Acórdão nº 95/21.3YHLSB.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 26-09-2022

Data de Julgamento26 Setembro 2022
Ano2022
Número Acordão95/21.3YHLSB.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes da Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:


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I.–RELATÓRIO:


Nesta ação comum, sob a forma de processo de declaração, veio K… demandar Solverde – Sociedade de Investimentos Turísticos da Costa Verde, SA pedindo a condenação da ré:
a pagar à autora a quantia de 18.000,00 € (dezoito mil euros), respeitante a 5.000,00 € (cinco mil euros) por cada um dos espetáculos representados pela (Best Moments, Summer Special e B-Sides), mais um acréscimo de 1000,00 € (mil euros) por cada um, por terem sido exibidos em outros casinos que não apenas o de Vilamoura;
a pagar à autora a quantia de 10.000,00 € (dez mil euros), a título do ressarcimento devido pela falta de autorização por parte da autora para a utilização das suas coreografias em outros espetáculos, que não os por si autorizados;
a pagar à autora o montante a apurar respeitante a receitas de bilheteira auferidas pela Ré, requerendo-se que esta seja notificada para informar todos os montantes apurados com a realização dos espetáculos Best Moments, Summer Special e B-Sides;
a pagar à autora o montante gasto na defesa dos seus direitos na presente ação, o que inclui honorários do mandatário, sendo que, nos termos do disposto no art. 211º do CDADC, este valor é constitutivo do montante indemnizatório, montante a apurar em execução da sentença.
a pagar à autora a quantia de 10.000,00 euros por danos morais.
a não utilizar as coreografias da autoria da autora para nenhum fim ou por qualquer meio, sem a sua autorização escrita.
Como fundamento da sua pretensão alegou, em síntese, que é coreógrafa e que a ré a contratou para desenvolver coreografias para espetáculos no seu Casino do Algarve. Que em 2019 e 2020, a ré utilizou coreografias suas para montar novos espetáculos, sem a sua autorização. Que tal conduta causou danos à autora e a deixou revoltada e zangada.
A ré foi citada e veio contestar pedindo a improcedência da ação.
Alegou, em síntese, que a autora nunca desenvolveu coreografias, mas apenas se limitou a montar um espetáculo previamente definido, pelo que, nessa medida, nenhuma criação fez, não sendo titular dos direitos de autor que invoca.
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Foi proferido despacho saneador, com fixação do objecto do litígio e dos temas da prova, com recurso à faculdade de dispensa da realização da audiência prévia.
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Foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente, sendo o seu segmento decisório do seguinte teor:

“Decisão
Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente esta ação e, em consequência:
- deve a ré abster-se de utilizar as coreografias da autoria da autora, sem a sua autorização;
- condena-se a ré a pagar à autora a quantia de 6.750,00 euros, a título de indemnização, sendo, a quantia de 4.500,00 euros, a título de danos patrimoniais e a quantia de 2.250,00 euros, a título de danos não patrimoniais;
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Custas pela ré e pela autora na proporção do decaimento, fixando-se em 2/5 para a ré e 3/5 para a autora.”
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Desta sentença apelou a R., com impugnação da matéria de facto e de direito, pedindo a procedência do presente recurso, onde lavrou as seguintes:

