Acórdão nº 910/10.7TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 02-03-2021

Data de Julgamento02 Março 2021
Case OutcomeNÃO SE CONHECE DA REVISTA NORMAL. REMETE À FORMAÇÃO PARA APRECIAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS DA REVISTA EXCEPCIONAL E INDEFERE A RECLAMAÇÃO QUANTO AO EFEITO DO RECURSO.
Classe processualREVISTA
Número Acordão910/10.7TVPRT.P1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça



Processo n.º 910/10.7VPRT.P1.S1

Revista – Tribunal recorrido: Relação ….., 2.ª Secção

Acordam em Conferência na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça

I) RELATÓRIO

1. «Axa Portugal – Companhia de Seguros, S.A.» intentou acção declarativa de condenação, em processo ordinário, contra AA, ........, peticionando a condenação do Réu na resolução de contrato de arrendamento e entrega de imediato à Autora, livre de pessoas e bens, do lado esquerdo do ....... andar do prédio identificado, com entrada pelo n.º …. da Praça …, no …..., e no pagamento da quantia de €25.929,45 referente às rendas em dívida e não pagas, acrescidas dos juros legais, desde a data dos respectivos vencimentos até ao seu integral pagamento, bem como a pagar-lhe todas as rendas mensais que se vencerem até à entrega efectiva do arrendado, acrescidas dos juros de mora desde os respectivos vencimentos até ao pagamento efectivo. Para lograr êxito alegou que é proprietária/”dona” do prédio identificado no art. 1º da petição inicial, foi celebrado entre ela e o Réu um contrato denominado de “contrato promessa de arrendamento” mediante o qual deu de arrendamento ao Réu e ao Dr. BB o ....... andar do referido prédio para o exercício das actividades do Réu e do Dr. BB, particularmente para o exercício ….., com início em 1/3/2004, contrato esse que foi alterado por iniciativa dos arrendatários, aceite pela Autora, dividindo os arrendatários o arrendado em dois espaços, ficando o Réu a ocupar o lado esquerdo e o Dr. BB o lado direito, ficando a cargo dos inquilinos os encargos necessários à separação contratual, bem como as respectivas obras. Ficara o Réu a pagar a renda mensal de €1.150,00 pelo lado esquerdo, que por força das actualizações era de €1215,29 em 1/3/2009, e de €1249,32 em 1/12/2009, tendo o Réu deixado de pagar a renda desde 1/3/2009, perfazendo o valor total em dívida, em Novembro de 2010, de €25.929,45, sendo essa falta de pagamento das rendas fundamento de resolução do contrato de arrendamento.

O Réu apresentou Contestação, sustentando que apenas foi celebrado um contrato promessa de arrendamento por falta do licenciamento adequado uma vez que o espaço se encontrava licenciado para habitação e não para comércio e serviços, o que impedia a celebração do contrato definitivo de arrendamento, nulo face à lei, tendo assinado o referido contrato promessa com vista à futura assinatura do contrato definitivo de arrendamento após as obras no prédio por parte da Autora de adaptação do local e aptidão para comércio e exercício de profissão liberal. Não tendo parte do clausulado do contrato sido previamente negociado mas de conteúdo previamente elaborado pela Autora, sem qualquer negociação prévia entre as partes, nem alterações ao seu conteúdo relativamente às cláusulas 1ª, 7ª, 8ª, 9ª, 10ª, 11ª, 13ª, 14ª, estas são nulas por serem cláusulas contratuais gerais proibidas pelo DL n.º 446/85. Foram realizadas obras no locado com vista à utilização do andar para o fim acordado, prevendo que a utilização do espaço perdurasse por mais de 10 anos, ao contrário do que veio a suceder, tendo posteriormente sido renegociados dois novos contratos, extinguindo-se o anterior contrato por acordo dos três intervenientes em 31/12/2006, mantendo-se como promessas de arrendamento (na medida em que, no final de 2006, a Autora ainda não tinha concluído as obras nas partes comuns de acesso, faltando designadamente a renovação dos elevadores de molde a ser possível licenciar o espaço para o fim pretendido, sendo também nulo o contrato não escrito de 2007, por falta de forma legal escrita e falta de licenciamento e demais requisitos legais). Mais alegou o Réu que, no decurso dos novos contratos, separaram o .......º andar em dois espaços (direito e esquerdo), tendo o Réu realizado inúmeras obras para essa separação, que constituem benfeitorias, considerando o Réu que desde 1 de Abril de 2009, após ter invocado a nulidade da relação contratual que o unia à Autora, passou a exercer o direito de retenção sobre o ....... andar esquerdo pelas mencionadas benfeitorias que efectuou no local e não pode levantar sem detrimento das mesmas ou do local. Alegou ainda que, desde Fevereiro de 2008, é constante a utilização da entrada, hall e elevadores por doentes em cadeiras de rodas e macas; foram realizadas obras de adaptação do prédio num hospital de campanha, por inquilinos, com perfeito conhecimento da Autora, das quais esta tira vantagens, as quais se prolongaram entre Dezembro de 2008 e o 1º trimestre de 2009, obrigando o Réu a ausentar-se do prédio durante o período normal de trabalho e ir trabalhar para casa, o que levou o Réu a comunicar à Autora que deduziria €592,82 à renda mensal por impossibilidade de utilização do locado para o fim a que se destinava, até porque desde Fevereiro de 2008 foi instalado um aparelho de ar condicionado que produzia ruído ensurdecedor, virado para uma das janelas do gabinete pessoal do Réu, que o impedia de aí trabalhar, tendo o Réu deixado de aí trabalhar em definitivo desde o início de 2009, o que foi comunicado à Autora, tendo o Réu transferido para casa o seu escritório em 31/3/2009, conforme comunicado à Autora, que não compareceu nessa data para receber o locado mediante o pagamento da compensação pecuniária exigida pelo Réu. Concluiu que a relação contratual iniciada em 2007 sobre o .......º andar esquerdo, para além de nula, está extinta por acordo das partes formalizada pela carta da Autora de 28/5/2009, não havendo direito ao pagamento de quaisquer rendas, mais invocando que improcede o pedido de entrega do locado porque opera o seu direito de retenção que tem vindo a exercer licitamente.

Formulou ainda o Réu pedidos em sede de Reconvenção no sentido de se declarar lícito e legítimo o direito de retenção, que exerce desde 1 de Abril de 2009 sobre o ....... andar esquerdo do prédio da Autora, pelo crédito de €19.710,98 referente a benfeitorias no imóvel, nos termos do enriquecimento sem causa, e condenação da Autora a pagar-lhe essa quantia de €19.710,98 acrescida de juros à taxa legal até integral pagamento; assim como de condenação ao pagamento da quantia de €7.751,18 a título de danos patrimoniais por motivo de falta da correspondente contraprestação relativa a metade da ocupação do .......º andar esquerdo entre 1 de Fevereiro de 2008 a 31 de Março de 2009, tendo o Réu pago indevidamente em cada um desses meses à Autora o dobro sem ter podido usar e fruir totalmente o espaço por culpa da Autora, acrescida de juros à taxa legal até integral pagamento; bem como a condenação ao pagamento da quantia de €25.028,91 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal até integral pagamento.

A Autora apresentou Réplica, deduzindo oposição quer à matéria de excepção, quer à matéria da reconvenção, concluindo como na petição inicial.
O Réu apresentou Tréplica, na qual apresentou ampliação do pedido e da causa de pedir e, por fim, requereu a condenação da Autora como litigante de má-fé, em multa e indemnização condignas, em montante nunca inferior a €63.000,00. Foi proferido despacho a admitir a tréplica apenas no que se refere à resposta à excepção de abuso de direito e ao pedido de condenação em litigância de má-fé, tendo-se indeferido a ampliação do pedido.

2. A Autora veio informar que o Réu, em 14/12/2012, procedeu à entrega das chaves do locado, requerendo a extinção por inutilidade superveniente do pedido formulado em A) da petição inicial. Proferiu-se despacho favorável a declarar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide no segmento respectivo do petitório, prosseguindo a acção para apreciação dos demais pedidos formulados quer em sede de acção quer em sede de reconvenção.

3. Prosseguida a instância (não foi realizada audiência prévia; proferido despacho saneador; realizada audiência de julgamento), o Juiz …. do Juízo Central Cível do Tribunal Judicial da Comarca …….. proferiu sentença em 16/6/2017, na qual se decidiu:

“Julgo totalmente procedente a presente acção e, consequentemente, condeno o Réu a pagar à Autora a importância de €25.929,45, referente às rendas vencidas até Novembro de 2010, bem como as vincendas desde essa data até à entrega do arrendado que ocorreu em Dezembro de 2012 no valor de €31,233,00, perfazendo a importância global de €57.162,45, rendas essas acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a data dos respectivos vencimentos até efectivo pagamento.

Julgo totalmente improcedente a reconvenção, absolvendo a Autora/Reconvinda de todos os pedidos reconvencionais contra ela formulados.
Julgo totalmente improcedente o pedido de condenação da Autora como litigante de má-fé.”

4. Inconformado, interpôs o Réu recurso de apelação para o Tribunal da Relação …... identificadas as questões a decidir, em acórdão prolatado em 10/9/2019, o TR…. (i) manteve inalterada a decisão sobre a matéria de facto impugnada pelo Apelante, (ii) julgou improcedente a alegação de falta de capacidade “judiciária” da Autora (art. 15º, 2, do CPC), (iii) julgou improcedente a alegação de “mora de credor” (art. 813º do CCiv.) da Autora pela não reposição das condições de utilização do locado, e, por fim, (iv) no que respeita à nulidade de renúncia antecipada de direitos (art. 809º do CCiv.), não descortinou “qualquer incumprimento das prestações de que a autora/senhoria estivesse obrigada, e do qual o apelante se tenha tornado credor e que tivesse renunciado”. Concluiu no dispositivo pela improcedência das alegações de recurso e pela confirmação da sentença recorrida.

6. Notificado, veio o Réu requerer a arguição de nulidade do acórdão do TR….. (art. 615º, 1, c) e d), CPC), o que faz fls. 930 e ss.

7. Depois, o mesmo Réu interpôs recurso de revista para o STJ visando a revogação do acórdão recorrido (de acordo como o requerimento de interposição e...

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