Acórdão nº 763/18.7T8PVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 31-01-2023
Data de Julgamento | 31 Janeiro 2023 |
Case Outcome | REVISTA PROCEDENTE. |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 763/18.7T8PVZ.P1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Processo n.º 763/18.7T8PVZ.P1.S1
Revista – Tribunal recorrido: Relação do Porto, ... Secção
Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça
I) RELATÓRIO
1. AA propôs contra BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, VV, WW, XX, YY, ZZ, AAA, BBB, CCC, DDD, EEE e FFF (após rectificação parcial), Condóminos do Edifício J..., sito na Avenida ..., ..., e Condomínio do mesmo Edifício J.., representado por GGG enquanto Administrador do Condomínio, acção declarativa constitutiva, sob a forma de processo comum, peticionando que: (i) se declare nula ou “quanto muito anulada e de nenhum efeito” a deliberação do ponto 2 (eleição de nova Administração para o ano de 2018) da acta n.º ...6, uma vez que os trabalhos haviam sido interrompidos pelo Presidente da Mesa e, assim sendo, que a marcação da assembleia extraordinária referente à ata n.º 47 e as deliberações aí tomadas sejam declaradas nulas, não produzindo qualquer efeito; (ii) caso assim não se entenda, ou seja, caso se entenda que a Assembleia continuou de forma legal, deverá ser declarado nulo ou anulado e de nenhum efeito o ponto 2 (2.1 e 2.2) da acta n.º 47, referente aos assuntos do contencioso, uma vez que tais deliberações são contrárias aos interesses do condomínio e do preceituado no regulamento, não são deliberações de partes comuns do edifício e, como tal, existe ilegitimidade do senhor Administrador na sua proposição à Assembleia para votação, tal como consta da acta, além de que as mesmas são destituídas de qualquer apoio legal e documental; (iii) o administrador seja exonerado das suas funções, de acordo com o artigo 1435º, 3, do CCiv.
A Autora desistiu deste último pedido (requerimento de 09/11/2018), devidamente homologada por sentença de 27/06/2018.
Em síntese, alegou: a Autora é condómina da fração ..., do edifício em causa; em 17/02/2018 realizou-se assembleia geral ordinária de condóminos do edifício na qual esteve presente, sendo que não esteve até final em razão de o Presidente da Mesa ter comunicado que iria suspender os trabalhos, motivo pelo qual se ausentou; só tomou conhecimento que não houve suspensão dos trabalhos quando recebe carta datada de 05/03/2018, com cópia da acta n.º ...6; por email do indicado Presidente e da aca, verifica-se que houve a falta de vários condóminos por se terem convencido que os trabalhos estavam suspensos; houve assim impedimento de voto a tais condóminos; no que se refere à Assembleia Geral Extraordinária, realizada em 17/03/2018, a Autora não esteve presente, nem representada, sendo que foi aprovado que a Administração do Condomínio desistisse da execução intentada contra a condómina BB por a quantia se encontrar integralmente paga, suportando a administração o pagamento das custas do processo, juros e pagamento dos honorários com o advogado e com o agente de execução; tal comprometimento estava justificado com o facto de a anterior Administração ter instaurado execução sem qualquer interpelação prévia; tal votação não é de uma parte comum do edifício mas relativa a uma fracção de um condómino, sendo assim ilegal tal votação; quem deu causa à ação/execução foi a condómina por não pagar quotas em tempo; a deliberação é contrária ao condomínio e ao regulamento do condomínio – artigo 20.º, n.º 6; quanto à dívida que o condomínio foi condenado a pagar a BB, não se percebe como se atingiu o valor de € 16 576,62 , constante da acta n.º 47.
2. O Réu Condomínio, representado pelo seu administrador e em representação dos condóminos, apresentou Contestação, excepcionando com a caducidade do direito de Autora pedir a anulação da deliberação registada sob a acta n.º ...6 e impugnando as suas alegações, visando a improcedência da acção e absolvição dos Réus dos pedidos.
3. Foi proferido despacho saneador, em que se julgou parte ilegítima o Réu Condomínio, com absolvição da instância, e se relegou para final o conhecimento da excepção de caducidade.
4. Após audiência final de julgamento realizada, o Juíz Local Cível ... proferiu sentença, na qual foi julgada parcialmente procedente a acção e, em consequência, declaradas anuladas “as deliberações tomadas na assembleia de 17 de Março de 2018, sob o ponto 2 (2.1 e 2.2) vertidas na acta n.º 47, referente aos assuntos do contencioso”, absolvendo os Réus do demais peticionado.
5. Inconformados, os Réus condóminos interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, que, identificadas as questões decidendas – “validade das duas deliberações do condomínio no que se reporta a: assunção de pagamentos de custasem processo em que o exequente/condomínio desistiu; redução do valor a pagar pelo condomínio a uma condómina, valor esse fixado em decisão judicial” –, proferiu acórdão em que, no que toca à reapreciação da matéria de facto, se eliminou o facto provado 10., e julgou procedente a apelação: “revoga-se a decisão recorrida na parte em que declarou anuladas as deliberações tomadas na assembleia de 17/03/2018, sob os pontos 2.1 e 2.2, vertidas na ata n.º 47, referente aos assuntos do contencioso, absolvendo-se a recorrente/Réu também desse pedido.”