CONCLUSÕES:
I–Conforme resulta da transcrição supra do depoimento da Testemunha J…, a Recorrente celebrou contratos de prestação se serviços com outro(s) coreógrafos para os mesmos espetáculos, acrescendo que, tal como resulta dos Pontos s) e t) dos factos provados a conceção/criação e produção dos diversos
espetáculos aludidos acima referidos foi do Engenheiro J…, administrador da ré, tendo a Recorrida feito parte da equipa contratada para a produção dos referidos espetáculos, que também incluiu outros coreógrafos, responsável de guarda-roupa,
diretor técnico, além do produtor, Jo…
II–A Recorrente não concorda com a decisão da matéria de facto vertida nos Pontos a) a e) e f) a g), porquanto da Contestação resulta, de forma expressa, que não contratou a A., ora Recorrida, na “ qualidade de coreografa “, e, que tal realidade também não resulta provada dos documentos mencionados nos articulados, aliás a matéria em causa – qualidade em que a Recorrida foi contratada - foi objecto de impugnação expressa, ao invés de aceitação expressa conforme, indevidamente se entendeu na douta sentença recorrida, o que aliás decorre do alegado nos artigos 4º a 19º, 23º 32º a 36º da Contestação.
III–Desta forma, nos Pontos a) a e) e f) a g) deverá ser retirada a expressão “qualidade de coreografa “, mantendo-se o restante teor.
IV–A factualidade levada ao Ponto J) não reflete a sua própria motivação e fundamentação, padecendo de ambiguidade e obscuridade, porquanto do depoimento da testemunha J… aí realçado em termos probatórios, ressalta de forma cristalina que os “… concretos passos e movimentos e a sua sequência…” não eram criados exclusivamente pela.
V–Desta forma, salvo melhor opinião, afim de evitar contradições, obscuridade e ambiguidade na decisão da matéria de facto, o Ponto J) deverá ser alterado, tendo também em conta a factualidade provada sob os pontos s) e t), passando a teor seguinte: j) No âmbito dos contratos aludidos em a) a d), f) e g), a autora concebeu os passos, movimentos e sequências a desenvolver pelos bailarinos para as danças serem exibidas naqueles espetáculos, em equipa contratada pela ré para a produção dos referidos espetáculos, que também incluiu outros coreógrafos, responsável de guarda-roupa, diretor técnico, além do produtor, Jo…
VI–Ao invés do afirmado pela Recorrida, o Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos não consagra ou define o conceito de coreografia, aliás, a douta sentença socorre-se do conceito que resulta do dicionário Infopédia disponível online no endereço:https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/coreografia.
VII–Com o devido respeito, à semelhança do entendimento da testemunha, J…, aliás em consonância com muitos artigos de opinião escritos acerca desta problemática, é inequívoco que um criador deve ter em conta e sob seu controle, o ritmo do resultado final do seu trabalho. Num nível micro, ou seja, o ritmo de pequenas sequências coreográficas, bem como o ritmo do espetáculo, num nível macro, sendo certo que nos espetáculos objectos dos presentes autos, não estamos perante uma mera coreografia de dança.
VIII–Para podermos falar criação/concepção da coreografia de um espetáculo, não basta encontrar uma música bonita, juntar este ou aquele passo de dança, vestir os dançarinos desta ou daquela forma, utilizar este ou aquele efeito de luz mais, sendo necessário harmonizar a interpretação com a coreografia, ou esta com o tema proposto, ora a Recorrida limitou a sua actividade, tal como resulta dos contratos de prestação de serviços realizados com a Recorrente, do depoimento das testemunhas, das suas próprias declarações, e da propria sentença recorrida, a uma parte limitada dos espetáculos, circunscrita a “… concretos passos e movimentos e a sua sequência…”
IX–A natureza da actividade da Recorrida está, aliás espelhada no Ponto 3.2 da douta sentença donde decorre que, - A autora fez parte da equipa contratada pela ré para a produção dos referidos espetáculos, que também incluiu outros coreógrafos, responsável de guarda-roupa, diretor técnico, além do produtor, Jo…
Destes factos, resulta que a autora fazia parte de uma equipa que montava espetáculos, sendo que a criação dos espetáculos era da autoria do Engenheiro J… . Nesse contexto, a autora concebeu os passos, movimentos e sequências a desenvolver pelos bailarinos para as danças serem exibidas naqueles espetáculos.
Ora, esta conceção de passos movimentos e sequências a desenvolver pelos bailarinos para as danças, enquadra-se no conceito de coreografia acima mencionado, sendo que, se é certo que a autora não desenvolvia ou concebia todo o espetáculo, desenvolvia a parte relativa à composição em concreto das danças. Assim, a atividade da ré desenvolvida a pedido da autora configura criação coreográfica, protegida pelo Direito de Autor.
X–Acresce que, sem conceder, a questão ultrapassa a de saber se a atividade da Recorrida desenvolvida a pedido da Recorrente configura criação coreográfica protegida pelo Direito de Autor, porquanto ainda que a resposta seja afirmativa, importará ainda saber se estão reunidos os pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, desde já antecipando que tal não ocorre na presente situação.
XI–Feita a subsunção da factualidade provada ao disposto nos artigos 16º a 19º do CDADC, é fácil concluir que a sentença recorrida não faz a correcta aplicação dos normativos legais, desde logo porque, independentemente da qualificação jurídica da factualidade assente, é inequívoco que a actividade da Recorrida, circunscrita a “… concretos passos e movimentos e a sua sequência…”, não pode ser separada ou individualizada do espetáculo na sua concepção e criação na globalidade, cuja autoria não lhe pertence e que, aliás contou com a participação de outros coreógrafos, correspondendo a um trabalho de equipa, criado e concebido pela Recorrente, Solverde SA.
XII–Esclareça-se ainda que, nos contratos de prestação de serviços realizados entre Recorrente e Recorrida (Cfr. Cláusula 9ª, al. d)), foi esta que assumiu a obrigação de Não produzir o espectáculo para utilização de terceiros, nem utilizar o material, coreografia, música, imagens, fotografias, ou outros elementos componentes do espectáculo, em futuras produções., por outras palavras, para além de não existir ilicitude na actuação da Recorrente, entende-se, também, que não existe uma actuação/omissão dolosa ou negligente, o que sempre afastaria a sua responsabilidade civil nos termos do art. 211º e segs do CDADC, dada a não verificação dos seus requisitos.
XI–Por ultimo, considerando o conjunto dos factos provados e até o montante arbitrado a titulo de danos patrimoniais, a ser devida
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