Acórdão nº 8/11.GCODM.S1 de Tribunal da Relação de Évora, 16-10-2012
Judgment Date | 16 October 2012 |
Acordao Number | 8/11.GCODM.S1 |
Year | 2012 |
Court | Court of Appeal of Évora (Portugal) |
ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SUBSECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DE ÉVORA
1. RELATÓRIO
A – Decisão Recorrida
No processo comum colectivo nº 8/11.GCODM.S1, da Comarca do Alentejo Litoral, Odemira, o M.P. deduziu acusação contra o arguido A, pela prática, em autoria material, na forma consumada e concurso efectivo, dos seguintes crimes :
- vinte e três ( 23 ) crimes de abuso sexual de crianças agravado, p.p. pelos Artsº 171 nsº 1 e 2, 177, nº1, al. a), e 179 al. a), todos do CP ;
- um ( 1 ) crime de abuso sexual de crianças agravado, p.p. pelos Artsº 171 nsº1 e 2, 177 nsº 1, al. a), 4 e 7, e 179 al. a), todos do CP ;
- três ( 3 ) crimes de abuso sexual de abuso sexual de menor dependente agravado, p.p. pelos Artsº 172 nº1, 177 nº1 al. a) e 179º al. a), todos do CP ;
- um ( 1 ) crime de abuso sexual de abuso sexual de menor dependente agravado, p.p. pelos Artsº 172 nº1, 177 nsº 1, al. a), 4 e 7, e 179 al. a), todos do CP;
- um ( 1 ) crime de aborto, p.p. pelo Artº 140 nº1 do CP e
- quatro ( 4 ) crimes de violência doméstica, p.p. pelo Artº 152 nsº1 als. b) e d), 2 e 4 a 6, do CP.
O Ministério Público, em representação da menor B ,deduziu ainda pedido de indemnização civil contra o arguido peticionando a condenação deste no pagamento àquela da quantia de € 50.000,00 ( cinquenta mil euros ) a título de indemnização por danos morais.
Efectuado Julgamento, foram a acusação e o pedido de indemnização civil julgados parcialmente procedentes, por provados, e, em consequência :
Foi o arguido absolvido da prática de 2 ( dois ) dos 23 ( vinte e três ) crimes de abuso sexual de crianças agravado, p.p. pelos Artsº 171 nsº1 e 2, 177º, nº1 al. a) e 179 al. a), todos do Código Penal e de 1 (um) dos 3 (três) crimes de abuso sexual de abuso sexual de menor dependente agravado, p.p. pelos Artsº 172 nº1, 177º nº1 al. a) e 179 al. a), todos do Código Penal, pelos quais vinha acusado.
Foi o arguido condenado :
- pela prática, entre o verão de 2004 e 23/01/10, como autor, em concurso real, de 21 ( vinte e um ) crimes de abuso sexual de criança, agravados, p.p. nos termos das disposições conjugadas dos Artsº 172 nsº1 e 2, 177 nº1 al. a) e 179 do Código Penal, na redacção anterior à conferida pela Lei nº 59/07, de 04/09, no caso dos crimes praticados antes de 15/09/07 e dos Artsº 171 nsº1 e 2, 177 nº1 al. a) e 179 al. a), todos do Código Penal, na actual redacção, conferida pela mencionada lei, na pena de 5 ( cinco ) anos de prisão por cada um ;
- pela prática, como autor, entre Outubro e Dezembro de 2007, de 1 ( um ) crime de abuso sexual de criança agravado p.p. nos termos das disposições conjugadas dos Artsº 171 nsº1 e 2, 177º nº 4 e 179 al. a), todos do Código Penal, na pena de 5 ( cinco ) anos e 8 ( oito ) meses de prisão;
- pela prática, entre 23/01/10 e Setembro de 2010, como autor, em concurso real, de 2 ( dois ) crimes de abuso sexual de menor dependente, agravados, p.p. nos termos das disposições conjugadas dos Artsº 172 nº1, 177 nº1, al. a) e 179º, al. a), todos do Código Penal, na pena de 2 ( dois ) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um ;
- pela prática, como autor, em Setembro de 2010, de 1 ( um ) crime de abuso sexual de menor dependente agravado, p.p. nos termos das disposições conjugadas dos Artsº 172 nº1, 177 nº4 e 179 al. a), todos do Código Penal, na pena de 2 ( dois ) anos e 8 ( oito ) meses de prisão;
- pela prática, como autor, em Fevereiro de 2010, de 1 ( um ) crime de aborto p.p. Artº 140 nº1, do Código Penal, na pena de 3 ( três ) anos de prisão;
- pela prática, como autor, de 4 ( quatro ) crimes de violência doméstica, p.p. nos termos do Artº 152 nsº1, als. b) e d), 2, 4 e 6, do Código Penal, na pena de 2 ( dois ) anos e 6 ( seis ) meses de prisão por cada um.
Em cúmulo jurídico de todas estas penas, foi o arguido condenado na pena única de 14 ( catorze ) anos e 10 ( dez ) meses de prisão.
Em sede de indemnização civil, foi o arguido condenado a pagar à demandante a quantia de € 50.000,00 ( cinquenta mil euros ), a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Mais decidiu o Tribunal Colectivo, decretar a inibição do poder paternal do arguido relativamente à sua filha B pelo período que falta até a mesma atingir a maioridade, ao abrigo do disposto nos Artsº 179 al. a) e 152 nº6, ambos do Código Penal.
B – Recurso
Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido, direccionando o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído as respectivas motivações da seguinte forma ( transcrição ) :
I - O arguido entende que relativamente aos crimes de abuso sexual de crianças e abuso sexual de menores dependentes e pelos quais foi condenado, é de aplicar a figura do crime continuado, nos termos do art.º 30º do C.Penal, pois verificam-se os pressupostos do mesmo ;
II - Logo, por aqueles crimes, deverá o arguido ser condenado em penas inferiores aquelas que foram efectivamente aplicadas;
III - O arguido discorda das penas parcelares aplicadas na condenação dos restantes crimes imputados, por as mesmas serem manifestamente excessivas e não traduzirem toda a factualidade dada como provada e não levarem em linha de conta todas as atenuantes que militam a favor do arguido;
IV - Como consequência a pena única aplicada e depois de operado o cúmulo jurídico, é excessiva, pois não levou em conta algumas atenuantes que beneficiavam o arguido;
O douto acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” violou, assim, o disposto nos arts.º 30º, 40º e 71º, todos do Código Penal.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se o douto acórdão na parte que ora se recorre.
C – Resposta ao Recurso
O M. P, junto do tribunal recorrido, respondeu ao recurso, concluindo do seguinte modo ( transcrição ):
I - A conduta criminosa do arguido Fernando Jorge Gonçalves Vaz não se amolda à figura jurídica do crime continuado.
II - A medida concreta das penas, parcelares e única, cominadas ao arguido é equilibrada e ajusta-se à estigmatização da sua actuação e aos critérios legais dos artigos 40.º, 71.º e 77.º do Código Penal.
III - O tribunal colectivo fez uma correcta interpretação e aplicação da lei.
IV - Nenhuma das críticas que o arguido aponta ao douto acórdão é, por isso, merecida.
V. Exas, no entanto, com mais elevada prudência e sabedoria, decidirão, como sempre, a habitual Justiça.
D – Tramitação subsequente
Recebido o recurso no Tribunal recorrido, foi o mesmo remetido ao Supremo Tribunal de Justiça.
Aí, foi decidido que esse Alto Tribunal não era o competente para conhecer do recurso, na medida em que o mesmo colocava a questão de direito da subsunção á figura do crime continuado dos crimes de abuso sexual de criança agravado e de abuso sexual de menor dependente agravado, pelos quais o arguido foi condenado em penas, ( à excepção de um deles ) iguais ou inferiores a 5 anos de prisão e ainda, a questão da redução das penas parcelares em foi condenado pelos restantes crimes, todas elas, em medida inferior a 5 anos de prisão.
Em consequência e ainda que com um voto de vencido, foi determinado que os autos fossem remetidos a esta Relação por ser a competente para o conhecimento do recurso.
Aqui recebidos, foram os autos com vista á Exma Procuradora Geral Adjunta, que afirmou concordar com as razões invocadas pelo MP na 1.ª instância para a manutenção da decisão recorrida.
Observado o disposto no Artº 417 nº2 do CPP, não foi apresentada resposta.
Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
A – Objecto do recurso
De acordo com o disposto no Artº 412 do CPP e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no D.R. I-A de 28/12/95 ( neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/"www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria ) o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Na verdade e apesar do recorrente delimitar, com as conclusões que extrai das suas motivações de recurso, o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, este contudo, como se afirma no citado aresto de fixação de jurisprudência, deve apreciar oficiosamente da eventual existência dos vícios previstos no nº2 do Artº 410 do CPP, mesmo que o recurso se atenha a questões de direito.
As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem, assim, da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no nº 2 do Artº 410 do CPP, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no nº1 do Artº 379 do mesmo diploma legal.
In casu e cotejando a decisão em crise, não se vislumbra qualquer uma dessas situações, seja pela via da nulidade, seja ainda, pelos vícios referidos no nº2 do Artº 410 do CPP, os quais, recorde-se, têm de resultar do acórdão recorrido considerado na sua globalidade, por si só ou conjugado com as regras de experiência comum, sem possibilidade de recurso a quaisquer elementos que ao mesmo sejam estranhos, ainda que constem dos autos.
Efectivamente, do seu exame, não ocorre qualquer falha na avaliação da prova feita pelo Tribunal a quo, revelando-se a mesma como coerente com as regras de experiência comum e conforme à prova produzida, na medida em que os factos assumidos como provados são suporte bastante para a decisão a que se chegou, não se detectando incompatibilidade entre eles e os...
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