Acórdão nº 88/2002.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 15-12-2009

Judgment Date15 December 2009
Acordao Number88/2002.L1-7
Year2009
CourtCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
7ª SECÇÃO CÍVEL

I - A instaurou contra o Estado Português a presente acção declarativa, com processo ordinário, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 1.209.495,11, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação, bem como a quantia, a liquidar posteriormente, como indemnização de danos futuros.
Alegou, em síntese, que:
- Foi regulado o poder paternal relativo ao seu filho que foi confiado à guarda de sua mãe, com estipulação de regime de visitas do pai;
- Em 19/07/99, não tendo a mãe cumprido o estabelecido quanto a visitas, o autor suscitou o incidente de incumprimento, na sequência do que foi de imediato decretada a entrega do menor;
- Então, a mãe do menor acusou o autor de actos de pedofilia na pessoa do filho de ambos e requereu, com base nesses mesmos factos, a suspensão do regime de visitas, tanto em sede do incidente de incumprimento, como em sede de alteração ao regime de regulação do exercício do poder paternal em vigor – apenso F -;
- Em 21.09.09 foi proferido despacho onde se ordenou que os autos de incidente de incumprimento – apenso E – aguardassem a prolação de decisão nos autos de alteração de regulação do pode paternal – apenso F -;
- Tendo o autor requerido em 27.09.99 que se retomasse o regime de visitas normal, foi proferido despacho em 2.12.99, sustentando o anterior.
- Houve, em 17.12.99, uma conferência de pais, para acordo, o que é ilegal;
- Por não ter havido acordo, em 23.12.99, o A. requereu a fixação de regime provisório, o que foi indeferido por decisão confirmada em recurso que contra ela interpôs;
- Em 31.01.00, o Hospital designou o dia 27.04.00 para exame pericial aos pais do menor, o qual não se realizou por não ter sido enviada cópia das alegações do A.; tendo depois sido designado para o efeito o dia 31.05.00, o autor não compareceu por não haver sido notificado; tendo-se de novo indicado para realização do exame o dia 11.10.00, mais uma vez o autor faltou por não ter sido notificado.
- Em 9.05.00, o MP, em contra-alegações, sustentou que o pai devia ter visitas supervisionadas pelo IRS;
- Em 27.3.00, foi realizado exame de pedo-psiquiatria, cujo resultado levou à promoção do MP e a despacho que ordenou a entrega do menor ao autor.
- Foi depois proferido o despacho de fls. 406, de 2.08.2001, que fixou o regime de visitas ao A., incumprido pela mãe do menor; houve novo relatório do IRS e novo incumprimento pela mãe do menor, continuando o autor sem estar com o seu filho.
Alega, ainda, que houve erro judiciário, por não existir motivo para a suspensão do regime de visitas, não haver lugar às segundas alegações produzidas, nem necessidade de duplicação de exames periciais; e, ainda, por não se ter usado de urgência no processo, por não se terem executado os despachos proferidos, nem notificado peças processuais e despachos e por se ter dado acesso de todo o processo aos avós paternos, sem necessidade e sem fundamento, com violação da intimidade da vida privada.
Diz ter havido ultrapassagem do prazo razoável e anormal funcionamento, com demora na marcação dos exames periciais, não instrução do processo, não atribuição de carácter urgente ao processo, e não execução das decisões que ordenaram a entrega do menor ao pai.
E sustenta que o dito erro judiciário, a ultrapassagem de prazo razoável e o anormal funcionamento, consubstanciam factos ilícitos, tendo havido também culpa dos magistrados, funcionários e peritos.
Alega que sente grande dor por não ver o seu filho e grande tristeza e frustração, depressão crónica, tendo perdido o interesse pela vida e sofre de insónias, de complexo de perseguição, fobias, instabilidade e perdeu capacidade de trabalho.
Para ressarcimento destes danos de natureza não patrimonial, pede indemnização no valor de 1.000.000,00€.
Diz também que, ao ser impedido de ver o seu filho e face à necessidade de permanecer em … para exames periciais, se viu impedido de cumprir o contrato de trabalho que tinha em …, o que lhe acarretou um prejuízo de 1.200.000$00 mensais, o que até à data perfaz 209.495,11€.