6. Sem se resignar, veio a Autora interpor recurso de revista para o STJ, no intuito de revogar o acórdão recorrido, finalizando as suas alegações com as seguintes Conclusões:
“1º – Entende a recorrente que o Tribunal da Relação do Porto, com o devido respeito, para proferir a decisão de que ora se recorre parte de uma premissa errada.
2º – Entenderam os Senhores Desembargadores que havendo desistência da execução, as custas terão que ficar a cargo do condomínio, no entanto, o que aqui está em causa é a deliberação da desistência da execução, esta contrária ao regulamento do condomínio.
3º – Os Senhores Desembargadores partiram da premissa da existência da desistência da execução e, em consequência, entenderam que as custas, no caso dessa desistência ficavam a cargo do condomínio.
4º – No entanto, o que viola o regulamento do condomínio é precisamente a deliberação da desistência da instância por parte do condomínio, esta sim é anulável, porque contrária ao regulamento, conforme decorre do artigo 1433º, n.º 1 CC.
5º – É pacífico que a condómina tinha quotas em atraso, logo o condomínio avançou com a execução, sendo que as quotas foram pagas já na pendência do processo.
6º – Desta forma, naturalmente, teria que haver extinção da instância por inutilidade superveniente da lide e, como tal, as custas a suportar pela executada.
7º – O que o condomínio delibera é sobre a desistência da instância com custas pelo condomínio, porque a condómina faltosa não foi previamente interpelada antes da execução (vide ponto 2.1 da ata n.º 47).
8º – Tal deliberação viola de forma clamorosa o regulamento do condomínio que refere no seu artigo 20º, n.º 6 “– Todas as despesas inerentes a advertências ou aplicação de coimas pelo incumprimento do estipulado neste regulamento e na própria lei, bem como as acções ou execuções a propor com o mesmo fim, serão da responsabilidade dos condóminos não cumpridores ou com faltas. Nomeadamente serão da sua responsabilidade honorários do advogado, cartas enviadas pelo mesmo, despesas administrativas, de expediente, de gestão, custas judiciais, procuradoria e outras (…) n.º 9: “Todas as despesas inerentes à instauração de processo judicial de cobrança das prestações de condomínio em atraso, nomeadamente, honorários de advogado, despesas administrativas, de expediente, de gestão, custas judiciais de procuradoria e outras que eventualmente venham a ser exigidas a esta Assembleia de Condóminos, serão da responsabilidade única e exclusiva, do condómino faltoso, fazendo parte acrescida da respetiva tributação para com o condomínio, desde o momento da proposição da acção ou execução”
9º – A consequência de tal violação é a anulabilidade do ponto 2.1 da ata n.º 47.
10º – No que concerne ao perdão da dívida (ponto 2.2 da ata n.º 47) ao contrário do que é mencionado pelos Senhores Desembargadores que referem: “Esta, ao que julgamos, é a primeira crítica à deliberação, ou seja, no fundo questiona-se que se tenha calculado o valor da dívida do condomínio à indicada condómina naquele montante, alegando-se perdoar um valor remanescente que se desconhece se efetivamente existe. Não é alegada a anulabilidade da deliberação, nos termos do artigo 1433º, nº 1 do C.C (deliberação contrária à lei ou ao regulamento).
11º – Com o devido respeito, tal foi alegado e mais que alegado, conforme consta do pedido final da petição inicial, entendendo, de facto, a recorrente que tal deliberação viola o regulamento do condomínio, uma vez que a assembleia deliberou assuntos que não são de partes comuns do edifício e, como tal, não tinha poderes para o fazer, pois afeta direitos que apenas estão na disponibilidade da aludida condómina e não do condomínio.
12º – Ao contrário do que é alegado pelos Senhores Desembargadores o valor de 15.000,00 euros não está relacionado com uma condenação do condomínio do custo de obras que a condómina teve que realizar numa parte comum do edifício, isso é uma ilação que não pode ser tirada.
13º – Com o devido respeito, em lado algum do Acórdão que condenou o condomínio a pagar pelas ditas obras e que se encontra junto aos autos, refere esse valor, mas sim o valor de 11.104,48 euros, acrescido dos respetivos juros.
14ª – São dois valores apresentados pelo condomínio, na ata n.º 47, um de 16.576,62 euros, onde estão incluídos os custos suportados com a condómina, que, mais uma vez, vai contra as normas do regulamento, desconhecendo-se, aliás, que custos são esses! E um outro valor de 15.000,00 euros, que representa um “perdão”, que o condomínio apresenta sem que se saiba o porquê de tal valor, qual o perdão concedido, concedido por quem? E qual é afinal o “perdão”, uma vez que, mais uma vez se refere que o valor que...
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