Acórdão nº 925/08.5TVLSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 02-02-2010

Data de Julgamento02 Fevereiro 2010
Número Acordão925/08.5TVLSB.L1-7
Ano2010
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
7ª SECÇÃO CÍVEL

I - A e sua mulher M intentaram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra L e C, Ltd., pedindo a condenação:
a) do réu L a pagar aos Autores a quantia de € 1.500,00, acrescida de juros vincendos à taxa legal desde o trânsito em julgado da sentença condenatória até integral pagamento;
b) da ré C, Ltd., a pagar aos Autores a quantia de € 116.661,73, acrescida de juros vincendos à taxa legal desde o trânsito em julgado da sentença condenatória até integral pagamento.
Alegaram, em síntese, que ocorreu acidente de viação em que veio a falecer o seu único filho, sendo que o 1º réu, incumbido pelos autores de propor acção de indemnização cível contra os responsáveis, deixou decorrer o prazo prescricional sem a haver instaurado; nessa acção os autores teriam obtido as seguintes indemnizações: € 60.000 pelo dano morte sofrido pelo filho; € 15.000 para cada um dos autores a título de danos não patrimoniais e € 28.161,73 a titulo de danos patrimoniais por eles sofridos.
Contestou apenas a ré.
Sustentou, em resumo, que se verifica uma causa de exclusão do contrato de seguro de responsabilidade civil profissional vigente entre ela e o réu, já que este actuou, pelo menos, com dolo eventual, pugnando pela improcedência da acção.

Realizado o julgamento, foi proferida decisão sobre os factos levados à base instrutória e, subsequentemente, foi lavrada sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou:
a) O réu L a pagar aos autores a quantia de € 1.500,00, acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados desde o trânsito em julgado da sentença até integral pagamento;
b) A Ré C, Ltd. a pagar aos autores a quantia de € 87.360,04, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde o trânsito em julgado da sentença e até integral pagamento.
No mais, absolveu os réus do pedido.

Apelaram a ré e os autores, estes últimos subordinadamente.
A ré, tendo apresentado alegações onde pede a alteração da sentença com redução do montante indemnizatório, formula as conclusões que passamos a transcrever:
1. Por sentença de 03.03.2009 proferida no processo à margem referenciado, foi a Apelante condenada "a pagar aos Autores da quantia de € 87.360,04 (oitenta e sete mil trezentos e sessenta euros e quatro cêntimos).
2. Baseia-se a referida sentença em pressupostos errados, assim como faz uma incorrecta aplicação da legislação.
3 - Viola desde logo o disposto no artigo 12.° do Código Civil, ao aplicar uma norma jurídica que nunca poderia ser aplicada ao caso concreto (Portaria n° 377/2008, de 26 de Maio), por ainda não existir à data da prática dos factos.
4 - Além disso, deveria o tribunal a quo, ao procurar fixar uma indemnização, tentar "reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação" artigo 562.° do Código Civil, o que só é possível, já que se trata de uma acção que nunca chegou a ser interposta, através de um juízo de prognose, quanto ao resultado de tal demanda.
5 - Todavia, a sentença recorrida ignorou por completo a previsão do referido artigo 562.° do Código Civil, antes se tendo limitado a fixar uma série de quantitativos como se estivesse a julgar uma acção cujo prazo de interposição já se encontra há muito prescrito, e mais grave, por aplicação de normas jurídicas inexistentes à data em que a mesma deveria ter sido interposta.
6 - Tivesse o tribunal a quo feito o referido juízo de prognose, seria a condenação da Apelante certamente inferior ao que foi.
7 - Desde logo porque, além do pedido de indemnização dos Apelados ser, à data dos factos, bastante inferior ao que vieram a interpor na presente acção, na acção seria igualmente parte uma Companhia de Seguros que, enquanto terceiro, poderia vir a ilidir a presunção do artigo 674.° - A do CPC, reduzindo ainda mais o valor de indemnização a atribuir aos Apelados.
8 - Desta forma, a decisão recorrida violou não só o disposto no artigo 12.° do Código Civil, ao aplicar retroactivamente uma lei que não prevê tal aplicação, como o disposto nos artigos 562.° e 564.º, n.°1, ao não fazer o juízo de prognose a que estava adstrito, antes se limitando a julgar uma acção que já não podia ser julgada.
Nas contra-alegações apresentadas, os autores sustentaram a improcedência deste recurso.

