Acórdão nº 910/08.7TBMCN-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 21-10-2014
Data de Julgamento | 21 Outubro 2014 |
Número Acordão | 910/08.7TBMCN-A.P1 |
Ano | 2014 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Proc. nº 910/08.7 TBMCN-A.P1
Tribunal Judicial de Marco de Canavezes – 1º Juízo
Apelação
Recorrentes: B… e outros
Recorrido: C…
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos
Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:
RELATÓRIO
O executado C… veio por apenso à execução que lhe move o exequente D… deduzir oposição à execução e à penhora, onde, em síntese, alega que o exequente vem executar um crédito pretensamente titulado por um cheque que apenas servia como garantia do pagamento da divida, e não traduzia, por si só, o reconhecimento da alegada obrigação.
Para além disso, refere que o aludido cheque foi adulterado em relação à data aposta como de pagamento. Contudo, atenta a data de apresentação a desconto, sempre se encontrava prescrito o direito à competente acção, só podendo constituir-se como mero documento particular que importa a constituição ou reconhecimento de determinadas obrigações pecuniárias. No caso concreto, o cheque apresentado pelo exequente tem subjacente uma relação jurídica nula, por baseada num contrato também ele nulo e que comporta um conjunto de elementos que identificam essa relação como nula, não podendo, em consequência, servir de base à execução.
Sempre sendo certo que o eventual montante a reembolsar é inferior ao peticionado, uma vez que o executado procedeu ao pagamento do montante de 10.000,00€, por conta do valor em débito.
Suporta, por outro lado, a sua oposição à penhora no facto de terem sido penhorados bens em excesso, face ao montante reclamado, impondo-se o levantamento da penhora que incidiu sobre todos os bens do executado, nomeadamente sobre os veículos automóveis, recheio de habitação e reembolso de IRS de 2009, excepto sobre o imóvel penhorado nos autos executivos.
Pugna assim pela procedência da oposição à execução e pelo levantamento da penhora incidente sobre os bens móveis que identifica.
O exequente D… apresentou-se a contestar somente a oposição à execução, impugnando os factos invocados pelo executado e sustentando a relação jurídica subjacente no título executivo.
Para o efeito, alega que o cheque dado à execução é um reconhecimento inequívoco da dívida e caso o negócio subjacente seja declarado nulo, por vício de forma, sempre o executado terá que restituir ao exequente a quantia mutuada, a qual terá de ser efectuada em simultâneo com a declaração de nulidade.
Pretende assim que a oposição à execução seja julgada improcedente e que os autos executivos prossigam os seus trâmites.
Foi elaborado despacho saneador, sendo dispensada a fixação da base instrutória e a selecção da matéria assente.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais, tendo sido dadas as respostas à matéria de facto controvertida por despacho de fls. 80/82, que não foi objecto de reclamação.
Seguidamente proferiu-se sentença que julgou a oposição à execução procedente e determinou a extinção da execução.
Inconformado, o exequente interpôs recurso de apelação, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
1.- Vem o presente recurso interposto da sentença que, decidiu julgar procedente a oposição à execução deduzida pelo executado, por inexistência de título executivo válido, uma vez que foi verificada a nulidade do acto constitutivo da relação subjacente, por inobservância da forma legal, no campo das relações imediatas.
2- O que está em causa, no presente recurso é assim a questão de saber se pode o exequente no mesmo requerimento pedir a execução do executado para reaver o montante mutuado, ao abrigo do n.º 1 do art. 289º do CC, sem necessidade de, previamente, ter de propor a acção declarativa para o efeito, sendo a execução fundamentada numa declaração de dívida, em que o executado reconhece ter recebido uma determinada quantia do exequente, através de um contrato de mútuo celebrado entre ambos e tendo o exequente alegado no requerimento executivo que o referido contrato de mútuo havia sido celebrado por mero documento particular quando o mesmo, deveria ter sido formalmente celebrado por escritura pública.
