Acórdão nº 82/09.0PELSB.2.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 20-10-2022
Data de Julgamento | 20 Outubro 2022 |
Case Outcome | NEGADO PROVIMENTO. |
Classe processual | RECURSO PENAL |
Número Acordão | 82/09.0PELSB.2.L2.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Proc. n. º 82/09.0PELSB.2.L1.S1
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:
I
Relatório
1.1. No Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa (Juízo Central Criminal ... — Juiz ...) foi julgado, em audiência de discussão e julgamento, ao abrigo do disposto no art. 472.º, do CPP, o arguido AA e, por acórdão de 23.06.2022, foi condenado na pena única conjunta de 12 (doze) anos de prisão, resultante do cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos n.ºs 82/09.... (estes autos), 823/.06.7..., 1759/08...., 522/08...., 141/06.... e 8683/10.....
1.2. Este acórdão foi prolatado após acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05.05.2022, que decidiu o recurso do Ministério Público e declarou nulo o acórdão recorrido (do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, de 10.12.2021), porque “o acórdão recorrido não só nunca se refere aos factos provados no âmbito do processo n.º ...0..., como não nos esclarece porque não integrou a pena aplicada no processo n.º ...6..., apesar de o referir no elenco dos factos provados (cf. facto provado 2), entende-se que o acórdão é nulo, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379.º, nº 1, al. c), do CPP.“
2. Inconformado com o acórdão de 23.06.2022 do Tribunal Judicial ..., o arguido AA vem recorrer para este Supremo Tribunal de Justiça da pena única aplicada, tendo concluído nos seguintes termos:
«1-O recurso incide sobre a douta sentença que condena o Arguido em CUMULO JURÍDICO na pena única de 12 (DOZE) ANOS DE PRISÃO.
2 - Para o cúmulo de penas foram levadas em consideração os seguintes processo:
A - Nestes processo foi condenado por factos praticados em 2007, por Acórdão de 08 de Novembro de 2019, na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
B - O arguido foi condenado no processo n.s 522/08...., por factos praticados em 2007, por sentença de 3/12/2013, transitada em julgado em 17/06/2016, na pena de 15 meses de prisão.
C- O arguido foi condenado no processo n.º 823/06...., por factos praticados em 2004, por Acórdão de 21/11/2011, transitado em julgado em 16/09/2013, na Pena única: seis anos e dois meses de prisão.
D - No âmbito do processo n.º 17..., por factos praticados em 2007, por sentença de 5/11/2012, transitada em julgado em 30/09/2013, na pena única: dois anos e três meses de prisão.
E - O arguido foi condenado no processo n.º 8683/10...., por factos praticados em 2010, por acórdão, transitado em julgado em 03/06/2019, na pena de 3 anos de prisão (um crime), 1 ano e seis meses de prisão (três crimes) e 9 meses de prisão (dois crimes).
F) O arguido foi condenado no processo n.º 141/06...., por factos praticados em 2005, por acórdão transitado em julgado em 23/05/2012 na pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução e revogada em 2015
3 - Do relatório social destaca-se que o seguinte:
- Reconhece a pertinência da intervenção judicial revela em abstraio capacidade critica c reconhece o bem jurídico cm causa;
- Mantém em meio prisional um comportamento consentâneo com as regras institucionais, participando no coro de cantares alentejanos no E P ....
- Tem apoio familiar, recebe visitas da filha, da mãe, da namorada e da família desta última (filhos c netos).
- Em situação de reclusão, o arguido é tido como educado, correcto c colaborante, mantendo um percurso institucional adequado.
- Revela capacidade de relacionamento interpessoal e comunica com facilidade.
- Manifesta interesse em ocupação laboral, o que ainda não ocorreu por causa não lhe imputável, participando pontualmente cm actividades de âmbito sócio-cultural.
- Recebe visitas regulares da mãe, da filha c da companheira c não regista qualquer reparo disciplinar.
4 - A moldura do concurso não passa pela determinação das penas singulares. Tudo se passa como se fosse um crime único, referido a um determinado agente, porque o que interesse é a personalidade do agente;
5 - A medida concreta da pena do concurso, dentro da moldura abstracta aplicável, a qual se constrói a partir das penas aplicadas aos diversos crimes, é determinada, tal como na concretização da medida das penas singulares, em função da culpa e da prevenção, mas agora levando em conta o critério específico do Art° 77°, n° 1 do Código Penal "são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente".
6 - A visão atomística inerente á determinação da medida das penas singulares, sucede uma visão de conjunto, em que se consideram os factos na sua totalidade, como se de um facto global se tratasse;
7 - Como refere o Prof Figueiredo Dias "Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique".
8 - A moldura abstracta será: Limite mínimo: 5 anos e 2 meses e como limite máximo 25 anos de prisão.