Na apelação subordinada que interpuseram, os autores, pedindo a alteração da sentença na parte em que lhes foi desfavorável, formularam as conclusões que de seguida se transcrevem:
1. O Tribunal a quo, ao negar aos Apelantes a fixação de indemnização a pagar pelos RR., concretamente da quantia de 3.240,71 €, para que suportem o custo comprovado da reparação do velocípede a ser feita, violou o art. 562º do Código Civil, não sendo indispensável que os Apelantes tenham pago a reparação em questão para que devam ser indemnizados quanto a tal dano, até porque ao longo dos anos nunca tiveram capacidades económicas para o fazerem.
2. Ao entender não atribuir indemnização aos Apelantes a título de ressarcimento do dano perda da contribuição previsivelmente entregue pelo falecido filho aos Apelantes, durante cinco anos, o Tribunal a quo violou o art. 566º, 3 do Código Civil. Deveria a sentença recorrida, mesmo não tendo apurado o montante exacto que o falecido entregava aos pais, ter fixado, face aos factos provados e recorrendo à equidade, a indemnização a pagar pelos RR. aos Apelantes em pelo menos 7.500 €, conforme jurisprudência corrente do STJ que tem fixado entre 1/3 e 2/3 a contribuição provável da pessoa falecida, em circunstâncias semelhantes, para a economia doméstica.
3. Nestes termos, deverá nesta parte a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que:
a) quanto aos danos causados no velocípede condene os RR. também no pagamento da quantia de 3.240,71 € aos Apelantes, quantia acrescida de juros sobre ela incidentes à taxa legal de 4%, desde o trânsito em julgado do acórdão que ponha termo aos presentes autos até integral pagamento;
b) quanto ao dano perda previsível da contribuição económica entregue pelo falecido aos pais, condene os RR. também no pagamento da quantia de 7.500,00 € aos Apelantes, quantia acrescida de juros sobre ela incidentes à taxa legal de 4%, desde o trânsito em julgado do acórdão que ponha termo aos presentes autos até integral pagamento, sendo a franquia de 1.500 € a cargo do R. L e os restantes montantes indemnizatórios a cargo da R. C, com o que se fará a muito merecida Justiça.

Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questões sujeitas à nossa apreciação as enunciadas pelos recorrentes nas suas conclusões, visto serem estas, como é sabido, que delimitam o objecto do recurso.

II – Vêm descritos como provados os seguintes factos:
1- R e T foram condenados por Acórdão do Tribunal da Relação de 14.5.2002, transitado em julgado em 4.6.2002, como autores materiais de um crime de homicídio por negligência p. e p. pelo artigo 136º, nº1 do Código Penal de 1982, tendo como base designadamente os seguintes factos provados:
"1. No dia 29.7.94, cerca das 22h 45, o arguido T conduzia o tractor agrícola de matrícula BT pela Estrada Municipal no sentido A…/F…;
2. Tal tractor agrícola era propriedade do arguido R, por conta de quem, na ocasião, os dois restantes arguidos trabalhavam;
3. O mencionado tractor agrícola tinha acoplado à sua retaguarda um pulverizador e respectivo depósito com a capacidade de 400 litros e circulava sem iluminação de luzes de médios e com o comutador de luzes avariado, mas com as luzes de presença (farolins traseiros) e com uma luz rotativa amarela ("pirilampo") acesos;
4. O arguido T não estava legalmente habilitado a conduzir aquele veículo na via pública, apesar de saber que tal iluminação era necessária para efectuar a condução do tractor nas circunstâncias descritas;
5. Naquela mesma via, mas no sentido F…/A… circulava o arguido R conduzindo um automóvel ligeiro misto (tipo furgão), o qual, ao aperceber-se do tractor agrícola sua propriedade conduzido pelo arguido T imobilizou a sua viatura de modo a ambos os veículos ficarem ao lado um do outro e paralelamente;
6. Com os veículos assim imobilizados os arguidos T e R entabularam conversa um com o outro, tendo o segundo permanecido com os faróis acesos na posição de luzes máximas durante o tempo que durou a conversação;
7. Enquanto os veículos assim permaneceram imobilizados não foi colocado na traseira do tractor agrícola, à distância regulamentar, qualquer sinalização, nomeadamente o triângulo de pré sinalização;
8. No local a via desenrola-se numa pequena recta, antecedida por uma curva, considerando o sentido em que seguia o tractor agrícola, isto é, não inferior a quarenta metros da citada curva;
9. Quando os dois veículos se encontravam parados e na posição referida, aproximou-se do local o velocípede com motor de matricula LR, conduzido por D circulava no sentido seguido pelo tractor agrícola;
10. O mencionado velocípede com motor, conduzido por D, circulava na sua mão de trânsito e foi embater violentamente na traseira do tractor agrícola, mais precisamente no depósito do pulverizador que tal veiculo tinha acoplado;
11. Tal embate ocorreu a cerca de um metro e dez centímetros da berma direita da faixa de rodagem, atento o sentido de marcha do velocípede com motor;
11-A. D ficou encadeado com as luzes do veículo conduzido pelo arguido R e, não se apercebendo de qualquer iluminação na traseira do tractor agrícola, prosseguiu a sua marca, só descortinando a presença do tractor a curta distância deste;
12. Em resultado do embate o velocípede com motor ficou praticamente destruído, tendo o corpo do seu condutor - D - ficado imóvel no sob
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