3- O título apresentado reconhece a existência de uma obrigação contratual para o executado decorrente de um contrato de mútuo que o mesmo ali reconhece haver celebrado com o exequente e obrigação essa vencida, com a interpelação judicial, nos termos do art. 805º, nº 1 do Cód. Civil, tendo a sua formalização sido apenas por documento particular, e como tal o mútuo nulo por força do disposto no referido art. 1143º, sempre aquele título executivo preenche os requisitos previstos na referida al. c) do nº 1 do art. 46º, em relação ao capital mutuado peticionado.
4.- O art. 458º, nº 1 do Cód. Civil estipula que se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.
5.- O executado tem toda a possibilidade de exercer a sua oposição com a dedução dos fundamentos com vista a infirmar o valor daquela presunção, o que fez no seu requerimento inicial de oposição, fundamentos esses que ainda não foram apreciados por haverem ficado prejudicados com a decisão no sentido de que estando subjacente ao título executivo um negócio nulo por vício de forma, não se preenche a previsão da al. c) do nº 1 do art. 46º.
6.- Segundo o assento nº 4/95, de 28/03/1995 – DR nº 114/95, I série A de 17-05-1995 do Supremo Tribunal - hoje com valor de acórdão de uniformização de jurisprudência em que concluiu: “Quando o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade do negócio jurídico invocado como pressuposto da sua validade, e se na acção tiverem sido fixados os necessários factos materiais deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com o fundamento no nº 1 do art. 289º do Cód. Civil.“
7.- Encontrando-se a execução fundamentada numa declaração de dívida em que a executada reconhece haver celebrado um contrato de mútuo que, eventualmente, haja sido celebrado por mero documento particular quando o mesmo, por lei substantiva, devia ter sido celebrado por escritura pública, pode o exequente no requerimento executivo pedir a execução da executada para reaver o montante mutuado, facultado no disposto no art. 289º, nº 1 do Cód. Civil, sem necessidade de, previamente, ter de propor uma acção declarativa, para o efeito.
8.- Ora sendo o título executivo apresentado idóneo a preencher a previsão da referida al. c), apesar de a confissão de dívida dizer respeito a um mútuo nulo por vício de forma, há que fazer prosseguir os autos de oposição deduzida pelo executado para serem apreciados os demais fundamentos de oposição, nos termos permitidos na parte final do nº 1 do art. 458º do Cód. Civil.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência...
Tribunal Judicial de Marco de Canavezes – 1º Juízo
Apelação
Recorrentes: B… e outros
Recorrido: C…
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos
Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:
RELATÓRIO
O executado C… veio por apenso à execução que lhe move o exequente D… deduzir oposição à execução e à penhora, onde, em síntese, alega que o exequente vem executar um crédito pretensamente titulado por um cheque que apenas servia como garantia do pagamento da divida, e não traduzia, por si só, o reconhecimento da alegada obrigação.
Para além disso, refere que o aludido cheque foi adulterado em relação à data aposta como de pagamento. Contudo, atenta a data de apresentação a desconto, sempre se encontrava prescrito o direito à competente acção, só podendo constituir-se como mero documento particular que importa a constituição ou reconhecimento de determinadas obrigações pecuniárias. No caso concreto, o cheque apresentado pelo exequente tem subjacente uma relação jurídica nula, por baseada num contrato também ele nulo e que comporta um conjunto de elementos que identificam essa relação como nula, não podendo, em consequência, servir de base à execução.
Sempre sendo certo que o eventual montante a reembolsar é inferior ao peticionado, uma vez que o executado procedeu ao pagamento do montante de 10.000,00€, por conta do valor em débito.
Suporta, por outro lado, a sua oposição à penhora no facto de terem sido penhorados bens em excesso, face ao montante reclamado, impondo-se o levantamento da penhora que incidiu sobre todos os bens do executado, nomeadamente sobre os veículos automóveis, recheio de habitação e reembolso de IRS de 2009, excepto sobre o imóvel penhorado nos autos executivos.
Pugna assim pela procedência da oposição à execução e pelo levantamento da penhora incidente sobre os bens móveis que identifica.
O exequente D… apresentou-se a contestar somente a oposição à execução, impugnando os factos invocados pelo executado e sustentando a relação jurídica subjacente no título executivo.
Para o efeito, alega que o cheque dado à execução é um reconhecimento inequívoco da dívida e caso o negócio subjacente seja declarado nulo, por vício de forma, sempre o executado terá que restituir ao exequente a quantia mutuada, a qual terá de ser efectuada em simultâneo com a declaração de nulidade.
Pretende assim que a oposição à execução seja julgada improcedente e que os autos executivos prossigam os seus trâmites.
Foi elaborado despacho saneador, sendo dispensada a fixação da base instrutória e a selecção da matéria assente.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais, tendo sido dadas as respostas à matéria de facto controvertida por despacho de fls. 80/82, que não foi objecto de reclamação.
Seguidamente proferiu-se sentença que julgou a oposição à execução procedente e determinou a extinção da execução.
Inconformado, o exequente interpôs recurso de apelação, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
1.- Vem o presente recurso interposto da sentença que, decidiu julgar procedente a oposição à execução deduzida pelo executado, por inexistência de título executivo válido, uma vez que foi verificada a nulidade do acto constitutivo da relação subjacente, por inobservância da forma legal, no campo das relações imediatas.
2- O que está em causa, no presente recurso é assim a questão de saber se pode o exequente no mesmo requerimento pedir a execução do executado para reaver o montante mutuado, ao abrigo do n.º 1 do art. 289º do CC, sem necessidade de, previamente, ter de propor a acção declarativa para o efeito, sendo a execução fundamentada numa declaração de dívida, em que o executado reconhece ter recebido uma determinada quantia do exequente, através de um contrato de mútuo celebrado entre ambos e tendo o exequente alegado no requerimento executivo que o referido contrato de mútuo havia sido celebrado por mero documento particular quando o mesmo, deveria ter sido formalmente celebrado por escritura pública.
3- O título apresentado reconhece a existência de uma obrigação contratual para o executado decorrente de um contrato de mútuo que o mesmo ali reconhece haver celebrado com o exequente e obrigação essa vencida, com a interpelação judicial, nos termos do art. 805º, nº 1 do Cód. Civil, tendo a sua formalização sido apenas por documento particular, e como tal o mútuo nulo por força do disposto no referido art. 1143º, sempre aquele título executivo preenche os requisitos previstos na referida al. c) do nº 1 do art. 46º, em relação ao capital mutuado peticionado.
4.- O art. 458º, nº 1 do Cód. Civil estipula que se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.
5.- O executado tem toda a possibilidade de exercer a sua oposição com a dedução dos fundamentos com vista a infirmar o valor daquela presunção, o que fez no seu requerimento inicial de oposição, fundamentos esses que ainda não foram apreciados por haverem ficado prejudicados com a decisão no sentido de que estando subjacente ao título executivo um negócio nulo por vício de forma, não se preenche a previsão da al. c) do nº 1 do art. 46º.
6.- Segundo o assento nº 4/95, de 28/03/1995 – DR nº 114/95, I série A de 17-05-1995 do Supremo Tribunal - hoje com valor de acórdão de uniformização de jurisprudência em que concluiu: “Quando o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade do negócio jurídico invocado como pressuposto da sua validade, e se na acção tiverem sido fixados os necessários factos materiais deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com o fundamento no nº 1 do art. 289º do Cód. Civil.“
7.- Encontrando-se a execução fundamentada numa declaração de dívida em que a executada reconhece haver celebrado um contrato de mútuo que, eventualmente, haja sido celebrado por mero documento particular quando o mesmo, por lei substantiva, devia ter sido celebrado por escritura pública, pode o exequente no requerimento executivo pedir a execução da executada para reaver o montante mutuado, facultado no disposto no art. 289º, nº 1 do Cód. Civil, sem necessidade de, previamente, ter de propor uma acção declarativa, para o efeito.
8.- Ora sendo o título executivo apresentado idóneo a preencher a previsão da referida al. c), apesar de a confissão de dívida dizer respeito a um mútuo nulo por vício de forma, há que fazer prosseguir os autos de oposição deduzida pelo executado para serem apreciados os demais fundamentos de oposição, nos termos permitidos na parte final do nº 1 do art. 458º do Cód. Civil.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência...
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