Acórdão nº 7/17.9IFLSB-E.L1-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 24-03-2022

Data de Julgamento24 Março 2022
Case OutcomeNEGADO PROVIMENTO.
Classe processualRECURSO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (PENAL)
Número Acordão7/17.9IFLSB-E.L1-B.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça



Proc. n.º 7/17.9IFLSB-E.L1-B.S1
Recurso extraordinário de fixação de jurisprudência

I Relatório

1. AA, arguido nestes autos, vem, ao abrigo do disposto no art. 437.º, n.º 2 a 5 e no art. 428.º, do Código de Processo Penal, interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência (mediante requerimento apresentado a 02.12.2021 — cf. certidão junta) do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02.03.2021, proferido no âmbito do processo n.º 7/17.9IFLSB-E.L1-B, que negou provimento ao recurso interposto.

Após a prolação do acórdão aqui recorrido, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional que por decisão sumária n.º 533/2021 (de 02.09.2021) não conheceu do objeto do recurso; esta decisão foi confirmada pelo acórdão n.º 834/2021 (de 28.10.2021).

O acórdão recorrido negou provimento ao recurso (interposto pelo arguido) não reconhecendo a alegada nulidade da busca domiciliária e da apreensão de telemóvel (realizadas a 04.03.2020) por aquando destas não estar representado por advogado, nem reconhecendo a existência de qualquer nulidade ou irregularidade resultante de o mandado de busca não conter qualquer referência ao facto de o arguido ser presidente de um certo clube desportivo, e concluindo, tal como o despacho recorrido, que a arguição de nulidades havia sido extemporânea uma vez que a busca foi realizada a 04.03.2020 e as nulidades apenas foram arguidas a 27.05.2022.

Apresentou como acórdão fundamento o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 06.02.2013, prolatado no processo n.º 6/07.9GABCL.P1, publicado em www.dgsi.pt.

2. Na interposição de recurso, o recorrente apresentou motivação que terminou com as seguintes conclusões:

«1. O presente recurso de fixação de jurisprudência vem interposto do Acórdão da Relação … que confirmou o despacho do Juiz de Instrução Criminal que não conheceu das nulidades arguidas pelo Arguido por considerar a sua arguição intempestiva (“Acórdão Recorrido”), por se encontrar em contradição com o Acórdão da Relação do Porto de 06.02.2013, processo n.º 6/07.9GABCL.P1 (“Acórdão Fundamento”).

2. O presente recurso é tempestivamente apresentado, uma vez que o Arguido apresentou requerimento de arguição de nulidade relativamente ao mesmo, recurso para o Tribunal Constitucional e reclamação para a conferência da decisão sumária proferida pelo Tribunal Constitucional, tendo no dia 02.11.2021 sido notificado do Acórdão que decidiu a referida reclamação, pelo que apenas nessa data transitou o Acórdão Recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 80.º n.º 4 da Lei do Tribunal Constitucional.

3. O Acórdão não admite recurso ordinário, porque proferido na sequência de recurso interposto do Despacho de Juiz Criminal que não conheceu das nulidades arguidas (art.º 400.º n.º 1 c) do CPP).

4. Os Acórdãos assentam na interpretação das normas dos artigos 120.º n.º 3 e 123.º n.º 1 do CPP, concretamente quanto ao momento de início da contagem de arguição de nulidades e irregularidades, tendo por referência o momento em que o Arguido constitui mandatário nos autos, ou lhe é nomeado defensor, pelo que se consideram proferidos no domínio da mesma legislação, não tendo ocorrido modificação legislativa que interferisse com a resolução da questão de direito controvertida.

5. O Acórdão Recorrido considera que, apesar de o Recorrente/Arguido não ter estado acompanhado de Advogado na busca, nem ter mandatário constituído nos autos, ter assinado o respetivo termo onde consta o direito de ser assistido por defensor e não tendo requerido nada, nem manifestado a intenção de arguição de nulidades, não o fez tempestivamente, aplicando o regime da arguição de nulidades e irregularidades dos atos em que o interessado assista.

6. É esta interpretação do momento de início da contagem do prazo para arguição de nulidades/irregularidades, que se encontra, em oposição face à aplicação do mesmo regime pelo Acórdão da Relação do Porto de 06.02.2013, processo n.º 6/07.9GABCL.P1, publicado em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/28cb03199104d3d480257b1900560eea?OpenDocument (“Acórdão Fundamento”).

7. Os factos referentes a cada Acórdão assentam em atos praticado na fase de inquérito distintos, no entanto tal não impede que esteja verificada a identidade de factos nem que a questão de direito em apreço nos dois acórdãos seja fundamentalmente a mesma e haja sido decidida de modo oposto – cf. SIMAS SANTOS E LEAL HENRIQUES.

8. A questão de direito em apreço nos dois Acórdãos é: “Os prazos de arguição de nulidades e irregularidades podem-se iniciar e esgotar antes que o Arguido tenha mandatário constituído nos autos?”

9. No Acórdão Recorrido, decide-se que, porque o Recorrente esteve presente na diligência, tendo sido constituído Arguido e assinado o respetivo o termo onde é referido o direito de ser assistido por defensor e porque o próprio nada requereu, encontra-se esgotado o prazo para o fazer, ainda que não tenha mandatário constituído nos autos – isto é, o Acórdão Recorrido responde que sim.

10. No Acórdão Fundamento, é decidido que só o arguido acompanhado de advogado no processo reúne as condições para reagir no próprio ato ou nos 3 dias seguintes em que tiver conhecimento do mesmo, pelo que apenas após a nomeação de defensor (com a notificação da Acusação), podia arguir a irregularidade – logo, o Acórdão Fundamento responde que não.

11. Pelo exposto, verifica-se que que estão cumpridos os requisitos impostos pelo artigo 437.º do CPP para que o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência seja admitido.»

3. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa respondeu ao recurso interposto tendo concluído a sua resposta nos seguintes termos:

«1 — O Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento interpretaram e aplicaram diversamente as normas dos artigos 120º, nº 3 e 123º, nº 1 do CPP, concretamente quanto ao momento de início da contagem de arguição de nulidades e irregularidades, proferindo decisões opostas.

2 — A situação de facto é similar e a solução jurídica concreta foi diversa, respeitando à aplicação das mesmas normas jurídicas – 120º, nº 3 e 123º, nº 1 do CPP.

3- No Acórdão recorrido, (do Tribunal da Relação de Lisboa), decide-se que, porque o recorrente esteve presente na diligência, tendo sido constituído Arguido e assinado o respectivo termo onde é referido o direito de ser assistido por defensor e porque o próprio nada requereu, encontra-se esgotado o prazo para o fazer , ainda que não tenha mandatário constituído nos autos -isto é , o Acórdão recorrido responde que SIM.

4- Por sua vez no Acórdão fundamento, é decidido que só o arguido acompanhado de advogado no processo reúne as condições para reagir no próprio acto ou nos 3 dias seguintes em que tiver conhecimento do mesmo, pelo que, apenas após a nomeação de defensor (com a notificação da Acusação) podia arguir a irregularidade – logo, o Acórdão fundamento responde que não –“ Citámos.

5- Tendo ambos os Acórdãos transitado em julgado.

6- Termos em que se conclui pela verificação dos requisitos legais previstos no art. 437° do C. de Processo Penal, por estarmos perante dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentam em soluções concretas opostas, verificando-se, assim, a oposição de julgados invocado pelo Recorrente.»

4. Distribuído o processo como recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, nos termos do art. 439.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o processo foi com vista ao Ministério Público, em conformidade com o disposto no art. 440.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto emitido parecer no sentido da rejeição do recurso considerando serem “diferentes as situações de facto e as questões de direito tratadas nos dois acórdãos em confronto”, porquanto:

«(...)Regressando ao caso dos autos.

Quanto aos requisitos formais.

A certidão que instrui o recurso contém [referência … (2022-02-07)]:

- A informação da data da interposição do recurso (página 1);

- Os autos de busca e apreensão ao complexo desportivo do … (páginas 3-6) e à residência do recorrente (páginas 17-18);

- O termo de constituição como arguido do recorrente (páginas 11-12);

- O requerimento de arguição de nulidade do despacho que ordenou a busca domiciliária, da busca domiciliária em si e da apreensão ocorrida no seu decurso (páginas 21-27);

- O despacho de 5 de Junho de 2020 do Sr. juiz de instrução do Tribunal Central de Instrução Criminal que não conheceu as nulidades invocadas em razão da sua intempestividade (páginas 29-34);

- O acórdão recorrido (páginas 35-55);

- O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6 de Julho de 2021 que apreciou um requerimento em que é arguida a nulidade do acórdão recorrido e solicitada a respectiva correcção (páginas 59-69);

- A decisão sumária 533/2021, de 2 de Setembro de 2021, do Tribunal Constitucional que não conheceu o recurso de constitucionalidade do acórdão recorrido (páginas 71-78);

- O acórdão 834/2021, de 28 de Outubro de 2021, do Tribunal Constitucional que indeferiu a reclamação da decisão sumária 533/2021 (páginas 79-90).

O recorrente, na qualidade de arguido e de afectado pela diligência de busca, tem legitimidade e interesse em agir para a interposição do recurso (artigo 437.º, n.º 5, do Código de Processo Penal).

Embora não esteja certificado que o acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no processo 6/07.9GABCL.P1 (acórdão fundamento) haja transitado, em atenção à sua data (6 de Fevereiro de 2013) e ao facto de se encontrar publicado no portal oficial...

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