Acórdão nº 7165/21.6T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 24-09-2024

Data de Julgamento24 Setembro 2024
Número Acordão7165/21.6T8LSB.L1-7
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I- RELATÓRIO
PP… veio intentar a presente ação constitutiva e de condenação, em processo declarativo comum, contra Novo Banco, S.A. pedindo que sejam declarados nulos os avais prestados pelo A. por violação, por parte do R., das obrigações emergentes do Dec.Lei n.º 446/85 de 25 de outubro, e por terem sido apostos em livranças em branco, sem pactos de preenchimento; e que seja declarada a nulidade dos contratos de financiamento celebrados entre o A., a V… e o BES, por simulação, e inexistente o aval prestado pelo A. e as livranças subscritas, em virtude dessa nulidade, condenando-se o R. ao pagamento de €20.000,00, a título de danos morais.
Para tanto alegou ser empresário e acionista da “P…-Sistemas de Fixação, S. A.” e “P… Automotive, S.A.”, que são empresas integradas no Grupo P…, fundado em 1983, que em 2007 iniciou um processo de internacionalização, alargando a sua operação para Espanha e Itália.
Em 2007 o A. foi abordado por funcionário do BES que lhe apresentou uma proposta de operação financeira que tinha como fim permitir a esse banco proporcionar ao A. outro nível de rentabilidade e apoios financeiros, o que passaria pela execução duma complexa operação de reestruturação empresarial, que consistia em transferir as participações que detinha, em nome próprio, para uma holding, que, por sua vez, seria financiada diretamente pelo BES, para que, desse modo, pudesse liquidar o preço da transmissão. O produto do encaixe financeiro assim efetuado pelo A., com a transmissão das suas participações, seria posteriormente integralmente aplicado no BES, que passaria a gerir o referido capital através do seu departamento de Private Banking.
Assim, agindo sob instruções do BES, foi constituída, em março de 2007, a sociedade V…, SGPS, Lda., cujo objeto era a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta do exercício da atividade económica, tendo em 3 de outubro de 2007 sido celebrado um contrato de financiamento, pelo montante máximo de €10.000.000,00, concedido pelo BES à V..., para garantia do qual foi subscrita e avalizada uma livrança pelo A. e efetuado um penhor de valores mobiliários de 170.200 ações da Espírito Santo Financial Group (ESFG-AE), valorizadas, à data, em €4.859.210,00; e 3.000.000 obrigações de NATIXIS, valorizadas, à data, em €2.896.500,00.
Esse contrato veio a ser alterado a 14 de outubro de 2010, quanto à taxa de juro e às garantias do crédito relativas ao penhor de carteira de instrumentos financeiros gerida pelo BES, sendo que, em 2 de janeiro de 2012, foi feita uma nova alteração.
Em 22 de outubro de 2012 veio a ser celebrado um novo contrato de financiamento entre o BES e a V…, que serviu exclusivamente para liquidar o contrato de financiamento anterior, sendo o contrato pelo valor máximo de dez milhões de euros e pelo prazo de 5 anos, para garantia do qual foi subscrita e avalizada uma livrança pelo A. e efetuado um penhor de valores mobiliários de: 170.200 ações denominadas por Espírito Santo Financial Group (ESFG-AE), valorizadas, à data, em €927.590,00; mais a carteira de instrumentos financeiros, considerada como uma universalidade, gerida pela ESGP, SA.
Os financiamentos feitos à V... serviram para esta pagar parcialmente a aquisição de 88,57% do capital social da sociedade anónima “P…-Sistemas de Fixação, S.A.”, que pertencia ao A.. Em simultâneo, o A., com o encaixe financeiro efetuado, entregou os fundos do preço recebido ao BES, que através do seu departamento de Private Banking, no uso dos poderes de gestão discricionária, que lhe havia sido concedido, os aplica, investindo numa carteira, composta por valores mobiliários, que foram os que ficaram dados como garantia, através de penhor, ao financiamento concedido pelo BES à V..., ficando cumulativamente o A. como garante da operação, através de aval prestado em livrança em branco, aceite pela V....
Sucede que, desde o início, o BES sempre transmitiu ao A. que a livrança subscrita por este era uma mera formalidade contratual que os funcionários e representantes do banco tinham que cumprir, reiterando e assegurando ao A. que o rendimento (juros) das suas aplicações seriam mais do que suficientes para cumprir com o custo do financiamento e que o valor das aplicações financeiras, efetuadas pelo BES, cobririam o capital financiado.
O contrato de financiamento de Outubro de 2012 foi concedido sem que tivesse sido amortizado um só cêntimo do contrato de financiamento de Outubro de 2007, pois os juros, durante esses cinco anos, tinham sido suportados pelo produto das aplicações que vinham sendo geridas pelo BES.
