Acórdão nº 873/19.3T8VCT-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 11-11-2020
Data de Julgamento | 11 Novembro 2020 |
Case Outcome | NEGADA A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 873/19.3T8VCT-A.G1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
I. RELATÓRIO
1. AA intentou ação declarativa contra Novo Banco, S.A., Banco de Portugal e Banco Espírito Santo, S.A., pedindo que:
a) Seja declarada válida e relevante, bem como aceite pelas partes, a cessão da posição contratual a favor do primeiro réu do contrato de mútuo e de investimento celebrado e consagrado no extrato de conta junto sob doc. 1, emitido em pleno processo de liquidação de instituição de crédito;
b) Seja julgada inválida e ilegal a deliberação do Banco de Portugal de 29.12.2015 de retransmissão de créditos e títulos preferenciais e não-subordinados para a esfera jurídica do BES por violação das normas legais sobre a retroactividade, cessão de créditos e das normas constitucionais;
c) Seja julgado, no caso de ser entendido como repristinado, o mútuo para a esfera jurídica do BES devido o pagamento do prejuízo sofrido pelo autor pela administração judicial respetiva do BES como dívida da massa;
d) Em consequência, seja o primeiro réu condenado a repor na conta do autor o valor de € 50.160,00, retomando a presente ação todos os seus efeitos;
e) Verificada a ilegalidade da deliberação de retransmissão por parte do Banco de Portugal, sejam todos os réus condenados a pagar solidariamente ao autor o montante de € 50.160,00, acrescido do valor de € 45.000,00 correspondente aos reclamados danos não patrimoniais; e
f) Sejam todos os réus condenados no pagamento dos juros legais, vencidos e vincendos a partir do mês de janeiro de 2018 e a vencer até ao efetivo pagamento.
2. Considerando a possibilidade de vir a proferir decisão de extinção da instância relativamente aos réus BES (por inutilidade superveniente da lide) e Banco de Portugal (por incompetência em razão da matéria), foi ordenada a notificação do autor para se pronunciar, o que este fez, manifestando a sua convicção de que os autos deviam prosseguir os seus normais termos contra os três réus identificados na petição inicial.
3. Em 24.04.2019 foi proferida sentença cujo dispositivo era o seguinte:
“Nestes termos decide-se:
a) Declarar extinta a instância interposta contra o co-réu "Banco Espírito Santo, SA" com fundamento na inutilidade superveniente da lide - artigo 277.º, al. e) CPC;
b) Declarar este Tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer dos pedidos insertos nas als. b) e e) do pedido final, e em consequência absolvendo-se os Réus nesta parte da instância.
Custas a final.
Notifique.
E devendo a acção prosseguir relativamente ao co-réu "Novo Banco, SA" proceda-se à citação do mesmo para os termos da presente acção, incluindo a presente decisão”.
4. Irresignado com esta sentença, o autor interpôs recurso de apelação.
5. Em 28.11.2019, o Tribunal da Relação de Guimarães proferiu Acórdão, em cujo dispositivo pode ler-se:
“Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida”.
6. Ainda irresignado, interpõem agora os autores recurso de revista excepcional [cfr. artigo 672.º, n.º 1, al, a), do CPC], com o fito de obter a revogação do Acórdão recorrido, quanto às decisões de manutenção de extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto ao réu BES e, por incompetência em razão da matéria, quanto ao réu Banco de Portugal, e a prolação de outro acórdão ordenando o prosseguimento dos autos e da instância contra todos os réus demandados, em litisconsórcio necessário.
Terminam as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
“A – Surgem as presentes alegações, no âmbito do recurso de Revista Excecional do douto acórdão com a referência 6734714, datado de 28.11.2019, o qual, confirmou a decisão recorrida que, em sede de gestão inicial do processo, declarou extinta a instância contra o co-Réu Banco Espírito Santo, SA em Liquidação, com fundamento em inutilidade superveniente da lide, e declara igualmente o Tribunal Cível incompetente em razão da matéria para conhecer os pedidos deduzidos contra o Banco de Portugal, e com o que o recorrente continua a não se poder conformar.
B – A presente acção, e tal como resulta dos seus elementos essenciais, causa de pedir e pedido, não constitui uma acção de reclamação de créditos, mas sim uma acção de responsabilidade civil, com base em violação ilícita do direito e interesse legalmente protegido do recorrente, como resulta claramente dos pedidos, aliás reproduzidos no acórdão em recurso.
C – Daqui resulta que o claro objecto da acção não era, contrariamente ao que consta no acórdão recorrido, uma reclamação de créditos deduzida em acção cível contra uma instituição bancária em liquidação, mas antes da verificação de validade e eficácia de uma cessão da posição contratual entre o recorrido Banco Espírito Santo, SA, ainda antes da liquidação e o Novo Banco, SA, cessão de créditos essa que, após ter sido aceite pelo Novo Banco, SA e, depois de ter sido comunicada e aceite pelo recorrente, foi declarada sem efeito, designadamente em função de resolução do Banco de Portugal.
D – O direito do recorrente resulta de ser titular da conta nº 61…0001 sedeada e gerida pelo primeiro recorrente NOVO BANCO S.A., conta essa constituída com o montante total de €52.403,67 e inicialmente aberta no BANCO ESPíRITO SANTO S.A., agora em liquidação, e posteriormente transmitida ao NOVO BANCO S.A. por força da Resolução do Banco de Portugal, datada de 03.08.2014.
E – Nos termos da referida Resolução foram transferidas para o NOVO BANCO S.A. todas as responsabilidades perante terceiros que constituíssem passivos ou elementos extrapatrimoniais do Banco Espírito Santo S.A., salvo os chamados passivos excluídos que integravam créditos ou relações subordinadas ou títulos de responsabilidade subordinada do chamado grupo BES, o que aconteceu, no caso concreto do recorrente, com a subscrição por parte deste por um período de 2 anos renovável, com início a 24.03.2014, dos montantes constantes do extrato junto aos autos, no valor de € 44.000,00 em investimento – modalidade Euro Aforro 8 (ISJN:XS0279081011) daqui resultando que, no momento em que foi proferida a deliberação do Banco de Portugal a 03.08.2014, já existia o investimento do recorrente na esfera Jurídica S.A .
F – Porque existia tal investimento é que o mesmo foi suscetível de ser transferido para o Novo Banco e Integrar a resolução do Banco de Portugal nunca podendo ser transferido para a Administração do Novo Banco S.A. um investimento que não fosse prévio.
G – E foi já com o NOVO BANCO S.A. já constituído e com a responsabilidade de gestão do investimento do recorrente transferida que o NOVO BANCO S.A. assumiu e aceitou conforme extratos de conta juntos aos autos, que teve lugar a ilegal retransmissão de responsabilidades novamente para o BES S.A. pela resolução de 29.12.2015 e aceite pelos Administradores Judiciais do BES, sendo que tal investimento do recorrente tão pouco era subsumível na sua natureza e data de constituição, na clarificação do Banco de Portugal.
H – Essa carteira de títulos sempre foi gerida, com mandato integral e sem representação pelo BES S.A., agora em liquidação, sendo este investimento que, no período inicial decorrido entre 24 de Março de 2014 até ao mesmo dia e mês do ano de 2016, foi renovado automaticamente por 2 anos posteriores, já com a transferência desse mesmo investimento para o Novo Banco, S.A., de acordo com as deliberações do Banco de Portugal.
I – Este enquadramento jurídico manteve-se, e deveria ter-se mantido, durante todo o segundo período de prazo desde 24 de Março de 2016 até 24 de Março de 2018, e assim sucessivamente, até 24 de Março de 2020, até que o Novo Banco S.A. entendesse pôr termo ao investimento financeiro feito com o correspondente reembolso dos valores investidos, tanto mais que o recorrido BES, S.A. em liquidação, aceitou tal tipo de investimento com um rendimento específico de 3,5% ao ano e quando, no âmbito do seu mandato sem representação, investiu tal valor em títulos, fê-lo necessariamente com a natureza de ações preferenciais reguladas especificamente nos artigos 341º e seguintes do CSC.
J – O montante dos juros foi contabilizado com base no valor de investimento de €44.000,00, o que corresponde, por cada período, ao montante de €3.080,00, o que, até ao presente, se traduzia num valor total de €50.160,00, sendo certo que o investimento do recorrente e subsequente subscrição de ações preferenciais, foi sempre realizado no interesse do Banco recorrido em completa autonomia, independência e gestão dos créditos, só assim se compreendendo que a aplicação do investimento do recorrente acabasse também por ser decidida contra a sua vontade.
L – Foi esse direito de crédito, nos termos da Resolução do Banco de Portugal de 03.08.2014, que foi transmitido para o Novo Banco S.A. e correspondendo a todas as responsabilidades perante terceiros que constituíssem passivos ou elementos extrapatrimoniais do Banco Espírito Santo S.A., uma vez que a natureza dos títulos e do antecedente investimento não estavam excecionados na referida resolução, integrando tal figura uma cessão ou transmissão de posição contratual, neste caso ope legis entre o Novo Banco S.A. e o BES S.A., a qual foi aceite pelo recorrente.
M – Foi após a cessão desta posição contratual que o cessionário Novo Banco S.A., perto dos finais do mês de março de 2016, envia uma comunicação ao recorrente a transmitir que o NOVO BANCO S.A., já com plena assunção da posição contratual do contrato de mútuo de prestações recíprocas, iria renovar o investimento por novo período de 2 anos, ou seja, até Março de 2018, o que foi dado sem efeito, proferido o despacho de prosseguimento dos autos de liquidação judicial do BES, S.A., em 21.07.2016, em que o recorrente foi confrontado com uma nova comunicação da agencia bancária do NOVO BANCO de … em que era transmitido que o recorrente passava a constar do número de...
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