Acórdão nº 904/12.8BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 04-05-2023

Data de Julgamento04 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão904/12.8BEALM
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO


A ………….. – Sociedade Unipessoal, Lda (doravante A …………. ou Recorrente), interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o ato de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), do exercício de 2009, e respetivos Juros Compensatórios (JC), no montante global de €36.259,46.

A Recorrente formulou as conclusões que infra se descrevem:

“A - E o seguinte o pedido formulado no presente processo de impugnação: “Nestes termos e nos demais de direito, deve ser anulado o acto impugnado, pois que numa parte a Autoridade Tributária não considerou erradamente os encargos financeiros pagos em 2009 pela impugnante ao B… e relativos ao empréstimo pelo mesmo concedido e noutra parte tão-pouco considerou como custos do exercício as despesas respeitantes ao pagamento dos serviços de carpintaria e serralharia que tiveram por objecto a manutenção e instalação de equipamento do estabelecimento da impugnante”.

B - Na petição inicial identificou-se de forma completa e com toda a clareza o acto impugnado, que é a liquidação adicional de IRC relativa ao ano de 2009, no valor de €36.259,46, tendo-se inclusivamente explicado que 33,5% da referida colecta adicional pretendida pela AT, resulta da desconsideração dos encargos financeiros inerentes ao empréstimo do B... e 66,5% da mesma advém de se não terem considerado como custos do exercício as despesas inerentes ao pagamento dos atrás mencionados serviços de carpintaria e serralharia.

C - Porém, a sentença recorrida apenas apreciou e decidiu a primeira questão - desconsideração dos encargos financeiros inerentes ao empréstimo do B... - não se tendo pronunciado sobre a segunda questão, que tem a ver com o errado entendimento da AT, considerando imobilizado corpóreo o valor pago pela impugnante no ano de 2009 para pagamento de serviços de carpintaria e serralharia respeitantes à manutenção e instalação de mobiliário do estabelecimento da impugnante; quando deveria ter considerado esse valor como um custo do exercício.

D - Ora, é essencial tal questão sobre a qual não se pronunciou a Meritíssima Juíza “a quo”.

E - O que acarreta a nulidade da sentença recorrida (art° 125°, n° 1 do C.P.P.T.).

F - Que, por isso, tem que ser revogada.

G - E porque tal questão é de direito, constando do processo todos os elementos necessários para que da mesma se conheça, deve ela ser decidida no douto Acórdão que revogar a sentença recorrida (art° 665°, n° 2 do C.P.C., aplicável ex vi art° 2o, alínea e) C.P.P.T.)

H - E decidida favoravelmente à impugnante, ora recorrente, por força do exposto a esse respeito na petição inicial, que nessa parte aqui se dá por reproduzida.

I - Nem no relatório de inspecção, nem no parecer do chefe de equipa nem no despacho superior de concordância que determinaram a prática do acto impugnado se afirma que o produto do empréstimo concedido pelo B... à recorrente, foi utilizado na aquisição das quotas pela actual sócia A ……………… e não no investimento realizado em S. Tomé e Príncipe pela recorrente.

J - Apenas se diz que tal empréstimo foi contraído com o objectivo da referida A ……………..adquirir tais quotas, o que é completamente diferente.

K - Ou seja, a razão que determinou a correcção da matéria colectável da recorrente, relativamente aos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010, foi que o objectivo da contracção do empréstimo junto do B... correspondeu à aquisição das aludidas quotas.

L - Ora, uma coisa é o objectivo/destino que foi indicado ao Banco para aí justificar o pedido de empréstimo, outra a aplicação efectivamente dada ao produto do mesmo.

M - E só a afirmação de que a utilização desse produto consistiu na aquisição das quotas e não no pagamento de sinais para compra de imóveis,

T - Facto não considerado provado na sentença recorrida, que assim julgou incorrectamente este ponto da matéria de facto.

U - Como também erradamente decidiu que dos factos constantes da impugnação, “não se provaram os que não constam da factualidade descrita na mesma sentença”.

V- E, todavia, dos documentos juntos aos autos e dos depoimentos das testemunhas referidos nestas alegações, resultou provado que:

1- A D. Edviges Antunes Jorge, madrinha e protectora da farmacêutica A ……………. e pessoa com recursos financeiros, adiantou dinheiro próprio por forma a assegurar a compra de dois imóveis em S. Tomé e Príncipe para ali se poder estabelecer uma farmácia e respectivo armazém.

2 - No dia 8 de Abril de 2004, a recorrente reembolsou a referida Senhora da quantia por ela adiantada, nos termos atrás referidos, tendo em vista a aquisição dos mencionados imóveis.

3 - Tal reembolso foi efectuado com o produto do empréstimo concedido pelo B..., que foi integralmente aplicado no pagamento à D. E …………… da aludida importância de € 2.500.000,00, por ela antes adiantada.

