Acórdão nº 838/06.5TTMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 09-12-2010
Data de Julgamento | 09 Dezembro 2010 |
Case Outcome | CONCEDIDA A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 838/06.5TTMTS.P1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
I. O autor AA instaurou a presente acção emergente de acidente de trabalho contra a ré BB-Companhia de Seguros, SA, alegando ter sido vítima de um acidente de trabalho do qual lhe resultou, para além de incapacidades temporárias, uma incapacidade permanente parcial para o trabalho e pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 9.357,60 a título de indemnização pelos períodos de incapacidades temporárias e ainda as despesas com tratamentos, consultas, medicamentos, transportes, todas as despesas com outros tratamentos ou encargos que venha a suportar com o acidente e indemnização por incapacidade parcial permanente que lhe venha a ser atribuída.
A ré contestou, alegando que, não obstante a vigência do contrato de seguro à data do acidente, não é responsável pelo pagamento de qualquer quantia ao autor, por o acidente ter ocorrido por violação de regras de segurança por parte do mesmo, devendo, pois, considerar-se o acidente descaracterizado como acidente de trabalho.
Concluiu pela sua absolvição do pedido.
O autor respondeu, defendendo que o acidente não se ficou a dever à inobservância, por si, das normas e condições de segurança.
A Segurança Social deduziu pedido de reembolso no valor de € 5 236,23, pagos ao autor a título de subsídio de doença relativo ao período de 22/05/2006 a 02/07/2007.
A ré contestou este pedido.
Foi proferido despacho saneador e elaborado despacho de condensação.
Após julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e o pedido de reembolso pela Segurança Social improcedente, tendo condenado a ré seguradora a pagar ao autor:
a) com efeitos a partir de 19/05/2006, o capital de remição de uma pensão de €858,14 (oitocentos e cinquenta e oito euros e catorze cêntimos), acrescido de juros à taxa legal desde aquela data até integral pagamento;
b) a quantia de € 371,88 (trezentos e setenta e um euros e oitenta e oito cêntimos) a título de indemnização pelo período de incapacidade temporária absoluta, acrescida de juros de mora à taxa legal desde o seu vencimento até integral pagamento;
c) a quantia de € 1.208,66 (mil duzentos e oito euros e sessenta e seis cêntimos) – a título de indemnização pelas despesas com medicação, exames, tratamentos/consultas, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da tentativa de conciliação até integral pagamento.
Da sentença apelou a R., tendo a Relação do Porto concedido provimento ao recurso, absolvendo a R. do pedido.
II. Inconformado agora o A., interpôs a presente revista, em que formulou as seguintes conclusões:
1ª- O Acórdão do Tribunal da Relação do Porto não julgou correctamente a apelação;
2ª - Tendo, infundadamente descaracterizado o sinistro em causa como acidente de trabalho, imputando ao sinistrado a violação das condições de segurança a que estava obrigado;
3ª - E estabelecendo, até, um paralelismo com uma situação que apelida de "similar" com o decidido pelo STJ no processo n° 323/04.TTVCT.S1, de 23/09/2009, mas que, na verdade, não se lhe assemelha;
4ª- Com efeito, naquele Acórdão do STJ ficou provado que o telhado em causa oferecia perigo de queda em altura porque, nomeadamente, tinha uma inclinação de sete graus e era constituído por chapas translúcidas em plástico, as quais ofereciam fraca resistência ao peso;
5ª- Porém, nos presentes autos não ficou demonstrado que o telhado da garagem onde decorriam as obras de impermeabilização constituísse risco de queda;
6ª - O que somente se provou foi que a cobertura da garagem era composta por telhas de fibrocimento e algumas de plástico translúcidas, com asnas em madeira;
7ª- Nada se tendo provado sobre a inclinação de tal telhado e nada se provando sobre a natureza frágil da sua cobertura;
8ª- Por conseguinte, tal exígua factualidade é insuficiente para se concluir que o mesmo oferecia perigo de risco de queda;
9ª- E só a existência de tal risco é que obriga à adopção das medidas especiais de segurança, não sendo tais medidas obrigatórias só pelo facto de se andar em cima do telhado;
10ª- Ou seja, para o Recorrente ser obrigado a colocar tábuas de rojo, ou passadiços, ou, em alternativa, a usar cinto de segurança, competia à Recorrida alegar e provar que, no caso concreto, as circunstâncias de perigo de queda se verificavam;
11ª- O que não sucedeu, pois não se apurou que as telhas de fibrocimento e até as telhas de plástico não tivessem resistência para suportar o peso do Recorrente;
12ª- Ficando por demonstrar, além do mais, o estado de conservação das telhas, o modo como se encontravam assentes, a sua concreta dimensão e robustez, ignorando-se, também, o peso do Recorrente;
13ª- Além disso, nem sequer ficou apurado que o Recorrente tivesse necessidade de caminhar sobre as telhas de plástico para desenvolver a tarefa em causa, bastando-lhe caminhar sobre as telhas de fibrocimento;
14ª- Em suma, não se pode concluir, como no douto Acórdão proferido, que o Recorrente estivesse obrigado a colocar tábuas de rojo sobre as telhas ou, em alternativa, a usar cinto de segurança;
15ª- Falecendo, por isso, redondamente, a alegada descaracterização do acidente como acidente de trabalho, tal como foi doutamente decidido em primeira instância;
16ª- O Acórdão proferido violou as disposições legais contidas no artigo 44° do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil aprovado pelo Decreto n° 41821, de 11/08/58;
Pediu a revogação do acórdão recorrido, com a repristinação da decisão proferida em primeira instância.
A R. contra-alegou, defendendo a confirmação da decisão recorrida.
No seu Parecer, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo pronunciou-se no sentido de ser revogado o acórdão recorrido, com a repristinação do decidido na sentença.
A R. pronunciou-se sobre tal Parecer, defendendo a confirmação do julgado.
III. Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, o objecto dos recursos, é delimitado pelas respectivas conclusões (art.ºs 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1 do CPC, na redacção vigente em 10.10.2006 – data da participação em juízo do acidente – a aplicável), está em causa saber se é de descaracterizar ou não o acidente de trabalho sofrido pelo A., por alegada violação, pelo mesmo, de regras de segurança no trabalho.
O acórdão recorrido deu como provados os factos discriminados a fls. 370 e 371, que aqui se dão por reproduzidos, de que, para a apreciação a levar a cabo no presente recurso, interessa reter os seguintes:
1) O autor é sócio gerente da sociedade comercial CC, Construção Civil, Lda.
3) Por contrato de seguro titulado pela apólice n° …, a CC, Construção Civil, Lda, tinha transferido a sua responsabilidade emergente de acidentes de trabalho, incluindo os sofridos pelo autor, para a ré,
4) O autor caiu desamparado para o interior do prédio vizinho e embateu contra o chão daquele prédio, de uma altura superior a três metros.
10) Além da gerência, o autor exerce serviços de fiscalização e acompanhamento das obras de construção civil que a CC, Construção Civil, Lda adjudica.
11) O autor subiu ao telhado de um prédio contíguo ao prédio em que decorriam as obras.
12) O autor calcou com os pés umas telhas em plástico, as quais não aguentaram o peso do seu corpo, tendo cedido.
21) No dia 29/04/2006, cerca das 15 horas, o autor encontrava-se na Rua ..., …, Perafita, a executar a tarefa que tinha sido adjudicada à CC, Construção Civil, Lda.
22) A obra que decorria no local consistia em impermeabilizar o telhado da garagem.
23) O autor colocou o pé em cima de uma telha de plástico translúcida que distava cerca de 1 metro do local em que se encontrava, a qual de imediato se quebrou.
24) Tendo originado que o autor caísse.
25) Tendo antes batido noutra telha de fibrocimento que também partiu.
26) O local onde o autor caiu localiza-se por trás e contiguamente aos anexos da casa, que estava a ser remodelada na parte de trolha e pedreiro.
27) Como o dono da obra pretendia colocar um rufo para evitar a penetração de humidade no vizinho, o autor subiu ao telhado dos anexos em remodelação e passou para o telhado da garagem, composto de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO