Acórdão nº 764/15.7T8CSC-A.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 08-10-2015
Judgment Date | 08 October 2015 |
Acordao Number | 764/15.7T8CSC-A.L1-2 |
Year | 2015 |
Court | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa
RELATÓRIO
Em 04.5.2015 Investments, S.A. intentou no Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste, por apenso à ação declarativa pendente naquele tribunal com o n.º 000, procedimento cautelar de arresto contra Fundo, gerido e representado por Fund, S.A..
Por despacho proferido em 05.5.2015 o procedimento cautelar de arresto foi indeferido liminarmente, por se entender que não haviam sido alegados factos integradores do direito a acautelar, não valendo como tal a mera remissão para o que fora alegado na ação principal.
Em 08.5.2015 a requerente apresentou novo requerimento, ao abrigo do art.º 560.º do CPC.
Para sustentar a sua pretensão a requerente alegou que em 14.6.2007 havia celebrado (então ainda com a denominação Investimentos, Lda) com a requerida um contrato-promessa mediante o qual a requerente se obrigara a comprar à requerida e a requerida se obrigara a vender à requerente uma determinada fração autónoma de um prédio a construir, designado comercialmente por “Edifício Estoril”. Por carta de 23.8.2010 a requerida comunicou à requerente que a celebração do contrato de compra e venda estava marcada para 16.9.2010. Porém a requerente solicitou o adiamento da realização da escritura, por ter verificado que o edifício não estava totalmente concluído e em condições de funcionar. O que a requerida aceitou, marcando a escritura para 24.01.2011. Porém, para além dos obstáculos invocados, a requerente veio a verificar que desde 25.10.2007 se encontrava registada sobre o mesmo prédio uma ação intentada pelo Ministério Público em que era pedido que fosse “anulada a deliberação datada de 06.3.2006 da Câmara Municipal de Cascais, a qual determinou a extinção do encargo de construção e manutenção de uma piscina com o comprimento de 50 m e dimensões olímpicas para nela se poderem realizar competições desportivas e anulado o cancelamento do registo de encargo da construção da referida piscina pela Ap. 87 de 09-10-2006”. Em resultado dessa ação era possível que todos os proprietários das frações autónomas do prédio dos autos viessem a ser obrigados a construir e a manter uma piscina com o comprimento de 50 m e dimensões olímpicas para nela realizar competições desportivas. A requerente comunicou então à requerida que não era possível celebrar a escritura definitiva enquanto permanecesse o aludido registo, uma vez que fora acordado que a fração seria transmitida livre de “ónus, encargos ou responsabilidades”. A requerida discordou, insistindo na realização da escritura definitiva, alegando que a aludida ação do Ministério Público, além de infundada, em nada afetaria a fração dos autos, não constituindo um ónus ou encargo. Face à situação descrita a requerente intentou contra a requerida, em 2011, uma ação em que pedia a execução específica do contrato-promessa celebrado entre as partes, com redução do respetivo preço, a qual corre os seus termos na Comarca de Lisboa Oeste, na Instância Central de Cascais. Entretanto a requerida informou a requerente de que o registo da aludida ação intentada pelo Ministério Público tinha sido cancelado em 22.10.2014, pelo que marcara a escritura para o dia 30.12.2014. Ora, entretanto a requerente perdeu interesse na aquisição da aludida fração, por razões que discrimina. Pelo que se verifica uma situação de incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte da requerida, que confere à requerente o direito a reaver em dobro o sinal que entregara à requerida, isto é, o direito a receber da requerida a quantia de € 896 400,00. Caso assim não se entenda, haverá erro sobre o objeto por parte da requerente ou, se assim também não se entender, alteração das circunstâncias, o que em qualquer dos casos fundamenta o direito da requerente à devolução das quantias que entregara à requerida a título de sinal, ou seja, ao montante de € 448 200,00. Por outro lado a requerente tem receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito, pois em 27.02.2015 a requerida deliberou a sua liquidação, o que fará com que todo o ativo da requerida será vendido ou transmitido por outra forma, deixando de existir quaisquer bens que possam responder pela dívida da requerida perante a requerente.
A requerente terminou pedindo que fosse decretado “o arresto da fracção S do prédio urbano sito em Cascais, na Avenida Marginal, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha (…) da freguesia de Cascais, propriedade do Fundo Requerido, para garantia da quantia que seja devida por esta à Requerente em resultado do incumprimento ou anulação ou resolução do contrato-promessa de compra e venda relativo à mesma fracção.”
Por despacho proferido em 03.6.2015 foi ordenada a remessa do procedimento cautelar para a Comarca de Lisboa, na sequência do assim decidido em relação à ação principal.
Em 02.7.2015, após se ter procedido à inquirição de testemunhas, foi proferida sentença em que se julgou o procedimento cautelar de arresto improcedente, por não provado, e em consequência não se decretou o arresto requerido.
A requerente apelou desta decisão, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões:
SOBRE A DECISÃO DE FACTO
1.ª Na douta decisão recorrida, o Exmo Senhor Dr. Juiz a quo entendeu que, além do mais, não resultou provado que:
“3. A requerente reduziu muito significativamente a sua actividade de compra e revenda de imóveis em Portugal, tendo-se nos últimos anos focado essencialmente na área de estudos imobiliários, controlo de qualidade de projectos imobiliários e consultoria imobiliária internacional;"
“4. Seja pela situação de enorme crise que se verificava em Portugal, seja por uma decisão estratégica, o "grupo" em que a requerente se integra deslocalizou a sua actividade para fora do país, sobretudo para a Polónia;"
“5. Atualmente a requerente não consegue obter financiamento bancário para aquisição da fracção;"
“6. (...) o que já lhe foi concretamente referido por algumas instituições financeiras, designadamente novamente o Deutsche Bank, a quem a requerente solicitou agora a análise de um possível financiamento;"
7. Tendo-lhe até sido referido que -o mais provável era a fracção nem sequer ser avaliada no valor do financiamento que antes tinha sido aprovado, pois o seu valor comercial actual será sensivelmente idêntico ao dito financiamento, ou seja, € 750.000,00;"
2.ª Porém, aqueles concretos pontos de facto foram incorrectamente julgados.
3.ª Dos depoimentos das testemunhas Luís, Fernando e João, designadamente das passagens das gravações já antes identificadas e que a final voltarão a indicar-se, resulta que sobre esses concretos pontos de facto devia ter sido dado como provado o seguinte:
- A requerente reduziu muito significativamente a sua actividade de compra e revenda de imóveis em Portugal:
- Pelo menos nos últimos 3 ou 4 anos a requerente tem exercido a sua actividade predominantemente na Polónia, designadamente na "área da prestação de serviços de engenharia;
- Após 2007 verificou-se uma enorme crise no mercado imobiliário em Portugal, em especial nos anos de 2008 a 2011, que teve consequência uma enorme desvalorização dos imóveis e uma redução muito significativa das vendas;
- O financiamento bancário à aquisição de imóveis encontra-se actualmente muito reduzido em Portugal.
- O Deutsche Bank tem igualmente reduzido muito significativamente a concessão de financiamentos à actividade imobiliária, mesmo a clientes antigos, regulares e cumpridores.
4.ª Já quanto ao valor actual da fracção dos autos, do documento n° 4 junto com o requerimento do arresto resulta claramente que "o fundo Requerido avalia actualmente (Março de 2015) a fracção dos autos em € 943.650,00", matéria de facto que devia ter sido dada como provada nestes termos.
5a É que esse é o valor que consta do documento junto como n° 4 com o requerimento de arresto e de onde consta a relação do património do fundo em Março de 2015 e o valor de mercado que lhe é atribuído pelo próprio.
6a Assim, deve ser alterado o julgamento da matéria de facto nos termos acima expostos.
DECISÃO DE DIREITO
7ª Sempre salvo o devido respeito e melhor opinião, o Exmo Senhor Dr. Juiz a quo não tem razão quando entendeu que não tenham sido alegados e ou provados factos dos quais se possa concluir com probabilidade da existência do seu crédito sobre o fundo Requerido.
8.ª Sendo ainda certo que a decisão recorrida sempre devia ter sido no sentido de deferir o arresto ainda que a matéria de facto correctamente dada como provada e não provada fosse — que não é, como já se viu — a considerada na douta sentença recorrida.
9.ª Na verdade, está alegado e provado (pontos 22, 24 e 27 da matéria dada como provada) que existiu uma acção intentada pelo Ministério Público contra o fundo Requerido no qual se pedia a manutenção de construções anteriores, que essa acção se encontrou registada relativamente à fracção dos autos e que a requerente só foi informado do cancelamento (efectuado em Outubro de 2014) em Dezembro de 2014.
10.ª Está ainda alegado e provado que o contrato promessa dos autos foi celebrado em Junho de 2007 e que a compra e venda devia ter tido lugar em finais de 2010, princípios de 2011 (pontos 6 e 17 a 19 da matéria dada como provada).
11.ª Por outro lado, a crise que assolou o mercado imobiliário em Portugal desde 2008 até hoje é um facto público e notário, que, como tal, nem carecia ser alegado ou provado, ainda que o tenha sido.
12.ª Como também é um facto notório a passagem do tempo em si mesmo, isto é, que entre a data prevista para escritura e o cancelamento do ónus mediaram pelo menos 4 anos.
13.ª Tais factos são por si só suficientes para se concluir pela probabilidade da existência do crédito da Requerente sobre o fundo Requerido, seja ele com o fundamento no incumprimento definitivo do contrato promessa, seja ele com fundamento na anulação por...
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