4 - A sociedade promitente-vendedora dos imóveis, veio a aceitar transferir a promessa de venda dos mesmos para a ora recorrente, celebrando com esta os respectivos contratos-promessa de compra e venda e dando quitação das quantias de € 1.000.000,00 e € 1.500.000,00, que haviam inicialmente sido pagas pela D. E ………… e a esta reembolsadas pela recorrente fundamentaria devidamente os actos impugnados. Tal afirmação nunca existiu por parte da AT.

N - Só a afirmação de que o produto do empréstimo concedido pelo B... e pago pela impugnante, foi efectivamente utilizado na compra pela pessoa singular A ……………. das quotas da sociedade, poderia fundamentar a conclusão, consubstanciada nos actos impugnados, de que os encargos inerentes a tal empréstimo foram verdadeiros rendimentos de capitais da sócia e, como tal, sujeitos a retenção na fonte.

O - Essa afirmação em parte alguma dos actos impugnados e do relatório e parecer em que eles se sustentam, surge, pelo que há realmente incongruência entre as premissas e a conclusão.

P - Pelo que não se podem considerar fundamentados os actos impugnados, que só por isso têm desde logo que ser anulados.

Q - Tem que se considerar provado que as quotas foram cedidas pelo valor nominal e não pelo invocado preço de € 2.500.000,00.

R - Não estando provado - antes foi provado o contrário - que as quotas foram adquiridas pelo preço invocado pela AT, cai um pressuposto essencial da tese que determinou a prática dos actos impugnado.

S - Dos documentos juntos aos autos e depoimentos das testemunhas inquiridas, resultou provado o seguinte facto: A dívida de € 2.500.000,00 contraída junto do Banco ……………., S.A., num primeiro momento por A ……………. e J o………………., destinou-se a pagar uma dívida que haviam contraído junto de E d……………..com vista à compra pela impugnante de imóveis em São Tomé e Príncipe. 

X - A sentença recorrida errou, ao considerar que a ora recorrente deveria ter junto aos autos documentos comprovativos dos contratos-promessa de compra e venda inicialmente celebrados entre a T…….., Lda e a D. E ………….. e dos pagamentos dos sinais por esta adiantados àquela.

Y - A verdade é que esses documentos eram da D. E …………, não tendo a recorrente neles tido intervenção, pelo que nem sequer tinha qualquer direito a tê-los consigo.

Z - Tendo falecido em 2008 a D. E ……….. e não sendo a recorrente nem a sua sócia suas herdeiras, de nada sabem da localização de tais documentos, que poderão até ter-se extraviado.

AI - - A circunstância - referida na sentença recorrida - de não ter sido até à data outorgado o contrato definitivo de compra e venda dos imóveis, em nada releva, tanto mais que ficou provado que isso ainda não aconteceu apenas porque a recorrente não tem tido capacidade financeira para tanto.

BI - Que, aliás, nunca mais irá ter se o presente recurso for julgado improcedente, pois isso levá-la-à inevitavelmente para a insolvência.

Cl - A sentença recorrida violou o art° 23° do CIRC, pois não considerou como gastos os encargos financeiros despendidos pela recorrente e referentes à aquisição de bens para desenvolvimento da sua actividade.

Dl - Por tudo isto e ainda pelo que doutamente se suprirá, deve a sentença recorrida ser revogada, anulando-se os actos de liquidação impugnados nos termos referidos na petição inicial.”


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A Recorrida DRFP optou por não apresentar contra-alegações.

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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

1) Em 18/03/2004, foi celebrada escritura pública de “Cessão de Quotas, Unificação e Transformação em Sociedade Unipessoal” da qual consta que M ………….., Mi …………….. e Ma ………………., únicos sócios e gerentes da sociedade comercial por quotas sob a firma “X……., L……. & F…….., Lda.” cedem a totalidade das suas quotas naquela sociedade a A …………., pelo valor nominal das quotas cedidas, sendo que A ……………. unifica as quotas e transforma a sociedade cedida numa sociedade por quotas Unipessoal sob a firma “A ………… – Sociedade Unipessoal, Lda.” (cfr.fls. 39 a 42, frente e verso, dos autos);

2) Em 18/03/2004 foi celebrado entre Banco ……….., S.A., J ……………, A. …………. e E……………um “Contrato de Abertura de crédito a prazo fixo disponibilizado em conta crédito” no montante de € 2.500.000,00, sendo J ……………… e A…………..o designados por clientes e garantes, pela subscrição duma livrança e E ……………….. designada por garante, pela prestação de penhor de banca seguros (cfr. fls. 147 a 149 v. do processo instrutor junto aos autos);

3) Do contrato identificado no ponto anterior consta, na Cláusula 1ª (Modalidade, Montante e Finalidade) o seguinte: “1. O B... concede um financiamento ao Cliente, que o aceita, até ao montante máximo de EUROS 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil...

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