Acórdão Nº 777/14 de Tribunal Constitucional, 12-11-2014

Número Acordão777/14
Número do processo573/14
Data12 Novembro 2014
Classe processualRecurso

ACÓRDÃO Nº 777/2014

Processo n.º 573/14

2ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., ora recorrente, ré nos autos de ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, em que é autor B., ora recorrido, apresentou reclamação, dirigida ao Tribunal da Relação de Coimbra, do despacho de 4 de outubro de 2013 proferido pelo Juiz do Tribunal da Figueira da Foz que, designadamente, lhe indeferiu o recurso de revisão interposto da sentença final (cfr. fls. 75 e ss.).

Efetuada a distribuição, o Desembargador Relator proferiu o despacho de fl. 130, com o seguinte teor:

«Aquando da apresentação da reclamação, a reclamante não juntou aos autos o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida (ou da concessão do benefício do apoio judiciário).

Assim, notifique-a nos termos e para os efeitos da 2ª parte do n.º 1 do art.º 642.º, do CPC de 2013, e sob a cominação do disposto no n.º 2 do mesmo art.º»

É o seguinte o teor da notificação de fls. 131:

«Fica deste modo V. Ex.ª notificado, relativamente ao processo supra identificado, para no prazo de 10 dias proceder ao pagamento da taxa de justiça (reclamação – art.º 643 CPC.-

Mais fica notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 642.º, n.º 1, 2.ª parte do CPC de 2013, sob a cominação do disposto no n.º 2 do mesmo artigo.

Anexo: fot. De fls. 130 e guias para pagamento da multa.-»

Tendo a reclamante vindo comprovar ter efetuado apenas o pagamento da multa, foi proferido o subsequente despacho:

«Como se referiu, decorrido o prazo para efeito, a reclamante não juntou ao processo o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida, mostrando-se comprovado, apenas, o pagamento da multa que lhe foi liquidada (em obediência ao referido preceito legal).» (fl. 134)

2. Notificada deste despacho, a ré apresentou o requerimento de fls. 138 e ss., pedindo que sobre a matéria do mesmo fosse proferido acórdão, nos termos dos artigos 652.º, n.º 3 e 643.º, n.º 4, do Código de Processo Civil (“CPC”). Suscitou, então, a seguinte questão de inconstitucionalidade:

«10. A Secretaria neste Tribunal da Relação notificou a reclamante, nos termos do nº 1., do artº 642º do CPCivil, para pagamento da taxa de justiça acrescida de multa.

Todavia, fê-lo, com certeza com a melhor das intenções, emitindo a respetiva guia, em termos que veio a induzir a reclamante em erro, pois, admitiu-se que a mesma incluía, desde logo, como era expectável e procedimentalmente mais simples, a taxa de justiça e a respetiva multa.

Assim, ao proceder ao pagamento do valor integral constante da guia enviada por este Venerando Tribunal, a reclamante fê-lo, na absoluta convicção de que estaria a pagar, integralmente, quanto era devido (taxa de justiça e multa).

Aliás, o pagamento em questão revela a sua boa-fé e vontade de cumprir integralmente o legalmente devido assegurando o prosseguimento, apreciação e decisão da reclamação apresentada por parte deste Venerando Tribunal.

Só ao receber agora a notificação do douto despacho do Exmo. Senhor Desembargador-Relator sobre o qual requer que recaia acórdão da conferência, se deu a reclamante conta de que, estranhamente, a guia emitida pela Secretaria deste Tribunal não incluía a taxa de justiça devida, mas apenas o montante correspondente ao da multa.

Estamos perante uma cominação máxima e violenta, que exclui e compromete o acesso ao direito e à Justiça, cominação sancionatória e excecional que deve ser interpretada e aplicada em termos de não inconstitucionalizar o no 2., do artº 642º do CPCivil, por violação do artº 20º da C.R.P., ao excluir-se a possibilidade deste Venerando Tribunal conhecer da reclamação apresentada.

Na verdade, o legislador, e bem, na redação do nº 2., do artº 642º do CPCivil apenas comina com o desentranhamento da alegação, da reposta ou do requerimento, ocorrendo cumulativamente, a omissão de pagamento, tanto da taxa de justiça devida, como da multa.

Ora, como medida sancionatória e drástica que é, só se aplica, quando se regista, simultânea e cumulativamente, a falta de prova do pagamento da taxa de justiça e da multa, o que significa, que provado o pagamento de uma ou de outra, tal cominação não pode ter aplicação.

Na verdade, qualquer interpretação ampliativa, não é consentida por ofender o direito fundamental do acesso ao Direito e à Justiça, ou seja, violar claramente o artº 20º da CRP, ou seja, inconstitucionalizar o nº 2., do artº 642º do CPCivil, o que para todos os legais efeitos se suscita e alega.

Assim, e sem prejuízo de se proceder desde já ao pagamento da taxa devida, bem inferior à multa, a...

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