Na verdade, o BES montou essa operação para angariar capital através dos produtos financeiros que emitia, junto dos seus clientes, para, posteriormente, os canalizar para as atividades empresariais, não financeiras, do então designado Grupo Espírito Santo (GES), sendo que o BES faliu e foi decretada a sua resolução pelo Banco de Portugal em agosto de 2014, caindo assim todo o esquema e todas as empresas do Grupo Espírito Santo (GES), figurando o A. entre os lesados do BES.
Com o colapso do GES, o A. deixou de ter o rendimento das aplicações em ações e obrigações, uma vez que o valor destas ficaram reduzidos a zero euros, tendo as suas poupanças/investimentos sido fortemente delapidados, sofrendo o A. e o Grupo P... os feitos colaterais desse desastre financeiro.
O A. ficou sujeito à pressão doutras entidades bancárias que, com receio da rutura financeira, iniciaram um processo abrupto de desalavancagem, cortando por completo as relações comerciais com o Grupo P..., deixando de o financiar e passando a exigir a liquidação dos financiamentos em aberto.
O A. viu o financiamento que avalizou, relativo ao contrato financiamento entre o BES e a V..., ser cedido/transmitido, no âmbito do despacho de resolução do Banco de Portugal, para o R., Novo Banco, onde ficaram alocados os ativos e passivos considerados não problemáticos, o qual assumiu a posição contratual do BES, como credor da V... e do A., como garante avalista.
A V... não tinha capacidade para fazer face às obrigações resultantes do contrato de financiamento e o A. ficou com a carteira de ativos perdida, sendo que as responsabilidades das empresas emitentes, todas do Grupo Espírito Santo, se encontravam todas em liquidação e sem capacidade para cumprir com as obrigações inerentes aos valores mobiliários por si emitidos.
O R. exigiu que o seu crédito fosse honrado pontualmente, mas tal era totalmente impossível para o A. e para a V..., já que esta última não tinha qualquer fonte de rendimento, como muito bem sabia o R., pois era uma sociedade meramente instrumental, criada para a operação sugerida pelo BES.
Face às perdas avultadíssimas que o A. sofreu com o colapso do GES era impensável que este continuasse a conceder suprimentos, financiando a V... para que esta conseguisse honrar as suas obrigações.
Na sequência de negociações, em que o A. experimentava uma fase de grande ansiedade, quer patrimonial, quer de saúde psicológica, sentindo que não lhe restava outra opção se não atender à solução proposta pelo R., aceitou alterar o contrato de financiamento com a finalidade única a “liquidação de responsabilidades” existentes, que advinham do financiamento concedido pelo BES.
Em 14 de março de 2017 é então celebrado um contrato de financiamento no montante máximo global de sete milhões de euros, concedido pelo R. à V..., sujeito a um plano de amortizações anuais, garantido por livrança subscrita e avalizada pelo A., o qual foi alterado em 20 de abril de 2018. Paralelamente é celebrado um outro contrato de financiamento no valor de três milhões de euros, também garantido por livrança subscrita e avalizada pelo A. e por penhor de: 170.200 ações, denominadas por ESFG-AE, valorizadas, à data, em 0,00€ (zero euros); e da carteira de instrumentos financeiros, considerada como uma universalidade, gerida pela GNB - Sociedade Gestora de Patrimónios, S.A., o qual também foi alterado em 20 de abril de 2018, quanto à taxa de juro aplicável.
Em qualquer das situações, no esquema de operação de financiamento montado pelo BES, bem como pelo R., verificou-se uma violação do dever de informação e de assistência junto do A., nos termos do Art. 77.º do RGICSF.
Por outro lado, as duas livranças subscritas e avalizadas pelo A. foram entregues em branco, na sequência dos contratos de financiamento que celebrou com o R., que eram meros contratos de adesão, sujeitos ao regime das condições gerais dos contratos, instituído pelo Dec.Lei n.º 446/85 de 25 de outubro, sendo que o R. não informou o A. dos aspetos compreendidos nas cláusulas contratuais gerais cuja aclaração se justificava, sendo que não lhe foi possibilitado ter um efetivo conhecimento dos contratos que avalizou e cujas condições não negociou, tendo as mesmas lhe sido apenas apresentadas para assinatura. Ao que acresce que sempre lhe foi dito que o aval era uma mera formalidade e que, em nenhum momento, existiram consequências para si e para o seu património pessoal, sendo que não houve qualquer acordo de preenchimento, nem neles é definida a obrigação cambiária, a fixação do seu montante, a data do seu vencimento, o local de pagamento e a estipulação de juros, o que determina a nulidade dos avais prestados, sendo o eventual preenchimento desses títulos abusivo, por não ter sido autorizado pelo A..
Sustenta ainda que na génese da operação de financiamento proposta pelo BES está uma vontade simulada, uma ação fraudulenta e um engano para o A., devendo o contrato de financiamento ser considerado nulo, com as consequências legais adjacentes, o mesmo se passando com os contratos celebrados com o R..
Acresce que o A. estava pressionado pela sua situação pessoal e pelas ameaças do R., caso não fosse regularizado o financiamento
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