9 - Há que considerar que no caso concreto:
- Muitos dos factos reportam-se a 2004,2007 e 2010, isto é, há mais de quinze anos;
- É certo que alguns dos factos revelam alguma gravidade;
- A intensidade do grau de culpa: dolo directo em todos os crimes de elevada intensidade;
- O lapso de tempo decorrido entre os factos julgados em todos os processos;
- A situação pessoal do arguido apurada no relatório social;
- O sentido crítico do Arguido em relação à sua actuação.
10 - Ponderando os factos numa perspectiva global constatamos que as condenações do arguido revestem elevada gravidade, atenta a forma e as circunstâncias em que os factos foram praticados.
11 - Mesmo assim não nos parece prementes as exigências de prevenção geral.
12 - No que respeita a prevenção especial, dúvidas não subsistem que em face dos factos provados, o arguido não carece de socialização, tendo-se em vista a prevenção de comportamentos similares.
13 - Tudo ponderado, entendemos adequado a aplicação ao arguido a pena única de 10 anos.
14 - Violou por isso a douta decisão recorrida as normas constantes dos Art° 50° n° 1 e 2, 70°, 71° e 77°, todos do Código Penal.
NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao recurso e alterar-se a douta sentença recorrida,
Porém, V.Exas., apreciarão e decidirão como for de JUSTIÇA.»
3. O Ministério Público junto do Juízo Central Criminal ... respondeu concluindo que “a pena é adequada e justa” pelo que deve “ser negado provimento” ao recurso.
4. Subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o Senhor Procurador-Geral Adjunto no Supremo Tribunal de Justiça emitiu parecer concluindo que o recurso deve ser julgado improcedente, porquanto:
«(...) O Tribunal a quo teve em consideração todos os elementos a que deveria atender, patenteando-se, como se vê, uma análise cuidada e objectiva da situação vertente, configurando-se correctas a ponderação e a valoração da ilicitude do facto e da culpa do agente, e respectivos graus, das circunstâncias que rodearam a prática dos factos, bem como das exigências de prevenção geral e especial, havendo que concluir, como tal, que a pena única aplicada respeita os parâmetros decorrentes dos critérios legais fixados nos artigos 40.º, 71.º e 77.º, do Código Penal, sendo justa, adequada e proporcional à gravidade dos factos e à perigosidade do agente, não se descortinando fundamento para que a mesma seja alterada.»
5. O arguido foi notificado ao abrigo do art. 417.º, n.º 2, do CPP, e não respondeu.
6. Colhidos os vistos, e não tendo sido requerida a audiência de discussão e julgamento, o processo foi presente à conferência para decisão.
II
Fundamentação
A. Matéria de facto
Na decisão recorrida, são dados como provados os seguintes factos:
«A – Factos Provados:
Das certidões juntas aos autos e do certificado de registo criminal do arguido, resultam assentes os seguintes factos:
1. O arguido foi julgado e condenado por decisões transitadas em julgado no âmbito dos seguintes processos:
a) O arguido foi condenado nos presentes autos, por factos praticados em 2007, por Acórdão de 08 de Novembro de 2019 pela prática, em concurso efectivo de infracções, de:
1 (um) crime de associação criminosa p. e p. pelo art. 299.º, n.º 1, do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão;
1 (um) crime de burla qualificada p. e p. pelos arts. 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, al. a), ambos do CP, na pena de 4 (quatro) anos de prisão (“V..., Lda.”);
1 (um) crime de burla simples p. e p. pelos arts. 217.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano de prisão (“D..., Lda.”);
Em o cúmulo jurídico das penas parcelares acima impostas, foi condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Por acórdão do Tribunal da Relação de 29.04.2021, transitado em julgado em 30.05.2021, foi o arguido absolvido da prática do crime de associação criminosa.
b) O arguido foi condenado no processo n.º 522/08...., por factos praticados em 2007, por sentença de 3/12/2013, transitada em julgado em 17/06/2016, pela prática um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pelo artigo 11.º, n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28/12 na pena de 15 meses de prisão.
c) O arguido foi condenado no processo n.º 823/06...., por factos praticados em 2004, por Acórdão de 21/11/2011, transitado em julgado em 16/09/2013 pela prática de:
- Um crime de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.º, n.º 1, 218.º, n.º 2, al. a) e 202.º, al. b) do Código Penal: cinco anos e dois meses de prisão;
- Um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, al. a) do Código Penal: 10 meses de prisão;
- Um crime de emissão de cheque sem provisão, previsto e punível pelo artigo 11.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-lei n° 454/91, de 28 de Dezembro: um ano e dois meses de prisão;
- Pena única: seis anos e dois meses de prisão.
d) O arguido foi condenado no âmbito do processo n.º 1759/08...., por factos praticados em 2007, por sentença de 5/11/2012, transitada em julgado em 30/09/2013, pela prática de:
- Dois crimes de emissão de cheque sem provisão, previsto e...
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