Acórdão nº 829/05.3PJLSB-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 02-03-2011

Data de Julgamento02 Março 2011
Case OutcomeNEGADO PROVIMENTO
Classe processualRECURSO DE REVISÃO
Número Acordão829/05.3PJLSB-A.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

No âmbito do processo comum com intervenção de tribunal singular n.º 829/05.3SPJLSB, do 4.º Juízo Criminal - 3.ª Secção, da Comarca de Lisboa, foi submetido a julgamento o arguido AA, que, por sentença de 24 de Fevereiro de 2010, constante de fls. 224 a 228, depositada no mesmo dia - fls. 229 - foi absolvido do crime de furto, p. p. pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, que lhe era imputado, em autoria material, pelo Ministério Público, bem como do pedido de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais deduzido pelo assistente e demandante cível, BB.

Foi ainda decidido na referida sentença, após a absolvição do demandado cível AA, do pedido, o seguinte: «Custas cíveis pelo assistente BB – cfr. Art. 446.º, n.ºs 1 e 2, do CPC – por às mesmas ter dado causa».

Em 29 de Junho de 2010 o assistente/demandante cível interpôs o presente recurso extraordinário de revisão, requerendo que as alegações sejam proferidas por escrito, com base nos fundamentos constantes de fls. 2 a 10, apresentando as seguintes conclusões (em transcrição):

A. O Tribunal violou o artigo nº 313º/1b) do CPP, ao omitir os factos e disposições aplicáveis.

B. Nos termos do art°313º/3 do CPP, a forma de notificação da notificação do despacho que designa a data de Audiência e julgamento efectua-se via postal simples se no decurso do processo o notificando não tiver alterado a residência, como é o caso, o que não aconteceu, omitindo-se a notificação, violou o Tribunal este preceito;

C. Nos termos do art° 113°/9 CPP, as notificações relativas a marcação de audiência e sentença devem ser notificadas tanto ao Assistente como ao seu mandatário; entendeu o Tribunal que não seria necessário proceder à notificação do Assistente, tendo em conta que teria notificado o seu mandatário, conforme consta da acta de audiência de 10 de Fevereiro de 2010, com este facto, violou a referida norma que impõe que aquelas notificações devem ser realizadas para ambos os intervenientes;

D. Tendo marcado uma nova hora para a segunda data de marcação, para continuação da diligência, em plena violação do art.º113º/9 CPP e do art.º 328º/7 do CPP, não mandou notificar os faltosos, pois apenas os presentes devem ser considerados notificados da interrupção ou adiamento;

E. O Tribunal omitiu as notificações relativas à prolação de sentença, deixando de notificar quer o Assistente, quer o seu Mandatário, com o que, mais uma vez, violou o art.º 113º/9 CPP;

F. Ao decidir que a presença do Assistente era essencial para a correcta averiguação de quem cometeu aquele crime, ou se o Arguido cometera aquele crime, o Tribunal a quo contradisse o despacho proferido em sede de audiência em que justifica o facto de não adiar a diligência, por inexistência de fundamento, nos termos do art.º331º/1 e 330°/2 ambos do CPP, o que implica que a presença do Assistente era indispensável à boa decisão da causa, ao que, deveria o Tribunal ter decidido pelo Adiamento nos termos do art.º 331º/3 do CPP, diligenciando pela notificação do Assistente, que havia sido omitida;

G. Ao declarar em sede de Sentença que a Audiência de discussão e julgamento foi efectuada, com observância de todo o formalismo legal, o Tribunal A Quo decide erroneamente pela inexistência de irregularidades e nulidades que obstem ao imediato conhecimento do mérito da causa, ignorando as nulidades processuais constantes do processo, nomeadamente as nulidades referentes às notificações, viola esta decisão o art° 122º/l do CPP que prevê que a declaração de nulidade resultante da omissão das notificações obrigatórias, importa na nulidade de todos os actos subsequentes, incluindo o a Audiência de Julgamento e a própria Sentença, que são por esta via NULOS;

H. Em cumprimento do disposto no art° 122º/2, a declaração de nulidade dos actos subsequentes aos actos feridos por este vicio deve ser sanada com a repetição do Julgamento, cumprindo-se as formalidades legalmente previstas com o que se fará Verdadeira Justiça!

O Ministério Público junto do 4.º Juízo Criminal de Lisboa apresentou resposta, nos termos constantes de fls. 19 a 22, propugnando pela rejeição do recurso, e concluindo:

1. O presente Recurso, interposto pelo Assistente nos autos, respeita a diversas decisões proferidas nos autos em momentos bem distintos, pelo que até parece não ser da Douta Sentença do processo, já que são referidas outras Decisões entretanto eventualmente transitadas em julgado, o que se estranha.

2. Acresce que o meio processual escolhido pelo Assistente é manifestamente errado, uma vez que o Recurso de Revisão é, por natureza, excepcional, pelo que o respectivo regime, constante dos arts. 449° e segs. do CPP, tem uma previsão bem delimitada na lei.

3. Nessa conformidade, as situações em que tal meio processual é admitido constam de uma enumeração taxativa, ínsita no art 449° do CPP.

