Acórdão nº 68/11.4TVPRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 28-10-2013

Data de Julgamento28 Outubro 2013
Número Acordão68/11.4TVPRT.P1
Ano2013
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo 68/11.4TVPRT.P1

Recorrente – B….
Recorridas – C… e D….
Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Carlos Gil e Carlos Querido.

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:

1 – Relatório:
1.1 – O processo na 1.ª instância
B… instaurou a presente ação declarativa com processo ordinário e, demandando as rés C… e D…, formulou os seguintes pedidos (considerando-se já a alteração formulada na réplica, e que foi aceite, aos pedidos a) e b) da petição inicial): a) Se declare que a 1ª ré interveio na escritura de aquisição do imóvel sito na Rua …, nº …/… no Porto, (correspondente ao prédio urbano com a descrição 2321 da 2ª Conservatória do Registo Predial do Porto (descrição em Livro N.º 3731, Livro Nº 11), inscrito na matriz sob o art. U-2120 da freguesia …) como mandatária sem representação do autor e a ré (seja) condenada a transferir o referido prédio para o autor, ou, em alternativa, caso se entenda não ser admissível a execução específica em sede do mandato sem representação, ser a ré condenada a pagar ao autor a quantia de 720.000.00€, montante correspondente ao valor atual do referido imóvel, com juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento; b) Se declare que as rés intervieram na abertura de conta bancária nº 0088 7250 0179 no E… como mandatárias sem representação do autor e (sejam) condenadas a transferir para o autor os depósitos poupança, fundos de investimento e demais valores existentes na referida conta bancária, no montante de 395.551,21€, atualizado com os respetivos juros bancários remuneratórios à presente data, e com juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento, ou, em alternativa, caso se entenda não ser admissível a execução específica em sede do mandato sem representação, serem as rés condenadas a pagar ao autor a quantia de 395.551,21€, com juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento; c) Ser a 1ª ré condenada a restituir ao autor os bens móveis que se encontram na moradia sita na Rua …, nº …, …, Porto, descritos no art. 139 da petição inicial por lhe pertencerem exclusivamente.
Subsidiariamente, relativamente aos pedidos formulados em a) e b) - Caso se entenda que os factos alegados nesta sede não consubstanciam um mandato sem representação, sempre deverá: d) A 1ª ré ser condenada a restituir ou pagar ao autor a quantia de 720.000.00€, montante correspondente ao valor atual da moradia sita na Rua …, acima melhor identificada, com juros de mora desde a citação até integral pagamento, com base na extinção da união de facto e consequente enriquecimento sem causa da 1ª ré; e) As 1ª e 2ª rés condenadas a restituir ou pagar ao autor a quantia de 395.551,21 Euros, atualizada com os respetivos juros bancários remuneratórios à presente data, referente a depósitos poupança, fundos de investimento e demais valores existentes na conta bancária nº ………… no E…, com base na extinção da união de facto e consequente enriquecimento sem causa das rés, com juros de mora desde a citação até integral pagamento.

O autor, fundamentando as suas pretensões, veio dizer o que ora se sintetiza:
- O prédio urbano em que o autor e a 1ª corré habitaram, enquanto perdurou a situação de união de facto em que viveram até ao mês de fevereiro de 2009, e onde a aludida ré atualmente habita, embora esteja registado em nome desta, foi pago integralmente pelo demandante, o mesmo se passando com a conta bancária que identifica, a qual, embora seja titulada pelas rés, foi constituída exclusivamente com dinheiro do autor, bens estes (imóvel e valores depositados) que as rés se recusam a entregar ou restituir e o autor pretende reaver com a presente ação.
- O autor e a 1.º ré mantiveram uma relação de facto, desde 1964 a fevereiro de 2009 e, não obstante as frequentes ausências do autor, nomeadamente no estrangeiro, mantiveram uma vida normal (dormiam no mesmo leito, tinham relações amorosas, tomavam refeições juntos e partilhavam alguns interesses comuns), tendo nascido dois filhos (F… e D…) dessa relação. Foi sempre o autor quem pagou as despesas do casal e dos filhos. Entretanto, a relação amorosa entre os dois (autor e 1.ª ré) foi-se desvanecendo e durante todo aquele período de relacionamento houve outros de separação e reconciliação. No início de 1998, o autor iniciou uma relação amorosa com outra mulher, mas em 1999 reconciliou-se com a 1.ª demandada e, depois disso sucederam-se períodos de separação e reconciliação, até que, em 2009, agravado o relacionamento, a 1.ª ré resolveu mudar a fechadura da casa sita na Rua …, local onde habitavam, e assim pondo fim à relação existente.
- O autor acordou com a 1ª corré que aquele prédio urbano seria comprado em nome desta, de modo a que o património do autor ficasse protegido dos credores da H…, Lda., da qual era sóciogerente, assumindo a ré a obrigação de transmitir a propriedade da casa para o demandante logo que já não houvesse problemas com os avales por este prestados à banca, relativamente a financiamentos que haviam sido contraídos pela citada sociedade.
- Apesar de a 1ª corré reconhecer que a casa, efetivamente, pertence ao autor, vem-se recusando a transferir para este a respetiva propriedade e também a entregar-lhe o recheio que se encontra nessa casa, composto por bens que o autor herdou de seus pais e por bens que adquiriu exclusivamente com o seu dinheiro.
- O autor acordou com as rés que as suas poupanças, no montante de quatrocentos mil euros, fossem depositadas numa conta bancária onde constariam apenas as rés como titulares, o que foi feito para pôr a salvo esse património da mulher com quem o autor manteve uma relação amorosa no ano de 1998, comprometendo-se aquelas (rés) a restituir-lhe os fundos depositados nessa conta logo que a mulher com quem o autor manteve o aludido relacionamento amoroso desaparecesse definitivamente da sua vida e deixasse de lhe pedir dinheiro.
- No entanto, apesar de as demandadas reconhecerem que os valores depositados naquela conta bancária pertencem exclusivamente ao autor, vêm-se recusando a devolver-lhe esses valores.

