Acórdão nº 875/05.7TBILH.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 31-01-2012
Data de Julgamento | 31 Janeiro 2012 |
Case Outcome | CONCEDIDA EM PARTE |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 875/05.7TBILH.C1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I. Síntese dos termos essenciais da causa e do recurso
AA, viúvo, BB e sua mulher CC, e DD, viúvo, propuseram uma acção forma ordinária contra EE - COMPANHIA DE SEGUROS, SA, FF e sua mulher GG, e HH, pedindo a condenação dos réus no pagamento da quantia global de € 1.402,017,90, acrescida de juros de mora às taxas legais sucessivamente em vigor até efectivo e integral pagamento.
Alegaram, em resumo, que nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas na petição inicial, II, mulher do 1º autor e filha dos 2ºs e 3ºs autores, e JJ, filha do 4º autor, faleceram em consequência de um acidente de viação verificado por culpa exclusiva do condutor do veículo -OM, seguro na ré EE, que, sendo filho dos 2ºs réus, FF e GG, o fazia no interesse e por conta da 3ª ré, HH, sua proprietária.
A ré EE contestou, impugnando por desconhecimento a forma como o acidente se deu, bem como os danos, que reputou exagerados, além de esclarecer que à data do sinistro a propriedade do veículo OM pertencia à firma KK, SA, conforme apólice de seguro que juntou ao processo.
A ré HH também contestou. Invocou a sua própria ilegitimidade por não ser a dona do OM à data dos factos, mas sim a sociedade KK, SA; impugnou por desconhecimento a versão do acidente apresentada na petição inicial, os danos e as indemnizações pedidas; e alegou ainda que o condutor do OM o fazia sem a sua autorização ou conhecimento, pedindo, em conformidade, a sua absolvição da instância ou do pedido.
Os 2ºs réus, FF e sua mulher, não contestaram.
Os autores replicaram, reafirmando a legitimidade de todos os réus e requerendo a intervenção principal de KK - ... PORTUGAL, SA, que foi admitida.
A chamada KK, contestando, invocou a sua própria ilegitimidade por na altura do acidente não ser a proprietária do OM, mas mera entidade financiadora da sua aquisição por terceiro, aderindo, no mais, às restantes contestações; e concluiu pela sua absolvição da instância ou do pedido pelo facto de o veículo OM nunca ter sido conduzido sob as suas ordens e no seu interesse.
No despacho saneador decidiu-se julgar a ré HH parte legítima, mas procedente a excepção de ilegitimidade suscitada pela chamada KK, SA, que por isso foi absolvida da instância.
Realizado o julgamento e estabelecidos os factos foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a ré EE a pagar aos autores a quantia global de € 512.282,30, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a citação até integral pagamento.
Todos os autores e a ré EE apelaram.
Por acórdão de 22/3/11 a Relação de Coimbra deu provimento parcial às apelações e, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a ré a pagar aos autores a quantia global de € 324.782,30, distribuída da seguinte forma:
- Para os autores AA, BB e CC, como herdeiros de II, € 7.895,89 pelos danos patrimoniais causados no património desta;
- Para o autor AA, € 63.000,00 pelos danos não patrimoniais e perda do direito à vida sofridos pela vítima II, ex vi do nº 2 do art.º 496 do CC; € 25.000,00 pelos danos não patrimoniais iure próprio; € 80.000,00 resultantes da perda de alimentos, ex vi dos nºs 1 e 3 do art.º 495 do CC; e € 500 pelos danos patrimoniais próprios;
- Para os autores BB e CC, € 25.000 para cada um, a título de danos não patrimoniais iure próprio, e € 100,00 de danos patrimoniais próprios;
- Para o autor DD, € 63.000,00 pelos danos não patrimoniais e perda do direito à vida de JJ, ex vi do art.º 496, nº 2 do CC; € 25.000 de danos não patrimoniais iure próprio; € 2.786,41 de danos patrimoniais emergentes e, ex vi do art.º 495, nºs 1 e 3, € 7.500,00 pela perda de alimentos que aquela sua filha deixou de lhe prestar.
- Relativamente aos juros de mora, a Relação decidiu o seguinte (que se transcreve):
“Uma vez que, naturalmente, se verifica agora a actualização dos montantes atinentes aos danos não patrimoniais, e, bem assim, das quantias arbitradas a título de perda de alimentos futuros, vai ainda a Ré condenada a pagar aos AA. juros de mora, à taxa anual de 4%, desde esta decisão, sobre cada um dos montantes acima referidos com essa natureza, e desde a citação sobre as restantes importâncias (ou seja, sobre todas as que respeitam a danos patrimoniais que não são designados de perda de alimentos futuros)”.
De novo inconformados, os autores AA e DD interpuseram recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça.