4. Ora, as motivações de Recurso apresentadas pelo Assistente não podem ser integradas em qualquer das alíneas do referido Preceito Legal.

5. Nesta conformidade, o meio processual utilizado pelo Assistente é manifestamente inadmissível e inadequado, pelo que o presente Recurso deve ser rejeitado liminarmente.

6. Pelo que, deverá ser mantida a Douta Decisão recorrida.

O Exmo. Juiz emitiu parecer nos termos do artigo 454.º do Código de Processo Penal, em despacho manuscrito, a fls. 23 e verso, nestes termos:

«Ao abrigo do disposto no art. 454.º do CPP, refere-se que o recurso de revisão de que o assistente lançou mão para reagir contra a decisão de absolvição proferida no autos principais é manifestamente inadmissível e inadequado.

Concorda-se integralmente com o exposto na resposta do digníssimo Magistrado do M. P., sendo que o peticionado pelo arguido não encontra eco, ou se encontra fundamentado numa das alíneas do art. 449.º, n.º 1, do C.P.P.

Refira-se por fim, que as nulidades invocadas pelo arguido encontram-se apreciadas a fls. 259 e 260, tendo o tribunal indeferido as mesmas».

Foi solicitado o envio do processo principal.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, de fls. 59 a 62, onde consigna que: (Transcreve-se na íntegra o parecer por analisar toda a situação do processo e sobretudo, de forma cirúrgica, apontar os elementos relevantes a tomar em consideração num processo que passou quase completamente “a latere” do assistente/demandante cível, à margem do seu conhecimento. De nossa responsabilidade são os realces a negrito)

«BB, em 28.06.2010 (fls. 13), interpõe um recurso, pagando taxa de justiça e multa (fls. 11, 12 e 14, 15), requerendo as alegações por escrito mas a que chamou recurso extraordinário de revisão (fls. 2).

As conclusões do requerimento que delimitam o conhecimento do recurso conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, só nos levam no sentido de recurso ordinário, pois as normas violadas - arts. 313°, n° 1 al. b), n° 3, 328°, n° 7, 113°, n° 9, 330°, n° 2 e 122°, n° 2 do C.P.P., apenas poderão ser defensáveis nesse tipo de recursos e não cabem em nenhum dos fundamentos p. no art. 449, n° 1 do C.P.P..

Também parece resultar quer dos fundamentos da motivação quer da informação do Mmº Juiz e da resposta do MP ou ainda do processo principal que a decisão absolutória poderia não ter transitado pois dela não foi notificado o assistente (nem o seu advogado), quando o arguido, tendo estado presente na leitura (fls. 230), foi notificado de tal decisão, por via postal simples (em 23.03.2010 - fls. 232).

E, por isso, o assistente interpõe recurso e a 3.ª Secção certamente considerou que já tinham passado os 20 dias, mas que ainda estava dentro do prazo p. no art. 145° do C.P.C, e por isso, além da taxa de justiça, foi paga a multa.

Para melhor contextualizar resumirmos os factos do processado principal.

Os factos que originaram a queixa do assistente BB ocorreram na noite de 2.08.2005, tendo sido deduzida acusação em 1.02.2006 contra AA por autoria de um crime de furto simples.

Em 27.07.2006 foi, pelo Mm° Juiz, recebida a acusação e admitido o pedido cível, mas não foi designado dia para julgamento.

Passados quase 2 anos, em 28.05.2008, por não “haver” disponibilidade na agenda foi marcada a realização da audiência em 12.01.2011, 13h 30m ou em 20.01.2011 à mesma hora.

Em 15.10.2009 em cumprimento do provimento n° 4/2009, para maior celeridade foram alteradas as datas para realizações das audiências de julgamento para 10.02.2010 ou 17.02.2010 às 14 h.

Em 1.02.2010 o MP prescindiu da testemunha Pedro, por residir em Londres e a mesma não ser notificada por via de carta registada!!

As notificações do Assistente foram sempre remetidas para a morada indicada na queixa da P.S.P., embora até para prestar declarações em inquérito fosse conhecido que o local de trabalho era na Suécia e foi de lá que veio. Por isso nunca foi notificado das diversas datas de julgamento.

Os serviços (e o MP) em vez de solicitarem informações ao advogado constituído pelo assistente, solicitaram informação à P.S.P.!!

Finalmente em 10.02.2010 começou a audiência de julgamento, estando presente apenas, o arguido AA, tendo-lhe sido nomeado um defensor.

A Digna Magistrada do MP requereu no inicio da audiência com prévias diligências para apurar o actual paradeiro do Assistente, agora através do seu bilhete de identidade e do tribunal, sem ter sido tomado em conta quer o pedido cível quer as declarações em inquérito, nem do advogado constituído. No entanto e apesar de desde 3.01.2006, tomada de declarações (fls. 125) nunca mais ter sido contactado, é referido tal promoção que “tudo indica que há manifesto desinteresse”!!

Mas afinal pelo Bilhete de Identidade, cuja pesquisa não terá ocorrido durante o julgamento, como é referido, mas sim ao fim da tarde - 18h 12m 30 s foi, finalmente, descoberta a residência do Assistente, em Estocolmo (fls. 2l6).

No entanto foi decidido que inexistia fundamento para o adiamento da audiência,...

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