Acórdão nº 926/07.0TBPRG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 29-01-2014

Data de Julgamento29 Janeiro 2014
Case OutcomeCONCEDIDA EM PARTE
Classe processualREVISTA
Número Acordão926/07.0TBPRG.P1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]:

I.

AA e mulher BB instauraram a presente acção declarativa contra CC e DD.

Pediram que:

1. Se declare que os A.A. são legítimos proprietários do prédio urbano que identificam e que os RR. sejam condenados no reconhecimento deste direito de propriedade;

2. Os RR. sejam condenados a reconhecer que a favor daquele prédio urbano está constituída uma servidão de vistas materializada pela existência do espaço (terraço) identificado nos artigos 5.º a 11.º da petição inicial, assim se condenando os R.R. a demolirem ou recuarem a totalidade das fachadas constituídas por paredes e pilares do seu prédio urbano, e que confinam com o prédio urbano dos A.A., ou seja, as fachadas do prédio urbano dos R.R. viradas a norte e nascente, de tal forma que deixem um espaço livre e desimpedido com a distância não inferior a 1,50 metros do prédio urbano dos A.A.;

Ou, pelo menos, e se assim não se entender, que:

3. Os RR. sejam condenados na demolição peticionada nos termos do numero 2., mercê da existência e edificação consentida e deles conhecida das janelas, varanda e terraço vertidas nos artigos 12.º a 15.º, 36.º, 37.º e 46.º a 54.º da petição inicial;

Sem prescindir, e subsidiariamente, que os RR. sejam condenados:

4. A demolir a totalidade das suas fachadas referidas no pedido indicado em 2., de tal forma que deixem livre e desimpedido o espaço aéreo correspondente ao beiral do telhado do prédio urbano dos A.A. referido nos artigos 16.º, 38.º e 39.º da petição inicial, e por uma largura não inferior a 40 cm., desta forma também permitindo o acesso livre de desimpedido às fachadas do seu prédio e respectiva canalização aí existente, e ao regular escoamento das águas pluviais, conforme vertido nos artigos 38.º a 45.º da petição inicial.

5. A pagar aos A.A. uma indemnização pelos prejuízos causados pelas obras que processaram, os quais serão liquidados em execução de sentença;

6. A pagar aos A.A. uma indemnização por danos morais de, pelo menos, 3.000,00 (três mil euros).

Os RR. apresentaram contestação/reconvenção, concluindo pela improcedência da acção e pedindo que:

A) Se declare que os RR. são donos e legítimos possuidores do prédio urbano identificado nos artigos 75.º a 77.º da contestação, condenando-se os AA. a reconhecerem o direito de propriedade dos RR.;

B) Se condenem os AA. a demolir até ao enfiamento/limite das paredes sul e poente da sua alegada casa (o artigo 626) as cornijas da face sul na medida de 37/38 cm. por 15 metros que propendem sobre o espaço dos RR. e a demolir ainda na parte poente a cornija e o beiral que se salientam exteriormente e ocupam, em 70 cm. por quatro metros, o espaço da casa destes acima identificada (o artigo 217);

C) Se condenem os AA. a retirar do seu lado poente da sua alegada casa a caleira e algeroz metálicos no comprimento de 4 metros e que ocupa o espaço dos RR. e a conduzir as águas pluviais pelo seu prédio para a rua;

D) Se condenem os AA. a retirar os canos plásticos, metálicos e algerozes que marginam exteriormente as fachadas sul e poente da alegada sua casa e a fazer o escoamento das águas das chuvas pelo seu alegado prédio para a rua;

E) Se condenem os AA. a encerrar com materiais consistentes as duas janelas do 1.º e 2.º andares localizadas na fachada sul da sua alegada casa (artigo 626) e que deitam directamente e sem qualquer intervalo para terreno e prédio urbano dos R.R., o artigo 217.

Os AA. replicaram, pugnando pela improcedência da reconvenção.

Percorrida a tramitação normal, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção e, em consequência, declarou os AA. legítimos proprietários do prédio urbano identificado no ponto 1. dos factos provados e condenou os RR. a demolir a totalidade das suas fachadas constituídas por paredes e pilares do seu prédio urbano, e que confinam com o prédio dos AA., ou seja, as fachadas do prédio urbano dos RR. viradas a norte e nascente e confinantes com o prédio dos AA., por uma largura não inferior a 40 cm., e ainda pagar-lhes uma indemnização pelos prejuízos causados pelas obras que processaram e indicados nos pontos 39.º, 41.º, 42.º e 51.º dos factos provados, a quantificar em sede de liquidação de sentença, bem como na quantia de € 750,00 a título de danos morais, absolvendo quanto ao mais os R.R. do demais contra eles peticionado.

A reconvenção foi, do mesmo modo, julgada parcialmente procedente e, em consequência, declararam-se os RR. donos e legítimos possuidores do prédio urbano identificado no ponto 2. dos factos provados e condenaram-se os AA. a encerrar com materiais consistentes as duas janelas do 1.º e 2.º andares localizadas na fachada sul e que deitam para o prédio dos RR. absolvendo-se quanto aos demais pedidos, contra eles formulados.

Ambas as partes apelaram da sentença, vindo a Relação a julgar improcedente a apelação interposta pelos Autores e parcialmente procedente a apelação interposta pelos Réus, revogando a decisão recorrida na parte em que condenou os Réus a demolir a totalidade das suas fachadas constituídas por paredes e pilares do seu prédio urbano, e que confinam com o prédio dos Autores viradas a norte e nascente por uma largura não inferior a 40 cm.

No mais, manteve a decisão recorrida.

Inconformados, pedem agora revista os AA., tendo apresentado as seguintes conclusões:

1. O Tribunal deve conhecer oficiosamente da exceção perentória do abuso do direito, pelo que enquanto questão de conhecimento oficioso suscitada no recurso de apelação, a questão do abuso do direito no que se reporta ao encerramento das duas janelas dos Autores não deverá ser considerada uma questão nova, devendo ser suscetível de apreciação e valoração;

2. A douta Sentença final proferida em 1 a instância julgou parcialmente procedente o pedido reconvencional deduzido pelos Réus, condenando os Autores a encerrarem com materiais consistentes as duas janelas localizadas no 1º e 2º andares da fachada sul da sua casa;

3. Em face da factualidade considerada provada sob as identificadas alíneas 5., 20., 21., 46. e 66. da fundamentação de facto da douta Sentença final proferida, resulta evidente que as duas janelas em questão foram edificadas a menos de 1,5 metros de distância do imóvel dos Réus;

4. No entanto haverá que ponderar, na análise global da matéria de facto que resultou provada, se os Réus estão a exercer legitimamente o seu direito de propriedade, pedindo pela via reconvencional o encerramento destas duas janelas, ou seja, se este seu direito consagrado na lei, se revela injusto na sua aplicação ao caso dos autos;

5. No recurso de apelação interposto, o Venerando Tribunal da Relação declarou não verificada a exceção perentória do abuso do direito, por ter entendido que, apesar do período temporal decorrido correspondente a 8 (oito) anos, isso não significa que tais aberturas foram toleradas e que nunca se oporiam a tal violação, tendo reagido quando por força das circunstâncias tiveram de dotar o seu prédio de novas estruturas. No entanto,

6. Não se encontra provada qualquer matéria factual donde se possa extrair ou concluir que a existência das duas janelas é suscetível de causar prejuízos aos Réus, pois que,

7. Apenas resultou provado sob a alínea 48. da fundamentação de facto, que estas janelas deitam para as paredes e telhado do prédio urbano dos Réus, assim limitando ou mesmo anulando a possibilidade de devassa com a vista ou arremesso de objetos, cuja possibilidade e ocorrência nem sequer resultou demonstrada; por outro lado,

8. Ficou demonstrado nos autos que o início da construção do prédio urbano dos Autores remonta ao ano de 1987, onde desde então residem, sendo por isso anterior à construção do prédio urbano destinado a habitação processada pelos Réus, que apenas teve início no mês de Julho de 2007 - alíneas 6., 11., 12. e 13. da factualidade provada;

9. E muito embora as janelas aqui em questão tivessem sido edificadas pelos Autores no decorrer dos anos de 1993 a 1995, o certo é que tal ocorreu em data anterior à aquisição por parte dos Réus do imóvel onde edificaram a sua habitação, o que apenas se verificou em 1999 e por doação processada pelo pai da Ré e Autora-mulher - alíneas 3., 20., 23. e 24. da factualidade provada; ou seja,

10. Quando os Réus adquiriram por doação o imóvel onde edificaram a sua habitação, sabiam que o aí confinante prédio urbano dos Autores já se encontrava dotado das duas janelas, cujas obras foram do seu conhecimento - alíneas 25. e 29. da factualidade provada; aliás,

11. Os Réus não só não reagiram contra a edificação das identificadas janelas em 1999, data em que adquiriram a propriedade por doação do seu imóvel, como também não o fizeram até o decorrer do ano de 2007, altura em que iniciaram obras de ampliação do seu prédio urbano, os quais nem sequer contenderam com as aberturas (janelas) em causa; por outro lado,

12. Por residirem na localidade de Galafura, e nomeadamente a Ré-mulher, irmã da Autora-mulher, que residia em casa de seus pais sita em frente do atual prédio urbano dos Autores, os Réus também sabiam e sabem que as referidas janelas foram edificadas sobre a placa de teto da habitação, a qual entre os anos de 1987 e 1993 foi utilizada como se fosse o respetivo terraço, embora não dotado de parapeito; e, assim,

13. Durante este período temporal e, portanto, há mais de 20 (vinte) anos, os Autores sempre puderam usufruir deste terraço, nomeadamente com uma vista livre e desimpedida sobre os imóveis onde atualmente se situa o prédio urbano dos Réus - alíneas 15. a 19. e 47. da factualidade provada;

14. Sabiam ainda os Réus que a edificação das janelas em causa foi do conhecimento dos pais da Autora-mulher e da Ré-mulher, EE e esposa, os quais para além de figurarem como doadores dos bens em questão (aos Autores e aos Réus) também acompanharam as construções em...

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