Com a petição, o autor juntou os documentos constantes de fls. 99 a 229. As rés foram citadas e, depois de pedirem o alargamento do prazo de oposição, contestaram (conjuntamente) a fls. 247 e ss.

Na contestação, as rés começam por excecionar a prescrição do direito (de crédito) à transmissão resultante do mandato sem representação alegadamente subjacente ao contrato de compra e venda da casa da Rua … e, bem assim, a prescrição do direito à restituição do alegado enriquecimento sem causa, sendo certo que – defendem - a união de facto que existiu entre o autor e a 1ª corré cessou, não na data avançada pelo demandante, mas em agosto de 2005. As rés defendem-se, ainda, por exceção dilatória, considerando que existe falta de causa de pedir para os pedidos de restituição fundados no enriquecimento sem causa, posto que o autor não alegou quaisquer factos que substanciem, autonomamente, a inexistência de causa para o enriquecimento que vem imputar às contestantes. Também advogam a inexistência de causa de pedir para os pedidos de reconhecimento de propriedade, dado que o autor não alegou qualquer facto de que possa retirar-se o efeito jurídico de aquisição de qualquer direito real sobre a casa da Rua … e sobre os fundos existentes na conta bancária do E…. As rés contestam, igualmente, por impugnação. Alegam que a 1ª corré contribuiu financeira, económica e organizativamente para a vida em comum com o autor, adiantando que entre o autor e aquela foi acordado que a casa da Rua … ficaria definitivamente para a contestante, sem que houvesse lugar a quaisquer restituições, em espécie ou em dinheiro, e que, em relação às quantias depositadas no E…, as mesmas foram utilizadas, conforme acordado entre as partes, para sustento e educação da 2ª corré e também para financiar parte dos gastos regulares e quotidianos da família.

O autor, depois de também requerer a ampliação do prazo, veio replicar no articulado de fls. 283 e ss., aí procedendo – como já se referiu – à alteração aos pedidos a) e b), formulados na petição. Na réplica o autor responde às diversas exceções suscitadas pelas rés.

Treplicaram as rés (fls. 346/347), atenta a alteração dos pedidos, mas concluíram essencialmente nos moldes da contestação.

Realizou-se audiência preliminar (fls. 351/352) e a instância foi suspensa a requerimento das partes. No prosseguimento dos autos, proferiu-se despacho saneador onde se fixou o valor da causa (1.165.551,21€), se conheceram as exceções que, nessa ocasião, era possível conhecer[1] e se relegaram as restantes para conhecimento a final[2]. Na mesma ocasião fixou-se a matéria de facto assente e organizou-se base instrutória.

Procedeu-se a julgamento nos termos que as diversas atas documentam. A base instrutória obteve as respostas constantes de fls. 597 e ss e, conclusos os autos, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu as rés dos pedidos formulados pelo autor.

1.2 – Do recurso:
Inconformado, o autor veio apelar. Junta, "nos termos do disposto no art. 524.º e 693.º-B do Código de Processo Civil, 1 documento, em virtude de se revelar necessário face ao alegado pelas recorridas na contestação e ser superveniente à ação" e pretende que, reapreciada a prova, sejam alteradas diversas respostas à base instrutória e que, com diversa aplicação do direito, seja revogada a sentença recorrida e substituída por acórdão que julgue procedentes as pretensões por si deduzidas na ação. Apresenta as seguintes conclusões:
Relativamente à matéria de facto
I – Do fim da união de facto entre o recorrente e a recorrida C… (nº 1 e nº 2 da BI)
1ª) A douta decisão de facto apenas teve em consideração os depoimentos prestados pelas testemunhas das recorridas, I…, J…, K… e F…, não valorando nesta sede os documentos
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