Acórdão nº 95/14.0T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13-09-2018
Judgment Date | 13 September 2018 |
Acordao Number | 95/14.0T8BGC.G1 |
Year | 2018 |
Court | Court of Appeal of Guimarães (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I – Relatório
A. M. instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra X – Investimentos Imobiliários, S.A., pedindo que a anulação das deliberações sociais tomadas das Assembleias Gerais Extraordinárias de accionistas da sociedade "X Investimentos Imobiliários, S. A.", realizadas nos dia 30/09/2014, pelas 10.30 horas e pelas 15.00 horas.
Para o efeito e, em síntese, referiu que, sendo accionista da sociedade, foi impedida de participar e votar nas referidas assembleias.
*
A ré contestou invocando as excepções de erro na forma do processo, ineptidão da petição inicial, ilegitimidade da autora e impugnando parcialmente os factos articulados na petição.*
Procedeu-se à realização de audiência prévia, onde foi proferido despacho saneador, foram julgadas improcedentes as excepções deduzidas.Procedeu-se a audiência final, após a qual foi proferida sentença, cuja parte decisória reproduzimos na íntegra:
“Pelo exposto, julgo a presente acção procedente e, em consequência:
Declaro nulas [anulo] as deliberações sociais tomadas das Assembleias Gerais Extraordinárias de accionistas da sociedade X Investimentos Imobiliários, S. A., realizadas no dia 30 de Agosto de 2014, pelas 10.30 horas, e, no mesmo dia, pelas 15.00 horas.
Registe e notifique.
Custas a cargo da ré (artigo 527.º, números 1 e 2, do C. P. Civil).”.
*
Não se conformando com esta decisão veio a ré dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:“(Nulidades da sentença)
1. Compulsada a decisão proferida, verifica-se que o Tribunal a quo decidiu não integrar na fundamentação da decisão proferida os factos vertidos nos artigos 21.°, 28.°, 29.°, 30.°, 31.°, 32.°, 40.°, 41.°, 43.° e 63.° da contestação, não se pronunciando sobre tais factos. Com efeito, nada é dito a respeito de tal factualidade, sendo a decisão de facto e, bem assim, toda a restante sentença, completamente omissa no que a tais factos diz respeito.
2. Esta decisão traduz-se num incumprimento da regra estabelecida no artigo 615.°, nº 1, d) do CPC, uma vez que omite, na fundamentação da sentença, parte dos factos essenciais alegados pela ora Apelante no seu articulado, que foram objecto de prova documental, testemunhal e depoimento de parte da Autora - alterando, deste modo, a realidade histórica tal como resultou da produção da prova -, não considerando tais factos na matéria de facto adquirida, impedindo, desta forma, uma apreciação verdadeira, rigorosa e completa da matéria de facto, com possíveis consequências na decisão de direito.
3. Face ao exposto e nos termos do disposto no art. 615.°, n. 1, aI. d), segunda parte do CPC, a sentença proferida é nula.
4. No Ponto 14 do elenco dos Factos Provados lê-se: "A autora é actualmente possuidora de 10.500 (dez mil e quinhentas) acções ao portador da X - Investimentos Imobiliários, SA, no valor unitário de €5,00 (cinco euros), o que perfaz o valor de €52.500,00 (cinquenta e dois mil e quinhentos euros), a que corresponde uma percentagem de participação no capital de 52,5% (cinquenta e dois virgula cinco por cento). "
5. Salvo melhor opinião, o termo "possuidora" traduz-se num conceito de direito e, por isso, conclusivo, e não num facto, razão pela qual não deve constar da decisão da matéria de facto.
6. Na presença do enquadramento legal e jurisprudencial, apresenta-se luzente que, no vertente caso, a factualidade considerada provada no ponto 14.0 (por se não conter nos factos articulados), é manifestamente excessiva, pelo que, nesta parte, a sentença proferida é nula, devendo ter-se por não escrita, ao abrigo do disposto no art. 615.°, n. 1, aI. d), segunda parte, do CPC.
Sem Prescindir das nulidades invocadas, (Recurso sobre a matéria de facto)
7. Face à prova apresentada, atento o depoimento de parte da Autora e o depoimento da testemunha Joaquim, a Ré, ora Apelante entende que o facto constante do ponto 14 dos Factos Provados deve ser alterado, passando a ter o seguinte teor: "No dia 30.08.2014, a autora tinha na sua mão 10.500 (dez mil e quinhentas) acções ao portador da X - Investimentos Imobiliários, SA, no valor unitário de €5,00 (cinco euros), o que perfaz o valor de €52.500,00 (cinquenta e dois mil e quinhentos euros), a que corresponde uma percentagem de participação no capital de 52,5% (cinquenta e dois virgula cinco por cento)."
8. Face à prova produzida nos autos, nomeadamente a prova documental, prova testemunhal e o depoimento de parte da Autora, a Ré entende que, sem prejuízo da restante factualidade provada, resultam, também, provados os seguintes factos - contantes dos artigos 21.°, 28.°, 29.°, 30.°, 31.°, 32.°, 40.°, 41.°, 43.° e 63.° da contestação -, devendo, tais factos ser aditados ao rol de factos provados, nos seguintes termos:
- "A sociedade anónima ora Ré era uma sociedade familiar, em cuja escritura de constituição outorgaram os Pais, António e Maria e as Filhas M. C., M. F. e Luísa, todas de apelido C. G."