O réu contestou, pedindo a sua absolvição do pedido e a condenação do autor como litigante de má fé.
Houve réplica do autor, pugnando também ele pela litigância de má fé do réu que, por seu lado, apresentou tréplica.
Foi proferido o despacho de fls. 1228 e segs., onde se decidiu: a) atribuir carácter confidencial aos autos, nos termos do artº 168º nº 1 do CPC; b) considerar improcedente a invocada intempestividade da contestação; c) inexistirem nulidades na contestação.
Contra essa decisão recorreu o autor, recurso que foi admitido como agravo, a subir diferidamente.
No seu âmbito, autor e réu apresentaram alegações e foi proferido, a fls. 1253, despacho de sustentação tabelar.
A fls. 1307 e segs. o autor apresentou articulado superveniente em que alega factos ocorridos no processo de regulação do poder paternal que segundo ele, confirmam a sua alegação, tendo o réu pugnado pela sua não admissão.
A fls. 1386, em audiência preliminar, foi deferida a suspensão da instância, requerida pelo autor, suspensão depois reiterada a solicitação do mesmo e declarada cessada a fls. 1570.
A fls. 1573 e segs. o autor apresentou novo articulado superveniente, tendo-se o réu pronunciado pela sua inadmissibilidade.
Em audiência preliminar - fls. 1738 e segs. - foi o primeiro articulado superveniente admitido e o segundo articulado superveniente admitido em parte.
Foi proferido despacho saneador e seleccionou-se a matéria de facto assente, elaborando-se também a base instrutória.
Realizou-se a audiência de julgamento no final da qual se emitiu decisão sobre a matéria de facto levada à base instrutória e, subsequentemente, após alegações apresentadas pelo autor, foi proferida sentença que absolveu o réu do pedido.
Contra ela apelou o autor, tendo apresentado as respectivas alegações onde, além do mais, disse manter interesse no agravo retido.
O M. P. contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

Colhidos os vistos, cumpre decidir, começando-se, de acordo com o imposto no art. 710º, nº 1, do C. P. Civil, pelo conhecimento do agravo, primeiro dos recursos que foi interposto.

II – Do agravo
No seu âmbito, o autor apresentou alegações onde, pedindo que se anule o despacho recorrido e a tramitação processual subsequente, formulou, no que revela interesse para o conhecimento do recurso, conclusões do seguinte teor:
1ª As “questões prévias” consubstanciam uma defesa, quer por impugnação quer por excepção, pelo que deveriam ter sido articulados e especificados (arts. 151º e 488º do CPC).
2ª Não o tendo sido, temos pela nulidade da Contestação (art. 201º do CPC).
3ª Sendo que a decisão recorrida é nula, nos termos do art. 668º, nº 1, al. d) do CPC, por não ter tomado conhecimento da alegada não articulação e especificação das impugnações contidas nas “questões prévias”.
Nas contra-alegações que apresentou, o M. P. sustenta a improcedência do agravo e pede a condenação do agravante como litigante de má fé.
As questões a decidir neste recurso – cujo objecto é delimitado, como se sabe, pelas conclusões formuladas pelo recorrente – traduzem-se em saber se:
a) - a decisão agravada padece da nulidade que o agravante lhe atribui;
b) - se a contestação padece de irregularidade que consubstancie nulidade processual, tal como a define o art. 201º do C. P. Civil.

Sobre a invocada nulidade da decisão agravada:
O agravante, sustentando que a decisão agravada se não pronunciou sobre a questão por ele suscitada da não articulação, pelo réu, da matéria de defesa que alegou em sede de “questões prévias” na contestação e, bem assim, da falta de especificação das excepções que alguns desses factos integram, o que produziria nulidade da contestação, reconduz a situação ao cometimento da nulidade prevista no 668º, nº 1, al. d) do CPC.
É vício das decisões judiciais que ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia ter tomado conhecimento.
Seria na primeira das modalidades previstas que, no caso, se verificaria a nulidade em causa.
É por demais evidente a sua falta de razão, já que o despacho impugnado expressamente conclui que a contestação não enferma de qualquer nulidade, já que o Estado, na sua contestação, se defende apenas por impugnação, pelo que não haveria lugar à individualização de quaisquer excepções.
Temos, assim, que, suscitada pelo agravante a questão de saber se a contestação, pela forma como se mostrava elaborada, padecia, ou não, de vício que produzisse nulidade processual, o tribunal, conhecendo dela, decidiu pela inexistência de qualquer vício que afectasse a regularidade formal daquele articulado.
Daí que não faça o menor sentido atribuir-lhe, como faz o agravante, o vício de falta de pronúncia.
Nesta parte, soçobra, pois, a argumentação do agravante.

Sobre a irregularidade atribuída à contestação:
O recorrente reitera aqui o que já invocara a propósito da regularidade formal da contestação, sustentando que o conteúdo das “questões prévias” aí aduzidas, constituindo defesa por impugnação e por excepção, deveria constar de artigos – art. 151º do C. P. Civil –, especificando-se ainda separadamente a matéria integrante de excepções também aí deduzidas – art. 488º do mesmo diploma.
As denominadas “questões prévias” expostas na contestação versam, a primeira, sobre a confidencialidade dos autos, requerida pelo M. P. ao abrigo do disposto no art. 168º, nº 1 do C. P. Civil, e as demais contêm considerações de natureza factual e jurídica sobre os fundamentos da acção, nelas se negando, sucessivamente, a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual atribuída pelo autor ao Estado nesta acção.
Constituem, indiscutivelmente – estas últimas – matéria de defesa que se não
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