Acórdão nº 7888/19.0T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 21-04-2020

Judgment Date21 April 2020
Acordao Number7888/19.0T8LSB.L1-7
Year2020
CourtCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO
AA e BB Unipessoal, Lda. Intentam ação declarativa de anulação de deliberações de assembleia de condóminos contra DD e EE, formulando os seguintes pedidos: a anulação da deliberação da assembleia de condóminos de 12.2.2019 do prédio sito na Rua (…), nº (…), constante da Ata nº 26, que aprovou a proposta de substituição do elevador do prédio de acordo com a proposta da empresa Easylift a anulação da deliberação da assembleia de condóminos de 12.2.2019, do prédio sito na Rua (…) nº (…), que aprovou o orçamento e proposta de trabalhos da empresa JLCD com a pintura geral de paredes e tetos do vão de escada com as demãos necessárias na cor a definir.
Os Réus contestaram, arguindo a exceção dilatória da falta de legitimidade passiva dos Réus e por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.
Em 18.10.2019, foi proferido saneador-sentença que julgou existir a exceção dilatória da ilegitimidade passiva dos Réus, mas que, ao abrigo do Artigo 278º, nº3, do Código de Processo Civil, conheceu de mérito, com o seguinte dispositivo:
«Termos em que, face ao exposto, julgo a presente acção interposta por AA e BB Unipessoal, lda. contra DD e EE, improcedente, e, em consequência, não se decreta nem a nulidade, nem a anulação, das deliberações tomadas na assembleia de condóminos do dia 12.2.2019, referentes à aprovação da substituição do elevador do prédio id. nos autos de acordo com a proposta da empresa Easylfit e do orçamento e proposta de trabalhos da empresa JLCD para pintura geral de paredes e tectos do vão de escada com as demãos necessárias na cor a definir.»
*
Não se conformando com a decisão, dela apelaram os requerentes, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
«CONCLUSÕES
I. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou a presente ação improcedente, e, em consequência, não anulou as deliberações impugnadas pelas Autoras.
II. Cinge-se, contudo, o recurso à decisão de não anulação da deliberação relativa à substituição do elevador, conformando-se as Recorrentes com a decisão relativa à pintura de paredes e tetos do vão de escada.
III. O presente recurso abarca ainda a decisão do Tribunal no sentido de que a ação deveria ter sido intentada contra o condomínio.
IV. Não há dúvidas de que o tema da legitimidade passiva nas ações de anulação de deliberação da assembleia de condóminos tem ocupado a jurisprudência e a doutrina, mas não se crê que a solução a acolher seja a perfilhada pelo Tribunal a quo.
V. Os acórdãos citados não fixaram jurisprudência, sendo, de resto, abundante a jurisprudência que acolhe a posição adotada pelas Recorrentes ao intentar a presente ação, de resto, intentada antes da publicação da referida jurisprudência recente de julho e setembro de 2019 que nunca poderia prejudicar as Recorrentes.
VI. A letra da lei, tanto no art. 1433. °, n.º 6, do CC, como no art. 383. °, n.º 2, do CPC de 2013 é muito clara, não deixando margem para qualquer dúvida interpretativa.
VII. Quando um condómino intenta uma ação para impugnação de uma deliberação da assembleia de condóminos está fundamentalmente em litígio com o(s) outro(s) condómino(s), como a prática bem demonstra e como é o caso dos autos.
VIII. Na falta de uma norma que contenha uma indicação em contrário, por exemplo como a que consta do art. 60. ° do CSC (nos termos da qual "Tanto a ação de declaração de nulidade como a de anulação são propostas contra a sociedade") ou de alteração legislativa clarificadora, não existe motivo para reconhecer legitimidade processual passiva ao Condomínio.
IX. Sendo jurisprudência do nosso Supremo Tribunal de Justiça que as ações para anulação de deliberações tomadas em sede de assembleias de condóminos devem ser intentadas contra os condóminos que as votaram favoravelmente.
X. Pelo que deveria a exceção dilatória invocada pelos Réus ter sido conhecida e julgada improcedente.
XI. Por outro lado, nota-se que o Tribunal a quo identificou, e bem, a única questão que havia a decidir a propósito das deliberações: "saber se houve violação do art° 1425° do CC e se as obras aprovadas através de deliberação por maioria simples correspondem a inovações que deveriam ser aprovadas por maioria de 2/3, sendo, nessa medida, tais deliberações nulas", mas ofereceu a solução errada ao problema.
XII. Nos termos do n° 1 do artigo 1425° do Código Civil, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.
XIII. "Inovar" é nada mais, nada menos, do que "criar", "fazer algo de novo", "trazer algo de novo" àquilo que está. Obras inovadoras serão, portanto, aquelas que trazem algo de novo ao que está, algo de "criativo", introduzindo uma "novidade", ou seja, algo diferente daquilo que está. São aquelas que alteram a edificação no seu estado original."
XIV. Nos autos está em causa a substituição integral de um elevador, clássico, com porta de correr, por uma plataforma vertical com cilindro hidráulico, com a consequente relocalização do motor do elevador de um piso superior para o rés- do-chão.
XV. A referida obra representa uma inovação, no sentido do conceito tal como tem vindo a ser construído pela jurisprudência, pelo que tinha de ser aprovada através de maioria correspondente a 2/3 do valor total do prédio.
XVI. Não tendo assim sucedido, a deliberação em causa é nula nos termos do n° 1 e 4, segunda parte, do artigo 1433° do Código Civil - "se os condóminos tomarem deliberações de conteúdo contrário a normas imperativas, a sanção aplicável não pode deixar de ser a nulidade".
XVII. O entendimento do Tribunal a quo vertido na sentença sob recurso resulta de uma incorreta interpretação dos artigos 1433° n°s 1 e 6 e 1425° do Código Civil.
XVIII. Uma interpretação correta do disposto naqueles preceitos impunha que o Tribunal conhecesse da exceção dilatória e a julgasse improcedente e que considerasse procedente o pedido das Autoras em relação à anulação da deliberação referente à substituição do elevador.
XIX. Tendo a sentença sob recurso feito uma incorreta interpretação do disposto nos artigos 1433° n°s 1 e 6 e 1425° do Código Civil, deve a mesma ser revogada e substituída por outra que julgue procedentes o pedido formulado pelas Autoras no sentido de declarar nula a deliberação que determinou a substituição do elevador e relocalização do motor e que conhece da exceção dilatória invocada pelos Réus e a julgue improcedente.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e a sentença em crise revogada, substituindo-se por outra que i) conheça da exceção dilatória invocada pelos Réus e a julgue improcedente ii) declare nula a deliberação de substituição do elevador do prédio objeto dos autos e relocalização do motor do mesmo, aprovada por maioria simples, em manifesta violação do disposto no n° 1 do artigo 1425° do Código Civil.»
*
Contra-alegaram os apelados, propugnando pela improcedência da apelação, mais sustentando que ocorre ilegitimidade ativa porquanto a sociedade autora não é proprietária da fração “B”, juntando cópia de sentença.
QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso, v.g., abuso de direito.[2]
Nestes termos, as questões a decidir são as seguintes:
i. Ilegitimidade ativa da autora;
ii. Ilegitimidade passiva dos Réus;
iii. Se a aprovação da obra do elevador constitui inovação.
Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença sob recurso considerou como provada a seguinte factualidade:
1- Autoras e Réus são os únicos condóminos do prédio sujeito ao regime da propriedade horizontal sito na Rua (...) , em Lisboa, composto por 5 fracções (A , B, C, D e E).
2- A Autora AA é proprietária das Fracções C e D do identificado prédio.
3- A Autora BB é proprietária da fracção B do mesmo prédio.
4- Os Réus DD e EE são proprietários das Fracções A e E do prédio em causa.
5- Ás fracções A e E , propriedade dos Réus, corresponde a permilagem de 600 (100+500), e o remanescente (400) às Autoras, proprietárias das Fracções B, C, e D.
6- No dia 12 de Fevereiro de 2019, realizou-se uma Assembleia Geral Extraordinária de Condomínio do identificado prédio, com a seguinte ordem de trabalhos:
1. Votação de todos os trabalhos e orçamentos apresentados na Assembleia Geral n°25:
Ponto um: Renovação do elevador
Ponto dois: Renovação e recuperação do hall de entrada e escada edifício Ponto três: Nova porta de entrada para albergar 4 entradas de correio
2. Apresentação de orçamento para restauro dos terraços do piso 5.
3. Limpeza da fachada principal do edifício.
4. Discussão sobre alterações efectuadas à fachada do prédio desde 2015
5. Apresentação de Relatório técnico sobre o estado do edifício.
6. Apresentação das contas de 2019
7. Determinação de provisões/orçamento de condomínio para o ano de 2019
8. Recondução da Administração do condomínio, conforme Convocatória junta como doc.7 com a p.i..
7- Como consta da Acta da referida Assembleia, as Autoras fizeram-se representar por JPM (marido da Autora AA) e os Réus fizeram-se representar pelo seu
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