Acórdão nº 878/13.8TJPRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 24-04-2014

Data de Julgamento24 Abril 2014
Número Acordão878/13.8TJPRT.P1
Ano2014
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso de Apelação
Processo n.º 878/13.8TJPRT.P1 [2.ª Vara Cível do Porto]

Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I.
A B…, Lda., pessoa colectiva n.º ………, com sede no Porto, intentou acção declarativa contra C…, com o bilhete de identidade n.º …….., residente em …, pedindo a condenação da ré no seguinte:
a)entregar-lhe imediatamente a casa . do Bairro …, no Porto, livre de pessoas e bens, e a pagar-lhe a quantia de €100,00 mensais, desde a citação até efectiva entrega dessa casa;
b)demolir, no prazo de 15 dias e a expensas suas, as obras que edificou clandestinamente no logradouro da aludida casa, a remover todos os entulhos derivados dessa demolição e a deixar limpo o terreno da sua implantação.
Para tanto, alegou, em síntese, que:
- intentou uma acção declarativa contra a ora Ré, a qual, sob o nº 3809/03.0TVPRT, correu termos na 3ª Vara Cível deste Tribunal;
- na transacção judicial celebrada no âmbito dessa acção, a ora Autora reconheceu a Ré como arrendatária da casa . do prédio urbano denominado Bairro …, no Porto, tendo a Ré reconhecido a Autora como proprietária dessa mesma casa;
- em 24.1.2013, comunicou à Ré a sua intenção de proceder a um aumento da renda, tendo a Ré respondido, em 29.1.2013, que optava pela denúncia do contrato de arrendamento;
- no acordo celebrado na aludida acção nº 3809/03.0TVPRT foi estipulada, a favor da Ré, uma indemnização de €30.000,00, a pagar pela Autora no caso de denúncia do contrato de arrendamento, tendo sido intitulado que a razão dessa indemnização era por benfeitorias realizadas;
- a fixação desse valor de €30.000,00 teve unicamente em vista não uma indemnização por benfeitorias eventualmente realizadas mas apenas a fixação de um quantum indemnizatório pela denúncia antecipada do contrato de arrendamento;
- a Ré recusa-se a entregar à Autora a casa ., invocando direito de retenção sobre a mesma, enquanto não lhe foi liquidada aquela quantia de €30.000,00 a título de benfeitorias por ela realizadas;
- a Autora ainda hoje não reconhece qualquer benfeitoria realizada pela Ré na casa . como passível de indemnização, porquanto nenhuma obra que eventualmente a Ré tenha efectuado no então locado foi susceptível de aumentar o valor do mesmo;
- a Ré, ao exercer direito de retenção, pretende locupletar-se com valores que sabe não lhe serem devidos ou sequer passíveis de serem valorizados, agindo conscientemente com abuso de eventual direito, o que equivale à não existência desses alegados direitos, sejam à indemnização, seja ao direito de retenção;
- no período de ocupação da casa ., a Ré, sem autorização da Autora, edificou obra e edificou espaços clandestinamente na área de logradouro da casa, tendo aí construído um quarto, tratando-se de construções abusivas e clandestinas, devendo a Ré entregar e repor a casa no estado em que a recebeu e com a edificação estritamente inicial.
A Ré contestou, invocando a excepção do caso julgado, com o argumento de que a presente acção é, quanto às partes, à causa de pedir e aos pedidos, idêntica à acção que a Autora intentou contra ela, e que correu termos sob o nº 3809/03.0TVPRT, na 3ª Vara Cível do Porto.
Mais alegou em sua defesa o seguinte:
- na transacção celebrada e homologada por sentença transitada em julgado, as partes fixaram uma indemnização, no valor de €30.000,00, a pagar pela Autora à Ré a título de benfeitorias realizadas, tendo acordado que o pagamento do montante dessa indemnização seria efectuado aquando da entrega das chaves da habitação;
- apesar de o arrendamento se encontrar extinto, a Ré recusa-se a proceder à entrega da habitação, porque a Autora se recusa expressamente a pagar a apontada indemnização;
Na conclusão, defendeu que excepção do caso julgado deve ser julgada procedente e a Ré absolvida da instância. A terminar, deduziu, subsidiariamente, reconvenção, formulando os seguintes pedidos:
a) a Autora seja condenada a pagar-lhe a quantia de €30.000,00, a título de indemnização por benfeitorias (adicionada de juros moratórios legais contados desde a notificação da reconvenção até integral pagamento) ;
b) seja fixado à Autora um prazo para cumprir o pagamento da apontada quantia;
c) seja declarado e reconhecido à Ré o direito de retenção sobre o prédio, pelo tempo necessário, até que seja efectuado o pagamento integral da quantia em dívida a título de benfeitorias.
A Autora replicou, rebatendo a excepção dilatória do caso julgado e pugnando pela improcedência da reconvenção.
Em sede de audiência prévia, uma vez frustrada a conciliação das partes, o Mmo. Juiz a quo proferiu prontamente decisão conhecendo da excepção dilatória e do mérito da acção.
No que tange à excepção dilatória do caso julgado, o Mmo. Juiz a quo decidiu nos seguintes termos:
-julgo parcialmente procedente, por provada, a excepção dilatória do caso julgado deduzida pela Ré (…) e, em consequência, absolvo-a da instância desta acção, no que concerne ao pedido contra ela aqui deduzido pela Autora (…) e mencionado em (…) b), no sentido de a mesma ser condenada «a demolir», no prazo de 15 dias e a expensas suas, «as obras que edificou clandestinamente» no logradouro da casa . do Bairro …, no Porto, «a remover todos os entulhos» «derivados» dessa «demolição» e «a deixar limpo o terreno da sua implantação».
No que concerne à parte restante do pedido da Autora, o Mmo. Juiz conheceu de mérito e decidiu nos seguintes termos:
-julgo a presente acção improcedente, por não provada, e, em consequência, absolvo a Ré (…) do pedido contra ela deduzido pela Autora (…) e aludido em (…) a), no sentido de a referida Ré ser condenada a entregar imediatamente à Autora a casa . do Bairro …, no Porto, livre de pessoas e bens, e a pagar-lhe a quantia de €100,00 mensais, desde a citação até efectiva entrega dessa casa.
Notificada destas decisões, a autora interpôs recurso de apelação, que foi admitido apenas no tocante a este último pedido [alínea a)] julgado improcedente. As respectivas alegações terminam com as seguintes conclusões:
1- A Apelante foi senhoria da Apelada.
2- Nos termos da nova redacção dada ao NRAU (Lei 31/2012 de 14 de Agosto), a Apelante comunica à Apelada e por carta registada C/AR de 24 de Janeiro de 2013, a sua intenção de proceder a um aumento de renda.
3- Em resposta a essa comunicação e por carta de 29 de Janeiro de 2013, veio a Ré a utilizar a faculdade que lhe passou a ser permitida pela redacção dada ao artº 31 nº 3 alínea d) e artº 34º do NRAU, seja comunicar que optava pela denúncia do contrato de arrendamento.
4- Essa denúncia determinará eventual direito a indemnização por benfeitorias realizadas nos termos do possuidor de boa fé – artº 29 nº 2 do NRAU, exercendo a Apelada direito de retenção sobro o imóvel.
5- Anteriormente e em processo que havia corrido termos pela 3ª Vara Cível do Porto, 2ª Secção com o nº 3809/03.0TVPRT, a Apelante havia pretendido reivindicar o prédio em causa da Apelada, acabando por aí reconhecer a Apelada como a legítima arrendatária do seu prédio, a casa . do bairro.
6- A Apelante pretendia então negociar o terreno em que estava inserido o bairro … e a casa arrendada, acordando com a Apelada a forma de, pretendo o prédio devoluto, o conseguir e considerarem o contrato extinto por revogação mútua.
7– Foi celebrado termo de transacção homologado para prever essa mesma possibilidade, contando que fossem observadas determinadas condições, seja a comunicação da Apelante à Apelada com pelo menos 6 meses de antecedência relativamente ao momento pretendido e que a Apelante pagasse à Apelada uma quantia de € 30.000,00 e que referiu ser a título de benfeitorias.
8- Estava estipulado um sinalagma em que uma das partes pagava porque recuperava o espaço nas condições pretendidas e acordadas e não noutras, sempre se estipulando uma antecipação pretendida.
9– No processo alvo de transacção a própria Apelada reivindicava benfeitorias de apenas € 4.000,00.
10- Tinha e tem consciência, bem sabendo que o valor acordado foi apenas para a antecipação do termo do contrato, se ele se viesse a dar nas condições estabelecidas no termo de transacção homologado e transitado em julgado.
11- Bem se entendeu, porque pensamos ser patente tal intenção e ratio do termo de transacção, que a indemnização operaria apenas e só para o caso da Apelante pretender comunicar a intenção de recuperar a sua casa devoluta de pessoas e bens, sem razão que justificasse a extinção do contrato reconhecido.
12- A clausula 3ª da transacção prevê a obrigação de entregar a casa quando for notificada para tal e é com essa entrega que tem direito à indemnização (clausula 5ª).
13- Logo só para esse caso de ter que entregar se for para tal notificada, sendo que nunca a Apelante notificou a Apelada para qualquer entrega.
14– O valor acordado (€ 30.000) foi de tal forma discrepante relativamente ao valor reivindicado a título de benfeitorias (€4.000) e mesmo ao real valor da casa, (cerca de €7.000), que outro entendimento e razão o acordo não pode ter.
15- De outra forma estaríamos, como no caso estamos, perante um efectivo e patente abuso de um aparente direito.
16- Mas esse aparente direito apenas se tornará profícuo no caso de não interpretarmos correctamente o alcance do acordado, o que só por si bastará para determinar a razão da Apelante.
17- O alcance do termo de transacção foi aquele que supre referimos e justificamos, sendo necessário e caso duvidas existam, socorrermo-nos analogicamente das regras interpretativas do direito, seja o artº 9º e 10º do Código Civil.
18- O espírito de quem cria a norma, neste caso a Apelante e a Apelada, terá sempre que determinar o verdadeiro alcance do que foi pretendido, na boa fé e sem abusos.
19- A transacção homologada criou obrigações para ser cumprida nos termos em que foi acordada, funcionando como lei para os seus destinatários.
20- O nº 1 do artº 9º do C. Civil
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