- "Por se tratar de uma sociedade familiar todas as acções representativas do capital social da Ré se encontravam na casa de família à Rua ..., nº 1, em Bragança, num cofre à guarda do Pai, António que tinha o encargo de as conservar e guardar. "
-"As sócias filhas M. C., M. F. e Luísa requereram a notificação judicial avulsa do sócio seu Pai António para proceder à entrega de todas as acções de que elas eram titulares, notificação ocorrida pelas 12h05 no dia 20 de Maio de 2014 pela Solicitadora de Execução Carla (Processo 343/14. 6TBBGC do 2º juízo do Tribunal Judicial de Bragança. "
-"Perante a recusa da entrega das acções por parte do sócio Pai, as filhas M. C., M. F. e Luísa viram-se compelidas a demandar judicialmente o Pai para esse efeito no Processo n. o 96/14.8T8BGC, da Instancia Central de Bragança - Secção Cível e Criminal, Juiz 3. "
-"Nas assembleias gerais do dia 30.08.2014 e na petição inicial que apresentou nestes autos, a Autora nunca explicou a forma como chegou à posse das acções de que se arroga titular e não apresentou qualquer meio de prova com vista ao esclarecimento da sua alegada titularidade. "
-"Após o falecimento da sócia Mãe, o sócio Pai foi viver com a Autora, para casa desta última. "
(Recurso sobre a matéria de direito)
9. Tendo em conta o pugnado no ponto I deste recurso e a respectiva alteração da Factualidade Provada, com a alteração do Ponto 14 e o aditamento dos seis factos acima descritos, teremos que a Ré é uma sociedade familiar, em cuja escritura de constituição outorgaram os Pais, António e Maria e as Filhas M. C., M. F. e Luísa, todas de apelido C. G., que, precisamente por se tratar de uma sociedade familiar todas as acções representativas do capital social da Ré se encontravam na casa de família à Rua ..., nº 1 em Bragança, num cofre à guarda do Pai, António que tinha o encargo de as conservar e guardar, que em 07.09.2012 a accionista Mãe Maria vendeu as suas acções (títulos 7001 a 8000, 9001 a 10.000 e 10.0001 a 18.500) às accionistas suas filhas, M. C., M. F. e Luísa e que, após o falecimento da Mãe, estas requereram a notificação judicial avulsa do seu Pai António para proceder à entrega de todas as acções de que elas eram titulares e que, perante a recusa da entrega das acções por parte do accionista Pai, as filhas M. C., M. F. e Luísa viram-se compelidas a demandar judicialmente o Pai para esse efeito (Processo nº 96/14.8T8BGC, da Instância Central de Bragança ¬Secção Cível e Criminal, Juiz 3); que o accionista Pai foi viver com a aqui Autora, para casa desta, após o falecimento da sua esposa, a accionista Maria e que posteriormente, nas Assembleias Gerais do dia 30.08.2014 a Autora, representada pelo Mandatário Dr. Paulo, se apresentou nas reuniões, exibindo 10.500 acções, correspondendo, a sua maioria, às acções subscritas por Maria e vendidas por esta às suas filhas na escritura datada de 7 de Setembro de 2012 (títulos 7001 a 8000, 9001 a 10.000 e 10.0001 a 18.500), sem que tais acções lhe tenham sido entregues pela accionista Maria ou pelas Filhas desta e sem que tenha celebrado qualquer negócio jurídico translativo de tais acções com qualquer uma das accionistas referidas.
10. A doutrina e jurisprudência são hoje praticamente unânimes no que respeita ao regime jurídico da transmissão das anteriormente existentes acções ao portador, entendendo que a transmissão de tais acções só ficava perfeita com a entrega dos títulos, sendo certo que tal acto de entrega, só por si, não bastava para operar a transmissão, uma vez que para tal - para a transmissão - era necessário que tal entrega fosse sustentada por um título válido, um negócio jurídico, o negócio causal subjacente.
11. No presente caso, no que toca à alegada transmissão de acções por Maria à Autora, resulta da prova constante dos autos que não houve contrato nem modo, uma vez que ficou provado que a accionista Maria não celebrou qualquer contrato com a Autora referente às acções e não lhe entregou tais títulos, correspondentes às acções com os números 700l a 8000, 9001 a 10.000 e 10.0001 a 18.500, pelo que não se verificando nenhum dos requisitos necessários à existência da transmissão dos títulos, não poderá a Autora ser considerada legítima titular dos mesmos, accionista da sociedade Ré, com os direitos inerentes a tal qualidade.
12. Não se diga, em contrário do acima referido, que, tendo a Autora as acções na sua mão é possuidora das mesmas, estando dessa forma legitimada a exercer os direitos inerentes aos títulos. Com efeito, a posse dos títulos conferiria à Autora - apenas e só - a presunção de titularidade das acções. Nada mais.
13. No entanto, tal presunção resultou ilidida da abundante prova produzida nestes autos, tendo, no entender da Ré - e como já foi acima referido - ficado claro que a Autora não pode ser considerada uma...
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