Apresentaram extensas alegações e não menos alongadas conclusões (tudo ocupando, no total, 126 páginas), onde sustentam, no essencial e em resumo, o seguinte:
1º- Pela violação do direito à vida de II deve ser atribuída uma compensação de 120.000,00 € (e nunca inferior aos 80.000,00 € fixados no acórdão recorrido);
2º- Pela violação do direito à vida de JJ deve ser atribuída uma compensação de 110.000,00 € (e nunca inferior aos 80.000,00 € fixados no acórdão recorrido);
3º- Os danos morais do autor AA devem ser compensados, pelo menos, em 50.000,00 € (e nunca em valor inferior aos 35.000,00 € indicados na petição inicial);
4º- Os danos morais do autor DD devem ser compensados, pelo menos, em 50.000,00 € (e nunca em valor inferior aos 35.000,00 € indicados na petição inicial);
5º- Os danos futuros do autor AA devem ser fixados em 600.00,00 € (e nunca num valor inferior a 450.000,00 €, por ser este, aproximadamente, o valor médio das compensações definidas na jurisprudência citada no corpo das alegações);
6º- Os danos futuros do autor DD devem ser fixados em 380.000,00 (e nunca num valor inferior a 190.400,00 € por ser este, aproximadamente, o valor médio das compensações definidas na jurisprudência citada no corpo das alegações);
7º- Os danos patrimoniais da vítima II devem ser fixados, equitativamente, num mínimo de 8.376,00 €, devendo a ré, no limite, ser condenada numa indemnização que tenha por referência o valor de 2,75 €, contado desde a data do acidente até à data do valor a entregar;
8º- À condenação da ré nas diversas quantias peticionadas deve acrescer a condenação em juros de mora desde a data da citação até ao efectivo pagamento.
A recorrida contra alegou, defendendo a manutenção do julgado.
II. Fundamentação
a) Matéria de Facto:
1 - No dia ... faleceu II, que tinha então ... anos de idade, pois nascera em....
2 - No mesmo dia faleceu também JJ, então com ... anos de idade, pois nascera em ....
3 - Também na sequência do acidente ocorrido nesse mesmo dia faleceu LL.
4 - O A. AA é o viúvo da falecida II.
5 - Os AA. BB e esposa CC são, respectivamente pai e mãe da falecida II.
6 - Os três são, também, os seus únicos herdeiros.
7 - O A. DD é o pai da falecida JJ e, também, o seu único herdeiro.
8 - A responsabilidade civil inerente à circulação do veículo ligeiro de passageiros de matrícula -ER, propriedade da II, encontrava-se transferida para a seguradora EE - Companhia de Seguros SA, por efeito da celebração do contrato de seguro, em vigor à data do acidente, com a apólice nº ....
9 - A responsabilidade, pelo menos pelos danos causados a terceiros, na decorrência da circulação rodoviária do veículo -OM, encontrava-se transferida para a ora Ré EE através de contrato de seguro válido e em vigor que tomou a apólice nº ...
10 - À data do sinistro e desde 18/9/00, que a Ré HH figurava registralmente como proprietária do -OM, embora existisse encargo de reserva, desde a mesma data, a favor de MM & Cª, Lda.
11 - No mesmo acidente o veículo ligeiro de passageiros, Opel Corsa, era conduzido por LL.
12 - Cujos pais, FF e GG, são seus herdeiros.
13 - No dia 18/7/02, pelas 9 horas, ocorreu na EN nº 109-7, na ponte da Barra, concelho de Ílhavo, um acidente de viação envolvendo três viaturas ligeiras de passageiros.
14 - O veículo também envolvido no acidente de matrícula -OM, marca Opel, modelo Corsa, adiante designado por OM, era conduzido pelo dito LL.
15 - A estrada onde ocorreu o acidente era e é uma extensa recta, com mais de 1 km, cuja faixa de rodagem tinha e tem 13, 10 metros de largura.
16 - A referida faixa de rodagem possui duas hemi-faixas de rodagem que, por sua vez, tinham e têm duas vias de trânsito, perfazendo desse modo quatro vias de trânsito, sendo duas em cada sentido.
17 - Cada hemi-faixa tinha e tem a largura aproximada de 6,55 metros, pelo que cada via de trânsito tinha e tem cerca de 3,28 metros.
18 - O piso era e é de asfalto betuminoso, encontrava-se seco, liso, e sem quaisquer irregularidades.
19 - A estrada tinha e tem boa visibilidade em mais de 1 Km.
20 - Estava sol e o céu encontrava-se limpo.
21 - A velocidade máxima legalmente permitida e devidamente assinalada naquele local era e é de 50 Km/hora.
22 - Correu os respectivos trâmites no Tribunal da Comarca de Ílhavo, o inquérito nº 133/02.9TBAILH, que foi arquivado ao abrigo do art.º 277, nº 2, do CPP.
23 - Encontrando-se a responsabilidade por danos causados a terceiros pelo veículo OM transferida para a seguradora EE, esta já assumiu a existência de elementos que permitem concluir por uma plena e convicta aceitação da responsabilidade.
24 - Tendo procedido ao pagamento dos danos causados no mesmo acidente ao veículo EC.
25 - O veículo ER, Opel Corsa, ficou em estado insusceptível de reparação e totalmente inutilizado, conforme documenta o valor dos salvados que é de € 0,00.
26 - O veículo encontrava-se em excelentes condições mecânicas e de carroçaria, sendo um veículo comercialmente valorizado por ser citadino, tendo nessa data valor não inferior a € 3.000,00.
27 - A viatura OM ficou completamente destruída.
28 - A viatura EC ficou com a zona frontal completamente destruída.
29 - A vítima II havia contraído casamento com o A. AA em 07/04/2002.
30 - Numa das viaturas envolvidas no acidente - o-ER - seguia como condutora a II.
31 - Acompanhada pela ocupante sua prima JJ.
32 - Ambas vítimas mortais do acidente.
33 - Outra das viaturas - a -EC, marca BMW,...
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