigo 32.°, n.° I, da LULL, desde que haja qualquer razão para interromper a prescrição...

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