Acórdão nº 669/20.0T8FAR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23-05-2024
Data de Julgamento | 23 Maio 2024 |
Número Acordão | 669/20.0T8FAR-A.E1 |
Ano | 2024 |
Órgão | Tribunal da Relação de Évora |
Recurso de Apelação n.º 669/20.0T8FAR-A.E1
Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
I – Relatório
1. Nos autos de inventário n.º ...... [Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo de Competência Genérica ... – Juiz ...], a que se procede por óbito de AA, em que é requerente e cabeça-de-casal BB e interessados, além da requerente, CC, filhas da de cujus, e DD e EE, como donatários e netos da falecida, foi proferido o despacho (ref.ª 127109956), de 22/02/2023, que decidiu da reclamação apresentada pela interessada CC contra a relação de bens e de “questão controvertida” apresentada pela interessada e cabeça-de-casal BB, na qual, na parte que releva para o presente recurso, decidiu-se o seguinte:«I – DA RECLAMAÇÃO À RELAÇÃO DE BENS APRESENTADA PELA INTERESSADA CC:
Por requerimento datado de 07.007.2020 (cfr. ref.ª 8015678), veio a interessada CC reclamar da relação de bens apresentada pela Cabeça-de-Casal nomeada nestes autos – BB – em 02.03.2020 (cfr. com o requerimento inicial), nos termos do disposto no art. 1104º, n.º 1, al. d), do CPC, nos seguintes termos:
(…)
d) Omissão de verba do activo: alega a interessada que a Requerente e Cabeça-de-Casal, ainda em vida da inventariada e fazendo uso de procurações a sai passadas e ao seu marido, vendeu a parte que pertencia àquela de um prédio misto, sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...74 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...32 e na rústica sob o artigo 197 secção AE da freguesia ..., pelo preço de € 225.000,00, tendo o produto da venda sido dividido por dois, cabendo à inventariada a quantia de € 112.500,00, que o depositou numa conta bancária titulada pela Autora ou por esta co-titulada, devendo ser relacionada;
(…)
Procedeu-se a várias diligencias de prova para apuramento desta matéria, nomeadamente, procedeu-se à notificação do banco Santander Totta para vir aos autos indicar qual o montante titulado pelo seguro PPR associado à conta bancária n.º ...20, da qual a inventariada era titular, à data da sua morte; à notificação da Interessada CC para vir aos autos juntar certidão predial do prédio misto sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...74, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...32 e na rústica sob o artigo 197 Secção AE da freguesia ...; à notificação da Cabeça-de-Casal para vir aos autos juntar uma cópia da escritura pública de compra e venda do prédio misto sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...74, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...32 e na rústica sob o artigo 197 Secção AE da freguesia ..., tendo como referencia o contrato promessa de compra e venda junto a fls. 43 a 45 dos autos (cfr. despacho com a ref.ª 121411416).
Foi solicitada mais documentação bancária a várias entidades, a qual se mostra junta aos autos.
Encontra-se o Tribunal em condições de apreciar a presente reclamação e não se afigurando necessária a produção de prova, cabe decidir da pertinência do relacionamento/alteração dos bens acima indicados e objecto da presente reclamação.
Analisemos os sucessivos pontos, com base nas declarações das partes e da prova documental junta aos autos.
(…)
*
Quanto à alínea d): omissão de verba do activo:
Invoca a Interessada reclamante que a Cabeça-de-Casal, ainda em vida da inventariada e fazendo uso de procurações a sai passadas e ao seu marido, vendeu a parte que pertencia à Inventariada de um prédio misto, sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...74 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...32 e na rústica sob o artigo 197 secção AE da freguesia ..., pelo preço de € 225.000,00, tendo o produto da venda sido dividido por dois, cabendo à Inventariada a quantia de € 112.500,00, que o depositou numa conta bancária titulada pela Autora ou por esta co-titulada, devendo por isso ser relacionada.
Em resposta, veio a Cabeça-de-Casal dizer que actuou como representante de sua mãe e de seu tio no negócio e que da leitura da procuração junta se percebe que se trata de uma procuração, datada de 1989, para compra e não para venda de imóveis.
Analisemos, antes de mais, os documentos trazidos aos autos pelas Interessadas.
Pela Interessada reclamante CC foi junto com a reclamação (cfr. ref.ª 8015678) um contrato promessa de compra e venda, datado de 24.10.2006, outorgado pela Inventariada e seu irmão FF e esposa AA, na qualidade de promitentes vendedores e GG, na qualidade de promitente compradora de um prédio misto sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...21 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...32 e na matriz predial rústica sob o artigo ...97 da secção AE da freguesia ... e o prédio rústico sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...21 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...07 da secção AE da freguesia ....
O preço acordado pela venda dos imóveis foi de € 225.000,00, devendo a promitente compradora entregar a quantia de € 56.250,00 a título de sinal e antecipação de pagamento do preço, o que fez, com a entrega de dois cheques no valor cada um de € 28.125,00 (cuja cópia também se mostra junta com o contrato).
Pela mesma Interessada foi junta uma procuração datada de 09.10.1989, através da qual a Inventariada AA constituiu seu bastante procurador HH, a quem deu poderes precisos para, em seu nome e do seu marido, outorgar e assinar uma escritura de justificação, pela qual ela e o marido e terceiras pessoas, se declaram donos e legítimos possuidores, na proporção de metade para cada um, de um prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo ...34 da secção AE, da freguesia ..., bem como para vendê-lo pelo melhor preço.
Ora, desde já podemos daqui concluir que não é verdade, nem que esta procuração comprove que a Cabeça-de-Casal, fazendo uso desta procuração, outorgou o contrato promessa em representação da Inventariada – que como já vimos, outorgou pelo seu próprio punho esse contrato promessa de compra e venda – nem é verdade que tal procuração se reporte apenas a poderes para vender, senão também para assinar uma alegada escritura de justificação notarial.
Seja como for, não há dúvidas que tal procuração nada tem que ver com o contrato de promessa de compra e venda supra referido, já que se reportam a prédios totalmente distintos.
Pela Cabeça-de-Casal foi junta aos autos (cfr. ref.ª 9385178), certidão da escritura de compra e venda dos mesmos prédios objecto do contrato promessa de compra e venda acima referido, outorgada em 23.01.2007, pela Inventariada e seu irmão, na qualidade de vendedores e GG na qualidade de procuradora de II, na qualidade de compradora, pelo preço global de € 225.000,00, que aí se dizia já recebido.
Foi tal aquisição, por compra registada pela Ap. ...4 de 02.02.2007, conforme certidão do registo predial junta com a ref.ª ...75.
Mais nenhuma prova foi produzida quanto a esta matéria.
Da documentação junta é possível extrair que efectivamente, a Inventariada era titular do direito de propriedade, na proporção de ½ dos dois prédios acima descritos e que, em vida – mais concretamente em 23.01.2007 – os vendeu a um terceiro, pelo preço global de € 225.000,00 – cabendo-lhe a quantia correspondente a metade no valor de € 112.500,00, que recebeu.
Não é correcto, como afirmou a Interessada reclamante que a Cabeça-de-Casal tenha tido alguma intervenção neste negócio, nomeadamente na qualidade de procuradora da Inventariada, como também não resultou provado, seja por que meio for, que a quantia que competia à Inventariada tenha sido depositada numa conta bancária titulada ou co titulada pela Cabeça-de-Casal.
Desconhece-se, aliás, qual o destino dado à quantia de € 112.500,00 correspondente a metade do preço que cabia à Inventariada, o que atenta a data da celebração do negócio de compra e venda (23.01.2007) e a data da sua morte (02.03.2019), ou seja, mais de doze anos depois, não é despiciendo pensar que foi utilizada pela Inventariada, em seu próprio benefício.
Facto é que da informação bancária fornecida aos autos (cfr. informação prestada pelo Banco de Portugal com a ref.ª 10084508, conjugada com as informações prestadas pelo Banco Santander Totta com a ref.ª 10106627), não é possível comprovar que tal montante estivesse depositado em alguma das contas bancárias da Inventariada.
Por outro lado, não logrou a Interessada reclamante provar que a Cabeça-de-Casal tenha feito sua tal quantia, como alega, não tendo sequer resultado da prova junta que tenha tido qualquer intervenção no negócio em causa.
Face ao exposto, por total falta de prova, indefere-se a reclamação nesta parte.
(…)
*
II – DA “QUESTÃO CONTROVERTIDA” APRESENTADA PELA INTERESSADA CABEÇA-DE-CASAL BB:Em sede de requerimento inicial, veio a Cabeça-de-Casal alegar duas questões:
(…)
b) Segunda questão: um depósito bancário, titulado pela conta n.º ...74, do Millennium BCP:
Diz a Cabeça-de-Casal que a Inventariada AA era titular de um depósito bancário, titulado pela conta n.º ...74, do Millennium BCP, no valor de € 100.000,00 e que em 12.06.2018, reverteu para uma outra conta bancária em nome da Interessada CC, filha da Inventariada, aberta no mesmo dia, tendo liquidado a primitiva conta.
Alega que no mesmo balcão, posteriormente, em 25.06.2018, adicionou a sua filha CC como titular, tendo esta Interessada voltado a transferir o mesmo montante para a conta primitiva. Acrescenta que, nesse mesmo dia, esta Interessada procedeu a um levantamento no valor de € 9.000,00.
Em resposta, a Interessada CC não nega a existência dessa conta bancária. O que alega é que esse montante foi aplicado num depósito VIP do Millennium BCP na data de 25.04.2018 e que desconhece a situação do depósito a prazo à data do óbito.
Da documentação junta aos autos pela Cabeça-de-Casal e pela...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO